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CALVINO, Italo.

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101 
TriceVersa, Assis, v.2, n.2, nov.2008-abr.2009 
 
 
 
EXPERIÊNCIAS E TESTEMUNHOS: O BALANÇO DE ÍTALO CALVINO 
 
Patricia Peterle 
UFSC 
 
 
Italo Calvino já é um autor consagrado dentro e fora da Itália. Ao 
contrário de muitos escritores italianos que ainda não tiveram suas obras 
traduzidas no Brasil, como o próprio Dante Alighieri (com a exceção da Divina 
Comédia) ou Francesco Petrarca, só para ficar no famoso pilar da literatura 
italiana, Calvino goza de um espaço aberto. De fato, suas obras têm sido 
frequentemente traduzidas. Diogo Mainardi, Nilson Moulin, Ivo Barroso e 
Roberta Barni são os tradutores de Calvino no Brasil, que é publicado pela 
Companhia das Letras. 
“O fio não perde a tensão, nem se embaralha” é umas das frases de 
Harold Bloom para se referir a Calvino. E é justamente este equilíbrio que o 
leitor encontra nesse mais novo livro. “Aqui é a forma do labirinto a 
predominar” (2009, p. 115). Imagem, essa, tão cara ao autor italiano que 
pode representar a totalidade da obra que chega agora ao público brasileiro, 
na tradução de Roberta Barni. Assunto encerrado, cujo subtítulo é discursos 
sobre literatura e sociedade, é uma coletânea de conferências, realizadas 
dentro e fora da Itália, e de textos publicados em diferentes periódicos entre 
1950 e 1978. 
A ideia de labirinto presente em alguns textos ficcionais de Calvino já é 
conhecida do leitor brasileiro. Basta pensar nos inúmeros romances 
começados e inacabados em Se uma noite de inverno um viajante (1999), que 
unem dois personagens-leitores, ou nas múltiplas percepções da cidade, que 
numa análise combinatória perfilam uma só, em As cidades invisíveis. Esse 
espaço poliédrico, que envolve e atrai, chama a atenção do próprio Calvino 
em outros escritores como: Butor “labirinto do conhecimento 
fenomenológico”, Carlo Emilio Gadda “labirinto da concreção e estratificação 
TRICEVERSA 
Revista do Centro Ítalo-Luso-Brasileiro 
de Estudos Linguísticos e Culturais 
ISSN 1981 8432 
www.assis.unesp.br/cilbelc 
TriceVersa, Assis, v.2, n.2, nov.2008-abr.2009 CILBELC 
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TriceVersa, Assis, v.2, n.2, nov.2008-abr.2009 
linguística”, Borges “labirinto de imagens culturais” na célebre Biblioteca de 
Babel. A saída do labirinto é um desafio e é dessa forma que, para Calvino, a 
literatura se apresenta: “[...] que ela [a literatura] própria forneça a chave 
para podermos sair dele. O que a literatura pode fazer é definir a melhor 
atitude para encontrar o caminho da saída, embora essa saída nada mais será 
que a passagem de um labirinto para outro. E o desafio ao labirinto que 
desejamos salvar é uma literatura do desafio ao labirinto que desejamos 
evidenciar e distinguir da literatura da rendição ao labirinto” (2009, p. 116). 
Esta é uma das reflexões presentes em Assunto encerrado e está no texto 
“Desafio ao labirinto”, originalmente publicado no periódico Il Menabò, em 
1962. 
Tal imagem do labirinto representa, ainda, o emaranhado das existências 
humanas, que nas páginas calvinianas passa pelo crivo de dois elementos 
essenciais: a fabulação e o real. O “fabulista dotado de comicidade 
esplêndida”, sempre segundo Bloom, apresenta, discute, provoca o riso com 
suas histórias que parecem fantásticas, como a do barão que pula de árvore 
em árvore, a do visconte partido ao meio, a do cavaleiro inexistente ou a dos 
encontros e desencontros em os Amores difíceis (1992). Em todas essas 
histórias e narrativas o ponto de confluência é a criação/imaginação como um 
modo de sobreviver, refletir e até enfrentar as atrocidades da História. 
Italo Calvino é uma personalidade complexa, que congrega vários perfis 
que aparecem, às vezes mais, às vezes menos, nas entrelinhas de seus textos. 
São eles: o do escritor, o do crítico, o do teórico, o do tradutor, sem esquecer 
o trabalho em uma das maiores editoras italianas, a Einaudi. De uma forma ou 
de outra, o leitor em Assunto encerrado tem a possibilidade de ter um maior 
contato e compartilhar o caminho diversificado, trilhado e testemunhado nas 
quase 400 páginas que se apresentam. 
“Como se configuram os caminhos hoje de desenvolvimento da literatura 
italiana, e mais particularmente no campo que me é mais familiar, o 
romance?” (2009, p. 64). Ao falar das questões relativas à literatura italiana, 
Calvino cita uma série de escritores que também já são conhecidos do leitor 
brasileiro: Cesare Pavese (que já tem algumas traduções e do qual este ano 
foi publicada a bela edição de Trabalhar Cansa, pela 7Letras/Cosac Naify), 
Elio Vittorini, Pier Paolo Pasolini, Alberto Moravia e tantos outros que fizeram 
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TriceVersa, Assis, v.2, n.2, nov.2008-abr.2009 
parte dessa geração do pós-guerra na Itália. Mas é falando e refletindo sobre 
essa literatura materna que Calvino aponta algumas questões e problemáticas 
da própria literatura, vista ainda por um prisma trans-nacional, que vai além 
das fronteiras geográficas e culturais. “O romance não pode mais ter a 
pretensão de nos informar sobre como é o mundo; deve e pode descobrir, 
porém, as mil, as cem mil novas maneiras em que nossa inserção no mundo se 
configura, expressando pouco a pouco as novas situações existenciais [...] ato 
natural de quem toma consciência de si próprio, de quem olha em volta com o 
espanto de estar no mundo” (2009, p. 85). Um estar no mundo que pode 
lembrar o ser no mundo, a inserção da qual já falara Jean-Paul Sartre. 
É nessas páginas que Calvino se abre e fala da sua passagem pela 
literatura da Resistência, com A trilha dos ninhos de aranha (2004) e seu 
célebre prefácio. Naquele momento do pós-guerra, pelo qual todos os de sua 
geração passaram, não tinha como ser indiferente, até o silêncio possuía um 
forte significado! Contudo, ao mesmo tempo, a sociedade mudava e as formas 
de olhar e interagir também mudavam, e tudo isto para o autor italiano 
significava, sobretudo, uma mudança “na inserção no mundo” e “nas novas 
situações existenciais”. Uma nova ordem requer outros e novos parâmetros. 
Ora, não é isso que é colocado nas Seis propostas para o próximo milênio 
(1990), quando Calvino, no “papel de teórico”, define leveza, exatidão, 
velocidade, multiplicidade e visibilidade? 
Ao todo Assunto encerrado é composto por 42 textos, ou melhor 
dizendo, ensaios, fragmentos mais ou menos curtos que propõem sempre uma 
reflexão em torno de um determinado tema. Escritos que testemunham uma 
experiência de quase 25 anos: o desenvolvimento e o amadurecimento do 
percurso de Calvino. Da ambição juvenil, do projeto de (re)construção de uma 
nova literatura do pós-guerra, até o colapso de uma sociedade que pode se 
apresentar “desmoronada” ou como uma “gangrena”. “Desmoronada” e 
“gangrena” são palavras explicitadas pelo autor já na apresentação do livro, 
datada de 1980, e que também podem lembrar os escritos do mesmo período 
de Susan Sontag, como por exemplo A doença como metáfora, de 1978. 
Assim, essa publicação, organizada pelo próprio Calvino em 1980, 
resgata e oferece uma rica coletânea de conferências, realizadas dentro e 
fora da Itália, e de textos publicados em diferentes meios, em mais de duas 
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TriceVersa, Assis, v.2, n.2, nov.2008-abr.2009 
décadas. Il Giorno, Il Menabò, Paese Sera, The times literary supplement, Il 
Caffè, Corriere della Sera, Nuova Corrente, L’Approdo Letterario, Il Ponte, 
Libri Nuovi, Revista Pirelli, 20th Century Studies, L’Espresso, Almanacco 
Bompiani, Nuovi Argomenti, Nuovasocietà, Derrière Le Miroir e Pubblico são 
os periódicos citados. 
Este livro pode ser visto, portanto, como uma espécie de balanço da 
trajetória percorrida. É apresentando-se como uma experiência finalizada que 
a sequência destas páginascomeça a tomar forma, a tornar-se uma história 
que tem seu sentido no desenho de um conjunto contextual: “[...] Para 
compreender o ponto em que estou. Para pôr um ponto-final. Para encerrar o 
assunto” (2009, p. 80). Um encerrar que pode representar um outro e novo 
recomeço. 
Um novo recomeço que pode ser a tentativa de reconhecer e sair do 
“inferno”, como coloca Marco Pólo, nas últimas linhas inquietantes de As 
cidades invisíveis: “O inferno dos vivos é aqui, o inferno em que vivemos 
todos os dias, o inferno que, juntos, formamos. Há duas maneiras de escapar 
de tal sofrimento. A primeira é fácil para muitos: aceitar o inferno e se tornar 
parte dele, com tamanha intensidade que já não se consiga sequer vê-lo. A 
segunda é arriscada e requer vigilância e preocupação constantes: aprender a 
identificar quem e que, no meio do inferno, não é inferno, e preservá-los, e 
abrir-lhes espaço” (1990, p. 150). 
 
 
 
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 
CALVINO, Italo. Assunto encerrado  discursos sobre literatura e sociedade. 
Tradução de Roberto Barni. São Paulo: Companhia das Letras, 2009. 
______. As cidades invisíveis. Tradução de Diogo Mainardi. São Paulo: 
Companhia das Letras, 1990.

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