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Revista Tecer - Belo Horizonte – vol. 5, nº 8, maio de 2012 29 O cyberbullying e a liberdade de expressão: uma proposta de análise dos limites que garantem a manutenção do convívio social * Matheus Berto Resumo A emergência da internet e evolução tecnológica dos meios comunicacionais ampliaram as formas de interação social, abrindo novos espaços para atos de livre expressão. Entretanto, no momento em que ultrapassa os limites dos outros sujeitos atrapalhando o convívio social, a liberdade de opinião proporcionada pela internet transforma-se em um ato de cyberbullying, que trazem consigo diversos transtornos psicológicos e sociais aos sujeitos vitimizados. Com base nesse cenário o presente trabalho apresenta uma análise acerca dos conceitos de cyberbullying e liberdade de expressão, e propõe uma tentativa de delimitação entre esses termos. A reflexão é subsidiada pelas teorias de direito a comunicação a partir de uma revisão de literaturas sobre o tema. Palavras-chave: cyberbullying; liberdade de expressão; comunicação; internet; diálogos virtuais Comentários iniciais Em janeiro de 2010 Phoebe Prince, uma adolescente de 15 anos do estado americano de Massachusetts, cometeu suicídio após ter sido submetida a agressões verbais e ameaças de agressões físicas através de sites de relacionamento social como o Facebook, enquanto as meninas acusadas de serem às responsáveis pelo seu ataque, também sofriam ameaças e intimidações pela internet. (REUTERS, 2010) Pelas mesmas razões, Makoto, um adolescente japonês, tentou suicidar-se duas vezes após sucessíveis agressões virtuais infligidas por colegas através de e-mails e sites de relacionamento. Sem sucesso em suas tentativas e ainda constrangido pelas violências digitais, o adolescente se tornou anoréxico e passou a evitar sair do quarto por cerca de seis meses. (REUTERS, 2007) No Brasil, mais recentemente, o apresentador e humorista Rafinha Bastos foi alvo de duros protestos na internet, encabeçados por moradores e autoridades do Estado de Rondônia, após ter declarado em um show de stand up comedy em abril de 2011 que * Artigo recebido em 17/10/2011 e publicado em 05/05/2012. Publicitário graduado pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas, especialista em Marketing, pós- graduado pela Media Marketing School e Mestrando em Comunicação pela Universidade Metodista de São Paulo. Docente e coordenador Adjunto da Faculdade de Educação e Ciências Gerenciais de Sumaré. matheusberto@hotmail.com Revista Tecer - Belo Horizonte – vol. 5, nº 8, maio de 2012 30 os moradores do Estado são “filhos do capeta”, e ainda que aquele é “o povo mais feio do Brasil” (JARUSSI, 2011). Essas e outras atitudes similares ocorridas com cada vez mais frequência na internet podem ser encaradas, de acordo com a definição proposta por Spyer (2009), como ações de Cyberbullying [o Cyberbullying] poderia ser traduzido como Coerção Cibernética ou, simplesmente, Abuso Online. É algo que está acima da ‘encheção de saco’. (...) O Cyberbullying pode ir de um e-mail ameaçador, um comentário ofensivo, um boato maledicente publicado de forma aberta em uma comunidade virtual, até uma perseguição que ultrapassa o mundo do teclado e vai para o universo físico. Entretanto, há quem diga que apenas a postagem de comentários desse tipo efetuada nos meios eletrônicos não caracteriza em si uma ação de Cyberbullying, e sim brincadeiras sociais ou ainda simples atos de liberdade de expressão no meio eletrônico. Contudo, quais são os limites que diferenciam essas duas ações? Com base no cenário apresentado, este trabalho propõe uma discussão acerca dos limites que caracterizam e diferenciam as ações de Cyberbullying e os atos de liberdade de expressão na internet, sob a ótica dos direitos à comunicação. Cyberbullying: coerção em ambiente virtual As palavras bullying e cyberbullying são termos derivados da língua inglesa ainda sem tradução para português. Na tentativa de explicar o seu conceito, parte-se do princípio que bully é um termo inglês que significa “valentão”, o que garante à palavra bullying o significado de “o ato de coagir” ou “o ato de intimidar”. Nesse sentido, o presente trabalho baseia-se na ideia de bullying como um ato de coerção contra alguém, efetuado por uma ou mais pessoa sem que haja um motivo concreto e evidente, o qual possibilite à vítima pouca ou nenhuma oportunidade de defesa, promovendo ao vitimizado problemas na manutenção do seu convívio social. Indo ao encontro dessa definição este trabalho foi fundamento a partir da classificação que categoriza cyberbullying como uma ação de bullying ocorrida em ambiente virtual. Sob essa ótica, pode-se observar que o bullying não é a manifestação de um único crime, mas sim de vários atos criminosos, tais como: calúnia e difamação, agressão física ou moral, danos à propriedade privada, dentre outros, fazendo com que o agressor responda criminalmente a essas infrações (FAUSTINO & OLIVEIRA, 2008). Até a poucos anos atrás, ações desse tipo eram consideradas normais e necessárias à maturação do convívio social, tornando-se objeto de estudos e discussões, especialmente no Brasil, apenas nos últimos 15 anos (LISBOA, BRAGA, EBERT, 2009). A falta de conhecimento acerca desse assunto aliada à popularização dessa discussão, promovida em especial pelas mídias de massa banalizaram a utilização desses termos, o que reforça uma vez mais a necessidade de um debate acerca desse assunto. Os termos bullying e cyberbullying são termos originários da língua inglesa e ainda não traduzidos para a língua portuguesa. Revista Tecer - Belo Horizonte – vol. 5, nº 8, maio de 2012 31 Segundo ABRAPIA - Associação Brasileira Multiprofissional de Proteção à Infância e à Adolescência os atos de bullying são identificados por [ ...] colocar apelidos, ofender, zoar, gozar, encarnar, sacanear, humilhar,fazer sofrer, discriminar, excluir, isolar, ignorar, intimidar, perseguir, assediar, aterrorizar, amedrontar, tiranizar, dominar, agredir, bater, chutar, empurrar, ferir, roubar, quebrar pertences [...] (ABRAPIA, 2007). Corroborando com essa ideia, Lopes Neto (2005), em sua proposta de estudo sobre esse tema, classifica as ações de bullying em 2 categorias: O bullying é classificado como direto, quando as vítimas são atacadas diretamente, ou indireto, quando estão ausentes. São considerados bullying direto os apelidos, agressões físicas, ameaças, roubos, ofensas verbais ou expressões e gestos que geram mal estar aos alvos (...) O bullying indireto compreende atitudes de indiferença, isolamento, difamação e negação aos desejos (LOPES, 2005). Dentre todas as formas de bullying que se enquadram nessa classificação, tais como insultos verbais, coerção física e material, ataques psicológicos e morais e abusos sexuais, dentre outros, é o cyberbullying (também conhecido como bullying virtual) aquele que vem sendo praticado com maior frequência, de acordo com a cartilha de segurança na internet escrita pelo Conselho Nacional de Justiça (SANTOS, ABRUSIO, BLUM, 2012). De acordo com Calbo (2009), diversos estudos sobre o tema, afirmam que em todo o mundo esse tipo de coerção inicia-se em ambiente escolar, tendo como uma das causas previstas a disparidade da relação de poder entre os alunos e seus pares. Corroborando com essa visão, Fante (2005), afirma que o bullying apresenta-se de maneira predominante nas escolas, pelo fato de ser nessa rede social o local em que as crianças e adolescentesconstroem suas primeiras relações sociais fora do ambiente familiar. Entretanto, com o aumento da incidência do bullying virtual, as agressões que antes restringiam-se em sua maioria ao período letivo, agora espalham-se pela internet fazendo com que a intimidação continue mesmo fora da escola. Contudo, cabe ressaltar que os padrões éticos e morais com os quais o sujeito usuário da internet trata suas relações em mundo virtual, é uma extensão dos moldes que ele possui em sua vida real (TOGNETTA & BOZZA, 2010). Tal ação pode explicar o porquê desse tipo de agressão extrapola o ambiente físico e adentra o ciberespaço. O crescimento dessa modalidade de coerção pode ser explicado graças aos avanços tecnológicos na área comunicacional iniciada nas últimas duas décadas, que contribuíram para a popularização da internet e do computador pessoal, e à emergência das mídias sociais e o seu acesso através de múltiplas plataformas móveis e convergentes, aliadas às políticas públicas de inclusão digital que proveram um acesso maior da população a esses novos sistemas conversacionais, incentivando para que as relações sociais se tornassem cada vez mais virtuais. Revista Tecer - Belo Horizonte – vol. 5, nº 8, maio de 2012 32 Além disso, o anonimato oferecido por essa rede aos seus usuários também pode ser encarado como uma das razões para grande incidência de ações de bullying na internet, como observou Silveira (2009), ao dizer que a comunicação de forma anônima observada na internet pode caracterizar e produzir inúmeros problemas à segurança e aos direitos civis. A falta de privacidade na internet observada por Spyer (2009), principalmente após a emergência das novas redes sociais digitais, também é uma das responsáveis pelo aumento da incidência de casos de bullying virtuais, uma vez que através dessas novas formas de mídia conversacionais tornaram as relações sociais de qualquer usuário transparente e visíveis ao mundo todo, proporcionando um aumento da exposição de informações intimas dos usuários. Esse cenário observado resulta em sérios transtornos emocionais e psicológicos às pessoas vitimizadas, chegando a acarretar quadros de distúrbios alimentares, atos de baixa alto-estima, agressividade, pânico social e depressão, sendo os cenários mais graves podem evoluir inclusive para atos de suicídio (HINDUJA & PATCHIN, 2009). Em um ambiente virtual, existem inúmeras formas possíveis de agressão e violência a usuários, como por exemplo, o envio de mensagens ofensivas aos outros internautas ou grupos de usuários, ou ainda a criação de perfis falsos como o objetivo de difamar as vítimas de uma determinada rede social, como observaram Faustino e Oliveira (2008), ao estudarem os atos de bullying na mídia social Orkut. Porém, nem todas as formas de expressão encontradas no ciberespaço podem ser caracterizadas como tentativas de intimidação e coerção. Na mesma medida em que a internet pode ser utilizada com o intuito de agredir um outro sujeito, essa mesma ferramenta pode ser utilizada com a intenção de provocar discussões e debates democráticos acerca de um determinado tema ou sujeito, o que representaria atos de livre expressão de opiniões, algo necessário ao convívio humano e perseguido pela sociedade através dos tempos. A liberdade de expressão. Da ágora grega à ágora eletrônica A necessidade de comunicar-se e expressar suas opiniões e pensamentos são inerentes ao Homem e necessárias ao convívio social, estando presentes em nossas vidas desde as primeiras organizações sociais, haja vista a inexistência, em qualquer parte do mundo, de um povo que não se expresse linguística e culturalmente (GONTIJO, 2004). Essa precisão em interagir-se socialmente através da comunicação é tão forte e enraizada na natureza humana que, segundo Hoeschl (1997), ao longo da história da humanidade foram necessárias diversas evoluções nas organizações sociais para facilitar e assegurar a liberdade de expressão. A primeira dessas evoluções surgiu ainda na antiguidade com o advento das ágoras na sociedade grega. As ágoras eram constituídas nas encruzilhadas ou principais vias de acesso da cidade, e eram caracterizadas pela convergência de ideias distintas, pela disseminação de informações e pela discussão de assuntos de utilidade pública, além de questões sociais, culturais, etc. A citação desse fenômeno social torna-se necessária para discussão proposta por esse trabalho uma vez que esse foi o primeiro espaço organizado, aberto e de acesso livre, pelo menos a princípio, com o objetivo de promover a liberdade de expressão, o Revista Tecer - Belo Horizonte – vol. 5, nº 8, maio de 2012 33 que mais uma vez comprova a preocupação do Homem em encontrar novas formas de exprimir e apresentar seus pensamentos. Anos mais tarde durante o período iluminista, mais precisamente entre os séculos XVII e XVIII, a Europa viveu um período de efervescência na interação comunicacional, e essa construção voltada para a troca de informações evoluiu com o surgimento dos cafés. Segundo Cortez (2008), esse meio de comunicação estava espalhado por toda a Europa, com ênfase maior nas cidades de Londres e Paris, e servia como ponto de encontro e troca de informações e opiniões de forma livre e entre indivíduos pertencentes a diversas classes sociais, o que fazia desse um modelo conversacional inclusivo e democrático. Com base nessa ótica de análise, é possível observar nos Cafés algumas características muito semelhantes àquelas observadas nas ágoras gregas já apresentadas, principalmente no que diz respeito à organização baseada na liberdade de expressão e ao livre acesso de indivíduos de diferentes classes e de diferentes pontos de vista, similaridades que permitem classificar também os Cafés como meios de comunicação massivos e não midiáticos. Antes disso, porém, e mais precisamente durante a Idade Média, a humanidade viveu uma fase de cerceamento da sua liberdade de expressão pública, uma vez que, com o fim das ágoras, o principal meio para comunicação e troca de informações eram os sermões realizados nos púlpitos das Igrejas e cujos conteúdos eram ditados por uma elite formada pela nobreza e o clero (PERNOUD, 1997). Esse cerceamento das liberdades comunicacionais observadas nesse período, limitavam tanto o acesso à informação quanto a construção de um pensamento diferente daqueles tidos pelas pessoas no poder, o que representou um retrocesso nas interações sociais desse período. O modelo comunicacional tendo os sermões como principal meio de comunicação massivo apoiado pela divulgação de alguns documentos manuscritos e em latim perdurou por quase cinco séculos, sendo modificado apenas em meados do século XV com a invenção da prensa gráfica de Gutemberg. Esse advento iniciou uma nova fase na história dos estudos da liberdade de expressão por proporcionar uma maior disseminação e um maior acesso às informações, já que o novo sistema possibilitava a impressão de várias cópias de um mesmo documento ou livro e a possibilidade da comunicação em vernáculos, facilitando a compreensão dos conteúdos (BRIGGS & BURKE, 2004). Ao lado de todas essas características e qualidades, ressalta-se que a prensa de Gutemberg foi o primeiro grande avanço tecnológico a favor da liberdade de expressão uma vez que, aliado à invenção da escrita, esse advento garantia perenidade das informações e opiniões infligidas que, uma vez omitidas e registradas, poderiam ser repassadas sem que o seu sentido se perdesse ao longo do tempo, noção que não se torna possível na transmissão de informações boca-a-boca. A invenção da imprensa gráficapossibilitou também, o surgimento dos principais veículos midiáticos dos séculos XVIII, XIX e XX, com destaque especial para as revistas, os jornais e os panfletos, responsáveis pelo acesso à informação e pela manutenção da liberdade de expressão na sociedade contemporânea. Revista Tecer - Belo Horizonte – vol. 5, nº 8, maio de 2012 34 Na sociedade atual, são elas as grandes garantidoras dessa liberdade de expressão, sendo as mesmas um espaço de debate e discussão dos temas relevantes à manutenção da vida social. Contudo, Mendes (2008), salienta que as grandes mídias de massa, sobretudo nos países tidos como subdesenvolvidos ou emergentes, são utilizadas como instrumentos de alienação política e social graças à forte centralização do poder midiático nas mãos de uma elite, cabendo nesses casos aos instrumentos de comunicação comunitários o papel de disseminador informacional aos grupos sociais subordinados. Todos esses modelos experimentados pela humanidade através dos séculos representam, uma vez mais, a busca da sociedade em assegurar o livre-arbítrio na expressão de suas opiniões. Um exemplo é a Declaração Universal dos Direitos Humanos adotada pela Organização das Nações Unidas (ONU) em 10 de Dezembro de 1948, a qual assegura em seu artigo XIX e no primeiro inciso do seu artigo XX a liberdade de expressão e organização pacífica a todos os seres humanos: Todo ser humano tem direito à liberdade de opinião e expressão; este direito inclui a liberdade de, sem interferência, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações e ideias por quaisquer meios e independentemente de fronteiras. (...) Todo ser humano tem direito à liberdade de reunião e associação pacífica. (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 2000). Além disso, outro ponto que merece destaque é que tal liberdade é assegurada também pela legislação de todos os países democráticos, como é o caso da Primeira Emenda Estadunidense que afirma que “O congresso não fará lei (...) restringindo a liberdade de palavra ou de imprensa; ou o direito do povo de reunir-se pacificamente”, ou da o artigo 5º constituição brasileira de 1988 “É livre a manifestação de pensamento (...) [e] é assegurado a todos o acesso a informação” (KOSOVISKI, 2008, p.33). Todavia, apesar de todas as contribuições midiáticas já citadas, foi na internet e nas redes de relacionamento social virtuais que a sociedade contemporânea encontrou verdadeiramente o seu caminho em direção a uma real liberdade de expressão. Conforme afirma Hoeschl (1997), se as outras mídias de massa são partidárias, atreladas a interesses pessoais, e sujeitas a rigorosas regulamentações, o mesmo não ocorre com a internet, onde se pode veicular todo tipo de informações e opiniões. Essas características aliadas à evolução tecnológica que possibilitou o acesso da internet em diferentes plataformas midiáticas, à democratização da comunicação, e à inclusão digital, elevaram o ciberespaço ao patamar de ágora eletrônica global, (CASTELLS, 2001). Dessa forma o espaço virtual torna-se um território fundamental para o convívio social possibilitando a discussão de assuntos de interesses públicos e privados de forma livre e acima de tudo democrática. Nesse contexto, a liberdade para postar informações e opiniões pessoais acerca de um determinado acontecimento, atitude ou mesmo uma pessoa torna-se ilimitada, entretanto existem momentos em que esse livre-arbítrio extrapola os limites do convívio social, são nesses casos que as ações de livre-expressão transformam-se atos de bullying ou cyberbullying, quando a opinião é emitida em ambiente virtual. Revista Tecer - Belo Horizonte – vol. 5, nº 8, maio de 2012 35 Cyberbullying, quando a livre expressão extrapola os limites do convívio social As discussões apresentadas até aqui deixam claro que a internet possui diversos caminhos que asseguram a livre expressão das opiniões que o homem, na qualidade de ser social, necessita para a manutenção de suas relações sociais, e que essa liberdade para apresentar suas opiniões torna-se ações de bullying no momento em que as mesmas passam a atrapalhar de maneira profunda a existência social do sujeito-alvo dessas declarações. A primeira delimitação utilizada por esse artigo para tentarmos diferençar esses dois conceitos encontra-se no âmbito legal. De acordo com a cartilha “O que é bullying” escrita por Escorel; Barros (2008), afirma que existem três artigos presentes que constituição brasileira, e cujas transgressões representariam ações de bullying: “[O] Artigo 146 do código penal [indica que] constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, ou depois de lhe haver reduzido, por qualquer outro meio, a capacidade de resistência é crime de constrangimento ilegal. [O] Artigo 147 do código penal [indica que] Ameaçar alguém, por palavra, escrita ou gesto, ou qualquer outro meio simbólico, também é crime e o autor deverá responder na justiça. Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus diretos fundamentais. [E o] ARTIGO 5º da Lei 8.069/90 do Estatuto da criança e do adolescente [indica que] O direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente, abrangendo a preservação da imagem, da identidade, da autonomia, dos valores, ideias e crenças, dos espaços e objetos pessoais” (ESCOREL & BARROS, 2008). Entretanto os contornos e limites que diferenciam o bullying dos atos de liberdade de opinião são muito tênues e subjetivos, e por isso o presente trabalho apoia-se nesse momento na filosofia para tentar encontrar uma resposta. Segundo Locke, como afirmou (DALBOSCO, CASAGRANDA, MÜHL, 2008, p. 145) a discussão acerca da liberdade é muito abrangente e complexa uma vez que esse conceito depende de um consenso que determine onde termina o limite espacial de um sujeito, e onde se inicia o espaço dos seus pares, o que explica porque esse tema tem se mantido alvo de discussões ao longo da história do Homem. “Todas as culturas se veem diante da necessidade de garantir o espaço de liberdade e autonomia reservado ao indivíduo. Mas a liberdade concreta tem sempre um espaço limitado, ou seja, ela só é possível dentro do direito que limita a liberdade de cada um e impõe que uns respeitem a dos outros. Implica, portanto, necessariamente a tolerância, porque o contrário desta representa a negação da liberdade do outro” (DALBOSCO, CASAGRANDA, MÜHL, 2008, p. 145). Revista Tecer - Belo Horizonte – vol. 5, nº 8, maio de 2012 36 A filosofia possui diversas formas diferentes de expressar a ideia de limite. O conceito de őpos ou terminus, por exemplo, defende que o limite serve apenas para mostrar onde se termina um determinado espaço (físico ou não) e inicia outro. A filosofia hegeliana, por sua vez, defende que o limite é dado com o fim de ser superado, ou seja, a evolução torna-se possível apenas com a superação de algumas barreiras (MORA, 2004, p. 1747). Entretanto, a noção de limite que mais contribui para essa discussão é a ideia de situação-limite proposta por Jasper. Segundo o autor, são essas situações são aquelas que testam os contornos da existência e da convivência social humana, ou seja, são situações sem as quais não se pode viver em sociedade (JASPER, 1973). Esse conceito, que segundo o próprio autor não pode ser suficientemente explicado, aliado à ideia de hegeliana de limite, ajudam a esclarecer a diferençatênue entre a livre expressão e o bullying virtual, no sentido que a emissão de opiniões ofende e transgride o bom convívio social no momento em que o sujeito agressor, ao testar seus limites, leva o sujeito agredido a sua situação-limite. Com base na união de todos esses conceitos, chega-se à conclusão que o ato de expressar-se livremente em ambiente virtual transforma-se em ações de cyberbullying no instante em que as declarações emitidas ofendem ou infligem os direitos civis resguardados pela legislação e que preveem a manutenção de sua honra e o direito a um julgamento justo, seja qual for, a todos os cidadãos. Conclui-se também, que a liberdade de expressão transforma-se em coerção quando ultrapassa os limites éticos, morais e sociais do sujeito vitimizado, limites esses que são únicos e pessoais e, portanto, subjetivos. Entretanto, cabe ressaltar que o conceito de limite é muito volúvel e tem sido alterado e redefinido acompanhando as evoluções sociais ocorridas ao longo do tempo, ou seja, o que hoje pode representar uma infração aos direitos dos cidadãos, pode não ter o mesmo significado para as gerações futuras. Considerações finais Indubitavelmente a ideia de que a discussão iniciada por essa proposta de análise não está terminada não existe, até porque não se pode afirmar com exatidão quais são os limites de cada pessoa, pois são muitas e instáveis as variáveis responsáveis por essa delimitação. O que se pode afirmar com concretude é que a filosofia de transgressão dos limites propostas por Hegel se manterá viva promovendo novos contornos ao conceito de liberdade de expressão, como se manteve através dos tempos. A verdadeira e mais importante contribuição que essa revisão literária traz aos estudos do direito a comunicação, é a noção de que qualquer pessoa é livre para expor suas opiniões, e pensamentos da forma com que achar necessário, desde que se tenha em mente, no entanto, que o convívio social prevê as mesmas liberdades a todos os indivíduos, ou seja, ao ser ofendido o sujeito deve ter as mesmas ferramentas e oportunidades para expressar-se, que foram dadas ao sujeito agressor. Apenas quando alcançarmos essa forma de convívio social, ainda utópico para a sociedade contemporânea é que conseguiremos verdadeiramente viver o conceito de liberdade de expressão sem que essa possa ser encarada como atos de bullying, cyberbullying, coerção ou qualquer forma de manifestação censora, uma vez que Revista Tecer - Belo Horizonte – vol. 5, nº 8, maio de 2012 37 todos terão direitos iguais à comunicação, o que representa o direito de opinarmos e o dever de aceitar a opinião dos outros. The cyberbullying and the expression freedom: an analysis proposal of the limits tha guarantee the maintenance of the social live Abstract The emergence of the internet and technological communication evolution expanded the social interaction ways, open up new spaces for acts of free expression. However, when it exceeds the limits of others disturbing the social interaction, the opinion freedom provided by the internet becomes an act of cyberbullying, which brings with it many psychological and social issues to the victimized. Based on this scenario, this paper presents a review about the cyberbullying and the expression freedom concepsts, and proposes an attempted distinction between these terms. The reflection is subsidized by the theories of communication rights from a review of the literature about the subject. Key words: cyberbullying; expression freedom; communication; internet; virtual dialogues El cyberbullying y la liberdad de expression: un proyecto de análisis de los limites que garanticen la conservación de la vida social Resumen La apatición de la internet y la evolución de los medios tecnológicos de comunicación expandiendo las formas de interacción social, abriendo espacios para los actos de libre expresión. Sin embargo, cuando se superem los limites de los otros em el camino de interacción social, la libertad de opinion que la internet ofrece se convierte em um acto de acoso cibernético, lo que trae consigo muchos problemas psicológicos y sociales a las víctimas. Com base en este escenario, este trabajo presenta uma revisión sobre el acoso cibernético y los conceptos de la libertad de expresión, y propone uma distinción entre estos términos intento. La reflexión es subsidiada por las teorias del derecho a la comunicación a partir de uma revisión de la literatura sobre el tema. Palabras clave: cyberbullying; libertad de expresión; comunicación; internet; diálogos virtuales Referências ABRAPIA - Associação Brasileira Multiprofissional de Proteção à Infância e à Adolescência. Programa de redução do comportamento agressivo entre estudantes. Disponível em www.bullying.com.br. Acessado em 24/06/2007. Revista Tecer - Belo Horizonte – vol. 5, nº 8, maio de 2012 38 BRIGGS, A; BURKE, P. Uma história social da mídia: de Gutenberg à internet. Tradução Maria Carmelita Pádua Dias. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2004. CALBO, A. S. Bullying na escola: comportamento agressivo, vitimização e conduta pró- social entre pares. Contextos Clínicos, [a. 2], n.2, p.73-80, jul-dez. 2009. CASTELLS, M. La Galaxia internet. Barcelona: Plaza & Janés, 2001. CORTEZ, G. R. Os cafés como espaço de comunicação. Estudos em Jornalismo: Revista do Programa de Pós-Graduação em Jornalismo. Florianópolis: UFSC, [a.5], n.02, p.187 - 195, dez. 2008. DALBOSCO, C. A.; CASAGRANDA, E. A.; MÜHL, Eldon H. 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