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a influência de ERIC DARDEL na construção da GEOGRAFIA Humanista norte americana

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Anais XVI Encontro Nacional dos Geógrafos 
Crise, práxis e autonomia: espaços de resistência e de esperanças 
- Espaço de Socialização de Coletivos – 
 
 
 
 
Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. 978-85-99907-02-3 
 
1 
A INFLUÊNCIA DE ERIC DARDEL NA CONSTRUÇÃO DA GEOGRAFIA 
HUMANISTA NORTE AMERICANA1 
 
HOLZER, Werther 
Universidade Federal Fluminense. werther.holzer@uol.com.br 
 
INTRODUÇÃO 
O que pretendo discutir neste texto é como Dardel (1952/1990), com sua obra “O 
Homem e a Terra: natureza da realidade geográfica” influenciou a geografia cultural 
norte americana, na década de 1970, propiciando o aparecimento da geografia 
humanista. 
Como método seguirei as “pegadas” que uma leitura hermenêutica de alguns textos já 
clássicos da geografia humanista, escritos por Tuan e por Relph, nos oferecem. 
Em minha dissertação de mestrado (Holzer, 1992), já na introdução, apontava o aporte 
oferecido por Dardel, a partir de sua redescoberta pelos geógrafos norte americanos, 
como uma possibilidade de aproximação entre a geografia do espaço vivido francesa e a 
geografia humanista norte americana. Ironicamente, apesar de hoje podermos considerá-
lo um precursor de uma geografia pautada pelo uso da fenomenologia, Dardel não teve 
sucessores imediatos na França. Sua recuperação pelos geógrafos franceses só 
aconteceria na década de 1980, quando André-Louis Sanguin, da Universidade de 
Quebéc, resgatou o livro de Dardel comparando-o em importância aos trabalhos de 
Wright, demoraria mais de dez anos para o lançamento da reedição da pequena obra, em 
francês. 
Quando os franceses se deram conta da importância e da riqueza da obra de Dardel para 
a renovação da geografia, em especial a voltada para as questões culturais 
contemporâneas, já se haviam passado vinte anos desde a primeira citação de seu livro 
por geógrafos norte-americanos. Não por acaso o contato com o livro de Dardel ocorreu 
em uma universidade canadense, a de Toronto, onde eram veiculadas críticas a 
geografia da percepção de base comportamentalista. A mesma atitude crítica orientava 
 
1
 Trabalho apresentado no Espaço de Socialização de Coletivos “Perspectivas fenomenológicas da geosofia”, durante 
o XVI Encontro Nacional de Geógrafos, realizado em Porto Alegre, Julho 2010. 
Anais XVI Encontro Nacional dos Geógrafos 
Crise, práxis e autonomia: espaços de resistência e de esperanças 
- Espaço de Socialização de Coletivos – 
 
 
 
 
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jovens professores: Tuan, desde 1963 se aproximara das formulações de Bachelard e de 
Piaget, numa crítica interna aos métodos da Geografia Cultural e mais ampla geografia 
de base quantitativista e comportamentalista; Relph nos fornece um depoimento de suas 
motivações: 
A concepção de lugar e de não-lugar foi em grande parte um produto 
do acaso. Eu estava estudando as paisagens simbólicas do Escudo 
Canadense, porque os seus lagos e florestas são supostamente centrais 
para a identidade canadense. Conforme a pesquisa avançou, encontrei 
várias referências à importância do lugar e ao sentido de lugar, mas fui 
incapaz de encontrar uma definição substancial para estas idéias. Por 
isso, comecei a desenvolver as minhas próprias. 
Nessa época, eu também fui envolvido em um debate acadêmico sobre 
as metodologias da geografia, muitos dos quais versando sobre os 
supostos benefícios das técnicas quantitativas. Para meus propósitos, 
estes métodos eram triviais e de âmbito limitado. Vi, no entanto, na 
fenomenologia um método filosófico que reconheceu a importância 
dos significados e símbolos. Fazia sentido aplicar a fenomenologia 
para estudar o lugar (embora, em retrospecto, eu não tenha feito isso 
tão rigorosamente quanto deveria), e minhas tentativas de definição 
ampliada. As paisagens simbólicas do Escudo Canadense recuaram 
para segundo plano e, em seguida, desapareceu em uma gaveta de 
arquivo. (RELPH, s.d) 
Em sua busca por alternativas epistemológicas, como já observei em outro texto 
(Holzer, 1992), Relph recorreu a geógrafos clássicos, como La Blache, James, Sauer e 
Hartshorne, recorreu também a trabalhos mais recentes como os de seu colega Tuan 
(1971). Seu objetivo era de discutir a base fenomenológica da geografia para ressaltar a 
importância do lugar como conceito geográfico e para isso recorreu também a Dardel e 
a filósofos como Heidegger, Schutz e Merleau-Ponty. 
Tuan, em suas investigações humanistas, recorreu a textos de geógrafos como 
Humboldt, Sauer, Glacken, Lowenthal e Dardel (seguramente introduzido na geografia 
norte-americana por Relph em sua tese de 1973) e de filósofos como Kockelmans, 
Merleau-Ponty, Schutz, Heidegger, Van der Leew, Piaget, Cassirer, Bergson e Ricoeur. 
Munido deste aparato bibliográfico investigava as relações entre espaço e tempo e as 
características do “espaço” e do “lugar”. 
Os temas centrais que motivavam as pesquisas dos geógrafos humanistas estavam, 
certamente, contemplados em “O Homem e a Terra”: a relação primordial entre o 
homem e a Terra, as distâncias e direções na formação dos conceitos de lugar e de 
paisagem, todos os aspectos abordados a partir de uma perspectiva fenomenológica e 
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Crise, práxis e autonomia: espaços de resistência e de esperanças 
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interdisciplinar, onde a arte tem um papel preponderante como fonte de informação para 
a compreensão dos fenômenos. O centro das investigações está na intencionalidade 
voltada para os fenômenos espaço-temporais, sendo o “lugar” sua referência principal. 
 
O LUGAR NA OBRA DE DARDEL 
Dardel, em “O Homem e a Terra” não dedica um capítulo ou item especifico para 
discutir a questão do lugar. Ao contrário o conceito permeia o texto como fundamento 
para a construção de todas as relações temporais e espaciais do ser-no-mundo. Esta 
afirmação se apóia no seguinte trecho de seu texto: 
Do plano da geografia, a noção de situação extravasa para os domínios 
mais variados da experiência do mundo. A “situação” de um homem 
supõe um “espaço” onde ele “se move”; um conjunto de relações e de 
trocas; direções e distâncias que fixam de algum modo o lugar de sua 
existência. “Perder a localização”, é se ver desprovido de seu “lugar”, 
rebaixado de sua posição “eminente”, de suas “relações”, se encontrar, 
sem direções, reduzido à impotência e à imobilidade. Novamente a 
geografia, sem sair do concreto, empresta seus símbolos aos 
movimentos interiores do homem. (Dardel, 1990, 19). 
Como Sauer (.......), com toda certeza a partir de uma convergência epistemológica, 
Dardel propõe que os lugares são essenciais na construção de outros conceitos espaciais. 
Destes a paisagem é enfatizada como conceito de síntese, que permite, a partir da 
justaposição dos traços físicos com os traços da ocupação humana, compará-la com 
outras a partir de suas semelhanças e diferenças. Dardel enuncia esta idéia neste 
pequeno trecho: “Muito mais que uma justaposição de detalhes pitorescos, a paisagem é 
um conjunto, uma convergência, um momento vivido, uma ligação interna, uma 
“impressão” une todos os elementos.” (Dardel, 1990, 41) 
Esta paisagem, construída a partir da intencionalidade humana, que Dardel denomina de 
“uma tonalidade afetiva dominante”, a do mundo vivido, seria “refratária a toda redução 
puramente científica” (Dardel, 1990, 42). Esta irredutibilidade se deve ao fato de que o 
ser-no-mundo, o ser-ai (Dasein), implica numa totalidade onde o homem, o espaço, o 
tempo estão indissoluvelmente ligados. Esta indissolubilidade se manifesta naTerra a 
partir das ligações existenciais humanas, e pode ser chamada de geograficidade, 
definida como “a Terra como lugar, base e meio de sua realização.” (Dardel, 1990, 42). 
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Mas, esta intencionalidade implica em ação, assim Dardel enuncia a paisagem como o 
resultado das interações entre o espaço telúrico, o espaço aéreo, o espaço aquático e o 
espaço construído. 
A ação humana se manifesta, 
No âmbito da sua visão cotidiana e de sua movimentação diária habitual, o 
homem exprime sua relação geográfica com o mundo a partir do 
ordenamento do solo: “construtor de florestas” na Malásia ou nas Landas, 
destruidor de florestas, do solo vegetal e dos rios no Nordeste brasileiro, ele 
transforma em outro lugar, em horizonte pastoral, as águas do Zuiderzee. A 
geografia pode assim exprimir, inscrita no solo e na paisagem, a própria 
concepção do homem, sua maneira de se encontrar, de se ordenar como ser 
individual ou coletivo. (Dardel, 1990, 43). 
Esta relação é intersubjetiva e deve ser tratada pela geografia a partir do que interessa 
primordialmente ao homem: suas ligações existenciais, suas preocupações e seu bem 
estar, e seus projetos para o futuro. Ele fala aqui das relações estabelecidas pelo homem 
com outros homens e com todas as coisas que compõe seu mundo vivido. A geografia 
não seria um conhecimento referido a um determinado objeto, mas sim uma ciência que 
tem o papel de compreender o mundo geograficamente, do homem ligado à Terra por 
sua condição terrestre. Então, 
A realidade geográfica é para o homem, [...], o lugar onde ele está, os lugares 
de sua infância, o ambiente que atrai sua presença. Terras que ele pisa ou 
onde ele trabalha, o horizonte do seu vale, ou a sua rua, o seu bairro, seus 
deslocamentos cotidianos através da cidade. [...] A realidade geográfica exige 
uma adesão total do sujeito, através de sua vida afetiva, de seu corpo, de seus 
hábitos, que ele chega a esquecê-los, como pode esquecer sua própria vida 
orgânica. Ela está, contudo, oculta e pronta a se revelar. (Dardel, 1990, 46). 
Este dinamismo de nossa relação com a Terra se expressa a partir dos eventos que 
ocorrem no espaço concreto, a experiência da realidade-acontecimento, próxima da 
linguagem cotidiana, do vernacular. Que determina a localização de um elemento 
geográfico como resultado destas relações recíprocas entre lugares-acontecimentos. 
Dardel pergunta: 
Como evitar abrir assim a espacialidade geográfica para a perspectiva 
temporal? A geografia não é, no fim das contas, uma certa maneira de 
nós sermos invadidos pela terra, pelo mar, pela distância, de sermos 
dominados pela montanha, conduzidos em uma direção, atualizados 
pela paisagem como presença da Terra? (Dardel, 1990, 54). 
A geografia, então, se refere a habitar, a construir, a cultivar e a circular, onde “a Terra é 
experimentada como base. Não somente ponto de apoio espacial e suporte material, mas 
condição de toda “posição” da existência, de toda ação de assentar e de se estabelecer.” 
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(Dardel, 1990, 55). No conceito de lugar está a essência que estabelece a geografia 
como ciência. Dardel se apóia em Lévinas para estabelecer “o lugar como suporte do 
Ser”. Lévinas vê no sono, assim como Bachelard (.....) no devaneio, um método para 
nos aproximarmos das essências, para fazermos a redução fenomenológica, ao 
abandonarmos as relações corriqueiras de nossa vida cotidiana e nos dirigirmos 
imediatamente às relações fundamentais com a coisa. O fundamento desta redução é o 
“lugar”: 
Em nossa relação primordial com o mundo, tal como se manifesta neste gesto banal, ao 
nos abandonarmos assim “às virtudes protetoras do lugar”, nós firmamos nosso pacto 
secreto com a Terra, nós expressamos por nossa conduta que nossa subjetividade de 
sujeito se encolha sobre a terra firme, se assente, ou melhor, “repouse”. É deste “lugar”, 
base de nossa existência, que, despertando, tomamos consciência do mundo e saímos ao 
seu encontro, audaciosos ou circunspetos, para trabalhá-lo. Há no lugar de onde a 
consciência se eleva para ficar de pé, frente aos seres e aos acontecimentos, qualquer 
coisa de mais primitivo que o “início”, o país natal, o ponto de ligação, é, para os 
homens e os povos, o lugar onde eles dormem, a casa, a cabana, a tenda, a aldeia. 
Habitar uma terra, é confiar primeiro pelo sono aquilo que está, por assim dizer, abaixo 
de nós: base onde se aconchega nossa subjetividade. Existir é para nós partir de lá, do 
que é mais profundo em nossa consciência, do que é “fundamental”, para destacar no 
mundo circundante “objetos” aos quais se reportarão nossos cuidados e nossos projetos. 
Elemento não abstrato ou conceitual, mas concreto. Antes de toda escolha, existe este 
“lugar” que não pudemos escolher, onde ocorre a “fundação” de nossa existência 
terrestre e de nossa condição humana. (Dardel, 1990, 56). 
A Terra, então é uma experiência antipredicativa, ela está na origem da consciência que 
o sujeito tem de si e do mundo, como observa Dardel ela antecede toda objetivação e se 
mistura a qualquer intencionalidade da consciência, ou seja, o mundo vivido do homem 
só é a partir da Terra, a partir da qual ele constrói e erige. Dardel recorre a Heidegger 
para mostrar que esta relação é construída cotidianamente, uma vez descuidada 
determinada coisa que o homens constrói ela retorna a sua origem na Terra, como ruína, 
como obscuridade. 
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Esta realidade de cada indivíduo, se manifesta coletivamente enquanto espaço terrestre 
que “aparece como a condição de realização de toda realidade histórica, que lhe dá 
corpo e assinala a cada existente o seu lugar. É a Terra que, podemos dizer, estabiliza a 
existência.” (Dardel, 1990, 59). A partir desta idéia Dardel acompanha a geografia como 
o “lugar” da história: 
as geografias como concepções do mundo circundante são 
testemunhos de épocas sucessivas onde elas eram a imagem admitida 
da Terra. [...]O que nos importa, antes de tudo, é o despertar de uma 
consciência geográfica, através das diferentes intenções sob as quais 
aparecem ao homem a fisionomia da Terra. Se trata menos de 
períodos cronológicos do que de atitudes duráveis do espírito humano 
frente-a-frente com a realidade circundante e cotidiana, em correlação 
com as formas dominantes da sensibilidade, do pensamento e da 
crença de uma época ou de uma civilização. Estas “geografias” se 
ligam cada uma delas a uma certa concepção global do mundo, a uma 
inquietude central, a uma luta efetiva contra o “fundo escuro” da 
natureza circundante. (Dardel, 1990, 63). 
A partir do lugar, utilizando-se de todos os passos do método fenomenológico 
husserliano Dardel, melhor do que ninguém, aproximou-se de uma geografia “além da 
ciência”, que os geógrafos culturais procuravam, e o mais importante, referenciado à 
história, a partir das “ontologias” geográficas que permearam as mais diversas épocas e 
povos. Com certeza estes fundamentos de sua obra atraíram a atenção dos geógrafos 
norte-americanos que buscavam novos caminhos para a ciência geográfica, e o 
encontraram na fenomenologia eno conceito de lugar. 
A GEOGRAFIA DE DARDEL E A GEOGRAFIA HUMANISTA NORTE AMERICANA: O 
LUGAR COMO CONCEITO DE CONVERGÊNCIA 
Na introdução esbocei as relações entre a obra de Dardel e a geografia humanista norte 
americana. Certamente foi Relph (1970) o primeiro a apontar a fenomenologia como 
aporte teórico-conceitual alternativo para os geógrafos interessados em estudar a 
“percepção” a partir de um ponto de vista distante do positivismo e do 
comportamentalismo. Esta busca pelo aporte fenomenológico, acompanhada de artigos 
introdutórios ao método (Tuan, 1971 e Buttimer, 1974, p. ex.), orientaram as pesquisas 
destes jovens geógrafos culturais por novos campos, onde o “lugar” era o conceito 
fundamental para uma nova aproximação geográfica da relação do homem com o 
ambiente. 
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O método fenomenológico era enfatizado como “um procedimento para descrever o 
mundo cotidiano da experiência imediata do homem, incluindo suas ações, lembranças, 
fantasias e percepções; ele não é um método de análise ou explicação de qualquer 
mundo objetivo ou racional através do desenvolvimento de hipóteses e teorias prévias”. 
(Relph, 1970, 193). Neste momento, posso afirmar, o autor ainda não tivera contato 
com o livro de Dardel. Ele afirma que os geógrafos, com a exceção de Sauer, não deram 
atenção à fenomenologia. 
Sua preocupação era com a construção de novas formas de ver a natureza pela geografia 
baseada visão holística da relação do homem com a natureza, derivada da noção de 
intencionalidade, e na crítica que a fenomenologia faz ao cientificismo e ao positivismo. 
Esta rejeição contrária as aproximações mecanicistas e quantitativistas, permitiria que a 
geografia reconhecesse e descrevesse as essências da estrutura perceptiva, valorizando o 
mundo da experiência humana. 
As considerações de Relph foram ouvidas e logo um pequeno grupo de geógrafos 
culturais e históricos se aprofundaram nos meandros deste método alternativo — em 
breve denominado humanista — que pretendia agrupar um coletivo que se dedicasse ao 
estudo das relações do homem com a natureza a partir desta nova ótica. A ótica seria a 
do “lugar”, eleito como objeto de estudo por Relph, quando elaborava sua tese 
defendida em 1973, e que seria rapidamente adotada pelos outros componentes deste 
coletivo. 
A tese de Relph, intitulada “The Phenomenon of Place”, seria editada na forma de livro 
três anos mais tarde (Relph, 1976). Ali o autor diferenciava espaço de lugar, a partir da 
experiência humana. Aqui a influência da obra de Dardel se faz sentir. Os espaços, 
todos adjetivados, uma vez apropriados, nomeados, se tornam lugares, ou melhor, os 
lugares, a partir das experiências antipredicativas, constituem os espaços. Assim, espaço 
primitivo, está ligado ao comportamento instintivo e à ação inconsciente; o espaço 
perceptivo é o espaço da ação centrado nas necessidades imediatas; e o espaço 
existencial ou espaço vivido (que pode ser interpretado como o lugar), é definido como: 
[...] a estrutura íntima do espaço tal qual nos aparece em nossas 
experiências concretas de mundo como membros de um grupo 
cultural, ele é intersubjetivo, e portanto permeia a todos os membros 
daquele grupo, pois estes foram todos socializados de acordo com o 
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conjunto comum de experiências, signos e símbolos. (Relph, 1976, 
12). 
Relph observa que na vida cotidiana os lugares são experimentados como paisagem, 
como rotina, a partir das experiências pessoais com outras pessoas e com os artefatos 
que nos rodeiam. Assim: 
O lugar é o fundamento de nossa identidade como indivíduos e como 
membros da comunidade, o lugar onde habita o ser. O lar não é só o 
lugar em que você está feliz por viver, ele não pode estar em toda 
parte, não pode ser trocado, é um centro de significados insubstituível. 
(Relph, 1976, 39). 
Aproxima-se aqui, e a seguir, o que escreve Relph do que enunciara Dardel: o lugar é o 
centro da ação e da intenção. Eles estão incorporados às estruturas da consciência 
humana a partir da experiência. Através deles a intencionalidade define objetos e 
eventos, ou seja, “lugares são essencialmente focos de intenção, que tem usualmente 
localização fixa e traços que persistem em uma forma identificável.” (Relph, 1976, 43). 
Pouco tempo após Relph defender sua tese, Tuan (1980), em 1974, publicou livro que 
marca o inicio uma investigação conceitual que seria importante para enunciação de um 
campo autônomo de pesquisa, a Geografia Humanista, dois anos depois. Sua busca era 
por “conceitos espaciais que fossem mais adequados do que o de "paisagem", utilizado 
usualmente pela Geografia Cultural, permitindo uma investigação com características 
mais subjetivas e antropocêntricas, além de adequar-se ao aporte filosófico 
fenomenológico, existencialista.” (Holzer, 1992, 125). 
Em “Space and Place: Humanistic Perspective” (Tuan, 1979), publicado em 1974. Tuan 
afirma que “espaço” e “lugar” são os conceitos que definem a natureza da geografia. 
Introduz também o tempo como conceito em constante interação com o espaço. O autor 
defende a importância de sua investigação: 
A importância do “lugar” para a geografia cultural e humanista é, ou 
deveria ser, óbvia. Como nós funcionais no espaço, os lugares 
sujeitam-se as técnicas da análise espacial. Mas como um único e 
complexo conjunto — enraizado no passado e crescendo no futuro — 
e como símbolo, o lugar clama pelo entendimento humanista. Na 
tradição humanista os lugares tem sido estudados a partir das 
perspectivas histórica e literário-artística [...] Nos falta, contudo, 
análise sistemática [...] Exceto a dissertação de Edward Relph, a 
literatura sobre este tópico — seguramente de importância central para 
os geógrafos — tem sido, e continua sendo, negligenciada. 
Aprendemos a apreciar a análise espacial, a erudição histórica e a fina 
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prosa descritiva, mas o entendimento filosófico, baseado no método e 
ponto de vista dos fenomenologistas, ainda está além do alcance de 
nossos conhecimentos. (Tuan, 1979, 388-389). 
Para Tuan tempo e espaço estão ligados pela noção de distância, ambos os conceitos 
orientados e estruturados pela intencionalidade do ser (Tuan, 1979, 390). Deste modo, 
espaço e tempo são inseparáveis na atividade locomotora, apesar de serem separáveis na 
fala e no pensamento. 
Ao espaço se contrapõe o lugar. Considerado como entidade única que tem significado e 
história que o identificam dos demais. Desse modo a personalidade do lugar associa a 
qualidade físicas da Terra às modificações trabalhadas por gerações. É exatamente esta 
associação que provê aos lugares um sentido e estabilidade. O lugar é um artefato único 
ligado às experiências humanas (Tuan, 1975, 151). Neste mesmo texto Tuan (1975, 
152) afirma: “O lugar é um centro de significados construído pela experiência. O lugar é 
conhecido não somente através dos olhos e da mente, mas também pelos modos mais 
passivos e diretos da experiência. 
Esta investigação dos atributos do lugar culminaria em 1977 com a publicação do livro 
Space and Place: the perspective of experience(Tuan, 1983). Mas, seria em artigo 
posterior que Tuan deixaria entrever o peso da influência de Dardel: 
O lugar é uma pausa no movimento. Esta é uma relação entre tempo e 
lugar. A cidade é tempo tornado visível, esta é outra relação. 
Consideremos cada uma destas afirmações em breve comentário. O 
movimento exige tempo e ocorre no espaço: eles exigem um campo 
espaço-temporal. Lugar e movimento, no entanto, são antitéticos. 
Lugar é uma parada ou pausa no movimento — a pausa que permite a 
localização para tornar o lugar no centro de significados que organiza 
o espaço do entorno. (Tuan, 1978, 14). 
Por outro lado, aqui se antevê um afastamento, se por um lado Tuan define o lugar, a 
partir de sua relação com o tempo como mudança direcional e repetição. Ele aqui se 
esquece para Dardel é a distância que qualifica o lugar e o relaciona com o espaço 
geográfico, com podemos ver no trecho seguinte: 
Que o espaço geográfico aparece essencialmente qualificado por uma 
situação concreta que afeta o homem, isto é o que prova a 
espacialização cotidiana que o espacializa como afastamento e 
direção. A distância geográfica não provém de uma medida objetiva, 
auxiliada por unidades de comprimento previamente determinadas. Ao 
contrário, o êxito de medir exatamente resulta desta preocupação 
primordial que leva o homem a se colocar ao alcance das coisas que o 
cercam. A distância é experimentada não como uma quantidade, mas 
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como uma qualidade expressa em termos de perto ou longe. O que 
está perto é o que pode se dispor sem esforço, o que está longe exige 
um esforço e, implicitamente, um desejo de se aproximar. [...] O 
afastamento real, o que é geograficamente válido, depende dos 
obstáculos a serem vencidos, do grau de facilidade que um homem 
colocar um lugar ao seu alcance. Nos ocorre mesmo de sermos 
obrigados a tomar distância, a recuar, para colocar um cimo 
montanhoso ao alcance da nossa vista ou para fazer uma fotografia 
aérea. (Dardel, 1990, 12-13). 
Podemos concluir que a Geografia Cultural, renovada em Geografia Humanista pelo 
método fenomenológico, é tributária direta em seus temas centrais da geografia proposta 
por Eric Dardel. O que pretendo a partir da análise destes vestígios é oferecer subsídios 
para que possamos avançar em nossas investigações a partir de dois aportes 
extremamente próximos de nossas questões contemporâneas, que certamente exigem a 
construção da ciência geográfica em novas bases. 
 
REFERÊNCIAS 
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DARDEL, Eric. L'Homme et la Terre - Nature de la Réalité Géographique. Paris, Ed. 
CTHS, 1990. (1ª ed. Paris, PUF, 1952). 
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Janeiro, UFRJ/PPGG, 1992 . 
RELPH, Edward. An inquiry into the relations between phenomenology and geography. 
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Architectural Phenomenology Newsletter. 7 (3) : 14-16, 1996. 
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Anais XVI Encontro Nacional dos Geógrafos 
Crise, práxis e autonomia: espaços de resistência e de esperanças 
- Espaço de Socialização de Coletivos – 
 
 
 
 
Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. 978-85-99907-02-3 
 
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originalmente em: Progress in Geography. (6) : 211-252, 1974) 
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Janeiro, DIFEL, 1983. (1ª ed. norte-americana: Space and Place: the perspective of 
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