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Resgate histórico da trajetória sindical dos assistentes sociais no Brasil Ana Tojal – Assistente Social / Alagoas Margareth Alves Dallaruvera – Assistente Social / RJ A organização sindical dos assistentes sociais nasce embalada pelo Novo Sindicalismo. O final dos anos 70 e início dos anos 80 é considerado o momento de articulação sindical no âmbito da categoria dos assistentes sociais que resultou na criação da Comissão Executiva Nacional das Entidades Sindicais dos Assistentes Sociais (CENEAS) em 1979 e posteriormente na criação da Associação Nacional dos Assistentes Sociais (ANAS) em 1983. Desde sua origem a ANAS assume o desafio de lutar não somente pêlos interesses da categoria, mas fortalecer e participar das lutas mais gerais dos trabalhadores. Os relatórios da ANAS nos auxiliam a resgatar essa história e perceber o significado desta para o fortalecimento da profissão. A Organização Sindical dos Assistentes Sociais em nível nacional iniciou-se em 1978, com a realização do I Encontro Nacional de Entidades Sindicais de Assistentes Sociais, de 25 a 26 de agosto, em Belo Horizonte, que contou com a presença de quatro entidades, a saber: APAS (São Paulo, Bahia, Goiás) e Sindicato dos Assistentes Sociais de Minas Gerais, com apoio financeiro e político do CELATS( Centro Latino-Americano de Trabalho Social). Antes desse período, existia a ABAS( Associação Brasileira de Assistentes Sociais), com seções regionais, criada na década de 40 com o objetivo de lutar pelo reconhecimento oficial da profissão, sem caráter sindical. Depois surgiram as APAS( Associação Profissional de Assistentes Sociais) na década de 50 e as associações regionais- ARAS, de caráter cultural que existiam apenas no interior de São Paulo. Este I Encontro é realizado no momento em que começa a surgir o novo sindicalismo fruto das mobilizações operárias, no ABC paulista, contrapondo-se à estrutura sindical vigente de cunho corporativista. Intensifica-se a mobilização da categoria e neste mesmo ano, nos dias 2,3 e 4 de novembro em Belo Horizonte, realiza-se o II Encontro Nacional, contando com nove entidades presentes: Sindicatos do Rio de Janeiro, Porto Alegre, Rio Grande do Norte, Minas Gerais e Ceará e APAS de São Paulo, Bahia Goiás e ABAS seção Sergipe e ARAS de Ribeirão Preto. Destaca-se o debate inicial da criação da Federação Nacional dos Assistentes Sociais. O III Encontro Nacional realiza-se no período de 21 a 23 de setembro de 1979 em São Paulo com representação de entidades de 15 Estados. Durante este encontro é criada a CENEAS -– Comissão Executiva Nacional das Entidades Sindicais de Assistentes Sociais em resposta ao estágio de organização da categoria em nível nacional na época. O III Congresso Brasileiro de Assistente Sociais em São Paulo no ano de 1979 é marcado pela intervenção política conjunta de entidades sindicais, através da CENEAS. Significou um momento de ruptura da categoria com as posições conservadoras das direções das entidades do conjunto CFAS-CRAS que organizavam os fóruns dos profissionais da área. A forma autoritária e elitista de organização do Congresso é quebrada, transformando este em Assembléias de deliberações políticas da categoria. As entidades sindicais ao intervirem organizadamente captaram a insatisfação dos profissionais e estudantes presentes ao III CBAS, que repudiaram com veemência os representantes da ditadura militar que compunham painéis e mesas de abertura e encerramento. A “virada” do III CBAS é decisiva no compromisso político e coletivo da categoria com a classe trabalhadora. Em outubro de 1983 é realizada a I Assembléia Nacional Sindical organizada pela CENEAS, em Salvador, com a presença de aproximadamente 400 delegados eleitos em assembléias estaduais, convocadas pelas entidades sindicais existentes. "As deliberações da I ANAS se referem basicamente à construção do organismo sindical da categoria em nível nacional, sendo que as propostas aprovadas majoritariamente são aquelas defendidas pelo pólo cutista, que culmina com a deliberação da criação da federação, constituída de forma democrática e rompendo com a estrutura sindical oficial" ( Abramides e Cabral) Para se efetivar essa proposta, funda-se, durante esta primeira assembléia, a Associação Nacional dos Assistentes Sociais/ANAS que tem como tarefa ser a direção do movimento sindical nacional, encaminhar as lutas de forma unificada e o processo de criação da federação. A ANAS passa a integrar o conjunto de entidades da categoria com um papel destacado na luta pela organização dos profissionais de Serviço Social e na afirmação do compromisso político e coletivo com a classe trabalhadora. A ANAS conquista legitimidade na categoria e é reconhecida no interior do movimento sindical cutista, participando ativamente dos fóruns nacionais. As Assembléias Nacionais Sindicais, convocadas pela ANAS a cada dois anos, se constituem no fórum máximo de deliberação e representação sindical da categoria, emanando destas o programa político e plano de lutas a ser desenvolvido pela entidade nacional. Durante sua existência, a ANAS organizou os assistentes sociais em torno de seus interesses específicos, na luta pelo piso salarial, regulamentação da carga horária e condições de trabalho, transformando em projetos de lei no Congresso Nacional. Organizou a participação da categoria nas lutas nacionais, no movimento de mulheres (a categoria é majoritariamente feminina) e no movimento dos servidores públicos, onde se insere a maior parte dos profissionais. Com o avanço das discussões sobre a nova estrutura sindical proposta pela CUT, coube as entidades comprometidas com a construção de um sindicalismo classista independente, livre e autônomo, aprofundar junto as suas bases a possibilidade de extinção da estrutura sindical corporativista vigente. Em resposta a implantação de um nova estrutura sindical, a Associação Nacional dos Assistentes Sociais é extinta em setembro de 1994 durante a VI Assembléia Nacional Sindical, em Brasília sob a orientação da CUT, que avalia a necessidade de se evitar paralelismo de ações e deixar a categoria solta para sindicalização por ramo. Durante esta assembléia, os representantes da CUT defendem que a organização por categoria não é a melhor maneira dos trabalhadores enfrentarem os desafios que se apresentam. Os delegados sindicais presentes assumem a transitoriedade e comprometem-se com a categoria para vinculação aos sindicatos por ramo de atividade. “Apesar da resolução política acertada, a ANAS e as entidades a ela filiadas, enfrentam dificuldades em traduzir em ação essa política, ou seja, criar as mediações possíveis e necessárias que dessem configuração e concretude à transitoriedade. Temos de considerar que o movimento sindical mais geral não avançou muito na implementaçãoda nova estrutura sindical, rompendo definitivamente com a estrutura sindical oficial, o que também repercute no movimento sindical dos assistentes sociais”.( Abramides e Cabral) Embora tenha significado um avanço do ponto de vista político, a posição de vanguarda da diretoria da ANAS e dos sindicatos não encontraram eco entre as demais categorias profissionais. Médicos, psicólogos, enfermeiros, odontólogos, jornalistas, entre outros mantiveram suas entidades em pleno funcionamento. Isso provocou o isolamento da categoria no âmbito sindical, uma vez que a construção do ramo caminha a passos lentos e até o presente momento não se consolidou no país. Mantém-se em funcionamento quatro sindicatos (Alagoas, Ceará, Rio Grande do Sul, Caxias do Sul) cuja base deliberou em assembléia pela manutenção. O sindicato do Rio de Janeiro após fechamento em 1990, reabre em maio de 1995, com duas chapas concorrendo ao pleito. O número de assistentes sociais que participam de sindicatos de ramo ainda é insignificante se comparado ao número de profissionais que compuseram a base dos sindicatos que foram fechados Após o fechamento da ANAS, embora considerando a proposta da CUT a mais viável para o fortalecimento das lutas dos trabalhadores, os sindicatos existentes começam a se inquietar com a ausência de representação sindical da categoria. Estes passam a avaliar que houve uma precipitação da diretoria da ANAS, que não aprofundou junto às bases a discussão do modelo sindical. Os relatórios das últimas Assembléias Nacionais Sindicais, apontam que a participação da categoria era cada vez menor, transparecendo que a entidade estava perdendo o fôlego. Aliado a isto, o fato do redimensionamento do papel do conjunto CFESS/CRESS que abandona a ação policialesca e conservadora e adota um projeto ético-político comprometido com o fim das desigualdades sociais, atrai o interesse de muitas lideranças sindicais, que passam a assumir a direção destes conselhos. Porém há uma confusão ente os profissionais acerca da dimensão das funções dos conselhos profissionais, pois os mesmos não têm autoridade legal para atuar nas questões sindicais, nem mesmo esta é a sua finalidade. Em novembro de 1997 em Lusiania- GO, os Sindicatos de Assistentes Sociais, o Conselho Federal de Serviço Social/CRESS, a Associação Brasileira de Ensino de Serviço Social/ABESS e a Executiva Nacional de Estudantes em Serviço Social/ENESSO realizam o Encontro Nacional de Organização Política da Categoria. O relatório deste encontro revelam posições divergentes entre as entidades da categoria. Nas conclusões dos três grupos de trabalho está explícito diferentes encaminhamentos em relação à organização sindical: "Grupo A a) Aproximação dos CRESS junto aos sindicatos por ramo de atividade, buscando canalizar as demandas sindicais, de forma a fortalecer a categoria dos Assistentes Sociais junto aqueles sindicatos. b) Criar espaços de discussão em cada Estado, em relação ao processo de organização e formação política da categoria. c) Onde há sindicato de A. S.. que se estabeleça uma relação de respeito e parceria com os CRESS, formalizando a relação e considerando o principio de respeito à autonomia das Entidades e suas especificidades. d) Ao ser implementada pelo conjunto CFESS - CRESS pesquisa nacional sobre o mercado de trabalho, ver a possibilidade de incorporar o levantamento de informações sobre as diversas formas de organização da categoria. e) Que os próximos eventos considerem a necessidade de análise sobre os rumos dos movimentos sociais e as formas de articulação com a sociedade civil, dado o enfrentamento ao "projeto" neoliberal. Grupo B A questão quanto a forma de organização sindical mais conveniente entre nós não está suficientemente amadurecida na totalidade dos assistentes sociais. O que é consenso é que a categoria precisa ter um espaço para suas demandas sindicais. De início, convém registrar que se reconhece o esforço que vem sendo empreendido por companheiras que mantém "vivos" os 5sindicatos de Assistentes Sociais no país. No entanto, estão postas 2 posições que são distintas embora orientadas pela mesma preocupação - salvaguardar os interesses de natureza sindical. Esta duas posições partem de pressupostos diferentes: 1) A realidade do mundo do trabalho hoje, indica que a luta dos trabalhadores deva ser unificada através de Sindicatos por ramo, porque os pleitos são comuns aos de outros trabalhadores, e mais, que a unificação fortalece o movimento no enfrentamento cada vez mais acirrado. Este entendimento foi reafirmado nas exposições e debates havidos neste Encontro. 2) A outra, que a partir das particularidades das questões trazidas pelos Assistentes Sociais nas suas relações com o empregador, entende que a luta deva garantir a discussão e o encaminhamento das questões específicas através de Sindicato da categoria. Daí o reconhecimento de que se faz necessário criar nos Estados fóruns que privilegiem o tema da organização sindical dos trabalhadores, na preocupação de atingir o maior número possível de Assistentes Sociais. Como se pode operacionalizar, visto que esta demanda aparece insistentemente no CRESS? Estes deveriam criar espaços juntamente com os Sindicatos majoritários e os Sindicatos de Assistentes Sociais, quando existentes, para viabilizar aprofundamentos da discussão. Uma outra proposta foi a realização de uma pesquisa de opinião em nível nacional assumida pelas entidades da categoria, que não foi consensuada no grupo. Questiona-se a pertinência desta pesquisa e o seu custo. As entidades expuseram outras preocupações também relevantes incluídas na ação programática atual. Foi destacado, que em muitos CRESS, há pesquisas sobre Mercado de Trabalho em fase de conclusão, que trazem elementos para este debate. Seria o caso de socializar os dados em âmbito nacional. Grupo C A organização sindical é importante na organização política da categoria. A organização sindical por ramo de produção é o caminho que devemos seguir. Todos as entidades representativas da profissão devem encaminhar as demandas sindicais que lhes chegam aos sindicatos pôr ramo de produção. A existência, ainda, de alguns sindicatos de Assistentes Sociais é devido a particularidades regionais, que devem ser debatidas pelo conjunto das entidades do Serviço Social, buscando a transitoriedade para o ramo de produção". ( Relatório do Encontro Nacional de Organização Política da Categoria/ Lusiania-GO) Durante o IX Congresso Nacional de Serviço Social realizado em Goiânia em 1998, os cinco sindicatos presentes, Alagoas, Ceará, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Caxias do Sul) sentem-seexcluídos dos debates e solicitam uma reunião com a comissão organizadora do Congresso , exigindo o reconhecimento da existência dos mesmos. Os sindicatos realizam pesquisa de opinião com os congressistas. Dos 502 questionários respondidos, 333 assistentes sociais querem a reabertura dos sindicatos, 103 desejam fortalecer a organização pôr ramo de atividade e 66 não opinaram sobre a questão. Vale registrar que desde o fechamento da ANAS a relação dos sindicatos com o conjunto CFESS/CRESS se tornou conflituosa. Discordando da manutenção dos sindicatos e tendo sido recomendado o fechamento dos mesmos, as diretorias dos CFESS/CRESS consideram um atraso a manutenção das entidades sindicais da categoria, passando a ignorar sua existência. Em novembro de 2000, na cidade do Rio de Janeiro os cinco sindicatos em funcionamento realizam a I Assembléia Sindical Pró-federação dos Assistentes Sociais. Em pauta a trajetória sindical dos assistentes sociais e os caminhos do sindicalismo brasileiro. Os debates ocorridos revelam a crise do sindicalismo brasileiro e um processo de dessindicalização mundial. Os representantes da CUT e CNTSS presentes na assembléia, embora façam a defesa da organização dos trabalhadores por ramo de atividade, afirmam em seus discursos que “não é hora para desorganizar os organizados”e que as diversas formas de organização que se apresentam são importantes e devem ser estimuladas com o propósito de vencer o grande inimigo da classe trabalhadora – o projeto neoliberal. Durante a assembléia, o representante da Central Única dos Trabalhadores reconhece que a construção do ramo não se consolidou e que a entidade enfrenta sérios problemas com a crescente onda corporativista que permeia o interior das entidades sindicais. Ao final de três dias de intenso debate, os delegados sindicais deliberaram pela criação da Federação Nacional dos Assistentes Sociais/ FENAS com o papel de retomar o debate da organização sindical da categoria em todos os estados e promover a inserção dos profissionais nos sindicatos da categoria e/ou nos sindicatos de ramo de atividade. Esse fato novo, força as demais entidades a discutir as questões sindicais da categoria e a colocar em pauta nos fóruns nacionais essa temática. A criação da FENAS provoca ainda a incompreensão das demais entidades da categoria, que interpretam equivocadamente a nossa luta como disputa de espaço político, desconsiderando que a natureza e especificidade de cada uma das entidades não inviabiliza nem fragiliza as mesmas, ao contrário, fortalece a categoria e as próprias entidades. A Confederação Nacional dos Trabalhadores da Seguridade Social já abriu espaço para o debate com os assistentes sociais, criando o departamento de categorias para aprofundar a questão em todos os estados e durante o Congresso Nacional da CNTSS, em maio deste ano, foi aceita a proposta da FENAS de criação de comissões intersinsindicais para amadurecer a experiência coletiva entre as diferentes categorias profissionais. Com menos de um ano de existência, a FENAS reacendeu o debate sindical, rearticulou os cinco sindicatos que estavam atuando de forma localizada, conquistou participação na CUT, na CNTSS, no FENTAS, no Movimento Estudantil, se inserindo na luta com os demais trabalhadores, porém sem perder de vistas as questões específicas, como as lutas salariais e condições dignas de trabalho, retomando os projetos de lei da categoria em articulação com os parlamentares de esquerda. A FENAS nasce num momento de refluxo do movimento sindical, tendo dificuldades para garantir sua viabilidade financeira e política. Representa um grande desafio para estes novos atores sindicais, que tiveram a ousadia de enfrentar a crise do sindicalismo brasileiro e a desmobilização da categoria. Podemos afirmar que a trajetória sindical dos assistentes sociais ainda tem muitos caminhos a percorrer e que portanto se configura como um processo inconcluso. Porém esta não pode ter êxito se os profissionais não despertarem para a importância da sua participação na construção dessa história. “Não há esperança fora da luta, da busca, do empenho de mudar, de refazer, de recriar, de reinventar. Não há esperança na pura espera e na postura de quem cruza os braços e perdendo o desejo do sonho, submerge no fatalismo simbolista”. (Paulo Freire).
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