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1 AULA 1 : PREFERENCIAS E UTILIDADE 1. Origem da Teoria Microeconômica; 2. Preferências e os axiomas da escolha racional; 3. Axiomas Adicionais; 4. Utilidade; 5. Regiões e Curvas de Indiferença; 6. Caso 2 bens. Taxa marginal de Substituição; 7. Exemplos. 8. Bibliografia e Exercícios sugeridos 1. Origem da Teoria Microeconômica Discussões de natureza microeconômica remontam à Teoria do Valor da escola clássica, A.Smith (1723-1790) e D.Ricardo (1772-1823). Na valoração econômica de um bem, o primeiro autor distinguia seu valor de uso, do seu valor de troca. O segundo autor também distinguia o valor essencial do bem do seu preço, e desenvolveu uma teoria do valor de troca dos bens baseada no tempo de trabalho necessário à sua produção. O valor de uso de um bem está relacionado à utilidade que o seu consumo proporciona ao agente, podendo esta utilidade ser de natureza intrínseca (funcionalidade do bem) ou de natureza extrínseca, associada às preferências do consumidor. Se estou disposto a pagar mais para ter um carro vermelho, este valor adicional está associado à minha preferência, pois a utilidade intrínseca do carro vermelho é a mesma que a do carro prata. O valor de troca é o que torna o bem valorável vis à vis de outros bens isto é, aquele valor que pode ser expresso em uma medida monetária, comum a todos os bens. Este está diretamente associado ao preço monetário do bem. 2 Em princípio, se poderia pensar que os valores de uso e de troca devessem ser comonotônicos, isto é, aumentarem ou diminuírem conjuntamente. Tal não é o caso entretanto, e os clássicos usaram o famoso paradoxo da água e do diamante para ilustrar como os valores de uso e de troca poderiam divergir entre si. A água, com elevado valor de uso, tinha valor de troca quase nulo, enquanto que o diamante, com baixo valor de uso, tinha elevado valor de troca no mercado. Deixando de lado a questão filosófica do valor “essencial” ou valor de uso, os economistas se voltam para a explicação do valor de troca, isto é, do preço relativo dos bens. Uma explicação óbvia é a que associa ao valor de troca de um bem o seu custo de produção. No século XIX, boa parte do custo total da produção era constituído pelo uso do fator trabalho. Desenvolve-se assim uma teoria do valor-trabalho para explicar o valor de troca dos bens. Se a pesca de 1 kg de atum requer um tempo de trabalho 3 vezes maior do que a pesca de 1 kg de sardinha, então o preço do atum deveria ser o triplo do preço da sardinha. Similarmente, o diamante teria um valor de troca elevadíssimo em razão do considerável tempo de trabalho requerido para sua extração e lapidação. Se o valor-trabalho é suficiente para explicar o preço de um bem, como então explicar a variação dos preços em períodos em que não há mudanças significativas nas técnicas de produção ? Smith e Ricardo reconhecem o papel dos deslocamentos da demanda nas variações dos preços, mas eles viam a divergência dos preços de mercado com relação ao valor-trabalho como sendo de natureza ocasional e temporária. No longo prazo, o preço seria inteiramente determinado pelo custo do trabalho (salário) associado à produção do bem. 3 Os economistas clássicos relegaram a demanda à um papel apenas secundário na determinação do preço porque, de fato, não desenvolveram uma teoria adequada para o valor de uso dos bens. A Revolução Marginalista Entre 1850 e 1870 crescia entre os economistas a percepção de que, para complementar a teoria do valor-trabalho, era necessário construir uma teoria alternativa para o valor de uso. A escola filosófica Utilitarista de J.Bentham (1848) já lançara anos antes os fundamentos da escolha racional dos indivíduos, baseada no principio maximizador da utilidade total. Nos anos 1870 os economistas perceberam no entanto que não era a utilidade total do bem que determinava o seu valor de troca. Antes, a utilidade da última unidade consumida era o fator determinante do preço relativo do bem. Assim, apesar de extremamente útil para a vida e abundante na natureza, a água apresentava um valor de troca quase nulo porque o consumo de um copo adicional de água tinha um valor de uso extremamente baixo para as pessoas. Deste modo, os economistas “marginalistas” definem o valor de uso não mais à partir da utilidade total do bem, mas à partir da utilidade incremental ou “marginal” obtida no consumo deste bem. O conceito de demanda por unidades adicionais do bem dos economistas marginalistas será então confrontado com a análise dos custos baseada no valor-trabalho da produção, de modo a obter uma descrição completa da determinação do valor de troca do bem. 4 A Síntese Marshalliana Foi o economista inglês Alfred Marshall (1824-1924) que formalizou por primeiro o princípio marginalista, no seu livro Principles of Economics de 1890. Nele ele mostra que a demanda e a oferta cooperam simultäneamente para determinar o preço do produto. Assim como não se pode determinar qual das laminas de uma tesoura efetua o corte do tecido, argumentava Marshall, assim também não se poderia dizer que só a demanda ou só a oferta determinaria o valor do produto. Tal conclusão é ilustrada pela famoso diagrama das curvas de oferta (S) e demanda (D) que se cruzam no plano das quantidades X preços, como ilustrado na Figura 1 abaixo. Fig.1 Formação do Preço: Oferta e Demanda S D Preco Quantidadesq* p* 5 A curva de Demanda (D) é negativamente inclinada refletindo o principio marginalista de que o consumidor é propenso a pagar cada vez menos pela última unidade adquirida, à medida que aumentam as quantidades previamente demandadas. O valor fixado na margem para esta última unidade estabelece o preço a ser pago por todas as unidades adquiridas. A curva de Oferta (S) é positivamente inclinada refletindo o aumento dos custos de produção, à medida que mais unidades são produzidas. A convexidade da curva indica custos marginais crescentes na produção. As duas curvas intersectam no ponto (q*, p*), que é o ponto de equilíbrio do mercado. Ao preço p*, as quantidades demandadas igualam as quantidades ofertadas: D*=S*=q*. Se uma das curvas se deslocar, para cima ou para baixo, o novo ponto de equilíbrio também deslocar- se-á correspondentemente, para cima ou para baixo. Como vemos, o preço p* do bem será determinado pela operação conjunta e simultânea das quantidades ofertadas e demandas. Exemplo Numérico: Demanda: ppD /4)( = Oferta: 222)( ppS += Igualando a oferta e a demanda obtemos: . 1*2)1(2/4 32 =→+=→+= ppppp O preço de equilíbrio será 1 e 4)1()1( == DS unidades serão demandadas e ofertadas ao preço de 1 unidade monetária por unidade transacionada. 6 Na figura abaixo estão representadas a demanda e oferta inversas: Demanda: (Vermelho) qPD /4= Oferta: 12/ −= qpS (Preto) Fig.2 Equilibrio do mercado 2 3 4 5 6 0.0 0.5 1.0 1.5 2.0 q (quantidades) p (preço) Solução do paradoxo: O método Marshalliano permite resolver o paradoxo da água e do diamante, uma vez os preços refletem, ao mesmo tempo, a valoração marginal feita pelos consumidores e os custos marginais incorridos pelos produtores. Deste modo, não há paradoxo: o preço da água é baixo porque esta apresenta conjuntamente, baixa valoração no consumo marginal e baixo custo na produção de uma unidade adicional. Por outro lado, o diamante tem preço elevado porque a valoração de uma pepita adicional é elevada,assim como o seu custo de extração e lapidação. 7 2. Preferências e os Axiomas da Escolha Racional A teoria do consumidor, formulada na sua versão mais geral e axiomática, é devida a G.Debreu (1959), Na teoria do consumidor racional, as preferências portam sobre cestas de consumo situadas no espaço dos bens disponíveis no mercado. Supondo que a economia possua n bens, uma cesta de bens x é definida pela n-upla: x=(x1,...,xn) onde xi designa a quantidade do bem i=1,...,n presente na cesta x. Vamos supor que estas quantidades sejam não negativas, e definiremos então o conjunto das cestas de bens X como um subconjunto dos números reais n-dimensionais não negativos: . 0≥x nRX +⊂ Por exemplo, se a economia possui três bens, maça (i=1), laranja (i=2) e banana (i=3) x=(3,5,0) é uma cesta contendo três maças e cinco laranjas, enquanto que a cesta y=(1,4,3) é uma outra cesta contendo uma maça, quatro laranjas e três bananas. Relação de Preferências Vamos dotar o conjunto das cestas disponíveis de uma relação de preferências binária que definirá, para cada par de cestas de aquela que o consumidor prefere: X ≥ X Assim, se x e são duas cestas de , a notação y X yx ≥ indicará que o consumidor prefere a cesta x à cesta . Obviamente, esta relação de preferência é y ≥ 8 pessoal, cada consumidor possuirá a sua relação, de acordo com os seus gostos e interesses. A relação é uma relação de preferências fraca, no sentido de que ela não exclui a possibilidade das duas cestas conterem todos os bens em quantidades tais que o consumidor esteja indiferente entre elas. ≥ No exemplo acima, se o consumidor é indiferente entre 2 laranjas e 3 bananas, mas prefere quantidades crescentes de maça, a cesta )0,2,4(=x é fracamente preferível à cesta )3,0,4(=y e escrevo yx ≥ . Na verdade, ele é indiferente entre as cestas “derivadas” (retirando-se as maças), e . Mas como as cestas acima contém o mesmo número de maças, isto o deixa indiferente entre ambas. )0,2,0( )3,0,0( Por isso, a expressão yx ≥ significará que o consumidor considera a cesta x pelo menos tão boa quanto a cesta , não excluindo, portanto, a indiferença entre ambas. y A preferência forte notada f , também denominada preferência estrita, ocorre quando a indiferença está excluída: a cesta x é estritamente preferível à cesta , isto è y yx f se e somente se yx ≥ ocorre mas xy ≥ não ocorre. No exemplo acima, se o consumidor prefere mais maças do que menos maças, haverá preferência estrita entre as cestas )0,2,5(=z e )0,2,4(=y : . yz f A relação de indiferença notada ≈ ocorre quando o consumidor é indiferente entre as duas cestas: a situação yx ≈ ocorre se e somente se temos, simultaneamente yx ≥ e xy ≥ . 9 De acordo com estas definições, quando o consumidor compara duas cestas quaisquer x e disponíveis no mercado, um dos três eventos ocorre exclusivamente: ou y yx f , ou xy f ou yx ≈ . Isto é, ele prefere fortemente a primeira, ou prefere fortemente a segunda, ou então ele é indiferente entre ambas. Para que uma relação de preferências reflita as escolhas de um consumidor racional, são estipulados dois axiomas fundamentais: (A1) Completude Por este axioma, presume-se que o consumidor saiba comparar qualquer par de cestas de X . Formalmente, yxouxyouyxouXyx ≈≥≥∈∀ ,,, . Assim, supõe-se que o consumidor está perfeitamente informado sobre as características relevantes de todas as cestas disponíveis no mercado e está apto a efetuar comparações binárias entre cada par de cestas (duas a duas). (A2) Transitividade Este axioma requer que o consumidor saiba dar às suas escolhas binárias um encadeamento coerente, no seguinte sentido: zxentaozyeyxseXzyx ≥≥≥∈∀ ,,,, Em outras palavras, este axioma exige que as escolhas do consumidor sejam consistentes. Por exemplo, se o consumidor prefere uma cesta (x) contendo duas maças à uma cesta (y) contendo 4 laranjas e se ele prefere esta última à uma cesta (z) contendo uma dúzia de bananas, a consistência das preferências deste consumidor requererá que ele prefira a cesta com duas maças à cesta com uma dúzia de bananas. 10 OBS: A transitividade é uma das propriedades mais contestáveis da teoria. Estudos experimentais revelam que ela é freqüentemente violada na prática. Particularmente, quando o consumidor não conhece perfeitamente as conseqüências das suas escolhas (situação de incerteza). Por exemplo, baseado no histórico do turfe, ele pode comprar uma aposta no cavalo A em um páreo com o cavalo B, apostar em B no páreo com o cavalo C, e ter razoes suficientes para achar que este último cavalo ganhará a corrida contra A. Entretanto, o axioma (A1) pressupõe informação perfeita do consumidor, de modo que a transitividade é uma hipótese inteiramente aceitável neste contexto. Os axiomas (A1) e (A2) definem o que seriam as preferências de um consumidor racional. Antes de introduzir outras propriedades desejáveis para uma construção mais completa da teoria axiomática do consumidor, dada uma cesta Xx ∈0 definiremos abaixo os seguintes subconjuntos: a) que é o conjunto das cestas que são fracamente preferíveis à }:{)( 00 xxXxx ≥∈≡≥ 0x ; b) é o conjunto das cestas que são fortemente preferíveis à }:{)( 00 xxXxx ff ∈≡ 0x ; c) é o conjunto das cestas que o consumidor considera indiferentes a }:{)( 00 xxXxx ≈∈≡≈ 0x . Analogamente, define-se os conjuntos )( 0x≤ e das cestas fracamente e fortemente menos preferidas que )( 0xp 0x . Observe que, de acordo com as definições temos: )()()( 00 xxx ≤∩≥=≈ = 11 Isto é, o conjunto das cestas que o consumidor considera indiferentes à cesta 0x é a interseção dos conjuntos das cestas fracamente preferíveis e fracamente menos preferidas que aquela cesta. 3. Axiomas Adicionais Dentre os 4 axiomas adicionais apresentados a seguir, o primeiro deles, axioma (A3) tem a ver a representação matemática das preferências, requerendo das preferências um tipo de regularidade topológica cujo significado ficará mais claro no exemplo à frente. (A3) Continuidade Para toda cesta x , os conjuntos )(x≥ e )(x≤ , das cestas fracamente preferíveis à x e menos preferíveis que x , são ambos conjuntos fechados de X . Lembremos que o complemento de um conjunto fechado é aberto, de modo que se )(x≥ e )(x≤ forem fechados, seus complementos )(xp e )(xf respectivamente, serão ambos abertos. Lembremos também que podemos caracterizar um subconjunto fechado do pelo fato de que qualquer seqüência convergente de cestas do subconjunto tem seu limite de convergência dentro do próprio subconjunto, isto é: nR+ 12 )(x≥ fechado significa: se ,....2,1,)( =≥∈ nxyn com então y=yn n ∞→lim )(xy ≥∈ . A continuidade das preferências requer que o consumidor, nas suas escolhas, seja coerente “até o fim”. Isto significa que uma súbita reversão da sua preferência está excluída. Exemplo: Preferências Lexicográficas. O consumidor tem preferências lexicográficas, notada , quando ele lista os bens por ordem de preferência e, entre duas cestas, prefere aquela que possui quantidades maiores do bem mais preferido. L≥ Assim, se o índice 1 indica o bem mais preferido, o índice 2 o segundo bem mais preferido etc., digo que: yx L≥ isto é, o consumidor prefere a cesta x à cesta no sentido lexicográfico se: y ou se 11 yx > 2211 yxeyx ≥= ou se etc.3322 yxeyxe ≥=11 yx = Obs: O símbolo designa aqui a desigualdade “maior ou igual”. ≥ Suponha que o consumidor faça escolhas entre cestas contendo chocolate e sorvete, e que ele tenha preferência lexicográfica pelo chocolate. Considere a seqüência de cestas )0,/11( nyn += que contém mais de um bombom e nada de sorvete e a cesta que contém um bombom e um sorvete. )1,1(=y Como ele tem preferências lexicográficas, ele prefere qualquer cesta à cesta , isto é, , de modo que Todavia, lim ny ,1= y yy L n ≥ )0,1(,...2,)(≥∈ nyy Ln =∞→ nn y . Ora, esta cesta contém a mesma quantidade de chocolate que a 13 cesta mas não contém sorvete. Assim, , de modo que , o que implica y yLp)0,1( ).(yL≥)()0,1( yLp∈ )0,1( ∉ Há no limite reversão da preferência do consumidor, e o conjunto não é fechado. )(yL≥ )x Este exemplo mostra que a preferência lexicográfica não atende o axioma (A3) da continuidade. O axioma (A4) seguinte tem um significado econômico mais evidente, pois traduz o principio que os desejos do consumidor são essencialmente ilimitados, no sentido de que ele sempre pode modificar sua cesta de consumo de modo a torná-la mais atraente. Note a distancia entre a cesta ,0x(d x e a cesta 0x . Por exemplo, d pode ser a distancia Euclidiana: ∑ = −ni ii xx1 20 )(= . xxd 0 ),( Defina então uma bola aberta centrada em 0x e de raio 0>ε : }),,0 (:{) 0( εε <∈≡ xdXx (,0 xBx xB x eX (A4) Não Saciedade Local Formalmente, este axioma define-se como: 000 :), xxx fεε ∈∃>∀∈∀ . Em outras palavras, dada a cesta de consumo 0x tomada em primeira escolha pelo consumidor, o axioma estabelece que, através do aumento ou da redução nas quantidades de pelo menos um dos bens 14 presentes nesta cesta, ele possa compor outra cesta x , tão próxima ou parecida quanto queira da cesta original, com a qual ele ficará melhor do que antes, com 0x . Note que a expressão do anseio ilimitado do consumidor está na existência de cestas fortemente preferíveis à cesta inicial, mas que são tão próximas desta ou parecidas com ela, “quanto ele queira”. Observe também que a composiçao desta cesta nova e melhor, pode envolver tanto aumento nas quantidades de alguns bens quanto redução na quantidade de outros. O axioma seguinte (A5) estabelece um principio quantitativo relacionado à bondade dos bens econômicos e que faz com que o consumidor sempre prefira as cestas que contém mais quantidades do que as que contém menos quantidades dos mesmos bens. Notemos yx >= para a situação em que a cesta x contém, em cada bem, ao menos tantas unidades quanto a cesta . E notamos y yx >> para a situação em que a cesta x contém mais quantidades do que a cesta , de cada bem. y (A5) Monotonicidade Estrita ;,, yxentaoyxseXyx ≥>=∈∀ .yxentaoyxse f>> Por este axioma, o consumidor prefere fracamente a cesta x à cesta sempre que ela conter, de cada bem, pelos menos tantas unidades quantas aquelas presentes na cesta . y y 15 Além disso, ele preferirá fortemente x à sempre que a primeira cesta conter mais quantidades de cada bem, do que a cesta . y y Monotonicidade Estrita e Não Saciedade Local Observe que o axioma (A5) implica o axioma (A4), de modo que a monotonicidade estrita das preferências do consumidor implica em que ele seja localmente não saciável. Todavia, a implicação inversa não ocorre: uma vez posicionado diante de um plano de consumo 0x , pelo axioma (A4) o consumidor poderá melhorar sua cesta, eventualmente, reduzindo as quantidades de um ou mais bens presentes na sua cesta original. E isto violará o axioma (A5), pois este exclui situações em que melhoras no bem estar estejam associadas à reduções nas quantidades consumidas. Nas figuras Fig.3 à Fig.5 ilustramos, no espaço das cestas compostas por dois bens, disponíveis nas quantidades , a representação das regiões de preferência e indiferença, de acordo com os axiomas (A1)-(A5): ),( 21 xx 16 Fig.3 Preferências Racionais Descontínuas Localmente Insaciáveis, Não Monotônicas x 1 x2 x0 )( 0xf )( 0xp Na Figura 3 acima, a linha onde está situada a cesta 0x separa o conjunto das cestas estritamente preferíveis a esta cesta, acima da linha, do conjunto das cestas estritamente menos preferíveis que 0x , abaixo da linha. Esta linha define o conjunto das cestas que o consumidor considera equivalentes à cesta 0x . As preferências são completas e transitivas, mas não contínuas: o conjunto )( 0x≈ não é aberto (a linha de indiferença é tracejada embaixo à direita), de modo que os conjuntos superior e inferior não são fechados. )( 0x≥ )( 0x≤ Também, as preferências representadas da Figura 3 não são estritamente monotônicas, pois o conjunto de indiferença possui um trecho crescente. 17 Ao tomarmos duas cestas logo à esquerda de 0x , ao longo da linha, teremos cestas com quantidades crescentes dos dois bens, sem que haja preferência estrita do consumidor entre elas, pois serão ambas equivalentes à 0x . Na figura 4 abaixo representamos preferências racionais contínuas mas localmente saciáveis. Fig.4: Preferências Racionais Contínuas Localmente Saciáveis, Não Monotônicas x 1 x2 x 0 )( 0xf )( 0xp )( 0x≈ A região de indiferença à cesta 0x , está representada pelas linhas e pela região entre as linhas, no alto à esquerda. Com uma cesta localizada no interior desta região, o consumidor encontra-se plenamente saciado, no sentido que ele não consegue encontrar uma outra cesta, tão próxima quanto queira desta, mas com a qual ele ficaria melhor do que com a cesta inicial. Na figura 5 abaixo representamos preferências racionais continuas, localmente insaciáveis e monotônicas. 18 Aqui, o formato dos conjuntos das cestas estritamente preferíveis à 0x , estritamente menos preferíveis e indiferentes à 0x , não excluem a monotonicidade estrita isto é, o fato do consumidor preferir as cestas que possuem quantidades maiores de todos os bens. Fig.5: Preferências Racionais Contínuas Localmente Insaciáveis e Monotônicas x0 x1 x2 )( 0xf )( 0xp O último axioma das preferências (A6) que apresentaremos a seguir exclui a possibilidade de concavidades nas linhas de indiferença. Ele implica no fato do consumidor preferir cestas balanceadas, isto é, cestas que contém maior variedade de bens. (A6) Convexidade Dizemos que as preferências ≥ são convexas (fracamente) se, dadas as cestas 0x e 1x tais que 01 xx ≥ , então deveremos ter: 001 )1 xxttx ≥−(xt +≡ , . [ ]1,0∈∀ t 19 Isto é, se uma cesta é fracamente preferível à uma segunda, então qualquer combinação convexa destas duas cestas também será fracamente preferível à esta segunda cesta. A convexidade estrita (ou forte) ocorre quando a cesta balanceada é fortemente preferível à cesta original, isto é, quando, para 10 xx ≠ e 01 xx ≥ , temos: , 001 )1( xxttxxt f−+≡ )1,0(∈∀ t . Como mencionamos antes, a hipótese implícita neste axioma é que o consumidor sempre prefere compor cestas balanceadas no sentido delas eventualmente conterem quantidades mais equilibradas dos mesmos produtos ou conter uma maior variedade de produtos. Em particular, se o consumidor for indiferente entre as cestas, uma contendo 5 laranjas e outra 10 bananas, entao , se suas preferências forem estritamente convexas, ele preferiráfortemente à estas duas cestas, uma que contenha ambos os frutos, em qualquer proporção. Ele preferirá, por exemplo, a cesta (2 laranjas, 6 bananas), obtida tomando-se 4.0=t : )10,0(6.)0,5(4.)6,2( +=≡tx Observe que a convexidade exclui que o conjunto de indiferença possua qualquer trecho côncavo, como na Fig.5 anterior. Observe também que, diferentemente da convexidade forte, a convexidade fraca é compatível com trechos em linha reta na linha da indiferença. 20 A figura 6 abaixo ilustra uma relação de preferência convexa. Fig.6 Preferências Racionais contínuas, localmente insaciáveis e Convexas x1 x2 . x 0 . x 1 x2 . x t )( 0xf )( 0xp Na figura acima, vemos que a cesta tx , composta de uma proporção t da cesta 0x e )1( t− da cesta 1x , )1,0(∈t , é estritamente preferível à 0x (e à 1x também), uma vez que )() 10 xxxt p(f =∈ . Todavia, o mesmo não ocorre com as cestas resultantes de combinações entre as cestas 1x e 2x sobre a linha de indiferença, na figura 6. Estas cestas balanceadas não serão estritamente preferíveis às cestas originais, mas apenas equivalentes à elas. Por isso, a preferência representada na figura é convexa, mas não estritamente convexa. 21 4. Utilidade Uma vez definido o conjunto das cestas de bens disponíveis ao consumidor e a relação de preferência , definida sobre ele, a estrutura nRX +⊂ ≥ ),( ≥X forma o espaço de escolhas do consumidor. Entretanto, uma cesta de bens é um vetor n- dimensional, de modo que a comparação entre duas cestas diferentes envolverá a comparação binária de quantidades. nn Além disso, a análise das decisões do consumidor no espaço das cestas torna-se evidentemente complexa, em razão da questão dimensional. Por esta razão, os economistas criaram uma função que, a cada cesta, associa um único número real, o qual indica o grau de preferência relativa do consumidor por aquela cesta. Esta função é chamada função de utilidade. A idéia da utilidade remonta ao filósofo J.Bentham, Introduction to the Principles of Morals and Legislation (1848). A comparação dos valores de utilidade associados a duas cestas distintas indicará então qual a cesta preferível do consumidor. Aquela à qual está associado o maior valor de utilidade será a cesta preferível. 4.1 A função de Utilidade Definição: Dada a estrutura de escolhas ),( ≥X do consumidor dizemos que a função: RXu →: é uma função de utilidade do consumidor se ela representa suas preferências, isto é se: 22 yxyuxuXyx ≥⇔>=∈∀ )()(,, Assim, para representar as preferências do consumidor, a utilidade u tem de associar às cestas fracamente preferidas, valores não menores que aqueles atribuídos às cestas menos preferidas. (Na definição acima, o sinal >= indica maior ou igual, enquanto que o sinal ≥ indica, como antes, a relação de preferências fraca). Uma vez definida a funçao u , a estrutura das escolhas ),( ≥X do consumidor fica caracterizada como uma estrutura de escolhas representadas, notada ),, u(X ≥ . Do ponto de vista formal, podemos nos perguntar se uma função de utilidade u sempre existe ou, melhor dizendo, quais condições a preferência ≥ deve atender para que ela possa ser representada por uma função de utilidade contínua. Existência da função de utilidade G.Debreu (1954,1959) demonstrou o seguinte teorema: Teorema 1: Se a relação de preferências ≥ for completa, transitiva e contínua, então existe uma função real contínua que representa a preferência . RRXu n →⊂ +: ≥ A prova deste teorema é omitida, pois será estudada no Mestrado. Por este teorema, podemos ver que se as preferências do consumidor forem racionais, ,no sentido de que atendem os axiomas (A1) e (A2), e contínuas (axioma 23 A3), entao estas preferências serão representáveis por uma função de utilidade. Utilidade Ordinal e Cardinal Visto que o papel da função de utilidade é o de atribuir um número a cada cesta de bens com o intuito de apenas ordenar cada par de cestas distintas, nenhuma importância deve ser atribuída à magnitude absoluta do número )(xu em si mesmo. Por isso, se diz que u tem um sentido ordinal e não cardinal (grandeza numérica). Exemplo: Seja as cestas contendo as quantidades de maça, laranja e bananas e e as funções de utilidade representando as preferências de João e de Maria sobre estes três bens, respectivamente. ),,( 321 xxxx = Ju Mu Se e 7)4,1,3( =Ju 5)0,3,3( =Ju posso concluir que João prefere a primeira cesta (com bananas) à segunda (sem bananas e mais laranjas), porque com a primeira ele aufere 7 unidades de utilidade, e com a segunda 5 unidades, um número menor. Suponha agora que, para a primeira cesta, Maria atribui utilidade 0.6, isto é: 6.0)4,1,3( =Mu . Pelo fato deste número ser menor que 7 , não posso concluir que João tem preferência maior pela cesta do que Maria. )4,1,3( Isto acontece porque as unidades de medida da utilidade (ou da satisfação) auferidas por diferentes consumidores não são comparáveis entre si, uma vez que a utilidade tem função apenas ordinal, não cardinal. 24 No entanto, se poderia pensar em contruir uma base comum para avaliar a “intensidade” das preferências de duas pessoas entre duas cestas. Por exemplo, reduzindo as unidades de utilidade dos dois à uma medida adimensional, como a proporçao. Assim, suponha que 5.0)0,3,3( =Mu 2.05. . Vis à vis da cesta a preferência de João pela cesta aparece como “mais intensa” que a de Maria, porque )0,3,3( )4,1,3( 0/)5.06.0(4.05/)57( =−>=− . Todavia, tal comparação pode ser falaciosa, uma vez que a utilidade não tem um significado numérico própriamente dito. Múltipla representação das preferências O fato da função de utilidade ter um papel somente ordinal na representação das preferências do consumidor sugere que ela não é única. Qualquer transformação estritamente crescente de u também poderá representar as mesmas preferências . ≥ Isto é o que estabelece o teorema seguinte: Teorema 2 : Seja ),,( uX ≥ a estrutura das escolhas representadas por de um dado consumidor. Então, a função u )(xv também representa as preferências ≥ deste mesmo consumidor se e somente se existe uma função RRF →: ))( estritamente crescente em u tal que ()( xuFxv = . A prova deste teorema é deixada como exercício. Em virtude deste teorema, dizemos que a utilidade u fica definida univocamente “a menos de uma transformação monotônica estritamente crescente”. 25 Exemplo: Se a utilidade 6/1 3 3/1 2 2/1 1321 ),,( xxxxxxuJ = representa as preferências de João sobre as cestas de frutas do exemplo acima, então 3/1 3 3/2 2 1 1 xxx321 ),,( xxxvJ = também representa suas preferências, pois 2)( JJ uv = é uma função estritamente crescente de . Ju Analogamente, )ln(6/1)ln(3/1)ln(2/1),,( 321321 xxxxxxwJ ++= também representa as mesmas preferências de João, pois é outra transformação estritamente crescente de . )ln( JJ uw = Ju Podemos nos perguntar agora quais propriedades da função de utilidade ficam asseguradas pelos axiomas (A1)-(A6) especificados para as preferências. 4.2 Preferências e Propriedades da Utilidade Vimos que o axioma (A3) da continuidade das preferências, assegura a continuidade da funçao de utilidade. Segundo uma tradição teórica bem estabelecida em economia, costuma-se analisar problemas microeconômicosusando as ferramentas do cálculo. Nesta direção, uma propriedade desejável importante da função de utilidade é a diferenciabilidade. Esta é uma propriedade mais forte que a continuidade, pois exclui que os conjuntos das cestas indiferentes ou estritamente preferíveis à uma dada cesta apresentem irregularidades, como bordas quebradas, por exemplo. 26 A diferenciabilidade da utilidade, como função de duas ou mais variáveis, pressupõe a existência das derivadas parciais, uma condição importante para viabilizar o calculo das variações na margem. G.Debreu(1972) estabeleceu as condições adicionais que devem ser impostas às preferências para garantir que a funçao de utilidade que as representa seja diferenciável. Não iremos reproduzi-las aqui. Suporemos, sempre que necessário, a diferenciabilidade de u . Funções Monotônicas, Côncavas e Quase Côncavas Considere a função multivariada .: RRu n → e a cesta intermediária tx formada à partir das cestas 0x e 101 )1(: xttxxx t −+= ; .10 ≤≤ t A cesta tx é uma combinação convexa de 0x e 1x . 1. A funcao real u é monotônica crescente se )()( yuxuyx ≥⇒>= . Ela é monotônica estritamente crescente se )(yu)(xuyx >⇒>> ; Obs.: se u é monotônica crescente então é u− monotônica decrescente; 2. A função real é côncava se u nRyx ∈∀ , , 10 ≤≤ t temos: )()1(()( 10 xutxtuxu t ) −+≥ . Ela é estritamente côncava se para 1010 <<≠ ex tx temos )1x()1()0 utx −+()( tuxu t > . Obs.: se u é côncava, então u− é convexa; 27 3. A função real u é quase côncava se nRyx ∈∀ , , 10 ≤≤ t temos: [ ])(;)(min) 10 xuxu≥(xtu . Ela é estritamente quase côncava se para 1010 <<≠ texx temos [ ])(;)(min 0 uxu)(xu t > 1x . Obs.: A quase concavidade é uma condição mais fraca do que a concavidade. Assim, se u é côncava, então ela também é quase-côncava. Mas o inverso não é verdadeiro. Observe, pela definição, que qualquer função univariada monotônica, crescente ou decrescente, é quase côncava. O teorema abaixo apresenta duas propriedades da função de utilidade que são indissociáveis dos axiomas (A5) e (A6) propostos para as preferencias: Teorema 3 : Seja a estrutura ),,( uX ≥ . Então: (i) )(xu é estritamente crescente se e somente se a relação de preferências é estritamente monotônica (axioma [axioma A5]; ≥ (ii) )(xu é quase côncava (estritamente quase côncava) se e somente se a relação de preferências é convexa (estritamente convexa)[axioma A5]; ≥ A prova deste teorema é de nível de Mestrado. O teorema 3 estabelece a equivalência entre duas propriedades importantes das preferências entre cestas de bens, quais sejam, o “mais melhor” e o “mais balanceado melhor” e o crescimento e quase concavidade da função numérica que as representa. Mais adiante examinaremos as conseqüências destas propriedades da utilidade para o formato das regiões 28 de indiferença e a escolha das cestas ótimas do consumidor. Na seção 3 apresentamos com um exemplo um tipo de relações de preferências, as preferências lexicográficas, que pelo fato de não serem contínuas, não são representáveis por uma funçao de utilidade contínua. Consideraremos na seqüência dois outros tipos especiais de relações de preferências contínuas e que são representáveis por funções de utilidade dotadas de outras propriedades matemáticas ainda não exploradas. Tratam-se das preferências homotéticas e das preferências quase lineares. Como veremos adiante, os tipos de preferências serão importantes para particularizar a análise das decisões ótimas tanto do consumidor como também do produtor, na teoria da firma. 4.3 Preferências e Utilidades Homotéticas e Quase Lineares Definição: A relação de preferência ≥ é dita homotética se todos os conjuntos de indiferença gerados por ela se reproduzem em proporções fixas. Formalmente: 0,,, >≈⇒≈∈∀ kkykxyxseXyx Como veremos à frente, junto com o axioma (A5) da monotonicidade estrita, as preferências homotéticas implicarão que as superfícies de indiferença se deslocam paralelamente para cima, à medida que aumentam os níveis de utilidade. 29 A hipótese é contudo um tanto restritiva em muitas situações concretas. Por exemplo, posso estar indiferente entre uma “cesta” contendo um copo de cerveja gelada e outra contendo um copo de água mineral. Entretanto, como vou dirigir e não posso me embriagar, não estarei mais indiferente entre 10 copos de cerveja e 10 copos de água, preferindo, nestas quantidades, a água... Definição: Uma relação de preferência ≥ monotônica é dita quase linear no bem 1 (chamado bem numerário) se este bem é desejável e se a sua presença não altera o formato das regiões de indiferença. Formalmente: e 0,),...,,(),...,,(, 2121 >+∈∀ kxxxxxkxXx nn f 0,),...,,()...,,(,, 2121 >+≈+≈∈∀ kyykyxxkxentaoyxseXyx nn Freqüentemente, a hipótese quase linear das preferências é utilizada quando se quer considerar a moeda (numerário) como um dos bens cuja quantidade figura entre as escolhas do consumidor. Antes de apresentar o teorema que explicita as propriedades das funções de utilidade que representam estes dois tipos de preferências, será necessário abrir mais uma janela matemática. Funções Homogêneas e Homotéticas Considere a funçao multivariada .: RRu n → 1. A função real u é dita homogênea de grau k sobre X se 0, >∈∀ λXx temos: )()( xuxu kλλ = ; Obs.: se 1=λ dizemos que u é homogênea linear; 30 2. A função real u é dita homotética se ela é uma transformação crescente de uma função homogênea linear, isto é se: )(()( xvFxu = , onde )(xv é homogênea linear e F uma função univariada crescente. Obs.: Uma função homotética é uma transformação crescente de uma função homogênea linear. Como a função de utilidade tem valor apenas ordinal, sempre podemos representar as preferências homotéticas através de uma função homogênea linear. Exemplos: A função 2/1 2 2/1 1 1 21 ),( xx xxxu += é homogênea de grau 2/1 , a função 21 2 1 21 ),( xx xxxu += é homogênea linear, a função 21 2 1 21 1),( xx xxxu ++= é homotética,...etc. Enunciamos agora o teorema da representação das preferências homotéticas e quase lineares. Teorema 4 : Seja a estrutura . ),,( uX ≥ (i) Se a preferência ≥ é homotética, então a utilidade )(xu é uma funçao homotética; (ii) Se a preferência ≥ é monotônica e quase linear no bem 1, então a utilidade )(xu pode ser escrita como onde )nx...,,()( 21 xvxxu += v é uma função monotônica crescente dos seus argumentos. A prova deste teorema é de nível de Mestrado. 31 5. Regiões e Curvas de Indiferença Como vimos anteriormente, o conjunto das cestas que o consumidor considera indiferentes entre si são aquelas que lhe proporcionam o mesmo nível cardinal de utilidade. Assim sendo, fixado o nível numérico de utilidade digamos ( , um número real), o conjunto de todas as cestas que proporcionam ao consumidor o nível de utilidade será chamado o conjunto de indiferença de nível u , notado . Formalmente: 0u Ru ∈0 Xx ∈ nR+⊂ 0u 0 )( 0uI })(:{)( 00 uxuXxuI =∈≡ com .)(, 0 yxuIyx ≈⇔∈ Matematicamente, o conjunto de indiferença corresponde à uma superfície de nível da função u . 0u Como o gráfico de u está num localizado no espaço real -dimensional, o gráfico da região de está localizado no espaço real -dimensional. 1+n )( 0uI nValendo o axioma (A5) das preferências estritamente monotônicas, com utilidade u estritamente crescente (conforme Teorema 3 (i)) se tomarmos um outro nível de utilidade superior, , a superfície de nível conterá cestas estritamente preferíveis às cestas de nível : 01 uu > 1u 0u xyuueuIyuIx f⇒>∈∈ 0110 )(,)( . Exemplo: Suponha que as preferências do consumidor sobre os bens 1, 2 e 3 sejam representadas pela seguinte função de utilidade: 32 4/1 3 3/1 2 12/5 1321 ),,( xxxxxxu = Esta função é estritamente crescente nas quantidades dos três bens. Podemos construir a região de indiferença de nível igualando a utilidade a e depois expressando como função de e e : 0u 3x 0u 1x 2x 0u 3/4 2 3/5 1 4 0 30 4/1 3 3/1 2 12/5 1 xx uxuxxx =⇒= . A figura Fig.7 abaixo representa as superfícies de indiferença de níveis 10 =u e 257.1)2/5( 4/11 ==u . Fig. 7 : Superficies de Indiferença de nivel 1 e 1.257 Matematicamente: }1:),,{()1( 3/4 2 3/5 1 3 3 321 xx xRxxxI =∈= + 33 }5.2:),,{()257.1( 3/4 2 3/5 1 3 3 321 xx xRxxxI =∈= + Como vemos, todas as cestas de )257.1(I proporcionam utilidade 1.257 ao consumidor, as quais são estritamente preferíveis às cestas de )1(I , que proporcionam utilidade 1 mais baixa. Observe na Figura 7 que as superfícies de indiferença declinam à medida que aumentam-se as quantidades dos bens 1 e 2. Isto significa que o consumidor, para se manter no mesmo nível de utilidade, está disposto a sacrificar unidades do bem 3 a fim de obter maiores quantidades dos dois outros bens. Observe na figura também que as superfícies de indiferença tem formato convexo com relação a origem. Este formato não é casual, mas uma conseqüência de uma propriedade exibida pela função de utilidade u especificada no exemplo: a quase concavidade. Antes de apresentarmos os resultados gerais que relacionam o formato das regiões de indiferença à concavidade ou quase concavidade da função de utilidade definiremos os conjuntos: superior e inferior da função de utilidade: )( 0uCI })(:{)( 00 uxuXxuCS ≥∈≡ })(:{)( 00 uxuXxuCI ≤∈≡ 34 Assim, é a região acima do conjunto de indiferença de nível . Ele é o locus das cestas fracamente preferíveis às cestas de . )( 0uCS 0u )( 0uI Analogamente, é a região abaixo do conjunto de indiferença de nível . É o conjunto das cestas fracamente menos preferidas que as cestas de . )( 0uCI 0u )( 0uI Evidentemente, o conjunto de indiferença está na interseção dos conjuntos superior e inferior: )()()( 000 uCIuCSuI ∩= . Vamos agora abrir uma nova janela matemática. Conjuntos Convexos: Um conjunto nRS ⊂ é um conjunto convexo se ele contem todo segmento de reta passando por dois dos seus pontos. Formalmente, S é convexo se: [ ] SyttxxtemostSyx t ∈−+=∈∈∀ )1(:1,0,, Observemos que se todos os pontos intermediários tx forem interiores à S , isto é, pertencerem à este conjunto mas não estiverem na sua borda, para )1,0(∈t , então diremos que S é estritamente convexo. Obs.: A interseção de dois conjuntos convexos é um conjunto convexo. As figuras 8 e 9 abaixo ilustram ilustram 2 conjuntos um convexo e outro não convexo. 35 Fig. 8 Conjunto Convexo (não estritamente) S c o n v ex o x t y x Fig. 9 Conjunto Não Convexo S n a o Co n vexo x y x t Vamos agora enunciar um teorema que estabelece a relação entre a concavidade da função de utilidade e a convexidade dos conjuntos superiores: 36 Teorema 5: A função real multivariada RRu n →: é quase côncava se e somente se Ru ∈∀ 0 , é convexo. )( 0uCS Por este teorema, podemos identificar a quase concavidade da função de utilidade com a convexidade dos seus conjuntos superiores. Logo, podemos associar a quase concavidade da utilidade com a convexidade das regiões de indiferença. O Teorema 5, junto com o Teorema 3 (ii), permite também identificar a convexidade das regiões de indiferença com a convexidade das preferências do consumidor. Vamos agora estudar mais de perto as regiões de indiferença no caso de 2 bens. 6. O caso de 2 bens: Taxa Marginal de Substituição Neste caso, a curva de indiferença de nível é definida pela equação: 0u 021 ),( uxxu = (1) de modo que é possível expressar a região de indiferença por uma curva do plano Cartesiano expressando como função de . )( 0uI 2x 1x Vamos supor inicialmente que a funcao u represente preferências racionais contínuas, estritamente monotônicas e estritamente convexas. 37 Neste caso, o Teorema 3 nos garante que u é estritamente crescente e estritamente quase côncava. Além disso, a curva de indiferença será estritamente convexa, pelo Teorema 5. A figura abaixo representa esta situação: Fig.10 Curva de indiferença Convexa x1 x2 x1 x2 )( 0uCS Na figura acima, o conjunto superior é convexo e o consumidor é indiferente entre as cestas )( ouCS 1x e 2x , pois do consumo de ambas ele extrai as mesmas unidades de utilidade. 0u Qualquer cesta situada acima da curva de indiferença é fortemente preferível às cestas situadas sobre esta curva. )( 0uI 38 Curvas de Indiferença não podem intersectar Se as preferências forem racionais e estritamente monotônicas, é impossível que duas curvas de indiferença se intersectem. Para vermos isto, suponha por absurdo que duas curvas de indiferença se intersectem, como na figura abaixo: x 0 x1 y0 y1 Cu rvas de Ind ife rença nao se in te rsec tam Pela monotonicidade das preferências temos: e . Ora, 00 xy f 11 yx f 10 xx ≈ 0y f de modo que, por transitividade, deveríamos ter , o que é evidentemente falso, pois estas duas cestas estão sobre a mesma curva de indiferença. 1y Taxa Marginal de Substituição Se além da continuidade, supusermos que a função de utilidade é diferenciável, com derivadas parciais 39 contínuas, podemos calcular as utilidades marginais de cada bem: 2,1;)( =∂∂ ixxu i . Além disso, podemos definir uma função, chamada Taxa Marginal de Substituição (TMS). Esta função define, em cada ponto sobre a curva de indiferença, a taxa com a qual o consumidor está disposto a substituir um dos bens para obter uma unidade adicional do outro, de forma compensatória, isto é, de forma a permanecer sobre a mesma curva de indiferença. No caso da substituição do bem 2 pelo bem 1, esta taxa é matematicamente calculada como: teconsudx dxxxTMS tan 1 2 2121 |),( −≡ A proposição 1 abaixo estabelece uma fórmula que facilita o cálculo da TMS. Proposição 1: Se a função de utilidade é diferenciável no ponto ),( 21 xxx = , com derivada parcial com relação ao bem 2 não nula neste ponto, então temos: 2 1 2121 )( )( ),( x xu x xu xxTMS ∂∂ ∂∂= Prova: Diferenciando totalmente a equação (1): 0))(())((0),( 2 2 1 1 021 =∂∂+∂∂⇒== dxxxudxxxuduxxdu equação esta que implica em 40 2 1 1 2 )( )( x xu x xu dx dx ∂∂ ∂∂=− ao longo da curva de indiferença de nível . 0u ⊕A Proposição 1 nos diz que a TMS21 pode ser calculada como a razão entre as utilidades marginais do bem 1 e do bem 2. Matematicamente, a taxa marginal de substituição (TMS) é o módulo da inclinação da tangente à curva de indiferença no ponto considerado. Na figura 10, indicamos a reta tangente em duas cestas, 1x e 2x sobre a curva de indiferença, em linha pontilhada. Observe que na primeira cesta, que possui mais do bem 2 do que no bem 1, a inclinação da tangente é mais forte do que na cesta 2x , que possui mais do bem 1 do que do bem 2. Isto ocorre porque, no primeiro ponto, como o consumidor possui mais do bem 2, ele está disposto a sacrificar uma quantidade maior deste bem, para obter uma unidade adicional do bem 1. Ao passo que no segundo ponto, como ele possui pouco do bem 2, para obter uma unidade adicional do bem 1 ele está disposto a sacrificar somente uma quantidade menor daquele bem. Vemos assim que a TMS21 diminui quando se passa da cesta 1x para a cesta 2x , isto é, quando se aumenta as quantidades do bem 1 e se diminui as quantidades do bem 2. Na verdade, o fato da ser decrescente no bem 1 e crescente no bem 2 é uma propriedade geral das curvas de indiferença estritamente convexas. ),( 2121 xxTMS 41 Em virtude do Teorema 5, o decrescimento da permite também identificar as funções de utilidade que são estritamente quase côncavas. ),( 2121 xxTMS 7. Exemplos Apresentaremos abaixo 4 exemplos estilizados de funções de utilidade definidas para dois bens, as quais serão também usadas para ilustrar outros conceitos apresentados ao longo do curso. Os três primeiros casos representam preferências monotônicas e convexas. O último caso representa preferências monotônicas e côncavas. 1. Cobb-Douglas 0,,0,),( 2121 >>= βαβα AxAxxxu Esta é uma funçao estritamente côncava, gerando uma curva de indiferença estritamente convexa. Como a função é homogênea de grau βα + , ela representa preferências homotéticas. A curva de indiferença de nível é dada por: 0u βαβ β / 1 /1 /1 0 2 xA ux = . 42 u 1 u 0 x1 x2 U tilidade C obb-Doug las: Curvas de Ind iferença de n íve is u 0 < u 1. Observe que, sendo as preferências homotéticas, para níveis crescentes de utilidade, as curvas de indiferença se deslocam paralelamente para cima. A taxa marginal de substituição é dada por: 1 2 1 21 2 1 1 2121 ),( x x xAx xAxxxTMS β α β α βα βα == − − Como vemos, ela é decrescente em e crescente em . 1x 2x Além disso, a TMS não depende do nível de utilidade. Ela é igual à uma constante k ao longo do raio de equação 12 xkx α β= , partindo da origem. O consumidor com utilidade Cobb-Douglas considera os bens como substitutos. Mas a substituição não é perfeita: para um mesmo nível de utilidade, quanto menos ele tem de um dos bens, menos ele está disposto a renunciar deste bem para obter uma unidade adicional do outro. 43 2. Utilidade linear 0,),( 2121 >+= axaxxxu Esta é uma função côncava, gerando uma curva de indiferença linear convexa. Como a função é homogênea de grau 1, ela representa preferências homotéticas. A curva de indiferença de nível é dada por: . 0u 102 axux −= u 1 u 0 x1 x 2 U ti li da d e L in e a r: C u rv a s d e In d if e re nç a d e n í ve is u 0 < u 1 . Aqui também, sendo as preferências homotéticas, as retas de indiferença se deslocam paralelamente para cima. A taxa marginal de substituição é constante: aaxxTMS == 1 ),( 2121 Isto significa que o consumidor está disposto a trocar unidades do bem 2 por uma unidade do bem 1, independentemente de quanto ele tenha de cada um dos bens. a 44 Assim como no caso Cobb-Douglas, o consumidor com utilidade linear considera os bens como substitutos. Mas neste caso a substituição é perfeita, pois ele está disposto a trocar os bens em proporções fixas, quaisquer sejam as quantidades já possuídas. 3. Utilidade Leontieff 0,},min{),( 2121 >= axaxxxu Trata-se de uma função côncava, gerando uma curva de indiferença linear convexa. A função é homogênea de grau 1. Logo, representa preferências homotéticas. A curva de indiferença de nível é obtida da seguinte maneira: 0u auxaxx uxaxx /0112 0212 =⇒≥ =⇒< . A figura abaixo, ilustra estas curvas para dois níveis de indiferença. u 1 u 0 x 1 x 2 U t il id a d e L e on t ie ff : C u rva s d e In di fe re n ça d e n íve is u0 < u1. u 0/a u 1/a u 1 x 2 = a x1 Aqui também, sendo as preferências homotéticas, as linhas de indiferença se deslocam paralelamente para cima. 45 Estas linhas apresentam um kink ao longo da reta de equação . 12 axx = A taxa marginal de substituiçao TMS21 só está definida para . Neste intervalo ela é nula: aux /01 > auxxxTMS /;0),( 012121 >= Como ele não substitui os bens neste intervalo, consideramos que, neste caso, o consumidor considera os bens 1 e 2 como sendo complementares entre si. O consumo de um, requer necessariamente o consumo do outro. Uma vez de posse da cesta , o consumidor não melhora sua satisfação acrescentando unilateralmente mais unidades do bem 1 ou do bem 2. ),/( 00 uau Como veremos na próxima aula, ele demandará os bens em proporção fixa, a unidades do bem 2 por unidade do bem 1. 4. Utilidade Max 0,},max{),( 2121 >= axaxxxu Trata-se de uma função convexa, gerando uma curva de indiferença linear côncava. A função é homogênea de grau 1. Ela representa preferências homotéticas. A curva de indiferença de nível é obtida da seguinte maneira: 0u auxaxx uxaxx /0112 0212 =⇒≤ =⇒> . A figura abaixo, ilustra estas curvas para dois níveis de indiferença. 46 u1 u0 x1 x2 U tilidade Max: Curvas de Ind iferença de níve is u0 < u1. u0/a u1/a u1 x2 = ax1 Sendo as preferências homotéticas, as linhas de indiferença se deslocam paralelamente para cima. Estas linhas apresentam um kink ao longo da reta de equação . Trata-se de uma quebra invertida, com relação ao caso Leontieff. 12 axx = A taxa marginal de substituição TMS21 só está definida para . Neste intervalo ela é nula: aux /01 < auxxxTMS /;0),( 012121 <= O consumidor não substitui os bens neste intervalo. Até unidades do bem 1, ele não aumenta sua utilidade agregando mais unidades deste bem à sua cesta. au /0 De fato, a cesta proporciona ao consumidor a mesma utilidade que as cestas contendo apenas um dos bens ou . ),/( 00 uau ,/( 0 au),0( 0u )0 Como veremos na próxima aula, pelo critério econômico do menor custo, o consumidor preferirá consumir cestas contendo apenas um dos bens. 47 Qual dos bens ele consumirá, isto dependerá do relativo de preços, como veremos adiante. As preferências do consumidor representadas pela utilidade Max consideram os bens como excludentes. O consumo do bem 1 exclui o do bem 2 e vice-versa. Assim como o consumidor que tem preferências convexas e estritamente monotônicas prefere cestas balanceadas, o consumidor que tem preferências côncavas e estritamente monotônicas prefere cestas não balanceadas, contendo apenas um único bem. O primeiro consumidor valora a variedade, o segundo valora a uniformidade. 8. Bibliografia e Exercíciossugeridos Bibliografia: [SN] Cap. 3 ; [N] Cap. 1 e Cap. 3; [VO] Cap. 3, Cap.4, Cap.5; [PR] Sec. 3.1; Sec. 3.2; Sec.3.4; [JR] Sec.1.1; Sec.1.2; Sec.1.3. Exercícios Sugeridos. Anpec: 2012/ Q1 ; 2011/ Q2 ; 2010/ Q1; 2009/ Q2. [SN]: 3.2/ 3.3/ 3.4/ 3.8-3.13/ 3.14 (Analytical)
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