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1 AULA 3: MINIMIZAÇAO DO DISPENDIO 1. Os níveis de bem-estar desejados; 2. Minimização da Despesa; 3. A funçao Despesa - Propriedades; 4. Dualidade; 5. Efeitos Substituição e Renda; 6. A Lei da Demanda 7. Outros Exemplos 8. Bibliografia e Exercícios sugeridos. 1. Níveis de bem-estar desejados Assim como na aula 2 anterior, a estrutura das escolhas do consumidor no espaço dos bens é , e ele é confrontado com um vetor de preços dado pelo mercado. nRX +⊂ ),,( uX ≥ ...,( 1pp = )np No enfoque anterior, o consumidor possui uma renda R que delimita o conjunto das cestas de bens que ele pode adquirir. Ele entao escolhe, dentro deste conjunto, a cesta que maximiza a sua utilidade isto é, o seu bem estar. Agora, no presente enfoque, o consumidor não atenta imediatamente para o custo das cestas. Aqui, ele fixa o nível de bem-estar desejado, ou seja , e considera todas as cestas que lhe asseguram ao menos este nível de satisfação: *u *})(:{*)( uxuXxuS ≥∈= Este conjunto não é outro que o conjunto superior de nível da utilidade, o qual já foi definido na primeira aula. *u 2 Fig.1: Conjunto das cestas desejáveis de 2 bens x1 x2 0 Conjunto Superior de nível u*. Pref.Convexas u* S(u*) Uma vez delimitado o conjunto das cestas desejáveis, o consumidor escolherá então aquela mais em conta, isto é, aquela de menor custo. 2. Minimização da Despesa Formalmente, o programa da minimização da despesa é: *)(;min uSxxpx ∈⋅ (P) Como a minimização do dispêndio envolve a escolha da cesta *x de menor custo, dado o vetor de preços p e o nível de satisfação , esta cesta ótima será função do vetor de preços e do nível de satisfação desejado: *u *),(* upxx h≡ 3 Óbviamente, a cesta será desejável e de menor custo: *)(;**)(* uSxxpxpeuSx ∈∀⋅≤⋅∈ A demanda ótima de cada bem i será um componente do vetor *x . Estas demandas serão notadas *),(* upxx hii ≡ e serão chamadas Demandas Hicksianas ou também, Demandas Compensadas do consumidor. OBS.: Observe que, contrariamente às demandas Marshallianas, que dependem de variáveis preço e renda, ambos observáveis, as demandas Hicksianas dependem de um nível de satisfação que é, na prática, inobservável e arbitrário, uma vez que a utilidade não tem significado cardinal. *u Por esta razão, as demandas Hicksianas não são observáveis. Embora não tenham o valor empírico das demandas Marshallianas, sua importância teórica para a análise do bem estar é considerável. Método de Cálculo O problema (P) da minimização da despesa é o dual do problema (P) da maximização da utilidade, como visto na Aula 2. Por esta razão, o método de cálculo da cesta de custo mínimo neste caso é análogo àquele apresentado na aula 2. Observe que aqui a função objetivo é o custo da cesta xp ⋅ , o qual é uma função linear nas quantidades. 4 Por outro lado, a restrição *)( uxu ≥ é quase sempre não linear. As propriedades métricas do conjunto das cestas desejáveis *)(uS é que definirão o método de cálculo adequado. Trataremos aqui do caso mais comum, em que as preferências do consumidor são convexas, de modo que *)(uS é um conjunto convexo e a solução é interior. Os casos de não convexidade levarão a soluções de canto, de modo que as observações feitas no caso da maximização da utilidade também se aplicam aqui. No caso convexo, em que a utilidade é estritamente crescente, sabemos que a solução do problema (P) pode ser resolvido pelo método de Lagrange, com restrição de igualdade. O Lagrangeano da minimização é aqui: L: ))(*(),(),(: xuuxpxLxRRX −+⋅=→→× λλλ Supondo novamente a diferenciabilidade da utilidade, as condiçoes de primeira ordem são: ni x up x L i i i ,...,1;0 ==∂ ∂−=∂ ∂ λ e 0)(* =−=∂ ∂ xuuLλ Ou, ainda: nji p p x u x u xTMS j i j i ij ,...,1,;)( == ∂∂ ∂∂= (1) *)( uxu = (2) 5 Observe que a condição (1) das TMS´s igualarem os preços relativos é a mesma condiçao necessária da maximização da utilidade. Portanto, o hiperplano da restrição orçamentária é, no equilíbrio, tangente à superfície de nível da utilidade. *u A utilidade sendo quase côncava, o teorema 1 da aula 2 se aplica, mutatis mutandis. Assim, se ao 0*)*,( >>λx resolvem as condiçoes (1) e (2) então o vetor das demandas Hicksianas *),(* upxx h= resolve o problema (P) da minimização da despesa. Antes de apresentarmos as propriedades das demandas Hicksianas, trataremos da funçao despesa. 3. A Função Despesa - Propriedades A função despesa, notada, *),( upe é definida pelo custo da cesta ótima: *),(*),( upxpupe h⋅≡ Como vemos, dado o vetor de preços p , a funçao despesa dá o menor custo necessário a ser incorrido para obter o nível de satisfação . *u Se for contínua e estritamente crescente, então a utilidade indireta u *),( upe possui as seguintes propriedades: 1. Continuidade em RRn ×++ ; 6 2. *),( upe é estritamente crescente e ilimitada superiormente em ; *u 3. Homogeneidade linear (grau 1) em p ; 4. Crescente e côncava em p ; A propriedade (2) nos diz que aumentos no nível de bem estar desejado se traduzem em aumentos no custo das cestas que proporcionam este bem estar. A propriedade (3) nos diz que aumentos de 10% em todos os preços dos bens da cesta ótima, gera aumento também de 10% no custo desta cesta. A concavidade da função despesa (4) é uma propriedade importante a ser usada adiante para mostrar a negatividade dos efeitos de substituição. Ela decorre diretamente da linearidade em p da função custo e da minimização do custo. Ela implica em gastos marginais decrescentes à medida que os preços aumentam. Lema de Shephard: Adicionalmente, se u for estritamente quase va, *),( ucônca pe é diferenciável em p , e vale o chamado lema de Shephard: ni p upeupx i h i ,...1; *),(*),( =∂ ∂≡ Este lema permite que se obtenha a demanda Hicksiana de cada bem derivando-se a função despesa com relação ao preço do bem. 7 A prova do Lema de Shephard é uma conseqüência imediata da aplicação do Teorema do Envelope ao Lagrangeano da solução do problema (P) da minimização da despesa. (Veja Aula 2) Função Despesa e Preferências Homotéticas Se as preferências são homotéticas, entao a função de utilidade )(xu pode ser escrita como um funcional monotonico crescente de uma função homogênea linear U . Isto significa que podemos escrever: ))(()( xUFxu = , onde é uma funcao monotonica crescente e F U é homogênea linear. Neste caso, podemos mostrar que a função despesa admite a seguinte representação: )1,()(),( 00 peuupe φ= onde )1(/)()( 10 1 0 −−= FuFuφ é uma função crescente dos níveis de bem estar . 0u Prova: Considere que, na minimização da despesa temos a restrição , a qual é equivalente à: 0)( uxu ≥ 0))(( uxUF ≥ ou ou ainda: )()( 01 uFxU −≥ )1()( )( )1( 0 1 1 − − ≥xU u 1−F F F . Usando a homogeneidade linear de U e a monotonia crescente de , esta última desigualdade é equivalente à F 1))1(()))( 10 1/)1((( 1 =≥ −FFu−− FFUF. Logo, o programa sujeito à é equivalente ao programa xpx .min 0)( uxu ≥ ) )( )1(.(min )1( ( 1 0 1 F uF − − ) 0 1 1 x uF Fpx − − sujeito à 1)))(/)1((( 0 11 ≥−− uFFUF . 8 Colocando )( )1( 0 1 1 uF Fz − − ≡ , o programa da minimização será equivalente ao programa: )1( )( 1 0 1 − − F uF zpz .min suje (zu ito à . 1) ≥ Obtemos assim o resultado )1,( )1( )(),( 1 0 1 0 peF uFupe − − = . ⊕ 4. Dualidade Vimos anteriormente que os problemas (P) da Maximização da Utilidade e da Minimizacao da despesa são duais, pois a função objetivo de um ntra na restrição do outro. e Matematicamente, esta dualidade tem duas onseqüências notáveis. c A primeira conseqüência diz respeito à uma relação simétrica que se estabelece entre a função despesa e utilidade indireta. a unção despesa e utilidade indireta F Pode-se mostrar que se a função de utilidade u for contínua e estritamente crescente, dados o vetor de preços 0>>p , o nível de renda 0>R e o nível de utilidade , são validadas as identidades: u 1. RRpvpe =)),(,( 2. uupepv =)),(,( A primeira relação nos garante que a despesa mínima necessária para comprar a utilidade ),( Rpv , quando os preços são p e a renda R , é exatamente igual à R . 9 A relação (2) nos garante que a satisfaçao máxima que pode ser obtida com a renda necessária para adquirir a utilidade u , dados os preços p , é exatamente igual à . u As relações acima são bastante úteis, do ponto de vista analítico e operacional: A primeira nos permite obter a utilidade indireta à partir da função despesa, isto é, sem necessidade de se fazer a maximização da utilidade; Inversamente, a segunda nos permite obter a função despesa à partir da utilidade indireta, isto é, sem necessidade de se fazer a minimização da despesa. A segunda conseqüência da dualidade diz respeito à uma relação existente entre as demandas Hicksianas e as demandas Marshallianas. Demandas Hicksianas e demandas Marshallianas Se a função de utilidade u for contínua, estritamente crescente e estritamente quase côncava, dados o vetor de preços 0>>p , a renda 0≥R e o nível de utilidade u , são validadas as identidades: 3. )),(,(),( upepxupx i h i = 4. )),(,(),( RpvpxRpx hii = A relação (3) nos permite obter a demanda Hicksiana do bem que é necessária para que o consumidor obtenha a utilidade u , à partir das quantidades Marshallianas demandadas deste bem, quando o i 10 consumidor tem renda ),( upe , igual à renda mínima necessária para adquirir esta utilidade u . A relação (4) nos permite obter a demanda Marshalliana do bem i de um consumidor que dispõe de renda R , à partir da sua demanda Hicksiana deste bem, demanda esta necessária para que ele alcance o nível de utilidade ),( Rpv . Além da sua utilidade operacional, as 4 relaçoes que saem da dualidade dos processos de otimização do consumidor são também importantes do ponto de vista analítico. Elas nos permitem decompor o efeito total de variações nos preços sobre a demanda de qualquer bem, em duas partes que se adicionam: o efeito substituição e o efeito renda. 5. Efeitos Substituição e Renda Derivando-se a identidade 3. acima com relação ao preço , de ambos os lados da equação, e avaliando a derivada nos pontos em que jp )),(,( upepvu = e RRpvpe =,(,( )) teremos, com o uso da regra da cadeia: ),(| ),( Rpvu j h i p upx =∂ ∂ = ∂ ∂ e j i p upepx (| )),(,( +=Rup ), ),(),up( | ),(.| ),( )),(,( Rpvu j Re p upe upe upep == ∂ix ∂ ∂ = +∂ ∂ j i p Rpx ),( )),(,(.), xRp hj ( Rpvp R xi ∂ ∂ . Ou finalmente, usando a relação 4. acima: 11 ),(| ),( Rpvu j h i p upx =∂ ∂ = +∂ ∂ j i p Rpx ),( ),(.),( Rpx R Rpx j i ∂ ∂ nji ,...,1, = Os efeitos substituição e renda são obtidos tomando- se a derivada com relação ao preço do próprio bem. ip Assim, fazendo ij = da equação anterior e passando para a esquerda o segundo termo do lado direito, temos a chamada equação de Slutsky: =∂ ∂ i i p Rpx ),( ),(| ),( Rpvu i h i p upx =∂ ∂ + [- ),(.),( Rpx R Rpx i i ∂ ∂ ] A derivada à esquerda mede o efeito marginal total de uma variação no preço do bem sobre a demanda deste bem. i Este efeito total é resultado da soma de dois outros efeitos: O efeito substituição, que é a variação da demanda resultante da mudança no preço relativo do bem, mantido o nível de utilidade constante, cuja medida é feita sobre a demanda Hicksiana: ),(| ),( Rpvu i h i p upx =∂ ∂ ; E o efeito renda, que mede a variação, na margem, da demanda do bem, resultante da variação da renda real provocada pela mudança no seu preço: [- ),(.),( Rpx R Rpx i i ∂ ∂ ]. 12 Negatividade do efeito substituição Pelo Lema de Shephard temos: 2 2 ),(),( ii h i p upe p upx ∂ ∂=∂ ∂ . Ora, vimos que a funçao despesa é côncava, de modo que se a funçao despesa for duas vezes contínuamente diferenciável, é válida a identidade acima, de modo que: 0),( ≤∂ ∂ i h i p upx . Isto é, o efeito substituição nunca é positivo. Bens Normais e Bens Inferiores A teoria microeconômica costuma classificar os bens em bens normais e bens inferiores, de acordo com o efeito produzido por variações na renda sobre a demanda destes bens. Assim, o bem i é um bem normal se 0),( ≥∂ ∂ R Rpxi isto é, se a sua demanda não diminui com o aumento da renda nominal do consumidor. Por outro lado, se a sua demanda diminui com o aumento da renda, o bem é dito um bem inferior: i 0),( <∂ ∂ R Rpxi . É interessante observar, à partir da equação de Slutsky acima, que se o consumidor tem demanda positiva sobre um bem normal , variações no seu preço geram efeitos renda não negativos sobre a sua demanda. Efeitos renda positivos sobre a sua demanda são gerados se o bem for inferior. i Nas Figuras 2 abaixo ilustramos no plano de dois bens e , os efeitos substituição e renda nos casos de um bem normal (2a) e de um bem inferior (2b). 1 2 13 Ao mesmo tempo, figuramos o formato das curvas de demanda Marshalliana e Hicksianas derivadas à artir das variações no preço do bem. das anda. Caso de um bem Normal. p s Substituição e Renda e formato Fig.2a: Efeito Curvas de Dem x1 x2 x1 x0 x1 x10x11 x1s $ EfeitosSubstituicaoe Renda. 1 éumbemNormal p10 p11 X1h(p,u) X1(p,R) u 0 o equilíbrio inicial, o consumid o de renda N or dotad R aufere o máximo de satisfação ),( Rpvu = ao adquirir 14 a cesta ótima 0x , com quantidades do bem 1, compradas ao preço unitário . 0 1x 0 1p Neste ponto, de acordo com a relação de dualidade 4., as demandas Marshalliana e Hicksiana pelo bem 1 são idênticas, e suas curvas se intersectam. Com o aumento no preço do bem 1 de para , a mudança no preço relativo levou o consumidor à nova cesta ótima 0 1p 1 1p 1x , onde unidades do bem 1 são adquiridas. 1 1x ( 11x O efeito total sobre a demanda do bem 1 é igual à , o qual se decompõe no efeito substituiçao e no efeitorenda: 0 1 1 1 xx − ( 011 xx s − ) : )1sx− Deste modo o efeito total será: =− 0111 xx +− )( 011 xxs )( 111 sxx − . Face ao aumento no preço do bem, se o consumidor pudesse manter o mesmo nível de utilidade fruído na situação inicial, ele substituiria o bem 1 pelo bem 2, que se tornou relativamente mais barato, reduzindo a demanda do bem 1 de )( 1x s unidades. 0 1x− Por outro lado, como o bem 1 é um bem normal, o efeito renda é negativo: o aumento no preço reduz a renda real do consumidor . Esta redução no poder de compra da sua renda R , por sua vez, reduz ainda mais a demanda do bem, em unidades adicionais. )( 1 1 1 sxx − Por isso é que, em 0x , a curva de demanda Marshalliana intersecta a demanda Hicksiana por baixo. )(1 Rx ,p ),(1 upx h A Figura 2b abaixo descreve a mesma situação no caso em que o bem é um bem inferior. 15 Fig.2b: Caso de um bem Inferior x1 x2 x1 x0 x1 x10x11x1s $ Efeitos Substituicao e Renda. 1 é um bem Inferior p10 p11 X1h(p,u) X1(p,R) u 0 Na figura 2b, com o aumento no preço do bem 1 de para , a mudança no preço relativo levou o consumidor à nova cesta ótima 0 1p 1 1p 1x , onde unidades do bem 1 são adquiridas. 1 1x O efeito total sobre a demanda do bem 1 é igual à , o qual se decompõe no efeito substituição e no efeito renda 0 1 1 1 xx − ( 011 xx s − ) )( 111 sxx − . O primeiro efeito é sempre não positivo, como vimos anteriormente. O encarecimento relativo do bem 1 16 gera um expressivo efeito substituição do bem 1 pelo bem 2. Caso o consumidor pudesse manter seu nível de bem estar constante, ele reduziria as quantidades demandadas do bem 1 em )( 011 xx s − unidades. Note que aqui, o bem 1 é um bem inferior, de modo que o efeito renda é positivo: a redução na renda real do consumidor leva ele a aumentar as quantidades consumidas deste bem em )( 1 1 1 sxx − unidades. Deste modo, em 0x , a curva de demanda Marshalliana intersecta a demanda Hicksiana por cima. ),(1 Rpx ),(1 upx h Observe também que, no caso de um bem inferior, a demanda Hicksiana é decrescente no nível da utilidade u. Isto significa que, se o bem é inferior, para um dado vetor de preços, pode-se alcançar um nível de bem estar superior demandando menos deste bem. Bens de Giffen No século XIX, o economista inglês Robert Giffen observou, num certo período, que a medida que o preço da batata subia, os consumidores irlandeses, demandavam mais deste produto. Isto ocorria não apenas porque a batata era um bem inferior, mas também porque ela fazia parte dos hábitos de consumo das familias, de modo que o dispêndio com ela representava uma parcela significativa da renda dos consumidores. Deste modo, o aumento no seu preço reduzia substancialmente a renda real dos consumidores. Estes eram entao forçados a reduzir o consumo de outros bens de luxo para adquirir mais batatas. 17 A moderna teoria microeconômica explica hoje o aparente paradoxo dos tempos de Giffen, através da equação de Slutsky. Entre os bens inferiores, é possível que haja algum bem cuja variação no preço impacte sobre a sua demanda com um efeito renda positivo tão forte que supere em magnitude o efeito substituição. Neste caso, um aumento no preço deste bem produzirá o efeito paradoxal de aumentar a sua demanda. Este é um bem de Giffen. A Figura 2c abaixo ilustra o caso de um efeito renda positivo e maior que o efeito substituição (modular). Fig.2c: Caso de um bem inferior: bem de Giffen x1 x2 x1 x0 x1 $ p10 p11 x10x1s x11 R/p10R/p11 u X1(p,R) X1h(p,u) 0 Efeitos Substituiçao e Renda. 1 é um bem de Giffen 18 Imagine que o bem 1 seja a batata irlandesa e 2 o chocolate (um bem de luxo no sec.XIX !). Antes do aumento no preço da batata, o consumidor demanda a cesta 0x , no consumo da qual obtém satisfação . Esta cesta contém unidades de batatas. u 01x Após o aumento no preço da batata, o consumidor escolhe a cesta 1x , que contém unidades do produto, quantidades estas maiores do que anteriormente. 1 1x O novo equilíbrio contém também quantidades bem menores de chocolate, o bem de luxo, cujo consumo foi sacrificado em razão da expressiva redução na renda real do consumidor. Neste novo equilíbrio, o consumidor está em um nível de bem estar abaixo daquele que ele usufruía anteriormente ( u ). 6. A Lei da Demanda A negatividade do efeito de substituição nos garante que a função de demanda Hicksiana de um bem é não crescente no seu preço. Portanto, demandas negativamente inclinadas com relação ao seu próprio preço é uma propriedade garantida apenas para as demandas Hicksianas. Vimos acima que esta propriedade não está assegurada para as demandas Marshallianas. O caso de um bem de Giffen mostra justamente que a demanda Marshalliana pode até mesmo ser crescente no preço do próprio bem. 19 Entretanto, a equação de Slutsky nos permite discriminar as situações em que o decrescimento da demanda Marshalliana com relação ao próprio preço deve ocorrer: o caso dos bens normais. Com efeito, no caso dos bens normais, diante de um aumento no preço do próprio bem, ao efeito substituição negativo, que retrai a demanda, se soma um efeito renda também negativo, de sorte que o efeito total, dado pela variação na margem da demanda Marshalliana, será necessáriamente negativo. Por outro lado, a equação de Slutsky nos permite também afirmar que se a demanda Marshalliana de um bem for crescente no seu próprio preço, entao este bem é necessáriamente um bem inferior. Isto ocorre porque, neste caso, o aumento no preço do bem terá gerado um efeito renda positivo sobre a sua demanda. Temos assim o que se convencionou chamar na literatura a Lei da Demanda, relacionada à demanda Marshalliana: Lei da Demanda (i) O aumento no preço de um bem normal provoca uma redução nas suas quantidades demandadas; (ii) Se o aumento no preço do bem provoca um aumento nas suas quantidades demandadas, entao este é um bem inferior. Propriedades adicionais da demanda Hicksiana Além do não crescimento com relação ao próprio preço, as funções de demanda Hicksianas exibem as seguintes propriedades adicionais: ),( upxhi ni ,...,1= 20 1. Homogeneidade de grau 0 com relação ao vetor de preços: 0;),(),( >∀= tupxutpx hihl A prova desta propriedade é uma conseqüência direta da homogeneidade linear da função despesa com relação ao vetor de preços :p ),(),( upteutpe = . Usando então a relação da dualidade 3. vem: ),()),(,()),(,()),(,(),( upxupepxuptetpxutpetpxutpx hiiii h i ==== . Na penúltima igualdade, usamos a homogeneidade de grau 0 da demanda Marshalliana. Esta propriedade garante que a demanda Hicksiana de cada bem ficará inalterada se todos os preços variarem na mesma proporção. Isto ocorre porque o consumidor que minimiza a despesa para um dado nível de bem estar, só altera sua demanda se houver mudança nos preços relativos. Um aumento proporcional em todos os preços não altera os preços relativos, de modo que a demanda ótima do consumidor que minimiza a despesa ficará inalterada. Apenas o custo da sua cesta aumentará, na mesma proporção. 2. Simetria dos efeitos de substituição Se a função despesa é diferenciável até a segunda ordem, com derivadas contínuas, entao vale o teorema de Young: nji pp upe pp upe ijji ,...1,;),(*),(22 =∂∂ ∂=∂∂ ∂ , de modo que, pelo lema de Shephard temos: 21 nji p upx p upx i h j j h i ,...1,; ),(),( =∂ ∂=∂ ∂ A simetria dos efeitos substituição, é um propriedade técnica, relacionada às propriedades da função despesa. Todavia, é possível mostrar que ela está intimamente relacionada ao axioma da transitividade da relação de preferências do consumidor racional. Isto é, ela é uma conseqüência da hipótese de consistência (ou coerência) das escolhas do consumidor. 3. Definição negativa da matriz de Slutsky A matriz de Slutsky, notada ),( upS , é a matrix de ordem com elemento típico n ),( ji dado pelo efeito substituiçao cruzado, do preço do bem j sobre a demanda Hicksiana do bem . i Ora, pelo lema de Shephard devemos ter: ≡),( upS ⎥⎥⎦ ⎤ ⎢⎢⎣ ⎡ ∂ ∂ j h l p upx ),( ⎥⎥⎦ ⎤ ⎢⎢⎣ ⎡ ∂∂ ∂= ij pp upe ),(2 ; nji ,...,1, = . O termo à direita não é outra coisa que a matriz Hessiana da funçao despesa, a qual é côncava em p , como vimos anteriormente. Logo, ),( upS é necessáriamente uma matriz definida negativa. 22 Demandas Hicksianas e Preferências Homotéticas Na seção 3 vimos que se ))(()( xUFxu = , onde é uma funcao monotonica crescente e F U é homogênea linear, teremos )1,p()(),( 00 euupe φ= , onde )1(/)()( 10 1 0 −−= FuFuφ é uma função crescente dos níveis de bem estar . 0u Neste caso, é fácil verificar que a igualdade acima implica: )1,()(.)1,()(),(. 000 pxuppeuupxp hh φφ == , de modo que teremos, necessáriamente: )1,()(),( 00 pxuupx hh φ= Um exemplo: Utilidade CES Para 2 bens, a utilidade CES (Constant Elasticity of Substitution) é definida por: 10;)(),( /12121 <≠+= ρρρρ xxxxu Ela representa preferências homotéticas, estritamente monotônicas e estritamente convexas. Na Aula 2 obtivemos as demandas Marshallianas, R p ppRppx )1/(1 1 21 ,211 ),,( ρρρ − ⎟⎟⎠ ⎞ ⎜⎜⎝ ⎛ += e R p ppRppx )1/(1 2 21 ,212 ),,( ρρρ − ⎟⎟⎠ ⎞ ⎜⎜⎝ ⎛ += Com a parametrização )1/(01 θθρρρθ +=⇔>−≡ , podemos escrever estas demandas como: 23 Rpp p Rpx )1( 1 12 1 1 )/(1 1),( θ θ θ + + ⎟⎠ ⎞⎜⎝ ⎛ += e Rpp p Rpx )1( 1 21 2 2 )/(1 1),( θ θ θ + + ⎟⎠ ⎞⎜⎝ ⎛ += e a utilidade indireta: [ ] RppRpv θθθ /121),( −− += Vamos agora obter a função despesa e as demandas Hicksianas usando as relações da dualidade 1.-4., isto é, sem necessidade de efetuar a minimização condicionada do custo. a) Função Despesa: Pela relação da dualidade 2.: uupepv =)),(,( temos: [ ] ⇒=+= −− uupeppupepv ),()),(,( /121 θθθ [ ] uppupe θθθ /121`),( −−− += . b) Demandas Hicksianas: Podemos usar a relação da dualidade 3.: , ou então, mais fácilmente, usando o lema de Shephard: )),(,(),( upepxupx i h i = 2,1;),(),( =∂ ∂≡ i p upeupx i h i . Usando este último atalho, obtemos: e [ ] uppupxh θθθ /)1(211 )/(1),( +−+= [ ] uppupxh θθθ /)1(122 )/(1),( +−+= A partir destas expressões, podemos checar a validade da equação de Slutsky. Isto será feito explicitamente nos casos estilizados apresentados à seguir. 24 7. Outros exemplos Vamos calcular a função despesa e as demandas Hicksianas, assim que checar a relação de Slutsky nos 4 exemplos estilizados das duas aulas anteriores. a) Cobb-Douglas 0,,0,),( 2121 >>= βαβα AxAxxxu Esta é uma função estritamente crescente e côncava, gerando uma curva de indiferença estritamente convexa. Os bens são substitutos imperfeitos. Lembremos que as demandas Marshallianas são: 11 /),( pRRpx βα α += e 22 /),( pRRpx βα β += E a utilidade indireta é: βα βα βαβα βα β βα α 21 21 )()(),(),(),( pp RARpxRpAxRpv + ++=≡ Pela relação da dualidade 2.: uupepv =)),(,( temos: ⇒=++= + u pp upeAupepv βα βα βα βα β βα α 21 ),()()()),(,( βαβα β βα α +++= 1 21),( upBpupe , onde βαβα βα β βα α +− ++≡ 1 })()({AB 25 Obtermos agora as demandas Hicksianas usando o lema de Shephard: 2,1;),(),( =∂ ∂≡ i p upeupx i h i Derivando a função despesa obtemos: βαβα β βα α ++ += 1 121 )/(),( uppBupx h e βαβα α βα β ++ += 1 212 )/(),( uppBupx h b)Utilidade linear 0,),( 2121 >+= axaxxxu Esta é uma função linear, gerando uma curva de indiferença linear convexa. Os dois bens são substitutos perfeitos. Para as demandas Marshallianas, vimos na aula 2 que se qualquer cesta verificando a equação é uma cesta de equilibrio. 21 app = ),(* *2*1 xxx = 2 * 2 * 1 / pRxax =+ Se 2 1 p pa > , o consumidor gasta toda sua renda em 1: e =),(1 Rpx 1/ pR 0),(2 =Rpx ; b) Se 2 1 p pa < , ele gasta tudo no bem 2: e 0),(1 =Rpx 22 /),( pRRpx = . Vimos também que a utilidade indireta é: RppaRpv )/1,/max(),( 21= Usando a relação da dualidade 2. obtemos a função despesa: 26 )/1,/max( ),( 21 ppa uupe = Para obtermos as demandas Hicksianas, não podemos aqui usar o lema de Shephard como antes, pois a utilidade linear não é estritamente quase côncava. Para isso, usaremos a relação da dualidade 3., . )),(,(),( upepxupx i h i = Obtemos entáo: Se 2 1 p pa > , e auupxh /),(1 = 0),(2 =upxh ; Se 2 1 p pa < , e 0),(1 =upxh uupxh =),(2 . Se 2 1 p pa = qualquer combinação linear convexa das duas cestas acima será uma cesta de equilíbrio, pois terá o mesmo custo. Com efeito, para 10 ≤≤ α teremos: ),(),()1(),()1()/( 21 upeupeupeuppau =−+=−+ αααα . Note que a função despesa não é derivável ao longo da reta , de modo que a relação de Slutsky não é válida ao longo da reta. app /12 = Fora da reta, para ambos os bens, o efeito substituição é nulo, de modo que os efeitos total e renda coincidem. 27 c) Utilidade Leontieff 0,},min{),( 2121 >= axaxxxu A função de utilidade é côncava, crescente, mas não estritamente. Os dois bens são complementares perfeitos. Vimos na aula 2 que as demandas Marshallianas são: 21 1 ),( app RRpx += e 21 2 ),( app aRRpx += E a utilidade indireta é: 21 ),( app aRRpv += . Usando a relação da dualidade 2. obtemos a função despesa: upapupe )/(),( 21 += Para obter as demandas Hicksianas, podemos usar tanto a relação de dualidade 3. quanto o lema de Shephard. Por uma via ou outra obtemos: e auupxh /),(1 = uupxh =),(2 Não é surpreendente que, para ambos os bens, o efeito substituiçao é nulo, de modo que os efeitos total e renda coincidem. d) Utilidade Max 0,},max{),( 2121 >= axaxxxu Trata-se de uma função convexa, crescente mas não estritamente. Os bens são excludentes. 28 As soluções deste caso são em tudo idênticas ao caso b) da utilidade linear, exceto para o caso em que 2 1 p pa = . Para as demandas Marshallianas, vimos que, se 2 10 / p pa au u o >=temos: =),(1 Rpx 1/ pR e 0),(2 =Rpx Se 2 10 / p pa au u o <= temos: 0),(1 =Rpx e 22 /),( pRRpx = Se 2 10 / p pa au u o == , o consumidor demandará indiferentemente, ou o bem 1 ou o bem 2 mas ele não demandará qualquer combinação convexa das duas cestas, como no caso linear. A utilidade indireta é RppaRpv )/1,/max(),( 21= . a qual é idêntica aquela obtida no caso b) dos bens substitutos perfeitos. A função despesa é: )/1,/max( ),( 21 ppa uupe = . As demandas Hicksianas são : Se 2 1 p pa > , e auupxh /),(1 = 0),(2 =upxh ; Se 2 1 p pa < , e 0),(1 =upxh uupxh =),(2 . Se 2 1 p pa = o consumidor demandará )0,/( au com probabilidade 1 e com probabilidade 0 ou ),0( u )0,/( au com probabilidade 0 e com probabilidade 1. ), u0( 29 Exercício: Calcule as demandas Marshallianas e Hicksianas dos dois bens, no caso de preferências quase lineares, sendo 2 o bem numerário. 0;ln),( 1221 >+= axaxxxu O que dizer dos efeitos substituiçao e efeitos renda ? 30 8. Bibliografia e Exercícios sugeridos Bibliografia: [SN] Cap. 4 ; Cap.5 [N] Cap. 4; Cap.5 [VO] Cap. 6, Cap.7; Cap.8 [PR] Cap.4; [JR] Sec.1.4; Sec.1.5. Exercícios Sugeridos. Anpec: 2012/ Q02,Q03,Q11; 2011/ Q01, Q02, Q06 ; 2010/ Q02; Q03 2009/ Q02; 2008/ Q02 [SN]: 4.1/ 5.2/5.7; 5.12/ 5.13. (Analytical)
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