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UNIDADE 01 1 Objetivos da aprendizagem INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA PARAÍBA História da Língua Portuguesa Alessandra Gomes Coutinho Ferreira Joseli Maria da Silva Rosa Lúcia Vieira Souza Rosangela Vieira Freire AULA 01 Origem e formação da língua portuguesa Compreender as origens da língua portuguesa; Distinguir os fatores que contribuíram para a formação, expansão e transformação do latim vulgar. UNIDADE 01 12 Origem e formação da língua portuguesa 2 Começando a história Quando se indaga qual a origem da língua portuguesa, a resposta provável é a de que provém do latim, língua já considerada, por muitos, morta. Como falantes da língua portuguesa, talvez nos contentemos com essa simples informação e não tenhamos maior interesse em um estudo sistemático acerca de sua origem e evolução. Para estudiosos e mestres desse idioma, entretanto, é de fundamental importância conhecer o seu processo de formação e de difusão, considerando que o processo histórico influenciou seus aspectos internos e fortaleceu a sua importância política, social e cultural. Convidamo-lo, então, caro aluno, a traçar um percurso da história de nossa língua materna, a um só tempo prazeroso e útil a sua condição de usuário, estudioso e profissional que tem como objeto de estudo a “inculta” e “bela”1 língua portuguesa. 3 Tecendo conhecimento A língua portuguesa e as demais línguas românicas resultam de uma lenta e conturbada transformação do latim através dos séculos. O latim, por sua vez, resulta da transformação do indo-europeu, ao qual se convencionou chamar ariano ou indo-germânico, falado por um povo a quem se convencionou chamar ariano ou ária. O termo ariano foi utilizado pela primeira vez pelo diplomata e escritor francês o Conde Arthur de Gobineu (1806-1882). Segundo Gobineu, baseado na teoria de Friedrich Von Schlegel, existia um povo, os arianos, que se originou na Ásia Central, migrando para o sul e para o oeste, chegando à Europa e a alguns territórios em que hoje estão o Afeganistão, a Índia e o Irã. O povo ariano – palavra que significa “nobre” – seria o ápice da civilização. Julgava-se que a língua latina fosse proveniente da grega e, esta, do sânscrito. No entanto, Franz Bopp, Filósofo alemão, por meio de pesquisa realizada no início 1 BILAC, Olavo. In: Olavo Bilac – Poesia. 2. Ed. Rio de Janeiro. Agir, 1959, p.86. Figura 1 13 AULA 01 do século XIX, pelo método da gramática comparada, provou que o sânscrito, o grego, o latim, o lituânio, o gótico, o velho eslavônico e o alemão são oriundos do indo-europeu, também chamado indo-germânico ou ariano (apud SPINA, 2008, p.22). Franz Bopp: linguista alemão, professor de filologia e sânscrito na Universidade de Berlim e um dos principais criadores da gramática comparada. Em O sistema de conjugação do sânscrito comparado aos das línguas grega, latina, persa e germânica (1816), demonstrou a afinidade genética que existe entre essas línguas, deduzindo os princípios gerais de sua formação. Sua monumental Gramática comparada das línguas indo-européias (1833- 1852) foi traduzida para o francês por Michel Bréal. 3.1 A formação da língua portuguesa e o latim Você deve estar se perguntando, caro aluno, e a língua portuguesa, como surge nesse contexto? Continuemos, então, nosso percurso histórico. Roma, cidade simples, fundada hipoteticamente em 753 a.C., por sua localização estratégica e tino político-guerreiro de seu povo, domina toda a Itália, com exceção do Vale do Pó. Seus exércitos espalham-se, durante séculos, por todo o mundo conhecido, dominando, subjugando povos, impondo-lhes seus costumes e sua língua, o latim. No primeiro milênio antes de Cristo, quando os romanos iniciaram o processo de conquistas e, consequentemente, a ampliação de suas fronteiras para além do Lácio (Península Itálica), região da Itália central, inicia-se a formação da língua portuguesa. Os domínios do Império Romano foram dilatados com a penetração romana na parte meridional da Península Itálica. As conquistas romanas aconteceram em diferentes épocas: começaram em fins do século IV a.C. e continuaram até pouco depois do século I da Era Cristã. Roma não impôs o seu jugo a todos os conquistados simultaneamente, consumiu vários séculos na dominação do mundo. No auge desse longo período das Figura 2 14 Origem e formação da língua portuguesa conquistas externas, a expansão romana ia da Lusitânia à Mesopotâmia e do Norte da África à Grã-Bretanha. À medida que estendiam seus domínios, os romanos não só ensinavam às regiões conquistadas os seus hábitos de vida como também levavam suas instituições, imprimiam os padrões de sua cultura e, sobretudo, levavam a sua língua. Nas regiões romanizadas, foi assimilado, pois, o latim vulgar (sermo vulgaris), nesta denominação inseridas as variedades da língua falada, que vão do colóquio polido às linguagens profissionais e às gírias (sermo quotidianus, urbanus, plebeius, rusticus, ruralis, pedestris, castrensis etc.). Embora a denominação latim vulgar seja um tanto imprópria, tornou-se termo técnico da linguística. Entenda-se por ela, segundo B. E. Vidos (apud Cunha e Cintra, 2008), “a língua falada por todas as camadas da população e em todos os períodos da latinidade.” É, portanto, do falar simples de soldados, marinheiros, agricultores, pastores, artesãos, funcionários romanos, povo de cultura rústica e raças diversas, que provém o latim vulgar (sermo vulgaris) o qual, por diversos fatores, diversificou-se, com o tempo, nas chamadas línguas românicas. Visualizemos essa expressiva expansão. https://www.google.com.br/imghp?hl=pt Figura 3 15 AULA 01 3.2 As línguas românicas Falado em vasta área geográfica, por povos de raças e costumes diversos, o latim vulgar não conserva a sua relativa unidade. Se nos centros urbanos o ensino do latim difundia o padrão literário – praticado por uma pequena elite –, no campo, nas vilas e aldeias a língua fluía sem nenhum controle normativo, não mais existindo a unidade linguística do Império. Das alterações desse latim falado, resultam os romanços ou romances medievais – assim se chamavam as modificações regionais do latim – e, posteriormente, as línguas românicas ou neolatinas, que conservam vestígios de sua filiação ao latim no vocabulário, na morfologia e na sintaxe. Há dez línguas românicas, na concepção de Coutinho (2005): Português – espanhol – catalão – francês – provençal – italiano – reto-romano – dalmático – romeno – sardo. Segismundo Spina, (2008) cita como línguas neolatinas: francês, italiano, espanhol, romeno, rético, dalmático, sardo, galego, portu- guês. Confirmemos, então, o domínio de cada uma dessas línguas. https://www.google.com.br/imghp?hl=pt Figura 4 16 Origem e formação da língua portuguesa Fatores diversos contribuíram para a dialetação românica, para o surgimento das línguas neolatinas: o tempo, a política de dominação dos romanos, a grande extensão geográfica do Império e sua fragmentação política e, principalmente, a ação do substrato e do superestrato. Entre uma conquista e outra, os romanos levavam séculos, e a língua falada imposta – o latim vulgar – certamente se apresentava distinta. A língua levada para a Península Ibérica em mais ou menos 197 a.C., por exemplo, certamente foi mais arcaica que a levada para a Dácia em 107 d.C. Além disso, os povos encontrados nas regiões conquistadas provinham de raças e civilizações diferentes, com suas expressões idiomáticas, influenciando o latim sobretudo na fonética e no léxico. A esse conjunto de falares diversos dos povos conquistados que se infiltrou na língua do povo vencedor, denomina-se substrato linguístico. Na Lusitânia pré-romana, o célticofoi o elemento de maior valor linguístico para a estruturação do português. Eis alguns exemplos: No léxico Nos topônimos Nos metaplasmos cavalo (<caballus) manteiga (<mantica) camisa (<camisia) caminho (<caminum) gato (<cattus) Coimbra (< Conimbriga) Bragança (< Brigantium) Lisboa (< Lisbona) Sonorização de p-t-c: lupu > lobo; datu > dado; aqua > água. Apócope da vogal principal: male > mal; bene > bem; mare > mar. Palatização do l (lh) e n (nh) que precediam i, e ou a em hiato: vinea > vinha; filia > filha e a assibilação das consoantes d e t na mesma posição: gratia > graça; hodie > hoje; invidia > inveja. 17 AULA 01 No processo de dialetação, considera-se o substrato como o elemento mais importante, especialmente pelo processo de adaptação imperfeita da base física da fonação materna ao novo idioma a ser aprendido. Os superestratos limitam-se, na generalidade dos casos, ao vocabulário, exercendo, pois, influência menos significativa. Como fator de diferenciação linguística, o superestrato está ligado ao desmembramento do Império Romano e é representado pela língua dos invasores germânicos e árabes. No século V, o Império foi invadido pelos povos germânicos (bárbaros), com diversidade de influências, que muito contribuíram para a fragmentação linguística da Hispânia. Quando a violência das invasões germânicas foi reduzida, os bárbaros passaram a romanizar-se: adotaram a cultura dos povos vencidos que lhes era superior, cristianizaram-se e assimilaram o latim vulgar. Desse contato, resulta a influência germânica no léxico. Encontram-se no vocabulário português termos como: régua, trégua, roubar, bando, bandeira, orgulho, rico, franco, tacanho, feudo, arauto etc. A partir dos séculos VI e VII, ocorreu a invasão dos eslavos, o último grupo da família indo-europeia a aparecer no cenário europeu. Esse povo eliminou tudo o que havia de latim; o único sobrevivente foi o romeno. No século VIII, a Península voltou a ser invadida pelos árabes, consumando a série de fatores externos que explicam a diferenciação linguística do português que hoje conhecemos. A invasão dos árabes acentua a influência do superestrato no processo de dialetação românica. Mais de duas mil palavras de origem árabe estão no léxico português, a maioria nomes de plantas, instrumentos, ofícios, medidas etc. Destaquemos algumas: alface, algodão, arroz, azeitona, azeite, javali, jarra, almofada, quintal, arroba. 3.3 A nacionalidade portuguesa A invasão dos árabes também desencadeou a formação de Portugal como Estado monárquico. Tornou-se reino independente da Galiza e estendeu-se para o Sul, anexando-se às regiões reconquistadas. D. Afonso Henriques, que em 1139 se proclamou o primeiro rei de Portugal, e seus sucessores prosseguiram na luta contra os mouros até que, em 1250, D. Afonso III concluiu a conquista de Algarve, fixando os limites de Portugal até hoje. Confira na imagem. 18 Origem e formação da língua portuguesa O português, na sua versão originária galega, surge entre os séculos IX-XII, mas seus primeiros documentos datados só aparecerão no século XIII: O Testamento de Afonso II e a Notícia de Torto. 4 Aprofundando o conhecimento É provável que essa incursão que fizemos pela formação da língua portuguesa tenha deixado ainda indagações acerca de alguns aspectos, principalmente históricos, os quais, pela limitação de nosso espaço didático, não nos é possível detalhar. É, portanto, de suma importância buscar outras fontes que possam suprir essa necessidade. Afinal, nenhum texto deve ser, por si só, fonte única de informação. Seguem, então, algumas sugestões. Vamos navegar! à http://www.iilp-cplp.cv Site do Instituto Internacional da Língua Portuguesa, criado em 1989 em São Luís do Maranhão, quando os países de expressão portuguesa se reuniram para pensar as bases de uma comunidade de língua portuguesa. Esse endereço apresenta links para sites de vários países em que está presente a língua portuguesa. à http://www.instituto-camoes.pt/cvc/hlp/índex.html Site do Instituto Camões, cujos textos informativos versam sobre os diferentes crioulos de base portuguesa falados na África e na Ásia. É também dedicado à apresentação da história da língua portuguesa. Figura 5 19 AULA 01 5 Trocando em miúdos No estudo empreendido nesta aula, constatamos que os vários domínios romanos, que se estenderam por séculos, aliados à extensão territorial, foram elementos importantes na origem e transformação da língua portuguesa. Outro ponto importante é a causa etnológica, uma vez que as várias regiões sobre as quais os romanos estenderam os seus domínios eram habitadas por povos de raças e costumes distintos, sendo, pois, a diversidade do meio responsável pelas transformações ocorridas no latim vulgar. Ao receber o latim, cada povo o transformava a seu modo, de acordo com os hábitos fonéticos próprios. 6 Autoavaliando Compreender a origem e formação da língua portuguesa é o objetivo central deste estudo. Encontrar respostas acerca das influências e transformações que a língua sofreu em seu processo de formação e expansão é, com certeza, a comprovação de que você está preparado para enveredar por mais uma etapa de nosso estudo. Exercitando Retomando os conhecimentos adquiridos nesta aula, reflita acerca da seguinte informação e responda à indagação que a acompanha: O latim vulgar (sermo vulgaris) sofre alterações ao se deparar com povos de raças, hábitos e costumes diferentes dos romanos. Ao consultar um mapa (do século III ao XII, ou atual), você é capaz de identificar em que áreas da Europa, entre Portugal, Espanha e África, se concentraram os povos que contribuíram com a evolução do galego-português? Faça uma lista sucinta, no mínimo 10 e, no máximo, 20 exemplos, de palavras que herdamos desses povos em nosso idioma e destaque aquelas que se conservam até hoje. 20 Origem e formação da língua portuguesa Referências COUTINHO, Ismael de Lima. Gramática Histórica. Rio de Janeiro: Livraria Acadêmica, 1974. CUNHA, Celso. LINDLEY CINTRA, Luís F. Nova Gramática do português contemporâneo. 5. ed. Rio de Janeiro: Lexikon, 2008. ILARI, Rodolfo. Linguística Românica. São Paulo: Editora Ática, 1992. SILVA NETO. Serafim da. História da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Livros de Portugal, 1970. SPINA, Segismundo. (Org.). História da Língua Portuguesa. Cotia, SP: Ateliê Editorial, 2008. TEYSSIER, Paul. História da Língua Portuguesa. Tradução Celso Cunha. Martins Fontes 21 AULA 01 UNIDADE 01 Origem e formação da língua portuguesa 2 Começando a história 3 Tecendo conhecimento 3.1 A formação da língua portuguesa e o latim 3.2 As línguas românicas 3.3 A nacionalidade portuguesa 4 Aprofundando o conhecimento 5 Trocando em miúdos 6 Autoavaliando Referências
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