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concurso de crimes

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Etimologicamente, alguns autores afirmam que a palavra “estelionato” deriva do termo stellionatu, (prática criminosa) ou ainda stellio onde um lagarto muda de cor para se camuflar e enganar os insetos que fazem parte da sua cadeia alimentar. O estelionatário, consegue vantagens para si ou para outrem através de fraude. 
A conduta que tipifica o estelionato como crime econômico está prevista no Código Penal brasileiro, no Artigo 171, Título II, Capítulo VI, com a seguinte definição: “Obter, para si ou para outro, vantagem ilícita em prejuízo alheio, induzindo alguém em erro, mediante artifício, ardil ou qualquer outro meio fraudulento”. A pena para o crime em questão é de 1 (um) a 5 (cinco) anos, além de multa. Quando se trata de réu primário ou quando o prejuízo é pequeno, a pena de prisão pode ser substituída pela pena de detenção.
O estelionato é um crime um tanto embaraçado, seja por diversos elementos constitutivos, que devem coexistir em uma sequência causal, seja pela não rara difícil tarefa de distinguir o estelionato de um mero ilícito civil. Por esta causa, existem diversas controvérsias na interpretação do crime de estelionato. Não raro, ocorre uma simplificação da interpretação do estelionato, de forma a enxergá-lo como se fosse apenas a obtenção de vantagem com fraude, quando, o tipo é bem mais sério que isso. 	
Para que se caracterize o crime de estelionato são exigidos quatro requisitos obrigatórios, são eles: 1- Obtenção de vantagem ilícita, 2- Causar prejuízo a outra pessoa, 3- Uso de meio de ardil, ou artimanha e 4- Enganar alguém ou levá-lo a erro. A ausência de um dos quatro elementos, não importando qual seja, impede a caracterização do estelionato. 
O estelionato, na doutrina, também é considerado crime de consequência ou resultado, ou seja, o criminoso deve obter benefício ilícito sobre outra pessoa para que seja considerado crime de estelionato. O tipo subjetivo desse crime é o dolo (quando há intenção de prejudicar alguém), não havendo previsão para a forma culposa, ou sem intenção deste crime. 
Em caso de estelionato cometido contra uma entidade pública, institutos ou agências de serviço social e beneficentes, a pena poderá ser aumentada. O estelionato previdenciário, encaixa-se nesse conceito e sua pena pode aumentar em até um terço.
Em matéria de Direito Penal existem diversas divergências entre a doutrina e a jurisprudência sobre um aparente conflito que há entre o crime de estelionato, previsto no artigo 171 e o crime de uso de documento falso, previsto no artigo 304, ambos no mesmo código. Nesse sentido, existem atualmente quatro correntes que tentam ao menos minimizar o conflito, embora a maioria da doutrina, apenas limite-se a analisar, sem se posicionar sobre o tema. Para melhor esclarecimento, será analisado as correntes a seguir. 
	De acordo com a doutrina, quando o agente faz uso de documento falso para a prática de estelionato, haveria apenas um crime. A primeira corrente, terçando argumentos jurisprudenciais se biparte entre a prevalência ou do estelionato ou do falso, sendo o outro crime absorvido. 
	Na primeira corrente, o estelionato prevaleceria e absorveria a falsificação, por representar este o intento verdadeiro do agente de obter lucro ilícito embaindo a boa-fé da vítima. Nesse caso, o estelionato seria o delito-fim, absorvendo o falso, que seria o delito-meio, pois o delito de falsidade seria apenas o meio de alcançá-lo.
	Para essa corrente, haveria crime único, como já mencionado, estelionato absorvendo o uso de documento falso. Este, portanto, um antefato impunível. Nesse sentido o Superior Tribunal de Justiça (STJ), através da súmula 17, afirma: “Quando o falso se exaure no estelionato, sem mais potencialidade lesiva é por este absorvido”. 
	Na segunda corrente, toda vez que o delito de falsidade tem seus elementos completos, é ele de falsificação documental e não de estelionato. Rogério Greco não adota o posicionamento a respeito dessa corrente, no entanto considera o fato de que o delito de falsificação de documento público possui pena superior à do crime de estelionato, sendo, portanto mais grave. 
	De acordo com o saudoso Procurador Geral da Justiça, Dr. Mário de Moura e Albuquerque, deixou assinalado que que a potencialidade do cheque falsificado, transcende os limites restritos do crime de estelionato, ameaçando extensos círculos de atividade social, e por constituir uma infração mais grave , absorve qualquer outra que seja verificada como consequência da atividade do agente. Nesse caso, seria o estelionato absorvido pelo uso de documento falso, pois para essa corrente o estelionato seria, portanto, um pós-fato impunível.
	A terceira corrente defende que em uma situação que o agente faça uso de documento falsificado para praticar o estelionato, há um concurso material de crimes, uma vez que haveria pluralidade de comportamentos. Nesse sentido, Cláudio Heleno Fragoso escreve que há sempre concurso de crimes entre o falso e o estelionato que acaso seja praticado com o documento falsificado, solução esta que, se não for inteiramente pacífica, é, contudo, absolutamente dominante. 
	De acordo com Damásio de Jesus, se o agente quer falsificar um documento público e, com ele, cometer estelionato, cremos que não se pode falar em unidade de ideação. A lei não considera a falsidade elemento agravante ou elemento do estelionato, e se para cometer esse crime, o agente praticou falsidade, responde pelos dois crimes em concurso material. 	
	A quarta e última corrente que faz análise do conflito existente entre o crime de estelionato e o crime de uso de documento falso, afirma haver um concurso formal de crimes. De acordo com Luiz Regis Prado, dá-se o concurso formal quando existe unidade de desígnio. Em contrapartida, haveria também um concurso formal imperfeito, isto é, quando a ação ou omissão é dolosa e os crimes concorrentes resultam de desígnios autônomos, ou seja, a vontade é conscientemente orientada a fins diversos. 	
	Nesse sentido, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) é no sentido de desautorizar o entendimento que defende a absorção, afirmando a ocorrência de concurso formal quanto a falsidade é meio para a prática do estelionato. 
	De acordo com Magalhães Noronha, ocorrendo caso de falso e estelionato, tem-se presente o concurso formal, assim sendo, quem lesa o patrimônio mediante uso de documento falso, fere duas objetividades jurídicas, dois interesses: o patrimônio e a fé pública, sendo a primeira coisa inteiramente distinta da segunda. A dupla imputação dessas lesões a bens interesses diversos ao agente é justa, tão mais justa considera não ser o falso elemento do estelionato. 
	Se faz possível, em casos excepcionais, estejam a falsidade e o estelionato tão interligados que devam ser considerados atos de uma só ação, diante disso, conduzidos ao concurso formal. Mesmo assim não seria possível fugir à consideração da ausência da unidade de desígnio, ocorrendo um concurso formal imperfeito.
Cod penal brasileiro volume v 2 parte pag 162 1958 Magalhães Noronha
[13] JESUS, op. Cit, p.53
[3] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Súmula 17. Publicado no DJ 28.11.1990
[2] GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal: parte especial. volume IV. 2.ed. Niterói, RJ: Impetus, 2007, p.276.
[5] JESUS, Damásio E. de. Direito Penal: Parte especial: Dos crimes contra a fé pública a dos crimes contra a administração pública. V.4. 13.ed. ver. E atual. São Paulo: Saraiva, 2003,p. 54
[1] Sobre as teorias vide BITENCOURT; CAPEZ, GRECO, JESUS; NUCCI, PRADO.
Cláudio Heleno Fragoso Lições de direito penalvol iv pag 101
[6] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Hábeas Corpus nº 73846 / RJ - RIO DE JANEIRO. Primeira Turma, Rel. Min. Ilmar Galvão, publicado no DJ em 06/09/1996.
[11] PRADO, Luis Regis. Curso de Direito Penal brasileiro.Volume I. 2.ed. ver. Atual e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 492

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