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Metodologia da Economia O: Fernández & Pessali (2012); S: McCloskey (1998), caps. 2,10 e 11. C: Boumans & Davis (2010), cap. 6; Hands (2001), cap.6, seção 6.2; McCloskey (1983); Aula 14 Retórica na Economia 1 2 RETÓRICA E ECONOMIA: UM BALANÇO APÓS OS PRIMEIROS 25 ANOS RAMÓN GARCÍA FERNÁNDEZ (UFABC) HUÁSCAR PESSALI (UFPR) 3 0. APRESENTAÇÃO • Origem do artigo • Estrutura: 1. Introdução 2. A idéia de retórica 3. Da retórica clássica à retórica da ciência. 4. O projeto retórico em economia (PRE) 5. Um balanço do PRE. 4 1. Introdução • Metodologia tradicional com preocupações prescritivas. – O filósofo define o que é boa ciência (economia). • Pouca preocupação descritiva – Boa ciência é o que os bons cientistas fazem? • Pouca atenção ao processo de argumentação – O importante é o produto do conhecimento (indiscutível?) , não como chegamos a ele. • McCloskey (1983) chama a atenção para essa questão: retórica da economia – Tradição x desconfiança (má fama) 5 2. A idéia de retórica - I • Conceito de retórica: – “...a arte de descobrir crenças justificáveis e de melhora-las através do discurso compartilhado" (Booth, 1974, p. xiii). – “… o uso de argumentos para persuadir nossa audiência numa conversa honesta (e o estudo disso)" (Mäki, 1995, p. 1303). • Nem todo ato de fala constitui uma situação retórica: estas são as situações que envolvem alguém tentando convencer outras pessoas a respeito de alguma coisa (o triângulo retórico). 6 O triângulo retórico Mensagem Audiência Autor 7 2. A idéia de retórica - II • Situação retórica típica: – Orador falando numa assembléia/congresso – Advogado falando para o júri. • Todavia, há outras situações que podem ser consideradas como retóricas: – Conversa em pequenos grupos – Conversa com um único interlocutor – Debate interno • Situação típica envolvia uma comunicação falada, mas há crescente importância da comunicação escrita. • Esta é evidentemente diferente, mas também pode ser considerada como passível de análise retórica (i.e., tem alguém tentando convencer outras pessoas a respeito de alguma coisa) 8 2. A idéia de retórica - III • A desconfiança com a retórica: • Isto já vem dos gregos Verdadeiro Falso Bom Mau Justo Injusto Correto Incorreto Belo Feio Os elementos do lado esquerdo se impõem por si, não precisam de argumentos ao seu favor Os elementos do lado direito só se sustentam se alguém “enrolar” e nos confundir 9 2. A idéia de retórica - IV • Podemos questionar dois pressupostos existentes por trás dessa tabela: 1) É tão óbvia a força intrínseca dos elementos do lado esquerdo que possa prescindir da argumentação? 2) É sempre fácil discernir o lado da tabela ao qual uma certa afirmação pertence? • Em muitas circunstâncias cotidianas esses dois lados não estão perfeitamente definidos. Nessas situações, só podemos argumentar a favor ou contra determinada posição para decidir o que é verdadeiro, bom, etc. • Nesse caso, a arte que estuda como as pessoas argumentam é uma ferramenta indispensável para alcançar os objetivos mais nobres. 10 2. A idéia de retórica - V • Lógica e retórica são complementares, não opostos. “A retórica não é o mesmo que a lógica, mas são campos de investigação afins. A lógica estuda a maneira pela qual uma cadeia de raciocínios leva das premissas a conclusões indiscutíveis. A retórica também estuda como os oradores e sua audiência raciocinam, indo das premissas às conclusões, porém encontra-se localizada no âmbito da incerteza e da verdade provável, no qual as conclusões são mais questionáveis do que indiscutíveis”. (Covino & Jolliffe, 1995, p. 8) 11 3. Da retórica clássica à retórica da ciência - I • Grécia clássica: sofistas, Platão, Aristóteles. • Romanos: Cícero, Quintiliano. • Importância no mundo medieval (trivium) • Importância na Renascença (Erasmo, Montaigne, etc.). • Humanismo (beletrismo) escocês dos S. XVIII – XIX: Campbell, Adam Smith, Blair, Whateley. 12 3. Da retórica clássica à retórica da ciência - II • Decadência da retórica: Ramée e Descartes entendem que a retórica só se aplica a questões de estilo, mas não a nada que envolva procura da verdade. “A partir de 1650, os pensadores europeus foram tomados por um apetite por teorias universais e atemporais (....) Como um grande Moloch, este apetite pela teoria consumiu todos os ramos da filosofia prática: a ética casuística, a política prática, a retórica e todo o resto” (Toulmin, 1990, p.83). 13 3. Da retórica clássica à retórica da ciência - III • Ressurgir da retórica no século XX 1) Tradição dos EUA dos cursos de comunicação, etc. Kenneth Burke, I.A.Richards 2) Chaïm Perelman “Tratado da Argumentação”, com Lucie Olbrechts-Tyteca (1958). 14 3. Da retórica clássica à retórica da ciência - IV • Movimentos na filosofia que colocam o estudo da linguagem no centro das preocupações: 1) Tradição da filosofia analítica: questionamento do projeto da linguagem pura, segundo Wittgenstein, Austin, etc. 2) Tradição pragmática americana: Rorty. 3) Escola de Frankfurt: Habermas 4) Hermenêutica: Gadamer, Ricoeur 15 3. Da retórica clássica à retórica da ciência - V • Movimentos em outras áreas que convergem com a retórica. 1) Filosofia da ciência pós-positivista: Kuhn, Lakatos, Feyerabend, etc. 2) Sociologia do conhecimento científico, estudos de ciência e tecnologia, etc. • Constituição do Projeto da Retórica da Pesquisa (Univ. of Iowa, início dos anos 1980). – McCloskey muda para Iowa 16 3. Da retórica clássica à retórica da ciência - VI • Retórica começa a ser aplicada ao estudo das ciências sociais • Passa depois a ser também aplicada às “hard sciences”. • Convicção básica: não há diferenças significativas entre as formas de argumentação dos cientistas e do restante das pessoas. • Isso não significa diminuir ou desprezar a ciência. “A persuasão está no coração da ciência, não em uma de suas margens menos respeitáveis. Uma retórica inteligente, praticada dentro de uma comunidade de pesquisadores séria, experiente, conhecedora e compromissada é um método sério de procurar a verdade” (Bazerman, 1988, p.321) 17 4. O projeto retórico em economia - I • McCloskey publica o artigo “Rhetoric of Economics” (JEL, 1983), o qual é ampliado e transformado numa versão maior em livro com o mesmo título (1985). • Principais pontos: 1. Economistas têm uma metodologia oficial (modernismo) que não empregam em realidade. I. Se a empregassem, paralisariam a ciência. II.Toda metodologia baseada em regras deve ser abandonada. 2. Economistas se preocupam essencialmente em convencer uns aos outros (retórica). 3. Ter consciência de que eles agem assim melhoraria a prática dos economistas. 18 4. O projeto retórico em economia - II • Clima intelectual favorável → momento de surgimento de outras obras promovendo uma análise retórica: • Arjo Klamer em suas “Conversas com Economistas” (1984) mostra que os principais macroeconomistas não fazem suas escolhas técnicas só a partir dos fatos, etc, mas também por posições políticas, preferências estéticas, etc. • Pérsio Arida publica seu artigo em 1983, no qual sugere que as polêmica em economia não acabamdevido a que algum dos participantes consiga apresentar “evidências conclusivas”. 19 4. O projeto retórico em economia - III • Recepção com muitas polêmicas. • Alguns pontos importantes levantados nessas polêmicas e nas muitas obras posteriores de McCloskey. 1. Visão retórica destaca a importância da linguagem, mas não implica irrealismo, i.e., pensar que o mundo é construído pela linguagem “Alguém que não seja realista no mínimo em parte do tempo não consegue atravessar a rua sem ser atropelado” (McCloskey, 1995, p.1320). 2. Retórica se refere ao conjunto da argumentação, não o que sobra depois de tirar a lógica e as evidências. 20 4. O projeto retórico em economia - IV 3. Verdade não é irrelevante, é objetiva e surge do acordo nas conversas. Mas há que distinguir entre verdade com v minúsculo (a que surge das nossas atividades e acordos), e a Verdade com V Maiúsculo, “que se encontra na mente de Deus” (McCloskey, 1994a, p.211) e é logo inatingível. 4. Não são quaisquer conversas e consensos que permitem o avanço do conhecimento, só aqueles que respeitam a ética do discurso. “Não minta; preste atenção; não se burle; coopere; não grite; deixe os outros falarem; tenha uma mente aberta; se explique quando solicitado; não recorra à violência ou à conspiração para ajudar suas idéias”. (McCloskey, 1994a, p.99). 21 4. O projeto retórico em economia - V • Ainda sobre a verdade: – Nem sempre se chega a consensos nas conversas. – Quando há consenso entre especialistas, eles podem afirmar algo como “Concluímos que Y é uma característica de X”. – Dado esse acordo, e sendo esses especialistas reconhecidos e respeitados, podemos entender que “Y é uma característica de X”. – Para todos os fins práticos dessa comunidade, podemos afirmar: “É verdade que Y é uma característica de X”. 22 4. O projeto retórico em economia - VI • Verdade e consenso. – Nem todo consenso é válido: tem que ser obtido através de uma conversa que respeite a ética do discurso. • O consenso imposto pela maioria sobre a minoria, ou por uma minoria poderosa sobre a maioria, não é válido. – Isso demonstra que a retórica está profundamente preocupada com questões éticas. – Logo, uma comunidade científica que não tenha altos padrões éticos não pode avançar. – Decorre disso que o conhecimento só pode ser aumentado quando se está exposto a críticas que levem potencialmente a um novo consenso. – Em particular, comunidades científicas que não abrem espaço para vozes divergentes (não são pluralistas) estão fadadas à estagnação. 23 5. Um balanço do PRE - I • Forte impacto na profissão e especialmente no campo de metodologia (todo mundo o menciona, de forma favorável ou crítica). • Importância especial no Brasil. Trabalhos típicos: a) Estudos temáticos: – Relação entre teoria e recomendações de política no comércio internacional (Milberg, 1996). – Comparação da desaparição da figura de entrepreneur na economia ortodoxa com sua presença em outras escolas (Cosgel, 1996) – Argumentação em livros textos de economia (George, 1990). b) Importância da retórica para alguma corrente de pensamento. – Marxismo (Milberg & Pietrykowski, 1994) 24 5. Um balanço do PRE - II c) Estudo da obra (ou de um trabalho específico) de um determinado autor. – Capítulos sobre Muth, Fogel, etc., em McCloskey (1985) – Artigos sobre Prebisch e a CEPAL (Bianchi e Salviano Jr, 1999; Bianchi, 2002). – Estudo da obra de Keynes (Anuatti, 2003; Vieira, 2007) – Estudo da obra de North (Gala, 2003). – Estudo da obra de Oliver Williamson (Fernández & Pessali, 2003; Pessali, 2006; Pessali e Fernández, 2008). – Estudo da obra de Robert Putnam (Monasterio & Fernandez, 2008). – Estudo do artigo de McCloskey (Aldrighi & Salviano Jr, 1996) d) Estudo de controvérsias. – Simonsen x Gudin (Dib, 2003) 25 5. Um balanço do PRE - III • Problemas do PRE. • Menos trabalho e menor impacto do que parecia no início. • Dificuldades da interdisciplinaridade não parecem ser um argumento suficiente (neuroeconomia é igualmente interdisciplinar, mas cresce). • Questão básica: não se constitui como “ciência normal”. – Poucos trabalhos monográficos. – Poucas escolas com espaço para essa área. – Depende muito da competência pessoal dos seus criadores, mas não se constituiu numa escola, paradigma, programa de pesquisa, etc. – Situação diferente de outras áreas da retórica da ciência, nas quais este tipo de trabalhos são bastante freqüentes.
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