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��������� - Setembro 2006 vol. 34 nº 9 ATUALIZAÇÃO Sulfato de Magnésio nas Síndromes Hipertensivas da Gestação: Efeitos Hemodinâmicos Maternos e Fetais Magnesium Sulfate in Hypertensive Disorders of Pregnancy: Maternal and Fetal Hemodynamic Effects Alex Sandro Rolland de Souza Carlos Noronha Neto Melania Maria Ramos Amorim Isabela Cristina Coutinho Centro de Atenção à Mulher – Setor de Medicina Fetal do Instituto Materno Infantil Prof. Fernando Figueira (SEMEFE – IMIP) Resumo As síndromes hipertensivas constituem um grupo de intercorrências clínicas que com grande freqüência complicam a gravidez. Acometem cerca de 10% das gestações, encontrando-se entre as principais causas de morte materna e com elevada taxa de morbimortalidade perinatal no mundo, oscilando entre 5 e 20%. O sulfato de magnésio é a droga de escolha para profilaxia e tratamento das convulsões eclâmpticas, e seus efeitos benéficos em termos de prevenção das crises convulsivas e redução da morte materna foram já demonstrados em ensaios clínicos bem controlados. Sugere-se que o magnésio possa ainda exercer um importante papel na regulação da pressão sangüínea por modulação da reatividade do tono vascular e da resistência periférica total. Entretanto, o papel desses efeitos no tratamento dos distúrbios hipertensivos da gravidez não foi ainda elucidado. Desta forma, a presente revisão tem como objetivo descrever os mecanismos de ação do sulfato de magnésio e avaliar seus possíveis efeitos sobre a circulação materno-fetal. Até o momento não foi encontrada nenhuma evidência de que o sulfato de magnésio possa acarretar benefícios hemodinâmicos para a mãe e o feto, existindo muitas controvérsias na literatura. PALAVRAS-CHAVE: Pré-eclampsia. Sulfato de magnésio. Dopplervelocimetria. Introdução As síndromes hipertensivas constituem um grupo de intercorrências clínicas que com grande freqüência complicam a gravidez, em todo mundo. Sua incidência varia entre 2 e 8% das gestações nos países desenvolvidos, podendo no Brasil chegar a 10% ou mais (Nascimento et al., 2001). Encontram- se entre as principais causas de morte materna no Brasil (Costa et al., 2002; Vega et al., 2003) e a terceira causa no mundo, cursando ainda com ele- vada taxa de morbimortalidade perinatal, oscilando entre 5 e 20%. Esses altos índices de mortalidade decorrem de uma gama de complicações, como eclampsia, descolamento prematuro de placenta, síndrome HELLP, tromboembolismo, hemorragia cerebral, coagulação intravascular disseminada, entre outras (Report of the National High Blood Pressure Education Program, 2000). Em São Paulo, Brasil, no ano de 1999, obser- vou-se que as síndromes hipertensivas encontravam- se como a primeira causa de morte materna, seguida por hemorragia e infecções (Vega et al., 2003). Da mes- ma forma, no Recife, observou-se que a hipertensão foi responsável por 23,8% das mortes maternas no período de 1994-2000 (Costa et al., 2002). Uma importante medida que revolucionou o tratamento das pacientes com eclampsia foi a administração do sulfato de magnésio, inicialmen- te utilizado em 1906, através de injeção intratecal ������ - Setembro 2006 vol. 34 nº 9��� ������� � �� ����� ��� ��� ����� ������������� � ��������� ������� ���� �������� �������� � ������ e posteriormente, em 1920, por via intravenosa e intramuscular, sendo descrito seu uso clínico pela primeira vez em 1925 por Lazard. Diversas institui- ções em todo o mundo passaram a adotar protocolos baseando-se no uso de sulfato de magnésio, que se difundiu a partir da década de 50, quando Pritchard, 1955, introduziu o regime para tratamento de eclampsia no Parkland Memorial Hospital. A droga tanto pode ser administrada por via intra- venosa como intramuscular, sendo que a maioria das instituições prefere a via intravenosa para dose de ataque e manutenção, por ser menos dolorosa e permitir a rápida interrupção da in- fusão em caso de manifestações de toxicidade (Santos et al., 2004). Em mulheres com eclampsia, há vários anos já se demonstrou a efetividade da droga em termos de redução do risco de recorrência e de morte materna, tanto em relação à fenitoína como ao diazepam (Eclampsia Trial, 1995). Estão disponíveis três revisões sistemáticas da Biblio- teca Cochrane, comparando sulfato de magnésio com fenitoína, diazepam e coquetel lítico (Duley e Henderson-Smart, 2005; Duley e Gulmezoglu, 2005). Em todas essas, verifica-se nítida superio- ridade do sulfato de magnésio, reduzindo tanto o risco de convulsões como de morte materna, com melhores resultados para o concepto (redução do risco de depressão respiratória e internação em UTI). Por outro lado, nos casos de pré-eclampsia, vêm se acumulando evidências dos efeitos bené- ficos do sulfato de magnésio para prevenção da eclampsia e redução do risco de morte materna. O Magpie Trial (MAGnesium Sulphate for Prevention of Eclampsia), em 2002, foi um grande estudo mul- ticêntrico internacional envolvendo 175 hospitais e 10.141 mulheres nos quatro continentes em 33 países, incluindo o Brasil, comparando o sulfato de magnésio versus placebo. Observou-se que a utilização do sulfato de magnésio nas pacientes com pré-eclampsia grave reduz o risco de convul- sões (RR 0,42; IC 95% 0,23-0,76), da mesma forma que nas pacientes com pré-eclampsia não grave (RR 0,42; IC 95% 0,26-0,67). A revisão sistemática da Biblioteca Cochrane apontou uma redução em torno de 50% do risco de eclampsia e uma provável redução do risco de morte materna, embora não se tenha demonstrado melhora do prognóstico neonatal (Duley et al., 2005). Cumpre, entretanto, ressaltar que, apesar do uso consagrado na prática clínica e corroborado por diversos ensaios clínicos e revisões siste- máticas indicando sua efetividade e segurança tanto para prevenção como para tratamento das convulsões eclâmpticas, pouco se conhece ainda a respeito de sua homeostase, transporte e me- canismos reguladores. A magnitude dos efeitos hemodinâmicos para o binômio mãe-feto também persiste por ser esclarecida. Tendo em vista a ampla utilização do sulfato de magnésio nas pacientes com pré-eclampsia/ eclampsia e a importância de um melhor conhe- cimento dos aspectos farmacológicos da droga, realizamos uma revisão da literatura sobre os efeitos hemodinâmicos do magnésio na circulação materno-fetal. Mecanismos de Ação O magnésio é o mais abundante e importan- te cátion bivalente intracelular, com uma varieda- de de funções (Standley & Standley, 2002; Touyz, 2003; Wallace, 2003). Dentre elas, o magnésio tem um importante papel na regulação da pressão sangüínea por modulação da reatividade do tono vascular e da resistência periférica total (Stand- ley & Standley, 2002; Touyz, 2003; Wallace, 2003; Landau et al., 2004). Desta forma, alguns estudos clínicos e epidemiológicos sugerem o potencial benefício da suplementação com o magnésio na prevenção da hipertensão (Touyz, 2003). Entre- tanto, este efeito ainda permanece controverso na literatura, apesar da recomendação do Sixth Report of the Joint National Committee on Pre- vention, Detection, Evaluation and Treatment of High Blood Pressure para manter uma dieta adequada do magnésio. O magnésio entra na célula através do gra- diente de concentração e sai por transporte ativo. Os mecanismos para a entrada celular não estão determinados, mas os canais e/ou transportado- res podem ser importantes neste processo. Esses canais já foram identificados em alguns tecidos animais, porém ainda não foram determinados nas células vasculares (Touyz, 2003). Quanto aos mecanismos de saída da célula, alguns têm sido propostos, como a troca de Na+– Mg2+, na qual o sódio entra na célula e o magnésio sai. Este transporte do magnésio sódio-dependente é inibido pelotransporte Na+–H+ e pelas trocas Na+–Ca2+ (Touyz, 2003). O aumento da concentração do magnésio extracelular causa vasodilatação e atenua os ago- nistas que induzem a vasoconstricção, enquanto concentrações diminuídas causam vasoconstricção e potencializam os agonistas que causam vaso- constricção. O mecanismo exato deste processo é incerto, mas provavelmente é influenciado pelas concentrações de Ca2+, que é o maior determinante ��������� - Setembro 2006 vol. 34 nº 9 da contração do músculo liso vascular. Extracelu- larmente o magnésio atua inibindo o transporte transmembrana do cálcio, diminuindo a entrada do cálcio e a conseqüente diminuição da ação contrátil dos agentes vasoativos, ou intracelularmente atua como um antagonista do cálcio, modulando a ação vasoconstrictora (Touyz, 2003). Outra influência do magnésio sobre o tono vascular e a reatividade pode também estar as- sociada ao efeito sobre a atividade na bomba de Na+/K+ ATPase, a qual regula o transporte de Na+ e K+ e a formação do AMP e GMP cíclico, importantes fatores de modulação da vasodila- tação (Touyz, 2003). Evidências sugerem que o magnésio tam- bém regula o processo de crescimento e dife- renciação celular, que podem contribuir para a remodelação vascular na hipertensão. O aumento do magnésio extracelular estimula a síntese de DNA e de proteínas e o metabolismo energéti- co, sugerindo que também sejam importantes fatores associados promovendo mudanças na estrutura vascular (Touyz, 2003). Diante do exposto, tem sido reconhecido que concentrações extracelulares do magnésio influen- ciam o fluxo sangüíneo, a reatividade vascular e a pressão sangüínea nos mamíferos. A hipomag- nesemia causa vasoconstricção e hipertensão e o aumento do magnésio leva ao efeito inverso. Este mecanismo é sumariado na Figura 1 (Touyz, 2003). Além da ação direta sobre o músculo liso vascular, o magnésio também modula a função endotelial. Assim, já se observou que a infusão de magnésio intra-arterial aumenta a vasodilatação endotélio-dependente no antebraço de humanos, um efeito provavelmente dependente da integri- dade endotelial. Desta forma, um endotélio intacto previne contra os efeitos prejudiciais de hipomag- nesemia aguda, enquanto no endotélio lesado o efeito vasodilatador compensatório está ausente e a diminuição do Mg2+ tem um efeito contrátil direto sobre o músculo liso vascular (Touyz, 2003). Tais efeitos são, provavelmente, dose-depen- dentes e ocorrem por ação direta sobre a vasculatura (Touyz, 2003; Landau, 2004). Recentemente, demons- trou-se que a infusão parenteral do sulfato de mag- nésio ocasionava uma vasodilatação na veia dorsal da mão. Esse efeito foi detectado inicialmente com doses aproximadamente 1.000 vezes menores que as doses clinicamente utilizadas na prática clínica (2 g/h) e sem alterações sistêmicas hemodinâmicas, demonstrando que o resultado dessa venodilatação foi provavelmente devido a um efeito local da dro- ga (Landau, 2004). Contudo, já se demonstrou um efeito inibitório da resposta cardiovascular induzida pelos receptores N-metil-D-aspartato localizados na medula rostroventrolateral, sugerindo alguma ação central (Kagiyama et al., 2001). Sendo assim, o magnésio é considerado como um co-fator essencial nas funções enzimáticas, está envolvido no metabolismo energético celular e é necessário para o funcionamento da bomba Na+/K+ ATPase. Também atua como antagonista competiti- vo dos canais de cálcio e tem uma função estrutural no DNA, RNA e aminoácidos (Standley & Standley, 2002; Wallace, 2003). Além disso, também exerce efeito antiinflamatório, agindo sobre a diminuição da produção de superóxidos e promovendo uma varredura dos radicais livres (Wallace, 2003). Seus possíveis mecanismos de ação sobre o relaxamento do músculo liso são: a modulação do transporte do Ca2+ através dos canais de cálcio dentro da célula (ação competitiva devido à seme- lhança do cátion); a redução da ação despolarizante da acetilcolina; a redução da quantidade de neu- rotransmissor circulante por efeito diminuído do cálcio; o envolvimento no relaxamento do músculo liso mediado por prostaglandinas; e a participação nas interações do complexo receptor beta-agonista, proteína G e guanosina-trifosfato (GTP) conduzin- do à ativação de adenilciclase (Wallace, 2003). As possíveis ações do sulfato de magnésio nas pacientes com pré-eclampsia/eclampsia perma- necem ainda por ser completamente desvendadas. Sabe-se que a hipomagnesemia está relacionada com maior freqüência ao aumento da pressão san- ������� � �� ����� ��� ��� ����� ������������� � ��������� ������� ���� �������� �������� � ������ K – aumento;�L – diminuição Figura 1 - Mecanismo vascular por onde a diminuição da concentração do magnésio intracelular influencia no processo hemodinâmico da patogênese da hipertensão (adaptado de Touyz, 2003) ������ - Setembro 2006 vol. 34 nº 9��� güínea em gestantes com pré-eclampsia (Standley & Standley, 2002; Touyz, 2003). Entretanto, já se descreveu concentração sérica do magnésio au- mentada (Touyz, 2003) ou mesmo sem diferença significativa (Kumru et al., 2003) em mulheres com pré-eclampsia grave comparadas a gestantes saudáveis. Razões para estas diferenças não estão claras, mas a heterogeneidade das populações es- tudadas pode ser um fator importante. O mecanismo anticonvulsivante do sulfato de magnésio ainda não está totalmente elucidado. Possivelmente, envolve a combinação de várias ações. Dentre elas, têm sido citadas a estabilização do potencial das membranas celulares, a vasodi- latação cerebral que ocasiona aumento do fluxo sangüíneo e diminuição da isquemia cerebral, com redução da concentração de radicais livres. Todos esses efeitos apontam para uma ação central da droga, e não para efeitos periféricos de bloqueio da junção neuromuscular, conforme se aventou no passado (Wallace, 2003). A fisiologia das trocas placentárias do magné- sio e os seus mecanismos de controles também são muito pouco entendidos. Tem sido demonstrado que os níveis de cálcio total, cálcio ionizado e magnésio estão mais aumentados na circulação fetal que na materna. Esse gradiente materno-fetal se mantém a despeito da suplementação de magnésio nas pacien- tes com pré-eclampsia, sugerindo um transporte ativo na placenta (Standley & Standley, 2002). Tam- bém já foi demonstrada a importância das trocas Na+–Mg2+ como um mecanismo homeostático no citotrofoblásto, mantendo os níveis baixos de mag- nésio intracelular (Standley & Standley, 2002). Efeitos Hemodinâmicos sobre a Mãe Diante do exposto acima, observa-se que o sulfato de magnésio apresenta algum efeito vasodi- latador. Além disto, sabe-se que a insuficiente inva- são trofoblástica leva a redução da perfusão placen- tária podendo ocasionar pré-eclampsia/eclampsia e restrição de crescimento fetal. Então, postula-se que o sulfato de magnésio possa ter outros efeitos, que não somente o da prevenção de convulsões nas gestantes com síndromes hipertensivas. Diversas ações podem decorrer da vasodi- latação ocasionada pela hipermagnesemia sobre a hemodinâmica materna, como o aumento do fluxo sangüíneo cerebral, que já foi demonstrado em ovelhas. Entretanto, em voluntários saudáveis, não foram observadas alterações nos parâmetros da dopplervelocimetria na artéria cerebral média materna (Sherman et al., 2003). Por outro lado, nas mulheres com pré- eclampsia, que se associam a vasoespasmo cerebral, o sulfato de magnésio aumentou o fluxo sangüíneo nas artérias central da retina e ciliar posterior (Belfort et al., 1992) e na artéria cerebral média materna (Belfort & Moise, 1992; Belfort et al., 1993), todas avaliadas através do índice de pulsatilidade. Este possível efeito vasodilatador diminui a isquemia e acarreta melhorada perfusão, prevenindo o dano celular, o edema cerebral e as convulsões. Vale desta- car que os estudos comparando vários agentes anticonvulsivantes com o sulfato de magnésio demonstraram melhores resultados em mulhe- res com pré-eclampsia/eclampsia, uma vez que todos os outros agentes estudados não eram vasodilatadores (Duley et al., 2005). A resistência vascular (R) é inversamente proporcional à quarta potência do raio do vaso (r) (R s�1/r4). Então, pequenas mudanças no lúmen do vaso (raio) poderão causar significativo efeito sobre a resistência vascular. Desta forma, dos muitos fatores possivelmente envolvidos na regulação da resistência vascular, o magnésio pode estar implicado por causar modificações sobre o lúmen do vaso (Touyz, 2003). Cumpre ainda destacar que o magnésio pode promover redução da pressão arterial, através de seu efeito sobre o músculo liso vascular (Belfort et al., 1993). Sendo assim, Belfort et al., (1992) ob- servaram uma diminuição significante da pressão arterial sistólica após infusão do sulfato de magné- sio. Entretanto, este efeito não foi observado sobre a pressão arterial diastólica (Belfort & Moise, 1992). Em outro estudo encontrou-se uma tendência à redução da pressão arterial, porém esta diferença não foi estatisticamente significante (Belfort et al., 1992; Belfort et al., 1999). Em relação à freqüência cardíaca materna, não foram observadas diferenças significativas após a infusão do magnésio (Belfort et al., 1992; Belfort & Moise, 1992; Belfort et al., 1993). Contudo, em 1999, relatou-se um aumento significante da freqüência cardíaca materna (Belfort et al., 1999). Efeitos sobre a Circulação Uteroplacentenária e Fetoplacentenária É de fundamental importância avaliar tam- bém os possíveis efeitos do sulfato de magnésio sobre o bem estar fetal. Na artéria renal do feto não se encontrou diferença significativa do índice de pulsatilidade, através da dopplervelocimetria, ������� � �� ����� ��� ��� ����� ������������� � ��������� ������� ���� �������� �������� � ������ ��������� - Setembro 2006 vol. 34 nº 9 depois da utilização de 6 g de sulfato de magnésio (Belfort et al., 1993). No mesmo estudo, também não se encon- trou diferença estatisticamente significante nos parâmetros dopplervelocimétricos da artéria cere- bral média fetal (Belfort et al., 1993). No entanto, além de a amostra ter sido pequena (12 pacientes), também não houve diferenciação entre pacientes com pré-eclampsia grave ou leve, e possivelmente muitas destas pacientes apresentavam a forma leve da doença. De forma contrária, outro estudo evidenciou um aumento do índice de pulsatilidade na artéria cerebral média após a utilização do sulfato de magnésio, um efeito que persistiu mesmo depois dos ajustes feitos através da análise de co-variân- cia. Contudo, as pacientes não tinham distúrbios hipertensivos e estavam em tocólise com sulfato de magnésio por trabalho de parto prematuro (Keeley et al., 1993). Os autores ressaltam que esse aumen- to do índice de pulsatilidade pode ter sido devido ao trabalho de parto prematuro, ou seja, antes da infusão do sulfato de magnésio as pacientes já apresentavam baixo índice de pulsatilidade, de- vido ao estresse das contrações uterinas, e depois da inibição com o sulfato de magnésio este índice aumentou, retornando aos níveis normais. No modelo utilizando cotilédones placentá- rios de pacientes com pré-eclampsia para estudo da perfusão fetoplacentária, demonstrou-se uma redução da perfusão dos cotilédones depois da utilização do sulfato de magnésio (Kovac et al., 2003). Em outro modelo, utilizando vasos umbili- cais de gestantes saudáveis, ocorreu vasodilatação dos vasos umbilicais com e sem vasoconstricção mediada por um análogo do tromboxane A2, após a utilização do magnésio. Também se observou um efeito de atenu- ação da vasoconstricção induzida pelo peróxido do magnésio sobre a placenta, sendo possível que este efeito ocorra apenas nas pacientes com vasoconstricção placentária. Na artéria umbilical não se encontrou dife- rença significativa da relação S/D avaliada pela dopplervelocimetria, depois da utilização de 6 g de sulfato de magnésio em pacientes com pré- eclampsia (Belfort et al., 1993). Da mesma forma, também não se encontrou diferença significante do índice de pulsatilidade na artéria umbilical. Vale, porém, destacar que essas pacientes estavam em tocólise com sulfato de magnésio por trabalho de parto prematuro (Keeley et al., 1993). Quanto ao fluxo uteroplacentário, não se encontrou diferença significativa na média da relação S/D de ambos os vasos uterinos, depois da administração de 6 g de sulfato de magnésio (Belfort et al., 1993). Entretanto, uma diminuição do índice de pulsatilidade foi encontrada na média das duas artérias uterinas e em ambas, quando analisadas separadamente, mas apenas foi signi- ficante na artéria uterina direita e na média das duas artérias. Essa diferença parece não ter sido relacionada à lateralidade da placenta e manteve- se estatisticamente significativa mesmo depois da análise de co-variância. As pacientes avaliadas também estavam recebendo sulfato de magnésio para a inibição do trabalho de parto prematuro (Keeley et al., 1993). Estudos recentes sugerem que mulheres com pré-eclampsia apresentam uma diminuição da capacidade plástica das hemácias e que depois da administração do sulfato de magnésio há uma me- lhora desta plasticidade, podendo melhorar o aporte de oxigênio para o feto (Schauf et al., 2004). Tentando justificar a melhora do aporte de oxigênio para o feto após a utilização do sulfato de magnésio nas gestantes com pré-eclampsia, um estudo descreveu um aumento do volume de fluxo sangüíneo na artéria uterina de 5,09 mL/s para 10,02 mL/s após 24 h de tratamento (p = 0,0002). Contudo, não houve diferença significativa na avaliação de outros parâmetros como a velocidade de fluxo sangüíneo sistólica, diastólica e o índice de resistência nesse mesmo vaso. Isto pode ser explicado porque o índice de resistência é um pa- râmetro matemático calculado pela relação entre a velocidade de fluxo sangüíneo sistólico e diastólico. Desta forma, se ambos os parâmetros se elevam, o efeito no índice de resistência será nulo (Schauf et al., 2004). Em outra direção, quando se analisou a fre- qüência cardíaca fetal não se encontrou diferença significante antes e depois da utilização do sulfato de magnésio (Belfort et al.,1993; Hiett et al., 1995). Já se identificou, todavia, uma diminuição da variabilidade de curta duração da freqüência car- díaca fetal (short-term variation) e diminuição da quantidade de acelerações fetais. Entretanto, esses achados não se associam com o pior prognóstico perinatal (Hiett et al., 1995). Alguns estudos epidemiológicos sugeriram um efeito protetor do sulfato de magnésio na redução da incidência de paralisia cerebral em recém-nascidos de muito baixo peso. Entretanto, este papel neuroprotetor é incerto e diversas con- trovérsias existem em relação aos efeitos neonatais da utilização do sulfato de magnésio durante a gestação. Já se observou tanto uma diminuição da perfusão cerebral como ausência de efeitos sobre essa circulação nas primeiras horas de vida ������� � �� ����� ��� ��� ����� ������������� � ��������� ������� ���� �������� �������� � ������ ������ - Setembro 2006 vol. 34 nº 9�� em neonatos de gestantes que utilizaram o sulfato de magnésio para a inibição do trabalho de parto prematuro. Uma recente revisão da Biblioteca Cochrane (Crowther et al., 2005) mostrou ausência de efeitos benéficos neonatais quando o sulfato de magnésio foi usado como droga tocolítica, su- gerindo ainda um incremento do risco de morte perinatal (RR 2,8; IC 95% 1,20-6,62). Considerações FinaisAs síndromes hipertensivas constituem um conjunto de entidades fisiopatológicas de grande interesse para a comunidade médica e a população, devido às graves repercussões materno-fetais. Atu- almente, a utilização do sulfato de magnésio para a profilaxia de convulsões em gestantes com pré- eclampsia grave/eclampsia já está bem documen- tada na literatura, sendo ainda objeto de estudos futuros para os casos de pré-eclampsia leve. O sulfato de magnésio ocasiona vasodilata- ção por modulação da reatividade do tono vascular e da resistência periférica total. A hipomagnesemia causa vasoconstricção e hipertensão e o aumento do magnésio leva ao efeito inverso. Este possível efeito provavelmente ocorre em todo o sistema vas- cular. Pode ocorrer redução da resistência vascular decorrente administração do sulfato de magnésio, promovendo a queda dos níveis tensionais, porém esse efeito pode ser transitório, e não existem evidências apoiando sua utilização crônica e/ou profilática com essa finalidade. Abstract Hypertensive disorders are frequent complications during pregnancy. They affect about 10% of preg- nancies and are leading causes of maternal death and perinatal morbidity and mortality. Magnesium sulfate is the drug of choice for prophylaxis and treatment of eclamptic seizures and its beneficial ef- fects on preventing convulsions and reducing mater- nal mortality were demonstrated in well-controlled trials. In addition, studies suggest that magnesium can have an important role in regulating arterial blood pressure by modulating vascular tonus reac- tivity and total peripheric resistance. Notwithstan- ding, the impact of these effects on the treatment of hypertensive disorders of pregnancy have not been elucidated. Indeed, the objective of been this review is to describe the magnesium sulfate action mecha- nisms and to evaluate its possible effects in maternal and fetal circulation. At this moment no evidence of beneficial maternal or fetal hemodynamic effects of magnesium sulfate has been demonstrated and this issue remains controversial. KEYWORDS: Preeclampsia. Magnesium sulfate. Dopplervelocimetry. Leituras Suplementares 1. Belfort MA, Saade GR, Moise Jr KJ. The effect of magnesium sulfate on maternal retinal blood flow in preeclampsia: a randomized placebo- controled study. Am J Obstet Gynecol 1992; 167: 1548-53. 2. Belfort MA, Moise Jr KJ. Effect of magnesium sulfate on maternal brain blood flow in pre- eclampsia: a randomized, placebo-controled study. Am J Obstet Gynecol 1992; 167: 661-6. 3. Belfort MA, Saade GR, Moise Jr KJ. 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