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[SEELAENDER, Airton Cerqueira] Os juristas e a ditadura de 64

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Ricardo Marcelo Fonseca 
Professor da graduação e do curso de pós-graduação em direito da UFPR; Doutor em direito 
das relações sociais pela UFPR; Pós-doutor na Università degli Studi di Firenze, Itália (2003/2004), 
onde Integra o collegio dei docenti do curso de doutorado em storia dei diritto; Pesquisador do CNPq; 
Presidente do IBHD (2007-2011); Procurador federal; Membro do IAP (Instituto dos 
Advogados do Paraná); Diretor eleito da Faculdade de Direito da UFPR. 
Airton Cerqueira Leite Seelaender 
Doutor em direito na J.W.Goethe-Universitàt (Frankfurt/Alemanha); Pesquisador visitante do Max Planck 
Instituí für europãische Rechtsgeschichte (1994-1997) e Presidente do IBHD (2005-2007); 
Ex-Procurador do Estado de São Paulo; Professor de História do Direito e 
Direito Constitucional na Universidade Federal de Santa Catarina. 
HISTORIA DO DIREITO 
EM PERSPECTIVA 
Organizadores 
Do Antigo Regime à Modernidade 
Colaboradores: 
Airton Cerqueira Leite Seelaender 
Andrei Koerner 
Antonio Carlos Wolkmer 
António Manuel Hespanha 
Arno Dal Ri Júnior 
Bruno Feitler 
Carlos Petit 
Ezequiel Abásolo 
Gilberto Bercovici 
Ignacio Maria Poveda Velasco 
James Walker 
José Antônio Peres Gediel 
José Ramon Narvaez 
Luis Fernando Lopes Pereira 
Luiz Edson Fachin 
Manuel Martinez Neira 
Marcos César Alvarez 
Paolo Cappellini 
Paolo Grossi 
Peter Oestmann 
Pietro Costa 
Samuel Rodrigues Barbosa 
Silvia Hunold Lara 
Thomas Simon 
Curitiba 
Juruá Editora 
2009 
JURISTAS E DITADURAS: UMA 
LEITURA BRASILEIRA 
Airton Cerqueira Leite Seelaenderx 
I. "Em minha vida tenho tido o hábito salutar de não ficar remoendo o 
passado"'. Essa frase, que curiosamente figura nas memórias do jusfilósofo 
Miguel Reale, bem que poderia servir de divisa para algumas faculdades de 
direito no Brasil. Nunca poderia, porém, servir de orientação para quem preten-
de analisar a história ou compreender melhor algumas das linhas doutrinárias 
ainda hoje relevantes, no campo do direito. 
Tanto quanto a atuação do "Schreibtischtäter"3 na máquina judicial e 
administrativa dos regimes ditatoriais, o comportamento coletivo dos juízes e 
dos profissionais do direito durante as ditaduras tem atraído crescente interesse 
dos historiadores do direito. Recentemente, alguns destes últimos têm mesmo 
enfrentado um tema "tabu": o papel desempenhado pelos professores de direito 
- inclusive de figuras influentes no campo doutrinário - na legitimação e mesmo 
na gestão dos regimes supracitados. 
Ainda em desenvolvimento na Alemanha, na França e em outros países 
europeus, a discussão sobre tal tema deveria ser prontamente iniciada, no Brasil. 
Trata-se não só de viabilizar a obtenção de maiores conhecimentos sobre o pe-
ríodo ditatorial, mas também de estimular o abandono, pelas faculdades de di-
reito, de sua última atitude de conivência com a ditadura: o silêncio sobre as 
opções políticas passadas 4 . 
Professor da Universidade Federal de Santa Catarina; Doutor em Direito pela J.W. Goethe-
Universität (Frankfurt). 
2 REALE, M. (1987a), p . 136. 
3 Para uma análise do conceito e de sua distinção de outras formas de colaboração com ditaduras, 
por parte de juristas e intelectuais, cf. RÜTHERS, B. 1990, p. 22-24. 
Sobre a opção pelo silêncio e suas causas, no meio universitário alemão, cf, entre outros, 
R Ü T H E R S , B. 2 0 0 1 , p. 154; H A T T E N H A U E R , H. 1981, p. 7, e S T O L L E I S , M.; SIMON, 
D. 1981, p. 20. Para uma crítica a tal silêncio, no Brasil, cf. SEELAENDER, A. 2004, p. 35-36, 
n. 24. 
416 Air ton Cerque i ra Lei te See laender 
A superação desta atitude não será tarefa fácil. Há que se contar com a 
resistência dos antigos professores, muitos dos quais capazes de mobilizar am-
plas redes de apoio e de produzir autojustificações de alta qualidade literária. Há 
que se esperar a resistência de assistentes, sucessores, ex-colaboradores e anti-
gos orientandos - enfim, de todos que precisem "defender o velho", para impe-
dir o questionamento do seu próprio pedigree acadêmico 5 . A "defesa coletiva", a 
"lealdade" e a "solidariedade" podem, inclusive, gerar novos ganhos estratégi-
cos a tais indivíduos, permitindo-lhes reforçar laços, ampliar redes de apoio 
recíproco e dar eficácia maior às "coortes de sociabilização"6 de que participam. 
O silêncio sobre a colaboração com as ditaduras tende a se acentuar no 
meio jurídico, no qual a ascensão a posições de destaque e mesmo o êxito na 
advocacia tendem a ser mais fáceis para quem sabe manter canais abertos, não 
provocar "antipatias", impedir vetos informais e evitar a fama de "criador de 
caso"1. Não obstante, posturas defensivas análogas podem ser encontradas 
mesmo em faculdades de história. Na Alemanha, por exemplo, Rüthers de-
monstrou que os mesmos historiadores que se haviam escandalizado nos anos 80 
com as interpretações revisionistas sobre o Holocausto vieram a adotar, na déca-
da seguinte, uma postura bem mais contida, quando veio à tona a "contribuição 
científica" de seus próprios mestres para a legitimação da política racial e do 
expansionismo nazistas*. Antes, imperava um cômodo silêncio a respeito do 
tema, tendo a própria "área da História (...) por décadas ocultado com êxito a 
sua própria história"9. 
Mas voltemos às faculdades de direito e às estratégias nelas adotadas 
para ocultar o passado. O que está por trás de tanto silêncio? 
Seria possível, por exemplo, explicar tal atitude invocando-se um "es-
pecial talento do professor de direito" para fugir a dissabores desnecessários, 
identificando, por exemplo, riscos de um eventual processo por danos morais? 
Não é de se crer que aqui esteja a causa do problema. Note-se que, no 
Brasil, o professor conta não apenas com a liberdade de expressão prevista no 
5 Sobre tal postura, cf. RÜTHERS, B. 2001 , p . 22 e as., 153. 
6 Sobre o conceito, cf. RÜTHERS, B. 2001 , p. 3 e ss. Inspirando-se na denominação da unidade 
militar romana, o conceito de "coorte de sociabilização" remete a "grupos de pessoas marcadas 
por experiências de vida comuns" , sob a influência de fatores como idade, origem social, for-
mação e exposição a situações semelhantes (transformações políticas, oportunidades de carreira, 
riscos etc.). Segundo Rüthers (2001, p. 4), tais pessoas "não raramente" apresentariam seme-
lhanças cm suas "visões de mundo e de valores", "modos de pensar" e "formas de agir e reagir, 
quando" fossem "questionadas as concepções fundamentais enraizadas através da (sua) socializa-
ção" (cf. também R Ü T H E R S , B. 2001 , p. 9). 
Analisando o caso alemão, reconhece Hattenhauer que, enquanto continuaram nos seus cargos 
os principais juristas do período hitleriano, "uma crítica" a eles "podia ser prejudicial" para os j o -
vens que iniciavam a carreira acadêmica (cf. H A T T E N H A U E R , H. 1981, p. 7. Sobre o tema, 
cf. também STOLLE1S, M.; SIMON, D. 1981, p. 20). 
s Sobre a "42. Deutsche Historikertag" (1998) e sobre o debate a respeito da atuação de historia-
dores alemães no período nazista, cf. R Ü T H E R S , B. 2001 , p. 15-7, 152. 
0 RÜTHERS, B. 2001 , p. 23 . 
Histór ia do Dire i to e m Perspec t iva 417 
art. 5 o , IV e IX, da Constituição, mas também com uma específica "liberdade de 
ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento (...) e o saber" (art. 206-11). Os alunos 
têm direito à informação (art. 5 o , XIV) e liberdade de aprender" (art. 206-11), 
inclusive sobre temas espinhosos cujo exame contribua para prepará-los "para o 
exercício da cidadania" (art. 205). Dentro desse quadro, evitados abusos como o 
insulto e a imputação infundada de ações desonrosas ou ilícitas, sequer haveria 
lastro real para pedidos de indenização. 
E bem verdade que a menção do passado pode por vezes gerar hiper-
reações, por parte dos ex-defensores da ditadura no meio jurídico. Autores já 
estabelecidos podem irritar-se quandochegam ao conhecimento do público 
obras publicadas no início de suas carreiras, em períodos ditatoriais cuja curta 
duração não haviam previsto adequadamente. Temendo por sua reputação, po-
dem até provocar o Poder Judiciário, ansiando por uma apreensão de escritos ou 
pelo fornecimento de um "Persilschein"10. 
Isso parece já ter ocorrido na França, onde a atuação dos juristas sob o 
regime de Vichy ainda é um tema insuficientemente estudado", a despeito de 
haver uma discussão pública estimulada até mesmo pelo cinema 1 2 . Vejamos, 
aqui, só a título de exemplo, o chamado "Caso Duverger". 
Um dos mais destacados teóricos do Pós-Guerra, Maurice Duverger ha-
via escrito, no início de sua carreira, comentários à "situação dos funcionários 
depois da Revolução de 1940". Vendo na ascensão de Pétain após a derrota 
francesa uma "revolução" autoritária e nacional, Duverger descrevera como algo 
normal a vedação do acesso de judeus e cidadãos naturalizados aos cargos pú-
blicos 1 3 . Tentando décadas depois se justificar do ocorrido, o pensador francês 
invocou um acórdão de 1968, que declarava seu texto "um estudo puramente 
jurídico, técnico e crítico da legislação racial então em vigor"14. Restou escla-
recer, no entanto, se essa análise supostamente "neutra da legislação racial" -
uma análise sem rejnidio - não constituiria, ela mesma, uma forma de aceitação 
das novas normas ' 3 . Se a atitude voluntária do autor, redigindo e publicando tal 
artigo, não contribuiria, por si só, para a legitimação dessas normas como objeto 
normal do trabalho do jurista. 
1 0 Designação popular dos documentos fornecidos na Alemanha ocupada pelos Aliados, atestan-
do que o passado político individual não era demasiado comprometedor. A referência decorre 
de uma propaganda de sabão em pó ("Persil lava branco como a neve"). 
n Na França, já em 1961 um artigo de Emile Giraud enfrentava o problema da "responsabilidade 
das faculdades de direito no declínio da democracia" (v. GIRAUD, E. 1961 e SAULNIER, F. 
2004, p. 32). Sobre a colaboração de juristas com Vichy, podem ser úteis - além de STERNHELL, 
Z. 2000 e SAULNIER, F. 2004 G R O S , D. (2000), p. 26, 28 e ss., 34-35; e LOISELLE, M. 
2000, p. 450 e ss. 
1 2 Cf. o filme Sections spéciales de Costa Gavras. 
' O texto foi publicado na Revue de droit public et de la science politique, t. 57, 1940/1941. 
Sobre ele, cf. STERNI1EEL, Z. 2000, p. 4 2 1 , 472, n. 2. 
14 Apud STERNHEEL, Z. 2000, p. 475 , n. 2. 
1 5 STERNHEEL, Z. 2000, p. 476, n. 2. 
4 1 8 Airton Cerqueira Leite Seelaender 
Mesmo quem achasse possível alguém abster-se totalmente de juízos de 
valor no exame de temas polêmicos teria de reconhecer que os professores de 
direito realizam opções de certa fornia "comprometidas", quando elegem seus 
temas e quando definem as ocasiões para a divulgação de seu pensamento. A 
preparação e a publicação de um texto frio e técnico sobre normas anti-semitas 
são atitudes que indicam, senão entusiasmo, pelo menos conformismo com o 
direito vigente em uma ditadura racista. E são atitudes que tendem a indicar um 
certo empenho individual na legitimação de tal regime- empenho muito superior, 
aliás, ao exteriormente expresso nos mecânicos "juramentos de fidelidade" 
impostos pelas ditaduras ao professorado, sob risco de perda de cargo ou outras 
sanções 1 6 . 
O civilista que se promovia pontificando sobre "casamentos inter-ra-
ciais" bem que podia estar escrevendo sobre árvores limítrofes, se a legislação 
sobre o primeiro tema o houvesse levado mesmo à indignação. Em meios uni-
versitários mais sofisticados, a história do direito podia fornecer temas "clássi-
cos", nem sempre relevantes para as ideologias oficiais, até mesmo aos estudio-
sos do direito público 1 7 . 
A bem da verdade, nada obrigava Carl Schmitt a escrever obras como O 
Führer protege o direito 1 8 , justificando um massacre determinado por Hitler. E 
teriam Panunzio e Costamagna se arruinado, se houvessem imitado a autocon-
tençâo de Mortati no tratar da questão judaica 1 9 ? 
Mas voltemos ao silêncio das faculdades de direito. Percebamos que ele 
também serve a interesses "corporativos". Ele independe da qualidade da rela-
ção institucional com os regimes ditatoriais - relação, esta, que pode ser muito 
variada 2 0 . Pode até ser favorecido por inclinações conservadoras do corpo do-
cente. De qualquer forma, tal silêncio libera as faculdades de polêmicas especial-
mente desgastantes, com alto custo político interno. Não por acaso, imperou o 
silêncio, na Universidade de Munique do Pós-Guerra, acerca da literatura nazista 
Sobre a massiva aceitação do juramento de fidelidade, por parte dos professores universitários 
na Itália fascista, cf. STAFF, I. 2002, p. 89, n. 18. Sobre os juramentos de fidelidade no serviço 
público da era nazista, cf., entre outros, HATTEN11AUER, H. 198 lb , p. 112-113, 125 e ss. 
C o m o mostra Stolleis, os publicistas podiam optar, mesmo na Alemanha nazista, por "temas 
inofensivos da história do direito, do direito internacional, do direito administrativo e da teo-
ria da administração" (STOLLEIS , M. 1994, p. 21). 
SCHMITT, C. 1994, p. 227-232. Sobre os posicionamentos de Schmitt e suas circunstâncias, 
no que tange a tal obra, cf. MULLER, I. 1989, p. 51-52; RÜTHERS, B. 1990, p. 76-80; 
R Ü T H E R S , B. 1994, p. 120-124; STOLLEIS, M. 2002, p. 318-319; e BLAS1US, D. 2002, 
p. 119, 142 e s s . 
Mostrando diferentes graus de anti-semitismo nas obras desses autores STAFF, I. 2002, p. 100-101. 
Os malogrados projetos de constitucionalização de Vichy parecem demonstrar o prestígio 
institucional das faculdades de direito (cf, a respeito, a composição prevista para a "Corte Su-
prema de Just iça" no art. 35-2. da "Lei Constitucional de 10.07.1940"). Já na Alemanha, em 
1943, o Ministro Otto Thierack teria chegado a ameaçar os decanos das faculdades de retirar 
das universidades a formação jurídica (cf. STOLLEIS . M. 2002, p. 410). 
Histór ia do Direi to e m Perspec t iva 4 1 9 
de Larenz e Maunz 2 1 . Ou em Gõttingen, quanto a textos de Wieacker e Ebel 
anteriores a 1945 2 2 . 
E verdade que a tecnicização do direito, o peso do positivismo e o ethos 
profissional do acadêmico tendem a afastar o professor de direito da polêmica 
sobre os temas mais candentes da esfera política. A época do empolgante 
"Affaire Dreyfus", por exemplo, parte considerável dos juristas franceses sim-
plesmente se absteve de manifestações públicas 2 3 , a despeito da repercussão 
política do caso e de suas evidentes implicações no âmbito jurídico. De qualquer 
forma, tal tendência não é irreversível - pensemos em Weimar. Nem explica a 
fuga das faculdades a uma rediscussão científica- cujas implicações políticas 
mal seriam percebidas pelo "público externo" - sobre textos jurídicos relativos 
ao regime do funcionalismo, ao poder constituinte ou ao locus do ato institucio-
nal no ordenamento. 
Em nossas faculdades, a coragem que sobra para atacar o "Neolibera-
lismo", o "Estatismo" ou a "Globalização" - criaturas etéreas que não podem 
influenciar a composição de bancas - falta para analisar criticamente obras difí-
ceis de conciliar com a concepção usual do que seja democracia. Já estaria o 
Largo S. Francisco preparado, hoje, para aceitar uma tese sobre o pensamento 
corporativista-autoritário de antigos docentes seus? Ou sobre o apoio de alguns 
de seus professores ao regime pós-64, tanto em cargos elevados quanto em seus 
textos doutrinários? 
Cumpre registrar, porém, que o silêncio das nossas faculdades não pode 
ser explicado apenas a partir de "estratégias de mimetismo" dos jurisconsultos 
que seriam, em tese, os seus principais beneficiários. Com efeito, o silêncio 
persiste até mesmo quando estes não ocultam suas opções políticas passadas. 
Na verdade, há que se reconhecer que a omissão das faculdades nem 
sempre indica, necessariamente, a existênciade uma "censura interna" imposta de 
maneira informal pelos professores diretamente envolvidos. Tal omissão deriva, 
muito mais, de atitudes assumidas coletivamente por professores e pós-gra-
duandos. Reflete uma autocontenção que é, para estes últimos, tão cômoda como 
conveniente. 
Nesse ponto, ao invés de treinarem os jovens para o debate aberto e a 
análise crítica - vitais à democracia e à própria ciência do direito - nossas facul-
dades os estão mantendo na ignorância. Ou, pior ainda, os estão estimulando a 
optar entre a hipocrisia da "discrição cortesã" e o "oposicionismo inviril" da 
"queimação no corredor". 
2 1 Cf. R Ü T H E R S . B. 2001 , p. 22. Sobre Maunz, cf. a fundamental análise de STOLLE1S, M. 
1994, p. 306 e s s . 
Cf. R Ü T H E R S , B. 2001 , p. 22. Sobre a situação de tais autores e da História do Direito sob o 
regime hitlerista, cf. também STOLLE1S, M. 1994, p. 57 e ss., 68 e ss. 
2 3 O R O S , D. 2000, p. 23 . Segundo Emile Giraud, até a Primeira Guerra a maioria dos professores 
de direito franceses tendia a uma conduta moderada, não se lançando a uma "critica sistemáti-
ca, negativa ou construtiva da democracia", mesmo que esse regime não lhe despertasse maior 
simpatia (cf. G I R A U D , E. 1961. p. 270). 
4 2 0 Air ton Cerque i ra Lei te See laender 
II. A análise da trajetória e do pensamento dos juristas pró-ditadura é 
tanto mais necessária, por ser imprescindível para a compreensão da base ideo-
lógica de boa parte da literatura jurídica ainda hoje utilizada no ensino e no foro. 
A participação de muitos juristas, ainda que passageira, em regimes ou movi-
mentos políticos de inspiração autoritária, contribuiu para a ocorrência de trans-
formações no campo doutrinário, com a adoção de novos temas e teorias. Sob a 
influência direta ou indireta de tal participação, conceitos foram criados, recria-
dos e reformulados, não raro como arma ideológica na luta contra o pensamento 
jurídico liberal. O universo dos argumentos jurídicos foi alterado, alterando-se 
também o campo dos possíveis "atos de fala" no jogo do discurso jurídico. 
Isso não significa, porém, que todos os juristas pró-ditadura tenham tido, 
sempre, um compromisso com a inovação de sua área, em um sentido antilibe-
ral. Um certo rejeitar das novidades foi mesmo nota característica, por exemplo, 
dos juristas brasileiros ligados ao conservadorismo católico integrista. Cultores 
do "Princípio da Autoridade", tais juristas nem sempre tiveram dificuldades para 
se adaptar ao Estado Novo nem ao regime pós-64 2 4 . Tendiam a compartilhar 
com estes o discurso anticomunista, o moralismo em questões sexuais, a aversão 
ao livre debate e o ideal do poder mónocrático 2 5 . 
Papel mais inovador tiveram, entre nós, os egressos do movimento inte-
gralista. Assim como os comunistas, o partido de Plínio Salgado exerceu grande 
atração, nos Anos 30, sobre jovens intelectuais inconformistas. A assembléia de 
fundação da Sociedade de Estudos Políticos, da qual se originaria a Ação Inte-
gralista Brasileira, já comparecia - nas palavras do próprio Plínio 2 6 - um "grupo 
magnífico da Faculdade de Direito", com vários jovens que se destacariam, nas 
décadas seguintes, por sua influência na doutrina, na legislação e na jurispru-
dência. 
A capacidade do Integralismo de atrair jovens intelectuais e juristas é 
fato admitido não só nas memórias de Miguel Reale 2 7 , mas também em escritos 
de autores que jamais aderiram a esse movimento político 2 8 . Desiludidos com o 
liberalismo e com nossas instituições, tais jovens passaram a interessar-se pela 
Nos Anos 30, algumas manifestações de clérigos mais radicais já permitiam imaginar tal 
desenvolvimento (cf. DIAS, R. 1996, p. 63). 
Estimulado pelo Concílio Vaticano II e pela modernização do pensamento político católico, o 
surgimento de um grupo coeso de "juristas católicos" comprometidos com a democracia e 
projetos emancipatórios parece ser, entre nós, fenômeno recente. Fenômeno que não deve ser 
confundido, a rigor, com a simples presença de padres " insubmissos" em muitas rebeliões libe-
rais até 1842 (sobre tal fenômeno e suas raízes, cf., entre outros, C A R V A L H O , J. M. de 1996, 
p . 166 e ss). Cumpre ressalvar, contado, o papel pioneiro de figuras como Heráclito Sobral 
Pinto, que já registrava em 1942 seu desconforto com a adesão dos "melhores elementos no 
nosso catolicismo" aos "quadros do autoritarismo social?, com "muitos" já pugnando "pela 
vitória de Franco, de Salazar, de Hitler" (apud DULLES, J.W.F. 2 0 0 1 , p. 210). 
2 h ApudCAVALARI, R.M.F. 1999, p. 13. 
2 7 REALE, M. 1987a, p. 81-82. 
2 8 C A L M O N , P. 1995, p. 182. 
His tor ia do Dire i to e m Perspec t iva 421 
criação de novas alternativas politicas, em parte inspiradas nas ditaduras que à 
época floresciam na Europa. 
Esta era pródiga em modelos, que iam do Portugal salazarista 2 9 à Itália 
fascista - e mesmo à Alemanha de Hitler, referência importante para a corrente 
integralista liderada por Gustavo Barroso 3 0 . No Integralismo brasileiro, segundo 
dois destacados juristas egressos do movimento - Reale 3 1 e Goffredo Telles Jr . 3 2 
- o anti-semitismo não teria desempenhado, contudo, papel de relevo, tendo 
ficado restrito a Barroso e seus adeptos. Uma plena identificação do Integralis-
mo com o Nazismo seria, aliás, leviana, até porque foi abertamente combatida 
pelo próprio Plínio Salgado 3 3 . 
Desprezando os valores da democracia liberal, ensinando a obediência 
automáti4ca e reforçando a hostilidade contra a esquerda, o Integralismo formou 
quadros para o Estado Novo ' 4 e para o regime pós-64. Juntamente com o inte-
grismo católico, opôs à democracia e ao liberalismo o "Princípio da Autoridade"3*. 
Como o integrismo católico, treinou seus jovens intelectuais para a atuação 
conjunta no combate à "subversão", ensinando-os a identificá-la e a denunciá-la. 
Como o integrismo católico, praticou e legitimou a censura e o controle do pen-
samento 3 6 . 
2 9 Por algum tempo, o modelo salazarista exerceu certo fascínio não só no Brasil, mas também 
em países mais desenvolvidos, como a França c a Áustria (cf., entre outros, H U R A U L T , E. 
2000, p. 439 e ss.; e D U L L E S , J .W.F. 2001 , p. 119-210). 
3 0 Em textos dos Anos 30, afirma, porém. Reale que o Integralismo repudia "o racismo hitleris-
td\ ainda que apresente "valores que se encontram também nos movimentos fascistas euro-
peus, como o de Mussolini, de Hitler e Salazar". "A luta racista" - adverte Reale - "não nos se-
duz (...) Do Hitlerismo podemos tirar algumas lições em matéria de organização política e fi-
nanceira, mas não sabemos em que nos poderia ser útil a tese da superioridade racial, tese 
que consulta uma situação local (...) A moral não permite que se distinga entre o agiota judeu 
e o agiota que se diz cristão". (REALE, M. 1983b, p. 227, 231 -232). 
3 1 Sobre a diversidade das correntes no seio do Integralismo, cf. REALE, M. 1987a, p. 80. 
3 2 Sobre o tema, também negando que o anti-semitismo de Barroso seduzisse a AIB como um 
todo, T E L L E S JR., G. 1999, p . 120 e DITZEL, C. de H.M. 2004, p. 169-170, 192 e ss.). 
3 3 Cf. C A V A L A R 1 , R.M.F. 1999, p . 116 e ss. e SOUZA, F.M. de 1989, p. 326. 
3 4 A despeito da repressão getulista ao Integralismo, são vários os intelectuais do movimento 
acolhidos pelo Estado Novo e sua máquina administrativa. Reale, em 1942, passa a atuar no 
Departamento Administrativo do Estado de São Paulo. Câmara Cascudo preside a Comissão de 
Salário Mínimo da 6 a Região (cf. MICELI , S. 2001 , p. 133, 276, n. 3 1 ; e REALE, M. 1987a, 
p . 164 e ss.). 
3 5 Tal princípio, objeto de um capítulo do "Manifesto de Outubro" da AIB (cf. C A V A L A R I . R. 
M. F. 1999, p . 15, n. 5), foi difundido no Brasil sobretudo por expoentes do integrismo católi-
co, como Jackson de Figueiredo. "A autoridade acima de tudo!" - pregava este pensadormili-
tante, que chegou a descrever o regime de Mussolini como um "er ro" menos nefasto do que os 
"er ros" da "soberania popular, três poderes, liberdade de imprensa" (apttd DIAS, R. 1996, 
p. 74, 76). 
3 6 Informa Cavalari que, para publicar obras integralistas, o autor dependia da aprovação da 
Secretaria Nacional de Doutrina e Estudos (SNDE). Isso explica a presença do nada obsta de 
Miguel Reale em obras como a Introdução ao Integralismo de Machado PAUPERIO e J. R. 
M O R E I R A (cf. C A V A L A R I , R.M.F. 1999, p. 139). 
4 2 2 Ai r ton Cerque i ra Leite See laender 
A oposição de liberais e católicos conservadores à chegada de Miguel 
Reale à cátedra de Filosofia do Direito na U S P j 7 não nos deve levar a desprezar 
a eficácia do Integralismo na criação de "cortes de sociabilização". Pelo contrá-
rio, tal eficácia já se revela nos próprios apoios obtidos à época por Reale no 
meio jurídico nacional 3 8 . A AIB criou redes de relações pessoais e afinidades 
ideológicas que podem ter ampliado as chances de seus adeptos na disputa de 
posições no Poder Judiciário, na Administração e na Universidade 3 9 . 
Ao menos na área jurídica, não foram isolados os casos de aproveita-
mento, pelo regime pós-64, de quadros com passado integralista. O novo regime 
podia aqui, contudo, selecionar seus colaboradores dentro de um universo muito 
mais amplo do que a antiga AIB. Como no Estado Novo, Francisco Campos 
continuava útil e a mostrar seus talentos de jurista 4 0 - opções, porém, não falta-
vam. O quadro nas principais faculdades de direito era distinto daquele da dita-
dura anterior, não raro rejeitada pelos professores liberais. 
Em 1964, vários integrantes do corpo docente da Faculdade de Direito 
da USP manifestavam "o seu júbilo" pela derrubada do Governo Goulart 4 1 . Não 
falavam aqui só os antigos integralistas. Não falavam aqui, tampouco, só os 
intelectuais ligados ao catolicismo conservador. O "júbilo" era compartilhado, 
também, por alguns dos mais destacados liberais da Casa. 
Como compreender a atitude deste último grupo? 
O percurso político de muitos jurisconsultos liberais não deve ser com-
preendido só em função do fracasso político da UDN no plano nacional e da 
insatisfação com a insistente adesão popular aos adversários do partido 4 2 . Re-
Sobre a resistência a Reale cf. DULLES, J.W.F. 1984, p. 167-168, e REALE, M. 1987a, 
p. 149 e ss. 
Cf. DULLES, J .W.F. 1984, p. 168, e REALE, M. 1987a, p. 152. 
Mostrando como essas "coortes de sociabilização" podem se enfrentar na luta por espaços na 
universidade, cf. a correspondência entre o positivista Ivan Lins e o Gal. Peri Beviláqua, em 
que se imputa a uma "cabala integralista e clerical" a perseguição política ao filósofo Cruz 
Costa ( L E M O S , R. (Org.). 2004, p. 142-144). 
Vanguardista, como político, na importação da simbologia fascista, o jurista mineiro se mante-
ve afastado do integralismo, movimento no qual tinha desafetos. Intelectualmente atualizado e 
versátil, Campos tende a ser automaticamente visto como o cérebro jurídico do Estado Novo, 
muito embora tenha demonstrado, ao longo de sua vida, certa variação quanto às convicções 
políticas e jurídicas. Miceli o vê "escrevendo quase sempre ao sabor das circunstâncias e con-
veniências suscitadas por determinadas conjunturas de crise politica" - ou então "produzindo 
em regime de encomenda o elenco de justificativas" de seus "pareceres e projetos" (MICELI, 
S. 2001 , 270, n. 13. Sobre o pensamento de Campos e sua contextualização, cf. t a m b é m - entre 
outros - LAUF.RIIASS JR., L. 1986, p. 135 e ss.; e S C H W A R T Z M A N , S.; B O M E N Y , H. M. 
B.; COSTA, V. M. R. 2000, sobretudo p. 53 e ss., 61 e ss., 79 e ss., 298, 302 e ss.). 
D U L L E S , J .W.F. 1984, p. 375. 
Já em 1945 a eleição para o Senado decepcionava os udenistas de São Paulo, com Getúlio Vargas, 
Marcondes Filho e Luís Carlos Prestes deno tando o jurista liberal Ernesto Leme (sobre os re-
sultados, cf. DULLES, J. W. F. 1984, p. 368, e N O G U E I R A . J.C. de A. 1968, p. 9. Para uma 
leitura um tanto "udenista" dos mesmos, cf. LEME, E. 1979, p. 138-139, 180). Advirta-se, po-
rém, que Leme acabaria abandonando a UDN já em 1951, ano em que se tornaria Reitor da 
Histór ia do Dire i to e m Perspec t iva 4 2 3 
flete, também, os limites de seu liberalismo, em uma sociedade com dificuldades 
para assimilar este último fora dos editoriais, discursos e diplomas legais. 
Tais limites permitem que se fale em uma "concepção liberal-conser-
vadora", também estimulada, em parte, pela própria formação jurídica 4 3 . Uma 
concepção talvez difícil de compatibilizar com a instabilidade social atribuída 
por alguns juristas ao "clamor permanente, pela elevação de vencimentos e 
salários" e a um "governo (...) impotente para conter a espiral inflacionária" e 
sem "força para impedir tais reivindicações"1,4'. 
A participação ou apoio de juristas liberais a movimentos e regimes 
não-democráticos não é, evidentemente, um fenômeno só brasileiro. E fato veri-
ficável até na França, onde nem Georges Ripert escaparia à sedução de Vichy 4 5 . 
Joseph-Barthélemy - um "republicano moderno"46 e "perfeito liberal parla-
mentar"41 que combatera a censura e a discriminação racial 4" - acabaria mesmo 
por tornar-se ministro de Pétain. 
O temor da esquerda 4 9 , um certo apego à ordem 5 0 , a perspectiva do 
exercício do poder 5 ' e a idéia de uma continuidade do Estado francês 5 2 podem, 
USP (cf .LEME, E. 1981, p. 119). Este combativo adversário do Estado Novo ainda seria Em-
baixador na O N U (1954-1955) - ocupando em julho de 1954 a Presidência do Conselho de 
Segurança - e Secretário da Justiça em São Paulo (1964-1965). 
É difícil identificar, porem, em que grau os fatores " locais" conduzem a esta relativização do 
liberalismo. Assim como é difícil precisar, em outros países, o peso, na formação de uma 
mental idade avessa ao liberalismo, das tradições autoritárias, da mensagem conservadora do 
clero ou de um certo " temor das massas". Em todo caso, qualquer que seja a origem das moda-
lidades menos intensas da opção liberal, o fato é que estas mal resistem a quadros de radicali-
zação. A "bar thélemyzação" do jurista liberal - entendida como sua transformação de doutri-
nador de inspiração liberal em agente legitimador de uma ditadura não deve ser interpretada 
como uma adesão do liberalismo à ditadura, mas sim como uma opção "superadora" de um 
liberalismo mal enraizado. 
v. LEME, E. 1979, p. 180. Causada pela "ambição desmedida" de "todas as classes sociais" -
dos "industriais e comerciantes" aos "servidores públicos, operários e empregados" - a "espi-
ral inflacionária" estaria devorando como uma "leucemia" - segundo o jurisconsulto liberal -
"as últimas energias do País" (cf. LEME, E. 1979, p. 180). 
Cf. SAULNIER, F. 2004, p. 270, n. 814, que aqui invoca estudos de Paxton. Saulnier lembra, 
na esteira de Birnbaum e S. Riais, que parece ter havido aqui mais continuidade do que ruptu-
ra, em relação à Terceira República (SAULNIER, F. 2004, p. 270). 
Assim se apresentava o próprio Barthélemy (v. SAULNIER, F. 2004, p. 526). 
No dizer de A. Mestre, cit. em SAULNIER, F. 2004, p. 254. Segundo o próprio Barthélemy, 
referindo-se - nos Anos 30 ao legado da Revolução Francesa, "nossa bússola é a doutrina li-
beral" (apud SAULNIER, F. 2004, p. 258). 
Cf. SAULNIER, F. 2004, p. 255-256, n. 708 e 710. 
Vendo "a pátria em perigo" já antes da derrota francesa, Barthélemy não escondia sua preocupa-
ção com a Frente Popular e a ascensão das esquerdas (cf. SAULNIER, F. 2004, p. 266, 268 e t c ) . 
Saulnier o caracteriza como "um defensor da ordem" (SAULNIER, F. 2004, p . 267). 
Sobre o problema da "ambição pessoal" no caso Barthélemy, cf. SAULNIER, F. 2004, p. 282-
285 , e os autores ali citados. Saulnier não destaca tal fator, posto que lembre a atração exercida 
por Vichy sobre os que tiveram ambiçõesfrustradas na III República (cf. SAULNIER, F. 2004, 
p . 282). 
4 2 4 Ai r ton Cerque i ra Lei te See laender 
ao lado de outros fatores 3 0 , ter levado Barthélemy a ver a ditadura de Vichy com 
mais simpatia. A repulsa pela "desordem" social e política talvez tenha tido 
aqui um peso considerável - até porque, para este jurista liberal, "a primeira 
necessidade da sociedade é a ordem. A liberdade só vem depois"5*. Não é inco-
mum que juristas liberais mais próximos do conservadorismo se inclinem por 
este último em detrimento do liberalismo, quando a própria ordem social lhes 
parece prestes a ruir. 
Não é de se crer, na esteira de Dulles, que "era inevitável (...) que os 
bacharéis liberais anti- Vargas", confrontados com os triunfos eleitorais do popu-
lismo, "fizessem alianças"'5, inclusive com o golpismo militar. Opções políticas 
foram feitas, tanto na adesão de juristas udenistas à violação da Constituição de 
1946 quanto no perpetuar de sua colaboração com o regime, mesmo após o AI-5. 
Datam de bem antes de 1964, aliás, os apelos dos jurisconsultos ude-
nistas para que as Forças Armadas pusessem fim à "criminosa tolerância do 
governo" em face da mobilização comunista. Isso se vê claramente nas suas 
palestras na Escola Superior de Guerra - instituição onde seguiriam ocorrendo, 
após 1964, interessantes conferências de juristas. 
III. Como salienta Dominique Gros 5 6 , toda tradição jurídica francesa, 
após o Código Civil, parece repousar sobre "uma concepção unificada do estado 
das pessoas", de tal sorte que as "discriminações religiosas e raciais" de Vichy 
faziam "explodir o edifício construído por Cambaceres e Portalis". É por isso 
que o civilista Georges Ripert - em 1938, ou seja, antes de aderir ao regime 
colaboracionista de Pétain - podia contrapor o direito francês à legislação anti-
semita do Terceiro Reich, dizendo haver, tanto quanto uma "linha Maginot" de 
defesa militar, "uma linha do código civiF5'. 
Para contornar o equalizador conceito de pessoa 3 8 - conceito nuclear no 
direito moderno - tinha o jurista de comprar riscos, lançando-se à aventura da 
inovação. Isso mostra, ainda mais, a adaptabilidade dos juristas nas ditaduras. 
Olhemos de novo Georges Ripert 5 9 - ainda hoje tão influente no campo 
do direito privado. Assim como Joseph-Barthélemy, futuro ministro de Pétain, 
Ripert figurava entre os signatários de um protesto contra o anti-semitismo hitle-
rista em 1933. E assim como Barthélemy, Ripert também viria a assinar, na 
5 Cf. "supra", n. 93 . Sobre o "argumento da continuidade" como linha de defesa de Barthélemy, 
cf. SAULNIER, F. 2004, p. 292-294. 
3 3 Para uma análise dos demais fatores, cf. SAULNIER, F. 2004, p. 282 e ss. 
5 4 Apuei SAULNIER, F. 2004, p. 267. 
5 5 DULLES, J .W.F. 1984, p. 377. 
5 6 G R O S , D.(000, p. 30. 
57 Apud G R O S , D. 2000, p. 34. 
5 8 Sobre a função equalizadora em tela, cf. R A D B R U C H , G. 1979, p. 261 . 
5 9 Sobre Ripert e sua participação no regime de Vichy cf. GROS, D. 2000, p . 26, e M O T T E , O. 
1995, p. 519. 
Histór ia do Dire i to e m Perspec t iva 4 2 5 
década seguinte, atos discriminatórios contra judeus 6 0 . Na verdade, como podemos 
ver, a linha do código civil sucumbiu tão rapidamente quanto a linha Maginot, 
assim que se comprovou um embaraço à carreira daquele jurista - que ainda 
defenderia, em seu Tratado Elementar de Direito Civil, o uso da "religião 
para estabelecer um direito racial"h[. 
Foi, porém, no campo do direito público que as teorias mais rapida-
mente se adaptaram às pretensões dos ditadores do século XX. Aqui, nem o 
princípio constitucional da igualdade escapou de "releituras revolucionárias". Teses 
foram escritas especialmente para "adaptar" o princípio da igualdade ao racismo 
nazista, ao mesmo tempo em que negavam a possibilidade de invocar tal princí-
pio para submeter atos legislativos ao controle judicial 6 2 . 
No direito público francês já se esvaziava a igualdade constitucional 
mesmo antes da ascensão de Pétain. Antes de servir Vichy 6 3 , Barthélemy já 
falava de uma "relatividade do direito constitucional" na esfera colonial 6 4 . Em 
1936 destacava tal autor que, se o direito francês pressupunha a igualdade dos 
homens, o "sistema imperiaF pressupunha "a desigualdade das raças1 . E que a 
admissão do direito dos povos ao autogoverno não implicava o paralelo reco-
nhecimento, na esfera colonial, de um direito de secessão 6 6 . 
O pensamento jurídico de inspiração direitista e contrário à democracia 
liberal soube apropriar-se do vocabulário desta última, assim como de conceitos-
chave do socialismo e da solidariedade religiosa, alterando-lhes habilmente o 
sentido original 6 7 . Na Alemanha hitlerista, o conflito capital-trabalho passou a se 
ocultar sob a bela idéia de uma "comunidade empresarial" fundada em "honra, 
confiança e cuidado", à qual o trabalhador se incorporaria para tomar-se um 
"camarada de trabalho" do "Führer da empresa"6*. Na Itália, Costamagna des-
6 U Cf. G R O S , D. 2000, p. 28, 34-35. 
61 Apuei G R O S , D. 2000, p. 35. 
6 2 Cf., por exemplo, LUNGWITZ, A. 1937, p. 12-13. 
6 3 Joseph Barthélemy (1874-1945), professor de Direito Constitucional na Universidade de Paris, 
foi deputado e uma das mais prestigiosas figuras do meio jurídico e político francês antes da 
Segunda Guerra. Convertido em ministro no regime de Vichy (1941-3), tornou-se um dos ju -
ristas que tentaram legitimar as perseguições políticas e atos repressivos do novo regime. No 
final da guerra, Barthélemy arcou com as conseqüências de suas opções. Em Paris, o deão Ripcrt 
j á relatava, no início de 1944, atos de hostilidade na universidade, onde Barthélemy teria sido 
recebido com gritos de "assassino" (cf. SAULNIER, F. 2004, p. 16, n. 103). No mesmo ano, o 
ex-ministro foi preso. Morreu em 1945, antes de ter sido julgado (cf. SAULNIER, F. 2004, 
p.16, n . l03 e 18-24. Para a caracterização de Barthélemy como "um grande oportunista", 
v. GIRAUD, E. 1961, p. 269). 
6 4 Cf. GROS, .D. 2000, p . 30-31 . 
6 5 Apud GROS, D. 2000, p. 3 1 . 
6 6 Apud GROS, D. 2000, p. 3 1 . 
6 7 Talvez influenciando nesse ponto as hábeis redefinições de Francisco Campos, Carl Schmitt 
foi um dos mais atentos estudiosos do poder dos conceitos e de sua utilidade como arma política 
(cf, por exemplo, SCHMITT, C. 1992, p. 57, 119). 
6 8 Cf. o art. I o do projeto de lei sobre a relação de trabalho (1938) e os regulamentos empresariais 
da Hoechst de 1934 e 1939 transcritos em SÕLLNER, A. 1981, p. 150. 155. Sobre o tema, 
além do texto de Sõllner, cf. KROESC1IELL, K. 1992, p. 102-104, e a bibliografia ali indicada). 
4 2 6 Air ton Cerque i ra Lei te See lacnder 
crevia o estado de Mussolini como um "Estado de Direito"69. Expressões como 
"democracia autoritária", empregadas na Ação Francesa dos anos 30 7 0 , encontra-
riam numerosas variantes - como a "democracia substantiva" do nosso Estado 
Novo ' 1 e a "Democracia de fins" ou "Democracia Orgânica" do pensamento 
integralista . E Carl Schmitt não hesitaria em descrever as normas anti-semitas 
do hitlerismo como "a Constituição da Liberdade"13. 
O pensamento jurídico autoritário precisava, contudo, mostrar que re-
presentava a superação do pensamento jurídico da era liberal - e não apenas a 
sua deturpação sistemática, a serviço de novas ideologias e regimes. Era preciso, 
pois, invocar "uma nova idéia de direito" - como fez em 1942 o Curso de Di-
reito Constitucional de Georges Burdeau, ao justificar a concentração de pode-
res nas mãos do Marechal Pétain 7 4 . 
Aqui não teve importância apenas, como poderia parecer, a identifica-
ção pura e simples da lei com a vontade e a decisão do ditador, tidas por mere-
cedoras de cega obediência 7 5 . A concepção decisionista conviveu, pelo contrá-
rio, com concepções institucionalistas que agradavam os juristas mais conserva-
dores, por parecerem reconhecero caráter natural, a dignidade e a intangibilida-
de da família, da Igreja, da propriedade e da empresa. 
Que as formulações de Hauriou teriam influenciado a doutrina alemã e 
assim, indiretamente, o próprio direito nazista, era algo que já se afirmava na 
França dos Anos 30 7 6 . A utilidade do institucionalismo para o novo regime foi 
sustentada por Carl Schmitt, que já percebera a possibilidade de exorcizar as 
inseguranças do voluntarismo legislativo democrático predefinindo a família, o 
Estado e a empresa como instituições dotadas de vida própria e normatividade 
concreta 7 7 . 
No campo do direito do trabalho, essa concepção institucionalista de 
empresa logo se refletiu na jurisprudência alemã, fazendo com que se impusesse 
Cf. STAFF, I. 2002. p. 118. Sobre o tratamento do conceito na literatura jurídica do fascismo, 
cf. também STAFF, I. 2002, p. 111, 114. 
™ Cf. as passagens transcritas em H U R A U L T , E. 2000, p. 444. 
7 1 Cf. LAUERIIASS JR., L. 1986, p. 137. 
1 2 V.. por exemplo, REALE, M. 1983a, p. 205 e REALE, M. 1983d. p . 247. Sobre o uso do termo 
"democracia" no Integralismo, cf. também D1TZEL, C. de H.M. 2004, p. 201 e ss. 
7 3 V. RÜTHERS, B. 1994, p. 134; e Rüthers, B. 2001 , p. 49. 
74 Apuei GROS, D. 2000, p. 20. 
7 : 1 Segundo um jurista de grande influência no aparato nazista de repressão - o Presidente do 
"Volksgerichtshof Roland Freisler (1893-1945) quest ionar-se " c o m o o Führer decidiria 
nesse caso?" deveria ser era algo fundamental na atuação dos magistrados (cf. AHL, I.K. 1995, 
p. 217-218). 
7 < 1 Cf. LOISELLE, M. 2000, p. 452. É preciso advertir, contudo, que Hauriou não foi um arauto 
do totalitarismo, tendo, pelo contrário, prognosticado o triunfo da democracia em seus escritos 
(cf. GIRAUD, É. 1961, p. 272). 
7 7 cf. SCHMITT, C. 1993, p. 17, e- reconhecendo tal utilidade e o papel inspirador do institucio-
nalismo de l lauriou-p. 45 e ss. 
Histor ia do Dire i to em Perspec t iva 4 2 7 
a idéia de uma "ordem concreta da empresa"1*, comunidade de colaboração 
regida por um pequeno "Fiihrer empresarial" 7 9 . Comunidade, aliás, inspirada em 
uma concepção "germânica" supostamente inacessível aos judeus, que não po-
deriam invocá-la para exercer todos os direitos da legislação trabalhista 8 0. 
Na Itália, o institucionalismo de Santi Romano também difundiu a crença 
de que a organização interna da instituição-fábrica, com o manager exercendo 
um "poder disciplinar", exprimia um campo normativo próprio, que o direito 
estatal não podia regular de forma completa e direta 8 1 . A instituição aqui, mais 
uma vez, era mostrada como algo natural, distante do que deveria ser o campo 
de ação da vontade do legislador- inclusive do legislador democrático. Assim se 
dava a ocultação do poder pelo institucionalismo* 2, em uma identificação do 
direito com a ordem 8 3 , com o existente. 
Como vemos, sob um discurso institucionalista que parecia conter o po-
der estatal e defender um pluralismo jurídico, legitimava-se, assim, o poder e o 
autoritarismo privados na esfera do trabalho. Isso nem sempre se vinculava, 
porém, a uma defesa do liberalismo: seria afinal o Estado, eventualmente o Estado 
Corporativo fascista, que deveria restaurar, dentro desse quadro, a unidade. A 
adesão de Santi Romano à ditadura de Mussolini - inclusive como Presidente do 
Conselho de Estado 8 4 - não expressava, pois, incoerência alguma . 
Desde a publicação de A Interpretação Ilimitada de Bernd Rüthers 
(1968) desmoronou o retrato - tão conveniente para os juízes alemães e para os 
detratores do positivismo - da experiência jurídica nazista como singelo reflexo 
de normas impostas "de cima" por um regime truculento . A enorme massa de 
direito gerada antes de 1933 pela complexa sociedade alemã não podia, é claro, 
ser substituída automaticamente por normas "nazistas" - fosse lá o que isso 
quisesse exatamente dizer. Dentro desse quadro, alguns juristas da ditadura prio-
rizaram a rediscussão dos métodos de interpretação, tentando, através desta, 
7 S SÕLLNER, A. 1981, p. 144, 153. 
7 9 As expressões "Betriebsfuhrer" e "Fiihrer des Betriebs" podem ser encontradas tanto na dou-
trina quanto na jurisprudência e nos regulamentos internos empresariais (cf. SÕLLNER, A. 
1981, p. 153, 155. Cf. também SCHMITT, C. 1993, p. 53). 
8 0 Cf. o ju lgamento do Tribunal do Trabalho do Reich de 24.07.1940, transcrito em SÕLLNER, 
A. 1981 ,p . 152. 
8 1 Cf. MANGONI , L. 1986, p . 53. 
8 : Já denunciada por Baratta, na análise do pensamento de Santi Romano - cf. MURA, V., 
p. 392, n. 45 . 
8 3 Segundo Catania, cit. em M U R A , V. 1986, p. 392, n. 45 . 
8 4 Cf. CALVINO, P. 1995, p. 524. Para uma tentativa de reduzir o significado das opções políticas 
de Romano, cf. O R L A N D O , V.E. 1950, p. X-XI. 
8 5 Cf. M O N T A N A R I , M. 1986, p. 377. Pode ser exagero, contudo, a opinião desse autor, de que 
a "adesão ao fascismo" responderia, em Santi Romano, a "uma exigência interna de seu siste-
ma". Sobre a adaptação de Santi Romano ao fascismo, cf. também R O M A N O , S. 1928, p. 224-
226, e a análise de Silvio Trcntin em BOBBIO, N. 2007, p. 235. 
8 6 Sobre o tema, cf, entre outros, STOLLEIS, M. 1994, p. 11. 
428 Air ton Cerque i ra Lei te See laendcr 
inserir rapidamente um "ovo de cuco no sistema jurídico liberai. Pretendiam 
facilitar a transposição da moldura das normas preexistentes, não só através de 
invocações principiológicas genéricas, mas também por meio de um mergulho 
no institucionalismo**. 
O fascínio de setores da direita européia pelo institucionalismo era 
compreensível. Antes da ascensão dos ditadores, este já permitia fixar - diante 
de parlamentos eleitos cada vez mais democraticamente e cada vez menos con-
fiáveis para as elites - campos sociais de autonormatização (a Igreja, a família, a 
empresa), legitimando certa proteção destes últimos contra o direito legislado. 
Como contraponto à incómoda dinâmica da mudança social, a aparência de 
estabilidade das instituições tendia a atrair atenções em meio às rupturas da 
sociedade industrial . Dentro desse quadro, surgia para os próprios juristas a 
tentação de extrair normas a partir das instituições socialmente existentes - ou 
seja, de tirar de um "ser" um "dever-ser"90. 
Tendencialmente conservador, o institucionalismo podia, contudo, ser 
instrumentalizado pelo projeto nazista, desde que se nazificasse a própria com-
preensão da instituição. Como os demais institucionalistas, os adeptos da versão 
schmittiana dessa corrente ("konkretes OrdnungsdenkerT) partiam da idéia de 
que certos âmbitos da vida social (a família, a empresa, o funcionalismo, o exér-
cito etc.) tinham uma ordem interna e uma substância jurídica própria, que o juiz 
tinha de observar ao aplicar o anterior direito legislado 9 1 . Os jurisconsultos do 
nazismo se esmeraram, porém, em reconceber as próprias instituições, remol-
dando conceitos jurídicos ao sabor da ideologia e dos interesses do regime 9 2 . 
Como salientou Rüthers 9 3 , a normatividade das instituições como "ordens 
parciais" acabou por se converter, em última análise, em um canal de normatiza-
ção, pura e simples, da visão de mundo nazista. "Todas essas ordens parciais 
(...) recebiam seu 'sentido' e sua 'idéia condutora' da posição atribuída à ordem 
parcial concreta dentro da ordem totaF, a qual, por sua vez, tinha de ser imagi-
nada a partir desta Weltanschauung94. Desse modo, esta última se fazia direito 
vigente, atuando o discurso institucionalista como um singelo transformador 9 5 . 
Cf. a respeito as reflexões de H. Lange e C. Schmitt em SCHMITT, C. 1993, p. 49. Para uma 
análise da estratégia desses autores, cf. o indispensável RÜTHERS, B. 1994, p. 187 e ss. 
s s Analisando a versão schmittiana do institucionalismo. Rüthers destaca que a mesma era "um 
instrumento para a mudança e organização" do direito legislado então aindavigente, para sua 
pronta adaptação ao novo regime, sem necessidade de nova produção legislativa (cf. 
RÜTHERS, B. 1994, p. 75). 
8 9 Cf. RÜTHERS, B. 1994, p. 194. 
9 0 Cf. a análise de l lauriou feita em R Ü T H E R S , B. 1994, p. 195. 
'" Cf. RÜTHERS, B. 1994, p. 65-66. 
Nas palavras de Schmitt, "nós repensamos os conceitos jurídicos (...) nós estamos do lado das 
coisas que estão vindo" (apud RÜTHERS, B. 1994, p. 68. Cf. também RÜTHERS, B. 1994, 
p. 70). 
RÜTHERS, B. 1994, p. 76. 
" 4 RÜTHERS, B. Idem, ibidem. 
9 5 RÜTHERS, B. Idem, ibidem. 
Histór ia do Dire i to e m Perspec t iva 4 2 9 
O institucionalismo que tanto vicejou no solo fértil das ditaduras direi-
tistas também influenciou profundamente o Pós-Guerra. Analisando aspectos da 
teoria da relação de trabalho aceita nos tribunais, Rüthers demonstrou que esta 
era, na sua origem, tributária de uma equiparação com o casamento segundo a 
lei nazista de 1938 9 6 . Seria interessante verificar, aliás, o quanto "paralelos ins-
titucionalistas" análogos - e teorias institucionalistas em geral - teriam influen-
ciado, no Brasil, a doutrina trabalhista, o direito público, o direito empresarial. 
IV. A verificação da influência do pensamento jurídico das ditaduras -
ou adaptável às ditaduras - em nossa doutrina e jurisprudência nunca será feita 
seriamente, contudo, enquanto predominar uma memória seletiva, excluidora ou 
suavizadora de todos os dados politicamente incômodos. Tal verificação será 
particularmente dificultada quando for feita através de biografias de "grandes 
juristas", mesmo porque o gênero favorece uma certa identificação entre biógra-
fo e biografado. Mesmo em meios acadêmicos capazes de superar, nesse ponto, 
o discurso laudatório, verificamos dois pesos e duas medidas, na apreciação das 
agruras do jurisconsulto e da situação das vítimas do regime ditatorial por ele 
servido. A comovente descrição do fim de Barthélemy por Saulnier não vem 
acompanhada, em sua obra, de um relato dos derradeiros dias dos réus da "Justiça" 
colaboracionista de Vichy 9 7 . 
A discussão sobre o papel dos juristas e do pensamento jurídico nas di-
taduras brasileiras merece a atenção dos estudiosos da história do direito, não 
podendo mais ser abandonada nas mãos de pessoas sem formação específica 
nessa área - quanto mais de antigos amigos, colaboradores, colegas e discípulos 
dos autores estudados 9 8 . Não é aceitável que nossas universidades se omitam, 
enquanto se publicam obras sobre juristas relevantíssimos no período militar, 
nas quais a exata relação destes com o regime parece um tema menor, tratado ao 
lado de assuntos de interesse meramente doméstico. 
Nessa fase de consolidação da História do Direito como área científica 
no país, espera-se que dela venha uma contribuição efetiva à análise do tema 
aqui exposto. Isso é tanto mais necessário em face da conveniência de se cons-
truir, no Brasil, uma doutrina que não tema se defrontar com o seu passado e 
com a sua própria historicidade. 
Em suma, cumpre iniciar uma discussão, inclusive nas faculdades de di-
reito, do pensamento jurídico produzido no Brasil no Estado Novo e durante o 
RÜTHERS, B. 2001 , p. 23 . 
Cf. SAULNIER, F. 2004, p. 14 e ss. 
Como adverte Stolleis, o "perigo do diletantismo e subjetivismo é maior" quando "não está 
assegurada uma escolha e interpretação crítica das fontes". E quando pessoas "que não po-
dem ser descritas como 'historiadores do direito ', no sentido usual do termo", põem-se a es-
crever a história do direito, deixando que nesta se reflitam "deforma irrefreada seus senti-
mentos e seu massivo interesse na obtenção de um determinado resultado" (STOLLEIS, M.; 
S IMON, D. 1981, p. 17-18). 
4 3 0 Air ton Cerque i ra Lei te See laender 
regime pós-64. Não se trata, propriamente, de julgar condutas pessoais", mas 
sim de tentar compreender a função do direito, de seus teóricos e dos centros de 
ensino nesses períodos históricos específicos 1 0 0 . Nada impede, porém, que o 
pesquisador reconheça e indique quais modelos e idéias dentre os ainda hoje 
ensinados se mostraram adaptáveis à defesa das ditaduras e das violações de 
direitos humanos - e quais destes modelos e idéias surgiram justamente com 
esta finalidade, sob o signo do autoritarismo 1 0 ' . 
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Tal como a tendência dos juristas para desconsiderar motivações, práticas e condutas juridica-
mente irrelevantes, a sua obsessão pelo discutir da "culpa" também pode, aliás, gerar um de-
sastroso reducionismo na análise do direito dos regimes ditatoriais, ocultando "seqüências cau-
sais inteiras", de interesse do historiador. Esta é uma das razões do ataque de Stolleis a certa 
literatura de diletantes, produzida nesse campo por juízes e outros profissionais do direito (v. 
STOLLEIS, M. /SIMON, D. 1981, p. 26-27). 
E a busca dessa compreensão que é aqui a tarefa - temerária, mas legítima- do historiador do 
direito. Ainda que sua "ciência possa" - no dizer de Stolleis - "preparar e apoiar enunciados 
normativos e aumentar a plausibilidade destes últimos", ela certamente não pode fornecer "ensi-
namentos vinculantes", extraindo um "Sol len" do que descreve como um "Sein" passado 
(STOLLEIS, M.; SIMON, D. 1981, p. 31 . Cf. também STOLLEIS, M. 1994, p. 54-55. Sobre a 
fortuna e descrédito da fórmula Historia magistra vitae, cf. K.OSELLECK, R. 1992). 
Para uma anterior defesa dessa mesma posição, no Brasil, cf. SEELAENDER, A. L. C. L. 
2004, p. 35-36. Para um exemplo alemão dessa postura, cf. H A T T E N H AU ER, H. 1981b, 
p. 131-132. e sobretudo as obras de Rüthers acima citadas. Advertindo acerca das enormes di-
ficuldades para verificar "o que seja especificamente nacional-socialista no direito", mas re-
conhecendo a necessidade de orientar as pesquisas para uma análise das eventuais continuida-
des existentes, H A T T E N H A U E R , H. 1981, p. 9-10. 
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