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TEORIA DO ORDENAMENTO JURÍDICO 1.1 NOÇÃO DE SISTEMA JURÍDICO 1 1.2 O PROBLEMA DA COMPLETUDE: LACUNAS JURÍDICAS E A INTEGRAÇÃO 2-3 ARGUMENTOS EM PROL DA COMPLETUDE E DA INCOMPLETUDE 2 TIPOS DE LACUNAS JURÍDICAS 2 E 3 INSTRUMENTOS DE INTEGRAÇÃO DO DIREITO 3 1.3 O PROBLEMA DA COERÊNCIA: ANTINOMIAS JURÍDICAS E CRITÉRIOS DE CORREÇÃO 3-5 1.4 O PROBLEMA DA UNIDADE: O DEBATE SOBRE A NORMA FUNDAMENTAL 5-6 1. Teoria do Ordenamento Jurídico Ricardo Maurício 1 Teoria do Ordenamento jurídico trata-se da parte da teoria geral do Direito que se propõe a estudar o Direito como um sistema: um conjunto racional de elementos. Considerando a realidade como sempre caótica, seja a natural, seja a social, através da noção de sistema, a realidade pode ser ordenada. 1.1 A noção de Sistema Jurídico É possível conceber o direito como um sistema para melhor compreendê-lo e aplicá-lo. De todas as concepções propostas, ainda hoje a mais difundida é a pirâmide normativa de Hans Kelsen, para quem as normas jurídicas comporiam um todo hierarquizado, relacionando-se através de laços de validade. Ainda hoje é a construção sistêmica mais importante, porque alem de ser muito didática é também uma construção totalmente útil para a vida prática. Quanto maior a generalidade da norma, maior é a sua hierarquia. 1. Teoria do Ordenamento Jurídico Ricardo Maurício 2 1.2 O problema da Completude: Lacunas Jurídicas e a Integração Trata-se do problema referente à possibilidade do Direito oferecer respostas normativas para todos os problemas da vida humana em sociedade. O Direito realmente fornece resposta jurídica para todos os conflitos sociais? O Direito é completo e sem lacunas? Ou o Direito é incompleto e precisa lidar com lacunas causadas pela incessante mudança social? - Argumentos em prol da Completude (Visão positivista de um Direito sem lacunas) I. O Direito seria completo, porque tudo que não está juridicamente proibido está juridicamente permitido. Esse argumento é utilizado por Hans Kelsen. II. O Direito pode ser considerado completo, pois o julgador não pode eximir-se de julgar (alegando a falta ou obscuridade da lei), sendo a sua decisão a resposta normativa do sistema jurídico. Proibição do Non liquet. III. O Direito seria completo, porque ele próprio preveria instrumentos para o preenchimento de lacunas meramente provisórias (analogia, costume, princípios gerais do direito e equidade). - Argumentos em prol da Incompletude (Visão pós-positivista de um Direito aberto e lacunoso) I. O Direito seria incompleto, pois a sociedade se transformaria sempre em um ritmo mais célere. O Direito está situado no último comboio das transformações sociais. II. O Direito pode ser considerando incompleto, porque a existência de instrumentos de integração é a comprovação inequívoca da existência de lacunas jurídicas. III. O Direito seria incompleto, já que, especialmente nos sistemas de Civil Law, a lei não dispõe da capacidade oracular de regular com perfeição a vida social. Salvo melhor entendimento, parece-nos que o Direito deve ser considerado um sistema incompleto, ou ao menos completável. [Lacunas Jurídicas] Trata-se de toda e qualquer imperfeição que compromete a completude do sistema jurídico. Tipos de Lacunas Jurídicas A) Lacunas Normativas: são aquelas que se apresentam toda vez que inexiste norma expressa para regular uma dada situação social. Exemplo: ausência de Legislação Penal específica para a grande maioria dos crimes cibernéticos. 1. Teoria do Ordenamento Jurídico Ricardo Maurício 3 B) Lacunas Fáticas: ocorrem toda vez que a norma jurídica vigente perde contato com os fatos sociais (comprometimento da efetividade). Exemplo: a ineficácia do Código Brasileiro de Trânsito (obrigatoriedade do cinto de segurança no banco traseiro). C) Lacunas Valorativas: são aquelas que se verificam toda vez que a norma jurídica perde contato com a ideia de justiça de um dado contexto histórico- cultural (perda da legitimidade). Esse descolamento ocorreria entre a norma e os valores ou princípios sociais. Exemplo: redução da maioridade penal e a percepção da injustiça do marco de 18 anos. [Instrumentos de Integração do Direito] Integração do Direito consiste na atividade de preenchimento das lacunas jurídicas. A ciência jurídica oferece quatro instrumentos para a integração jurídica. Eles podem ser usados isolada ou conjuntamente, sem que haja hierarquia entre tais meios integrativos. São eles: I. Analogia: consiste na aplicação de uma norma jurídica que regula uma dada situação social para um outra situação social semelhante que carece de uma regulação normativa expressa. Exemplo: aplicação analógica da Lei Maria da Penha que protege a figura da mulher para a transexual em um ambiente doméstico e familiar. II. Costume: são práticas sociais reiteradas que oferecem elementos para a integração das lacunas jurídicas. Exemplo: a utilização de costumes para o preenchimento das lacunas contratuais (Código Civil Brasileiro vigente). III. Princípios gerais do Direito: são normas éticas, expressas ou implícitas que regulam a relação entre direito e moral, potencializando a realização da justiça. Exemplo: aplicação do Princípio da Insignificância Penal diante dos chamados furtos famélicos (furtos praticados para saciar a fome). IV. Equidade: consiste na aplicação do sentimento de justiça do julgador em face do caso concreto. Exemplo: o uso da equidade na Justiça do Trabalho. (presente na obra Ética a Nicómaco de Aristotéles) 1.3 O problema da Coerência: Antinomias Jurídicas e os Critérios de Correção Trata-se da exigência racional de que o sistema jurídico ofereça soluções para a contradição das normas jurídicas. 1. Teoria do Ordenamento Jurídico Ricardo Maurício 4 Denomina-se de Antinomia Jurídica o conflito estabelecido entre uma norma que permite e outra norma que proíbe a mesma conduta humana. Exemplo: paciente Testemunha de Jeová (Direito à vida vs. Direito à Liberdade Religiosa). [Critérios de Correção das Antinomias Jurídicas] I. Hierárquico: havendo conflito entre uma norma superior e uma norma inferior, prevalece a norma jurídica superior. Exemplo: a prevalência da Constituição em face dos editais de concursos públicos que proíbem a tatuagem. II. Cronológico: havendo conflito entre uma norma jurídica anterior e uma norma jurídica posterior, ambas de mesma hierarquia, prevalece a norma jurídica posterior. Exemplo: prevalência do Código de Defesa do Consumidor - CDC - (1990) em face do Código Civil anterior (1916) em matéria de contratos bancários. III. da Especialidade: havendo conflito entre uma norma jurídica que se revela mais genérica e outra que trata de forma mais específica, ambas de mesma hierarquia, prevalece a norma especial. Exemplo: prevalência da Lei Maria da Penha em face do Código Penal (vigente) em se tratando de violência praticada contra a mulher no ambiente doméstico. [Antinomia de Segundo Grau] Denomina-se antinomia de segundo grau conflito estabelecido entre uma norma anterior especial com uma norma posterior e geral, sendo ambas de mesma hierarquia. Nesta hipótese, haverá conflito entre o critério da especialidade e o critério cronológico. Para a ciência jurídica qualquer solução afigura-se possível. Exemplo: O conflito entre o Código de Defesa do Consumidor - CDC - de 1990 e o novo Código Civil de 2002. [Ponderação de Bens e Interesses] Trata-se do processo de estabelecimento de uma relação de prioridade concreta dos princípios constitucionais. Ponderar consiste em hierarquizar os princípiosem disputa, através de uma investigação zetética dos fatos e valores sociais (dimensões de legitimidade e efetividade). A ponderação é a solução hermenêutica possível diante da impossibilidade da utilização dos critérios tradicionais de solução das antinomias jurídicas. Exemplo: Candidato adventista e o conflito dos princípios constitucionais da liberdade religiosa e da igualdade nos concursos públicos. 1. Teoria do Ordenamento Jurídico Ricardo Maurício 5 A boa ponderação hermenêutica é aquela que possibilita a escolha de um principio em detrimento de outro, e não afasta totalmente o principio de menor dimensão de peso num dado caso concreto, a fim de que a decisão tomada possa ser considerada razoável. A depender do caso concreto um princípio, que havia sido preterido, pode tornar-se mais importante do que outro (hierarquização fluida). Exemplo: Direito de Privacidade vs. Direito a Liberdade de Comunicação. 1.4 O problema da Unidade: o Debate sobre a Norma Fundamental Trata-se da exigência racional para que o sistema jurídico apresente um dado ponto de convergência de todos os seus elementos. Discute-se assim qual seria a norma fundamental do sistema jurídico, em torno da qual orbitariam todas as demais normas jurídicas. [Concepções da Norma Fundamental] 1. Concepção Jusnaturalista: o fundamento do direito seria a própria ideia de justiça, que segundo tais defensores apresentar-se-ia como valor absoluto e universal. É muito criticada porque não há um valor absoluto, eterno e perene que ilumine a fundamentação do direito. 2. Concepção política: o fundamento ú ltimo do sistema jurídico seria a vontade do poder constituinte que cria a Constituição. O problema dessa concepção é que também se caracteriza como metafísica, colocando o fundamento do direito numa dimensão extrajurídica, além de ser controvérsia: o que seria essa vontade jurídica? 3. Concepção positivista-clássica: o fundamento do direito seria a Constituição, lei maior situada no ápice do sistema jurídico. O problema dessa visão é a sua simplicidade. A legislação está fundamentada na Constituição. Mas a própria Constituição está fundamentada em que? 4. Concepção positivista-lógica (Kelseniana): o fundamento do ordenamento jurídico seria uma norma hipotética fundamental, que teria de ser pressuposta pelos juristas, tal como a linha do Equador no âmbito da Geografia. Os juristas teriam que pressupor a existência de uma norma acima da Constituição que estabeleceria a aceitação dogmática de todo o ordenamento jurídico (norma hipotética fundamental). 1. Teoria do Ordenamento Jurídico Ricardo Maurício 6 É uma construção complexa, mas que pode ser entendida. Kelsen tenta explicar o fundamento da Constituição. Não pode ser nada posta, pois não existe nada acima da constituição, mas sim uma pressuposta pelos juristas; construção metafísica, mas de um ponto de vista lógico, coerente. 5. Concepção pós-positivista: o fundamento ú ltimo do sistema jurídico seria os valores que estão consagrados nos princípios constitucionais (liberdade, dignidade, igualdade, etc.), os quais exprimem as exigências concretas de justiça de uma dada cultura humana. Uma vez que você coloca os valores como fundamentos, nós encontramos um fundamento geral que está fora do direito, mas que não está em um plano metafísico, abstrato. Portanto, pode ser considerada a “mais correta”.
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