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Avaliação e questões de bem-estar de animais de produção Módulo 19 Objetivos de aprendizagem • Identificar causas primárias de bem-estar pobre em animais de produção • Diferenciar problemas de bem-estar inerentes daqueles evitáveis • Descrever uma estrutura para a avaliação do bem-estar de animais de produção na fazenda, baseada nas Cinco Liberdades • Demonstrar como esta estrutura pode ser utilizada para a avaliação do bem- estar de porcas em três sistemas de criação diferentes Sumário do conteúdo • Causas de bem-estar pobre – sistemas intensivos versus extensivos • Como avaliar bem-estar na fazenda: as Cinco Liberdades – o que observar? • Problemas de bem-estar evitáveis e inerentes • Um exempo: bem-estar de porcas em três sistemas de criação diferentes • Resumo • Bibliografia Bem-estar de animais de produção: Por que é importante? • Grande número de animais envolvidos • Completamente sobre o domínio humano • Considerados apenas como mercadorias Em termos numéricos, animais de produção constituem um dos maiores usos, se não o maior, de animais pelo homem. Uma pessoa comum no mundo desenvolvido comerá, em seu tempo de vida, aproximadamente 550 aves, 36 porcos, 36 ovelhas e 8 bois, mais 10.000 ovos e o equivalente a 18 toneladas de leite, como fluido e derivados. Como vimos em módulos anteriores, existe um enorme volume de trabalhos científicos que mostram claramente que animais são capazes de sentir emoções, desta forma capazes de sofrer, e que eles sentem dor de forma similar ao homem. Existe também evidência convincente e abundante de que eles têm sentimentos, tais como fome, sede, tédio e medo, e que possuem processos cognitivos, ou seja, que são capazes de aprendizado e entendimento. Eles também estão inteiramente sob nosso controle e são reproduzidos especificamente para produzir carne, leite ou ovos. Desta forma, temos uma responsabilidade moral de considerar os seus interesses e buscar minimizar seu sofrimento, fome, sede, ferimentos, dor, medo e tédio; temos uma responsabilidade de proteger seu bem-estar. Bem-estar de animais de produção: Causas de bem-estar pobre Sistemas extensivos versus intensivos Existe uma opinião generalizada de que sistemas de produção extensivos são bons, pois permitem liberdade de escolha e movimentos, e que sistemas intensivos são ruins porque a liberdade de escolha e movimentos está restringida. Entretanto, não é tão simples assim, pois a analogia é muito “preta e branca”. Sistemas extensivos versus intensivos “Do ponto de vista dos animais, não importa o que pensamos ou sentimos, mas o que fazemos” Webster 1993 Como vimos nos módulos anteriores, o bem-estar de um animal é inteiramente independente da nossa percepção de seu bem-estar e inteiramente dependente da percepção do animal. Como o professor Webster, da Universidade de Bristol, Reino Unido, escreveu: “Do ponto de vista dos animais, não importa o que pensamos ou sentimos, mas o que fazemos.” Se você está em dúvida sobre o estado de bem-estar de um animal, sempre imagine como a situação parece ao animal. Extensivo versus intensivo – a curva de McInerney Na realidade, ao assumirmos a responsabilidade por um animal, podemos melhorar seu bem-estar através da garantia de provisões de água e alimentos, proteção de predadores, vacinação para proteção de doenças endêmicas etc. O professor McInerney, da Universidade de Exeter, Reino Unido, publicou um trabalho descrevendo a relação entre intensidade dos sistemas produtivos e bem-estar dos animais; o gráfico resultante encontra-se reproduzido esquematicamente na projeção. Ele mostra que o bem-estar não é sempre bom em um sistema extensivo nem sempre ruim em um sistema intensivo, mas segue uma reação curvilínea, a curva de McInerney. Desta forma, um rebanho ovino na montanha, que talvez não seja alimentado, vacinado ou tratado quando doente (pelo seu baixo valor de mercado), nem protegido de predadores, tem mais liberdade que uma vaca ao pasto com um único bezerro, mas pode ter um nível mais baixo de bem-estar. A vaca é alimentada, vacinada, tratada quando doente e protegida de predadores, o que supera muito a restrição suave à sua liberdade de escolha e movimentos imposta pelas cercas de pasto; paradoxalmente, seu bem-estar foi aumentado pela intensificação. Extensivo versus intensivo – a curva de McInerney Intensificação Bem-estar Ovinos nas montanhas Poedeiras em gaiolas Vaca ao pasto com um bezerro Os problemas surgem quando a intensificação é ampliada para se aumentar a produção. As poedeiras em gaiolas industriais são alimentadas, vacinadas e protegidas de predadores, porém, não são tratadas quando doentes por causa de seu baixo valor de mercado e sua liberdade de escolha e movimentos é restrita de forma muito severa; a área de piso total para sua manutenção pode ser tão pequena quanto 320 cm2 por ave, dois terços o tamanho de uma folha de papel A4, e a ave pode não ser capaz de se levantar por completo e de realizar comportamentos normais, tais como andar, ciscar, bater as asas, aninhar-se ou tomar banho de areia. Para galinhas poedeiras, a restrição da liberdade de escolha e movimentos, o “comprometimento do bem-estar”, supera muito a proteção recebida por ser um animal de produção. Extensivo versus intensivo – como avaliar o bem-estar? Então, se não se trata de uma simples comparação sistema extensivo versus intensivo, como avaliar o bem-estar para estas poedeiras, por exemplo? Extensivo versus intensivo – como avaliar o bem-estar? Extensivo versus intensivo – como avaliar o bem-estar? As Cinco Liberdades: poedeiras industriais Boa na granja; muito pobre durante a saída – fraturas ósseas Medo e estresse Muito pobre – incapacidade de se mover, bater as asas, se aninhar, ciscar ou tomar banho de areia Para expressar comportamento normal Adequada na granja, muito pobre durante saída – fraturas ósseas Dor, lesões e doenças Muito pobre – pisos de arame, baixa qualidade do arDesconforto Adequada – porém possibilidade de fome metabólica devida à seleção genética para alta produção Fome e sede AvaliaçãoLiberdade Extensivo versus intensivo – como avaliar o bem-estar? Gaiolas industriais Nos módulos anteriores, discutimos como o bem-estar pode ser avaliado através da utilização de medidas científicas, tais como medidas patológicas, comportamentais, fisiológicas e bioquímicas. Como médico veterinário, muitas dessas medidas podem não estar disponíveis para você avaliar o bem-estar a campo, apesar de que você pode ter dados de mortalidade e pode realizar estudos post-mortem em animais perdidos. Um método que ajuda na inclusão de todos os aspectos de bem-estar na sua avaliação é a utilização das Cinco Liberdades, descritas em módulos anteriores. Você pode utilizar um sistema de cinco pontos – muito pobre, pobre, adequada, boa, muito boa – para avaliar em que grau o sistema que você está avaliando supre os requerimentos de cada uma das Cinco Liberdades. Você deve dar os motivos para cada uma das suas avaliações. Atualmente, não existe evidência científica sobre a importância relativa de cada Liberdade, embora exista um grande volume de atividade científica direcionada ao estabelecimento desta relação para muitas espécies de animais de produção, e essas comparações talvez em breve sejam possíveis. Nesta projeção, uma avaliação do bem-estar de poedeiras industriais é realizada como exemplo. Como avaliar o bem-estar? Cinco Liberdades: o que observar? As Cinco Liberdades são boas para se realizar uma avaliação geral de um sistema de criação; comovocê pode utilizá-las numa visita profissional para a avaliação do bem-estar em uma fazenda? A resposta reside em avaliar aspectos da fazenda que reflitam o bem-estar de um animal ou assegurem que o bem-estar é adequado, para cada uma das Cinco Liberdades. Estes aspectos podem ser: medidas feitas nos animais, tais como lesões de pele ou patas; avaliações de manejo e anotações, tais como a qualidade do programa veterinário; medidas dos recursos humanos, tais como a habilidade do tratador de observar problemas nas patas; ou uma medida dos equipamentos, tal como o número de aves por bebedouro. Para cada uma das Liberdades, você necessita tomar várias das medidas citadas. Quanto maior o número de medidas consideradas, mais precisa será a sua avaliação do bem-estar. Estudaremos agora quais medidas podemos tomar para nos auxiliar na avaliação da adequação de uma fazenda a cada uma das Cinco Liberdades. Livre de fome e sede Os aspectos que você deve avaliar dentro do conceito das Cinco Liberdades variam de acordo com o sistema de criação. Por exemplo, você precisa considerar as necessidades metabólicas de um animal para avaliar a adequação da dieta e do programa de alimentação; uma vaca holandesa aos três meses pós-parto necessita de uma dieta completamente diferente daquela de uma vaca seca. O alimento pode parecer nutricionalmente adequado, mas é adequado às necessidades do trato digestivo do animal e é palatável? Uma dieta concentrada de cereais e uréia é adequada para uma vaca de leite e a silagem de gramíneas é palatável? O escore de condição corporal, ou seja, a avaliação da cobertura de gordura dorsal, é uma boa forma de se avaliar a adequação da dieta. É relativamente fácil de desenvolver-se um sistema de pontuação, por exemplo, de 1, muito magra, a 5, muito gorda. Livre de desconforto Livre de desconforto inclui conforto físico e térmico, assim como um fluxo de ar adequado (mas livre de correntes) e boa qualidade do ar em termos de poeira e gases nocivos, tais como amônia. Se você não dispõe de equipamentos para medir poeira e amônia, use seu olfato – se é aversivo para você, é provável que também o seja ao animal. Dê atenção especial ao piso: textura, qualidades térmicas, limpeza, probabilidade de escorregões e se é convidativo a se deitar. A área é suficientemente iluminada e o programa de iluminação (para replicar as variações diurnas) é utilizado para comodidade dos animais? As instalações são frias ou quentes, os animais estão ofegantes ou amontoados ou se deitando nas áreas de escoamento de fezes/urina? A iluminação pode afetar o bem-estar de várias formas. Uma quantidade de luz aumentada permite boa inspeção dos animais, encoraja comportamento social, promove padrões diurnos “normais”, tais como o ato da galinha de se empoleirar; uma quantidade de luz diminuída pode reduzir interações agressivas. Como contexto, os níveis típicos de iluminação em granjas de frangos de corte são de 3 a 10 lux. Os níveis de luz são medidos utilizando-se um luxímetro. Níveis típicos obrigatórios para a inspeção de carne são de 1.200 lux; a 50 lux uma pessoa normal torna-se capaz de discernir as letras em um jornal comum. Em muitas criações intensivas, a intensidade e a duração da luz são ajustadas para o aumento da produção (por exemplo, para causar muda forçada) – isto é prejudicial ao bem- estar das galinhas. Livre de dor e doenças Os animais podem estar todos saudáveis durante o seu exame, mas existe um programa veterinário assegurando que os mesmos estejam protegidos de doenças, tais como parasitas? As medidas de biossegurança são apropriadas e adequadas – existe infra- estrutura disponível para a prevenção da entrada de doenças na propriedade, tais como pedilúvio e roupas protetoras específicas da propriedade? Existe a infra-estrutura adequada para o tratamento? Existem meios de se realizar eutanásia imediata e humanitária no caso de ferimento severo? Que mutilações são realizadas, são elas necessárias, as pessoas que as realizam estão adequadamente treinadas e todo o equipamento é mantido limpo ou esterilizado? As agulhas são utilizadas apenas uma vez e descartadas de forma adequada? (Muitos produtores tendem a reutilizar agulhas e a utilizar medicamentos com prazo expirado, sem perceber o dano causado ao animal e a probabilidade de desqualificação da carcaça devida a abscessos e doenças.) Os animais são geneticamente adequados ao sistema de criação? Alguns podem ser mais bem adaptados a sistemas mais extensivos. Livre para expressar comportamento normal Comportamentos extremamente anormais, tais como estereotipias, são imediatamente óbvios, porém raramente você terá tempo suficiente para observar o comportamento por um período longo. Lutas, devidas à competição por recursos ou às altas densidades de lotação, e lesões de pele, devidas ao comportamento agressivo, podem ser óbvias. Você também pode observar a probabilidade de que a maior parte do comportamento normal seja possível através do exame dos níveis de enriquecimento ambiental – palha para suínos, fardos para frangos de corte e densidade de lotação ou espaço disponível. Uma poedeira em gaiola com 320 cm2 de espaço de piso por 45 cm de altura não será capaz de realizar nenhum aspecto do seu repertório comportamental. Livre de medo e estresse Os graus de liberdade de medo e estresse que um animal possa ter dependerão de como ele é manejado pelo tratador, quão bem protegido de predadores e equipamentos barulhentos ele se encontra e se ele pode fugir da agressão de animais no mesmo grupo. Bem-estar de animais de produção: Causas de bem-estar pobre É importante ser capaz de distinguir entre bem-estar pobre inerente ao tipo de sistema de criação que você está avaliando e, desta forma, difícil ou impossível de corrigir imediatamente, e problemas de bem-estar causados por manejo inadequado ou recursos insuficientes, os quais podem surgir em qualquer sistema e podem ser corrigidos mais facilmente. É importante que você concentre sua energia em problemas de bem-estar que você, com a ajuda do produtor, possa ser capaz de resolver. Os médicos veterinários também têm um papel na recomendação de reforma/substituição de sistemas mais velhos e podem recomendar sistemas que tenham maior potencial de bem-estar, isto é, sistemas que não tenham características que, de forma inerente, diminuam o bem-estar. Discutiremos o conceito de “potencial de bem-estar” dos diferentes sistemas de criação de maneira mais completa a seguir. Ao se tentar resolver um problema de bem-estar, é útil identificar a causa básica. As causas básicas de muitos problemas de bem-estar incluem: negligência, onde cuidados insuficientes são dados aos animais; pressão para produção, onde as pessoas tentam aumentar a produtividade de um sistema através do aumento do número de animais mantidos em um dado momento ou através de um crescimento mais rápido; ou inadequação genética, onde animais reproduzidos para um sistema de criação são mantidos em outro. Causas de bem-estar pobre: Negligência • Falta de recursos • Treinamento/conhecimento insuficientes • Viés de subsídios • Baixa razão tratador/animal A negligência pode ser fruto de recursos insuficientes. Existem outras formas de se ter acesso aos recursos necessários? Se um produtor não pode contratar atenção veterinária, existe uma clínica mantida pelo governo nas redondezas? Se a construção de um abrigo com o propósito específico não pode ser paga, existe abrigo natural disponível? Como médico veterinário, você está numa posição excelente para atuar caso determine que o problema de bem-estar se deva a conhecimentosinsuficientes. É seu trabalho informar ao fazendeiro quais animais sentem dor, fome, estresse calórico e frustrações, da mesma forma que os humanos. Você também pode (e deve) explicar como ele pode aliviar estes problemas; um exemplo seria a recomendação do uso de cabresto para um burro em vez de amarrá-lo pela pata (que pode causar lesões). Às vezes o problema deve-se a um viés inapropriado de subsídios. Na Comunidade Européia (CE), por exemplo, ovinocultores vêm sendo subsidiados com base no número de animais por muitos anos, independentemente da produção, isto é um subsídio por cabeça, baseado no tamanho do rebanho. Naturalmente os fazendeiros recebem mais subsídios aumentando a lotação de suas terras para a maior quantidade possível de animais e, para melhorar a lucratividade, podem reduzir vacinações, alimentos, desverminação e o número de tratadores por cabeça. Inevitavelmente, isto resulta em severos problemas de bem-estar. A tempo, o sistema de subsídio na CE está prestes a mudar, de forma que o subsídio fique independente do número de animais. Um exemplo brasileiro seria o projeto Hungria, que propicia aos produtores de leite a aquisição de sêmen holandês no Ministério da Agricultura por R$ 3,00 a R$ 10,00 (valor no mercado comum em torno de R$ 90,00), com a facilidade de pagamento em até 5 vezes. O Brasil, pelo acordo, tem o compromisso de importar 226 mil doses de sêmen da Hungria. Aqui a distorção que compromete o bem-estar dos animais é o estímulo da utilização de animais altamente selecionados para produção de leite, que talvez não consigam se adaptar à realidade das propriedades onde serão criados, cujos responsáveis nem sempre recebem o devido treinamento ou têm as condições financeiras e de infra-estrutura adequadas para fornecer aos animais o suprimento de suas altas necessidades alimentares e exigências ambientais. O incentivo à utilização de genética importada como medida isolada leva ao grau extremo de desrespeito às Cinco Liberdades (de fome e sede, de desconforto, de dor, lesões e doenças) que se observa em alguns rebanhos de gado holandês no Brasil. Existe pouco que um médico veterinário individual possa fazer a campo para afetar diretamente esta situação, exceto apontar ao produtor suas responsabilidades para com o bem-estar de seus animais. Entretanto, você está na posição de reconhecer o problema e trazê-lo à tona para as autoridades competentes (estas podem ser as organizações de proteção animal, a polícia local ou funcionários de ministério). Isto, entretanto, somente ataca os sintomas. Para atacar as causas, aqueles responsáveis por alterações na política de subsídios têm de ser informados das conseqüências não-intencionais de suas políticas. Causas de bem-estar pobre: Pressão para produção Os problemas principais de bem-estar na produção intensiva ou “agroindústria/agronegócio” devem-se às pressões para produção. A pecuária intensiva é movida pela eficiência e aqueles que administram essas indústrias podem esquecer que estão lidando com seres capazes de sentir emoções em vez de mercadorias. Para aumentar lucros é necessário diminuir custos. Por exemplo, nos países onde a mão-de-obra é cara, inevitavelmente opta-se por reduzir o número de funcionários. Quando levado ao extremo, isto pode ser literalmente um desastre para o bem-estar animal. Nos EUA existem granjas de suínos com uma taxa de 1.000 porcas para um único funcionário – ele não tem oportunidade nem de ver todos os seus animais em um dia, muito menos de tratar deles, sendo que as considerações a respeito do bem-estar de cada porca serão impedidas por pressão do tempo de trabalho. As margens de lucro por área de manutenção dos animais e o retorno do investimento de capital feito em instalações e infra-estrutura podem ser aumentados com a manutenção de um maior número de animais por metro quadrado. Perus, nos EUA, podem ser alojados em até 70 kg de aves por metro quadrado de piso. Os animais podem ser selecionados para o aumento de produção em detrimento do seu bem-estar. A foto mostra uma vaca holandesa em uma propriedade do Noroeste dos EUA. Apesar do parto recente levar a certo grau de edema de úbere, agravando de forma temporária o aumento do volume das glândulas mamárias, salta aos olhos a desproporcionalidade entre o tamanho do úbere e o corpo do animal. Pode-se questionar, de imediato, o grau de diminuição do seu conforto, devido ao úbere exageradamente grande, durante atividades de rotina como, por exemplo, deitar-se para ruminar. Note também que a fazenda adota o corte de cauda como procedimento de rotina. O maior problema para a vaca leiteira em países desenvolvidos é a exaustão metabólica e fome crônica, devidas a produções de leite de mais de 9.000 kg por lactação. Talvez seja possível alimentar adequadamente esses animais ou assegurar seu bem-estar em algumas poucas fazendas muito especializadas e com excelentes recursos, porém, na maioria das fazendas, isto não é possível. Como médico veterinário, você tem a responsabilidade de chamar a atenção dos fazendeiros para os controles legais para o bem-estar animal em todos os países – esses controles não têm exceções por causa de imperativos econômicos. Causas de bem-estar pobre: Inadequação genética Como exemplo de inadequação genética, considere uma porca selecionada para alta produção mantida confinada (espaço suficiente apenas para se levantar e se deitar) e parindo em gaiolas parideiras. Se ela for transferida a um sistema de criação ao ar livre, ela provavelmente esmagará seus leitões e, tendo pouca pelagem, estará sujeita a queimaduras solares e a estresse por frio. Ela é geneticamente inadequada ao sistema. De forma similar, uma vaca de leite é geneticamente programada para produzir leite, independentemente da dieta. Se ela é transferida a um sistema a pasto com alimentação concentrada inadequada ou inexistente, ela continuará a produzir leite, porém se tornará muito magra e com fome crônica. Ela é geneticamente inadequada a este regime nutricional. O potencial de bem-estar dos sistemas de criação 1 • Sistemas de manutenção • Tipo de seleção genética • Regime alimentar • Práticas de criação que envolvam dor Uma outra forma de se pensar sobre o bem-estar de animais de produção é em termos do potencial de bem-estar dos diferentes sistemas de produção. As maiores preocupações com o bem-estar surgem a partir de métodos de produção animal com baixo potencial de bem- estar. Estes são sistemas que deixam de suprir as necessidades fisiológicas e comportamentais dos animais criados, tais como a criação industrial de poedeiras, desta forma causando sofrimento. Então, o que significa o potencial de bem-estar de um sistema de produção? De início, é importante reconhecer que altos níveis de recursos humanos e manejo são pré-requisitos para qualquer operação de produção animal de sucesso. Entretanto, o potencial para se atingir altos padrões de bem-estar está inevitavelmente ligado a e limitado pelo sistema de criação utilizado. Existe um número de fatores que afetam o potencial de bem-estar de qualquer método de produção animal. Estes incluem: • Sistemas de manutenção – sistemas de confinamento acentuado, tais como as gaiolas industriais para poedeiras, ou sistemas que restrinjam a expressão comportamental, que têm baixo potencial de bem-estar. Sistemas ao ar livre ou em instalações com animais soltos, onde os animais são mantidos em ambientes mais enriquecidos, têm mais alto potencial de bem-estar • Reprodução – animais que foram reproduzidos seletivamente para características produtivas à custa de critérios de bem-estar terão mais baixograu de bem-estar • Regimes alimentares – quando os animais recebem uma dieta que assegura alta produção, mas talvez não conduza à manutenção de saúde e vitalidade normais, existe baixo potencial de bem-estar • Práticas de criação – tais como mutilações (castração, corte de cauda, debicagem etc.), que provavelmente causem dor ou estresse resultarão em bem-estar diminuído. Estas práticas geralmente são realizadas para lidar com os sinais de sistemas de criação pobres O potencial de bem-estar dos sistemas de criação Um exemplo clássico de potencial de bem-estar pode ser encontrado na área de produção de ovos. Em gaiolas industriais, o ambiente lotado e estéril é tão restritivo que as necessidades comportamentais e fisiológicas das aves são frustradas. Como resultado as aves sofrem. A natureza restritiva das gaiolas comerciais é uma parte inerente do sistema. As gaiolas comerciais são, desta forma, um sistema de baixo potencial de bem-estar. Não importa quantos funcionários e cuidados você dispense às aves nesse sistema, o seu bem-estar permanecerá pobre e o sofrimento inevitável. Um sistema ao ar livre, no entanto – com seu espaço e ambiente enriquecido – tem um alto potencial de bem-estar. Obviamente, se os níveis de recursos humanos forem pobres ou os tratadores negligentes, as aves sofrerão. Porém, altos padrões de funcionários deve ser uma obrigação, não uma opção, em qualquer sistema de produção animal. Similarmente, uma unidade mal desenhada também pode ter um efeito negativo sobre o bem-estar dos animais. Entretanto, como os problemas não são uma parte inerente do sistema, eles podem ser ajustados ou melhorados. O ponto é que os problemas nestes sistemas ao ar livre podem ser resolvidos através de melhorias de desenho ou manejo, permitindo que o potencial de bem- estar do sistema seja atingido de forma integral. Exemplos de sistemas de criação animal com baixo potencial de bem-estar incluem: • Animais em sistemas de confinamento acentuado – gaiolas industriais para poedeiras, porcas em gaiolas de manutenção e gaiolas parideiras, gaiolas de vitela para bezerros • Métodos de produção animal em massa, onde animais são mantidos em ambientes estéreis e superlotados – criação de frangos de corte e perus, por exemplo, assim como engorda intensiva de suínos, produção de salmão em tanques, produção intensiva de gado bovino em confinamento fechado (tais como os sistemas “bovinos de cevada” (“barley beef”) e os pátios de engorda bovina ao ar livre estilo americano) etc. • Métodos fisiologicamente intensivos – tais como frangos de corte de crescimento rápido, vacas leiteiras de alta produção etc. Sistemas e práticas de produção animal com baixo potencial de bem-estar, que causem dor ou sofrimento aos animais, são eticamente inaceitáveis. Em termos gerais, existe um espectro de potencial de bem-estar. Este vai de sistemas altamente intensivos no extremo de baixo bem-estar (sistemas de confinamento fechado como as gaiolas industriais para poedeiras), passando pelos sistemas fechados menos intensivos (ex.: produção de ovos em galinheiros com aves soltas no interior), até os sistemas extensivos ao ar livre, tais como animais soltos, no extremo alto do espectro. Bem-estar de animais de produção – porcas Até aqui neste módulo, estudamos as principais causas de bem-estar pobre em animais de produção e como avaliar o bem-estar. Agora, vamos estudar um exemplo para ilustrar estes princípios. Aplicaremos nosso sistema de avaliação para verificar o bem-estar de porcas em diferentes sistemas de criação. Mas, antes que possamos entender os problemas principais de bem-estar, assim como as vantagens de cada sistema, precisamos entender os principais sistemas de criação utilizados para porcas. Sistemas de criação de porcas Existem três sistemas principais de manutenção de porcas quando elas estão gestantes e sem leitegada: instalações fechadas com animais soltos, baias ou amarras e ao ar livre. Estudando o primeiro deles, as porcas soltas em instalações cobertas são mantidas em grupos, em construções com ambientes controlados. A especificação exata de um sistema com instalações fechadas e animais soltos varia. O tamanho dos grupos varia de 4 a mais de 100 e os pisos podem ser total ou parcialmente ripados, de concreto sólido ou com uma camada fina ou espessa de cama de palha. A alimentação é geralmente restrita, uma vez que as porcas se tornam facilmente obesas graças à seleção genética para crescimento rápido. Um alimentador eletrônico para suínos (ESF) despeja no cocho quantidades de alimento calculadas por computador quando acionadas por um sensor acoplado a um colar; suínos alimentados via sistema ESF podem ser mantidos em grupos grandes, para compensar o custo de investimento nestes alimentadores. Em outras instalações de alojamento em grupo, a alimentação pode ser atirada ao chão para encorajar o comportamento de fuçar; neste caso é fornecido ao grupo todo uma quantidade total de alimentos apropriada ao estágio de gestação e, desta forma, os grupos tendem a ser menores. Entretanto, existe certo risco nestes sistemas de que porcas menos dominantes não recebam alimentação suficiente. A alimentação em baias individuais previne este problema, através do confinamento individual durante a alimentação, de forma que cada porca possa receber individualmente suas necessidades diárias totais. Ainda existem sistemas de alimentação para porcas “ad libitum”, geralmente uma “sopa” de leite e restos de indústrias de alimentos, fornecida através de encanamento, sendo que o alimento não é restrito; nestes sistemas, as porcas podem não ser alimentadas um dia na semana, para prevenir que fiquem obesas. As porcas sentirão fome neste dia. Este é um confinamento fechado com animais soltos e cama abundante, mostrado aqui com leitões. À primeira vista, parece que o bem-estar é muito bom para estas fêmeas. Como médico veterinário, você será capaz de analisar a situação com mais detalhes. Como já mencionamos, a primeira coisa a fazer é usar as Cinco Liberdades como referência. Dado o contexto das porcas da foto anterior, podemos construir a tabela acima. Claramente, devemos observar de perto, mais que simplesmente ver uma foto, para avaliarmos o bem- estar. Isto enfatiza a necessidade de se diferenciar entre problemas de bem-estar evitáveis e inerentes, como discutidos anteriormente. O sistema com cama espessa de palha não apresenta problemas inerentes, porém não saberemos sobre os problemas evitáveis até que uma análise mais elaborada seja conduzida. Como avaliar o bem-estar? As Cinco Liberdades: porcas em feno abundante Podem estar sujeitas à agressão de outros animais do mesmo grupo Medo e estresse Muito bom – podem preferir cama de madeira em decomposição ou casca de árvore Para expressar comportamento normal Exame clínico – feridas na pele ou articulações inchadas? Dados veterinários – desverminação, vacinação, tratamento quando doente? Dor, lesões e doenças Conforto físico muito bom, conforto térmico muito bom – controlado pela porca; qualidade do ar – existe poeira? Desconforto Avaliar o escore de condição corporal e inspecionar a qualidade e quantidade de alimentos Fome e sede AvaliaçãoLivre de Este é um sistema de baias. Em um sistema de amarras, as porcas são presas por uma corrente ao redor do pescoço. O piso pode ser total ou parcialmente ripado ou de concreto sólido, com um canal de esgoto na parte posterior das baias. Em ambos os sistemas, as porcas são mantidas sem possibilidade de fuçar, se exercitar ou se virar durante toda a gestação. Como antes, precisamos ver de perto,mais que somente observar uma foto, para avaliar o bem-estar. A tabela das Cinco Liberdades pode ser novamente construída – se o sistema não pode ser mudado, o problema inerente (e inevitável) é o comprometimento significativo da habilidade de expressar comportamento normal. Igualmente, a qualidade do piso pode gerar um desconforto considerável a partir de lesões nas patas e as porcas experimentam uma dificuldade considerável de “se aconchegarem” ao deitar. Porcas ao ar livre geralmente têm abrigos com cama de palha ao pasto. Elas dão à luz no abrigo, sendo que a palha fornece material para a construção do ninho. Mais uma vez, devemos avaliar o bem-estar com base nas Cinco Liberdades. O que parece inicialmente um sistema excelente em termos de bem-estar dos animais pode não ser adequado para alguns suínos. Alguns pastos podem ser inadequados – onde a terra tem pedras (ou é pantanosa) ou onde área sombreada ou poça não estão disponíveis. O principal motivo de se permitir acesso ao pasto – para permitir o comportamento de fuçar – pode ser vencido por preocupações ambientais. O fuçar excessivo (ou por um número excessivo de animais em área muito pequena) leva a pastagens danificadas e barrentas, desprovidas de vegetação, cujo solo fica passível de erosão para cursos d’água. Em alguns casos são utilizados anéis de focinho para a prevenção do fuçar excessivo, o que em si é um assunto de bem-estar, uma vez que causa dor aos suínos. Entretanto, este é um sistema com potencial de bem-estar muito alto. Questões primárias de bem-estar – sistemas de confinamento fechado com porcas soltas • Animais soltos – agressão/medo, desconforto, tédio – Brigas – Mordedura de vulva – Restrição de comportamento normal em sistemas sem cama (ripados totais/parciais ou pisos de concreto) Vimos que cada fazenda deve ser avaliada individualmente para propósitos de bem-estar. Entretanto, existem problemas inerentes que caracterizam sistemas de criação específicos e afetam o potencial de bem-estar destes sistemas, os quais você deve ter em mente antes de visitar uma fazenda para fazer a avaliação do bem-estar. Na maioria dos sistemas de criação em confinamento fechado com animais soltos existe sofrimento por agressão em graus variados pelas porcas dominantes, causando medo nos animais subordinados. Isto pode levar a lutas, ferimentos de pele e mordeduras na vulva. Este problema pode ser exacerbado por altas densidades de lotação e falta de cama para fuçar e brincar. Estes problemas podem ser reduzidos pela provisão de espaço adicional, cama e barreiras no sistema, que permitam a fuga dos animais subordinados para escapar dos animais dominantes do mesmo grupo. Questões primárias de bem-estar – sistemas de baias ou amarras 1 Quais são as implicações de baias ou amarras para o bem-estar? • Tédio/restrição do comportamento normal • Restrição do movimento • Desconforto físico • Infecção do trato urinário • Ferimentos nas patas • Ferimentos das amarras Este é um sistema com potencial de bem-estar muito baixo. Muitos dos problemas sérios de bem-estar são inerentes ao sistema. Os principais problemas associados aos sistemas de baia ou amarras são a restrição severa a movimentos e comportamento normais, o desconforto físico e os ferimentos nas patas. A tendência a infecções do trato urinário também fica aumentada. Porcas amarradas também freqüentemente têm ferimentos causados pelas amarras que podem ser severos. Estereotipias, tais como morder as barras de contenção ou as correntes, também são freqüentemente vistas nesses sistemas, provavelmente resultantes da severa restrição comportamental. Sistemas de baias e amarras são ilegais em muitos países, incluindo o Reino Unido. Sistemas de amarras serão ilegais em toda a União Européia ao fim de 2005. Sistemas de baias serão ilegais na UE a partir de 2012. Questões primárias de bem-estar – porcas em sistemas de criação ao ar livre • Sistemas ao ar livre – estresse por calor/frio, queimadura solar, ferimentos nas patas e anéis no focinho – Inadequação genética – Falta de abrigo/poças – Ferimentos nas patas devidos à presença de pedras no chão – Anel no focinho para evitar danos à pastagem Como já discutimos, os problemas potenciais de porcas ao ar livre são estresse por calor/frio, queimaduras solares, ferimentos nas patas e anel no focinho. As porcas podem ser geneticamente inadequadas para esses sistemas, o pasto pode não ser adequado para suínos ao ar livre devido à ausência de abrigos ou poças ou à presença de pedras causando ferimentos nas patas. Adicionalmente, a colocação de anel no focinho pode ser realizada para se prevenir danos ao pasto e, por sua vez, previne o comportamento normal de fuçar. Os recursos humanos são fundamentais para se evitar estes problemas de bem-estar. Questões primárias de bem-estar – porcas em gaiolas parideiras Muitos sistemas de produção intensiva de suínos utilizam gaiolas parideiras. A porca é levada à gaiola parideira até 1 semana antes do parto e ali permanece até que os leitões sejam desmamados, com 3 ou 4 semanas de idade. O principal objetivo é a redução do número de leitões esmagados pela porca. Os problemas inerentes principais de bem-estar de porcas em gaiolas parideiras são severa restrição de comportamento normal, doença e desconforto. Existe evidência científica forte de que porcas são tão motivadas* a construir um ninho nas 36 horas antes do parto quanto a comer, um comportamento cuja expressão não é possível em gaiolas parideiras em função da ausência de material para a construção do ninho. A restrição de movimentos leva a aumento nos níveis de distocia e infecções do trato urinário se comparado a confinamento com animais soltos. Os altos níveis de esmagamento de leitões parecem ser devidos a uma combinação de leitegadas grandes por seleção genética e um deitar “desajeitado” pelo desconforto e pela má forma física devida à falta de exercício. *Motivação: conjunto de fatores psicológicos (conscientes ou inconscientes) de ordem fisiológica, intelectual ou afetiva, os quais agem entre si e determinam a conduta de um indivíduo. Módulo 20 Este módulo tem dois objetivos: • Primeiramente, equipar você, como médico veterinário, com informações para auxiliá-lo durante uma visita a uma fazenda. Se sabe o que provavelmente encontrará em um dado sistema de criação, você está mais bem equipado para identificar e quantificar o problema. • Em segundo lugar, equipá-lo com informações sobre os sistemas de produção de forma que você possa assessorar adequadamente produtores ou legisladores quando for consultado sobre os méritos relativos e pontos fracos dos diferentes sistemas. Seu treinamento como médico veterinário o preparou para prestar consultoria sobre produção e doenças – este módulo o capacitará para consultoria em bem-estar. Para cada espécie de animal de produção, estudaremos os principais sistemas de produção, os problemas inerentes de bem-estar de cada um deles e as mutilações realizadas rotineiramente. Bem-estar de animais de produção: suínos • Porcas • Leitões • Leitões desmamados • Suínos de terminação Os sistemas de produção de suínos podem ser classificados: para porcas, para leitões não desmamados, para leitões desmamados e para animais de terminação. Em uma visita a uma fazenda de reprodução, você também deve querer inspecionar as acomodações do cachaço. Os problemas inerentes dos sistemas de criação de porcas foram estudados no Módulo 19. Leitões: principais questões de bem-estar • Esmagamento • Mutilações • Desmame precoce Os principaisproblemas de bem-estar para leitões incluem o risco de esmagamento pela porca. Como discutido no Módulo 19, os altos níveis de esmagamento de leitões são creditados a uma combinação de leitegadas anormalmente grandes, graças à seleção genética, com um deitar “desajeitado” pela porca devido ao desconforto e à pobre condição física pela falta de exercício. A utilização das gaiolas parideiras previne amplamente o esmagamento de leitões, porém causa uma restrição comportamental severa à porca. Leitões: exemplos de mutilações • Corte de dentes • Corte de cauda • Castração Os dentes caninos de leitões são freqüentemente cortados com alicate ou lixados com um aparelho elétrico aos 2 ou 3 dias de idade, sem um agente anestésico. A razão dada para este procedimento é que os dentes pontiagudos danificam a face dos outros leitões e as tetas da porca. Não está claro por que alguns produtores não cortam os dentes e, mesmo assim, não têm problemas com ferimentos faciais nos leitões ou nas tetas das porcas. O corte de dentes é um procedimento muito doloroso, e todas as fazendas deveriam, pelo menos, tentar um período sem ele, uma vez que talvez não seja necessário. A cauda dos leitões é geralmente cortada aos 2 ou 3 dias de idade, sem agente anestésico, mesmo na União Européia, onde é ilegal sem prescrição veterinária. As caudas podem ter apenas a porção distal removida ou serem cortadas proximalmente, deixando somente poucas vértebras coccígeas. As caudas são cortadas para a prevenção de sua mordedura em porcos de engorda. Existem muitos aspectos da criação de suínos que são suspeitos de contribuir para um surto de mordeduras de cauda, entre os quais ambientes estéreis (pisos parcial ou totalmente ripados sem cama) e altas densidades de lotação, apesar de que algumas vezes a mordedura pode acontecer em pisos com palha em baixas densidades de lotação. Se as caudas são rotineiramente amputadas em uma fazenda, a densidade de lotação da engorda deve ser reduzida e enriquecimento ambiental, preferencialmente com material para fuçar, deve ser fornecido. A maioria dos suínos é castrada sem agente anestésico aos 2 ou 3 dias de idade. Isto é realizado para se prevenir a formação da “carne de cachaço”, com um odor forte e característico que é causado pela presença de um hormônio na carne de suínos machos. Alguns mercados se preocupam menos com este odor e suínos abatidos mais jovens (menos de 90 kg) têm baixos níveis de odor. Adicionalmente, algumas raças têm taxas naturalmente menores do hormônio que induz o odor que outras. Leitões: desmame precoce • Mudança abrupta de dieta causando diarréia • Perda de contato materno • Sistema imune imaturo e susceptibilidade a doenças • Ambientes estéreis, tédio e restrição do comportamento normal Em condições naturais, leitões são desmamados entre 7 e 12 semanas de idade. Para se aumentar o número de leitões produzidos por uma porca em cada ano, o desmame geralmente ocorre entre 3 e 4 semanas. A mudança abrupta de dieta geralmente causa diarréia e a imaturidade do sistema imune aumenta a susceptibilidade a doenças. Isto é exacerbado pelo estresse de uma perda abrupta do contato materno e por ambientes estéreis. Muitos dos sistemas de cercados com piso puro utilizados são estéreis, causando tédio e restrição do comportamento normal. Sistemas de criação: suínos de engorda 1 • Totalmente ripado • Parcialmente ripado – área de descanso sólida e de dejetos ripada • Concreto – áreas de descanso e dejetos separadas, canais de escoamento de dejetos • Palha ou outros substratos • Ao ar livre Sistemas de criação para suínos de engorda podem ter pisos totalmente ripados; parcialmente ripados com uma área sólida para descanso e uma ripada para dejetos; pisos de concreto com áreas de descanso e dejetos separadas, onde o canal de escoamento de dejetos é varrido por máquina; pisos com palha ou outros substratos ou sistemas ao ar livre. Substrato é qualquer material que possa ser manipulado, utilizado para cama, tal como cepilho. Sistemas de criação: suínos de engorda Cercados parcialmente ripados, naturalmente ventilados, formam um ambiente muito estéril e mordeduras de cauda podem acontecer. O conforto térmico pode ser difícil de ser obtido tanto em clima quente quanto frio. Cercados com palha fornecem excelente conforto térmico e físico, assim como um substrato adequado para o comportamento normal. Os problemas principais para suínos de engorda são altas densidades de lotação, ambientes estéreis e resultantes mordeduras de cauda, flanco e orelhas, instalações escuras com alta amônia atmosférica e conseqüentes taxas altas de doenças respiratórias. Sistemas de criação: frangos de corte O bem-estar animal deve ser avaliado levando-se em consideração o bem-estar de todos os animais que contribuem para um produto alimentício. Assim, apesar do frango de corte ser o produto final, o bem-estar das aves reprodutoras e dos grupos de elite (onde existe seleção genética para melhoria na produtividade) também deve ser incluído. Alguns consumidores preferem comer aves criadas soltas ou por produção orgânica, onde métodos profiláticos artificiais não são utilizados. Frangos de corte sofrem de muitos dos problemas de suínos em sistemas muito intensivos, apesar de serem menos agressivos que os suínos e o canibalismo ser muito incomum. São geralmente mantidos em um ambiente controlado; em instalações estéreis e escuras há densidades de lotação tão altas quanto 45 kg de aves por metro quadrado. As aves orgânicas soltas ao ar livre terão mais espaço e acesso ao pasto, sendo desta forma capazes de desempenhar comportamentos mais naturais. Entretanto, essas aves podem estar menos protegidas de doenças introduzidas por aves silvestres e mais susceptíveis à predação por mamíferos e aves silvestres. Todos os principais problemas de aves de corte surgem a partir de uma combinação de seleção genética para crescimento rápido com altas densidades de lotação nas instalações. A indústria da carne de frango tem por objetivo aumentar a taxa de crescimento dos frangos de corte de forma a reduzir o tempo para atingir idade de abate em um dia por ano – e tem conseguido alcançar esse objetivo pelos últimos 40 anos. Um frango de consumo em 1960 teria sido abatido entre 10 e 12 semanas com 2 kg; hoje ele é abatido entre 40 e 42 dias com 2 kg. Isto resultou em uma ave muito pesada sobre ossos das patas cartilaginosos e imaturos, que são facilmente deformados quando jovens, levando a altos níveis de deformidade de patas. Além disso, altas densidades de lotação culminam com cama úmida, altamente contaminada por bactérias nas instalações de frangos de corte. Aves mancas ficam nessa cama contaminada, que causa queimaduras por amônia nos pés, articulações das patas e peito; isto é denominado “dermatite por contato”. Nesse cenário as bactérias prontamente invadem as lesões de pele causando doenças, especialmente infecções ósseas. O sistema circulatório também recebe uma sobrecarga pesada pelo tamanho excessivo da ave, e a falta de ar em função da insuficiência cardíaca é comum. Claramente, essas aves foram selecionadas para altas taxas de crescimento e estão, desta forma, programadas para serem extremamente famintas. Não se pode permitir que as aves reprodutoras cresçam à mesma taxa das aves de corte, pois se tornariam incapazes de se reproduzir entre 16 e 21 semanas de idade, graças à incapacidade de suas patas de suportar seu peso. Essas aves são mantidas em dieta muito restrita e passam por fome severa. Aves de elite passam por um grau ainda maior de fome. Inicialmente, são alimentadasà vontade para se avaliar desempenho e, então, aquelas selecionadas sofrem restrição alimentar severa para reduzi-las a um peso compatível com reprodução. Densidades de lotação muito altas podem resultar em baixa qualidade do ar, especificamente altos níveis de amônia e poeira. Altos níveis de morte por causa de estresse calórico foram relatadas, seja em conseqüência de sistemas de ventilação inadequados ou de falências dos sistemas. Como vimos até o momento, sistemas intensivos tendem a favorecer ambientes estéreis e escuros, e o caso de frangos de corte não é uma exceção. A escuridão encoraja taxas de crescimento aumentadas pela supressão tanto de atividade quanto de comportamento agressivo. Sugere-se que agressão reduzida melhora bem-estar, porém este é um argumento falso. Os genótipos de frangos de corte utilizados comercialmente hoje não tendem à agressividade e em sistemas intensivos muitas aves não têm mobilidade devido à claudicação. Para contextualizar, os níveis de luz típicos em granjas de frangos de corte variam de 3 a 10 lux. Os níveis de luz são medidos utilizando-se um luxímetro. Níveis típicos requeridos para inspeção de carne são 1.200 lux. A 50 lux uma pessoa comum começa a discernir as letras em uma impressão padrão de jornal. Apesar de que as aves em sistemas soltos ao ar livre possam exibir mais comportamentos naturais, existem problemas significativos. Aves geneticamente selecionadas para sistemas intensivos são freqüentemente utilizadas em sistemas ao ar livre. Graças à sua alta taxa de crescimento, essas aves podem estar sujeitas à fome pelos regimes de restrição alimentar necessários para se cumprir os requerimentos legais de idade ao abate (56 dias na Europa). Raças de crescimento mais lento reduziriam este problema. Além disso, muitos sistemas de produção ao ar livre e orgânicos são pobremente cercados e pode haver cobertura insuficiente. A mortalidade pode ser alta por predação, levando a medo nas aves que permanecem. Os genótipos de aves modernos foram selecionados para crescer nas dietas modernas de engorda, que incluem muitos micronutrientes, alguns dos quais sintéticos. Estes micronutrientes foram adicionados durante os últimos 30 anos para superar causas metabólicas de claudicação, resultante de taxas de crescimento mais altas. Padrões orgânicos proíbem a inclusão de nutrientes sintéticos na dieta e isto resulta em um ressurgimento de problemas nas patas, para cuja solução foram desenvolvidas as dietas incluindo nutrientes sintéticos. Também pode haver um problema com bicadas de penas em aves orgânicas, que pode ser devido a deficiências na dieta ou ao genótipo das aves utilizadas. A maioria destes problemas ocorre graças a uma raça inapropriada, podendo ser melhorado com a utilização de raças de crescimento mais lento. Com a raça correta, muitas aves nestes sistemas extensivos têm bom estado de bem-estar. Em outras palavras, o potencial de bem- estar deste sistema é alto. O total potencial de bem-estar do sistema pode ser alcançado quando são utilizados a raça apropriada de aves e os níveis adequados de manejo. Os principais sistemas de criação de poedeiras são: gaiolas industriais, galinheiros e galpões de poleiros e soltas ao ar livre, associado ou não à produção orgânica. Na União Européia, onde as gaiolas industriais têm de ser eliminadas até o ano 2012, “gaiolas enriquecidas” desenhadas para suprir necessidades comportamentais (incluindo caixa para ninho, poleiro, substrato para banho de areia e espaço adicional) permanecerão legais. Ainda não está claro se estes sistemas serão economicamente viáveis. O espaço fornecido atualmente em sistema de gaiolas industriais é de 320 cm2 (17,9 x 17,9 cm) por ave nos EUA a 550 cm2 (23,5 x 23,5 cm) na Europa; este último sendo aproximadamente o tamanho de uma folha de sulfite A4. A alimentação, o fornecimento de água e a colheita dos ovos são automatizadas. Em alguns países as poedeiras são submetidas à “muda forçada”, através de restrição severa de alimentos, água e às vezes luz, por até duas semanas, com o objetivo de fazer retornar a postura. Um tratador pode ser responsável por vários galpões, e em cada um podem existir dezenas de milhares de aves. Galpões de poleiros oferecem às aves mais liberdade comportamental que gaiolas. Caixas ou áreas coletivas para construção de ninho são fornecidas. Alguns sistemas, entretanto, podem ser utilizados em densidades de lotação muito altas. Assim como nas gaiolas industriais, a remoção das aves das instalações pode levar a altos níveis de fraturas. O principal problema inerente para poedeiras, em todos os sistemas de criação, é representado pelas fraturas ósseas, tanto durante o ciclo de postura quanto durante a remoção das aves das instalações. Isto se deve à seleção genética para alta produtividade, reduzindo os níveis de cálcio no organismo. Para comparação, uma matriz de frangos de corte produz aproximadamente a metade do número de ovos de uma poedeira, com aproximadamente 150 ovos por ano. Os níveis de fratura encontrados em poedeiras variam com o sistema de criação. Fraturas durante um ciclo completo são menos freqüentes em gaiolas industriais do que em galpões de poleiros e galinheiros. Entretanto, a fraqueza óssea crônica é inerente às gaiolas industriais. Em gaiolas industriais, altas densidades de lotação e gaiolas estéreis restringem severamente todos os comportamentos normais, incluindo bater as asas, ciscar, caminhar, fazer ninho, tomar banho de areia e empoleirar-se. Aves em sistemas de colônia têm mais espaço (em comparação com sistemas de gaiolas industriais) para liberdade comportamental e têm possibilidade de interagir com outras aves. Companhias comerciais geralmente mantêm as aves em grupos de tamanho grande. As aves não são capazes de formar uma hierarquia estável em grupos com mais de 100 animais. Isto leva a altos níveis de bicadas agressivas nas penas, medo, estresse e alta mortalidade. Existe alto grau de medo entre aves que talvez não consigam caminhar pela extensão necessária. A impossibilidade de se movimentar pode ser exacerbada por cobertura inadequada da área e proteção deficiente contra predadores, da mesma forma que para aves de corte. Por causa da necessidade de rotação de áreas, estas podem ser estreitas e compridas, aumentando desta forma a distância à periferia e reduzindo a motivação para movimentação. Os danos causados pelas bicadas agressivas são reduzidos pela “apara” ou amputação do bico. Existe uma quantidade considerável de trabalhos demonstrando que as aves passam por uma dor considerável quando utilizam bicos amputados, que são altamente inervados, podendo ocorrer a formação de neuromas na superfície de corte. Questões principais de bem-estar: debicagem Pintos são debicados por termocauterização no primeiro dia de vida. Isto é realizado através de uma lâmina de metal quente, que corta e cauteriza o bico. Isto será doloroso para a ave se uma quantidade grande de bico for removida. Galos: exemplos de mutilação • Debicagem • Remoção de dedos e esporas • Castração • Remoção de cristas e barbelas Os galos utilizados para reprodução, tanto de poedeiras quanto de frangos de corte, são também rotineiramente debicados para se reduzir danos a outras aves durante bicadas agressivas. A remoção de dedos é rotineira no pinto de um dia de idade para a redução de ferimentos às galinhas durante a cruza. Os galos podem ser castrados para encorajar a produção de gordura. Cristas e barbelas podem ser removidas para se reduzir os ferimentos em sistemas de restrição de alimentos através da cobertura de cochos comgrades. Também podem ser removidas para se prevenir ferimentos durante brigas. Esta é uma operação de rotina em galos de corte, onde a seleção genética para altas taxas de ganho de peso torna essencial uma restrição alimentar severa. Algumas dessas mutilações podem ser ilegais em certos países. Todas podem causar dor severa e restrição de comportamento. Questões principais de bem-estar: vacas leiteiras 1 Os principais sistemas de criação de vacas leiteiras têm baias e cercados com palha ou concreto. Para bezerros, os principais sistemas são gaiolas de vitelo e grupos em cercados com palha. Quais são as questões de bem-estar para vacas leiteiras? • Claudicação • Desconforto na área de descanso • Mastite • Gaiolas de vitelo Em sistemas de criação de vacas leiteiras, um problema de bem-estar se refere ao preparo do rufião. No preparo de rufiões para a identificação das vacas no cio, as quais serão inseminadas, são utilizadas técnicas cirúrgicas que provocam ou o desvio lateral ou a aderência ou a fixação do pênis do touro, não permitindo que ele penetre a fêmea. Tais intervenções, além dos inconvenientes próprios de qualquer procedimento cirúrgico nessa região anatômica, como o surgimento de grandes edemas pós-cirúrgicos, no caso da aderência e da fixação do pênis, ainda são responsáveis por dor intensa sentida pelo macho toda vez que este tenta, e não consegue, fazer a exposição do órgão diante da fêmea no cio. A seleção genética para alta produção aumentou a produção de leite por lactação de aproximadamente 3.000 kg por lactação na vaca Friesian para mais de 9.000 kg por lactação na vaca Friesian-holandesa, nos últimos 30 anos. Este estresse levou a um aumento na susceptibilidade a infecções, especialmente mastite e laminite. A vaca leiteira também é susceptível a doenças metabólicas e fome. Úberes aumentados causam desconforto e anormalidade no andar, que, por sua vez, leva a problemas nas patas em função de o peso do animal ser deslocado para os dedos laterais nos membros pélvicos. Os principais problemas em sistemas de baias incluem: • Baias insuficientes para o número de animais, levando as vacas a ficarem por muito tempo em pé, especialmente as subordinadas e as novilhas jovens • Desenho inadequado das baias (geralmente muito curtas ou muito estreitas): insuficiente área para se levantar*, divisões sólidas e pouca ou nenhuma cama causam desconforto, dificuldade para se deitar, cama/concreto sujos e mastite • Uso de silagem causa dejetos úmidos, ácidos e doenças de casco, e concreto excessivamente liso pode levar a escorregões *Área para se levantar = área necessária na frente do animal para permitir um movimento livre da cabeça durante o ato de se levantar Baias antigas podem ser muito curtas, muito estreitas com divisões sólidas ou ter espaço insuficiente para o animal se levantar e altura insuficiente do degrau. Um problema principal inerente aos sistemas de produção de leite em países desenvolvidos é a separação dos bezerros de suas mães no momento do parto ou logo após. Esta prática causa prejuízos ao bem-estar, tanto para a vaca quanto para o bezerro, por causa da perda do contato materno, e predispõe o bezerro a doenças, em função de seu sistema imune imaturo. O volume de leite que seria ingerido pelo bezerro é pequeno em comparação à produção de leite de uma vaca leiteira moderna. A vantagem econômica de um bezerro saudável pode superar os custos por causa do leite fornecido ao bezerro. Adicionalmente, a produção de leite de vacas leiteiras aumenta quando elas são ordenhadas mais freqüentemente; deixar o bezerro com a mãe pode aumentar a produção total de leite e reduzir mastite. As gaiolas de vitelo para a criação de bezerros causam problemas severos de bem-estar em conseqüência da restrição do comportamento normal, incluindo comportamento oral, locomotor e social, assim como das deficiências nutricionais, tais como de fibra e ferro. As gaiolas são tão estreitas que os bezerros logo se tornam incapazes de se virar ou exercitar. Os níveis de doenças e infecções, tais como pneumonia e doenças intestinais, são altos, e os bezerros passam por desconforto físico severo. Estes sistemas são ilegais em alguns países e se tornarão ilegais em toda a União Européia a partir de 2007, para bezerros com mais de 8 semanas. A descorna envolve a remoção dos botões dos chifres utilizando-se agentes químicos cáusticos ou termocauterização durante a primeira semana de vida. Infelizmente, os bezerros às vezes são consideravelmente mais velhos que isso quando a operação é realizada, freqüentemente sem um agente de anestesia local. Isto é ilegal em muitos países. Os chifres são removidos para facilitar o manejo dos animais e diminuir ferimentos a outros animais. Os chifres podem ser removidos em animais adultos que não sofreram descorna quando pequenos, utilizando-se uma serra de lâmina ou fio e termocautério. A anestesia local raramente é empregada. A reprodução de raças mochas para se evitar a necessidade de descorna deve ser fortemente encorajada. A castração é realizada cirurgicamente ou pela compressão do suprimento sangüíneo e cordão espermático, geralmente nas primeiras semanas de vida, apesar de que, em alguns países que utilizam sistemas extensivos, eles podem ser bem mais velhos que isso. Estudos têm demonstrado que todos os métodos de castração causam um grau significativo de dor, tanto aguda quanto crônica. A castração é realizada para facilitar o manejo dos animais, apesar de que alguns países criam com sucesso uma alta proporção de machos não castrados (touros) para a produção de carne; a Alemanha produz cerca de 70% da sua carne a partir de touros. O corte de cauda é utilizado em alguns países, tais como Nova Zelândia e Estados Unidos, rotineiramente, com o objetivo de diminuir o contágio de doenças, incluindo leptospirose, e melhorar o conforto do ordenhador. As caudas são removidas pela aplicação de um anel de elástico para constrição aproximadamente 12 cm abaixo da vulva e, duas semanas depois, secionando-se a cauda com aparadores de casco ou instrumentos agudos similares. Isto, comprovadamente, produz dor aguda e crônica. Existe pouca evidência de diminuição de contágio de doenças pela amputação da cauda e vários estudos fracassaram na tentativa de mostrar algum efeito desta amputação na condição de limpeza da vaca. Questões principais de bem-estar: gado de corte Questões de bem-estar em bovinos de corte incluem: • Descorna • Marcação a quente • Colocação de brincos • Marcação a frio A descorna acaba de ser descrita. Marcação a quente envolve a utilização de um ferro quente para se queimar uma marca de identificação na pele. É realizada sem anestesia e, de forma similar a você se queimar em um fogão ou com um ferro, é muito dolorosa. Brincos podem ser utilizados para identificação, apesar de que os mesmos podem ser removidos se o gado for roubado. Marcação a frio imprime uma marca permanente através da utilização de um ferro super-resfriado em gelo-seco; pensa-se que também seja dolorosa. Bezerros de corte podem ser removidos da mãe logo após o nascimento e passar por problemas similares àqueles de bezerros de leite: estresse pela separação, doenças intestinais e respiratórias surgindo a partir do estresse e da imaturidade do sistema imune. Bezerros mantidos com a mãe, que esteja amamentando somente o seu bezerro, geralmente gozam de maior grau de bem-estar. Gado de corte pode ser selecionado para taxa de crescimento e para aumento de tamanho dos cortes de carne mais valorizados. Isto resultou no desenvolvimento do gene paramusculatura dobrada no gado Belgian Blue, que por sua vez resultou na incapacidade de parir sem assistência das vacas Belgian Blue e algumas de suas cruzas. Estes animais têm problemas severos de bem-estar por causa da distocia, incluindo traumatismos ao canal do parto e infecções subseqüentes, paralisia do nervo obturador, retenção de placenta e as conseqüências de cesarianas, tais como dor, aumento do risco de infecção e complicações pós-operatórias. Bovinos que passam o inverno em pisos totalmente ripados, sem cama, são geralmente lotados em alta densidade, uma vez que se defende esta prática sob a alegação de ser necessária para que os animais forcem os dejetos através das ripas para o tanque de esterco abaixo. O espaço fornecido para um novilho de 600 kg pode ser tão pequeno quanto 2,2 m2; aqueles deitados tanto sofrem de desconforto quanto estão sujeitos a serem pisoteados pelos outros animais. A principal preocupação quanto ao bem-estar de bovinos em sistemas confinados ao ar livre é a exposição ao clima sem abrigo. Bovinos de corte a pasto têm poucos problemas de bem-estar, desde que haja abrigos e que o pasto não se torne lamacento em função de superlotação em clima úmido. Este animal de corte foi selecionado para aumentar o tamanho dos cortes de carne mais valorizados. Vacas gestando estes animais freqüentemente passam por um parto difícil e traumatismo de canal de parto ou por uma cesariana. Outras questões de bem-estar Cabras e ovelhas de montanha podem ser tratadas com negligência por causa de seu baixo valor. Elas são suscetíveis a fome, doenças e parasitas em conseqüência da falta de profilaxia e tratamento. Problemas específicos incluem claudicação em conseqüência da podridão de cascos, pneumonia por pasteurela e miíase, com postura de ovos de moscas em ferimentos ou lã suja de fezes, os quais então se desenvolvem para larvas. Em alguns países os problemas são exacerbados pela superlotação das pastagens; ex.: devido a sistemas de subsídio que pagam por número de animais no rebanho. Mutilações comumente realizadas em ovinos incluem castração para facilitar o manejo e melhorar o acabamento de carcaça, amputação de cauda e, em alguns países, “mulesing” para reduzir a susceptibilidade a miíase. “Mulesing” é a remoção de uma área de pele na região perineal, com a formação de tecido cicatricial; existe evidência que este procedimento, para o qual não se utiliza anestesia, é muito aversivo. A transferência de embriões em ovelhas atualmente envolve implantação cirúrgica de embriões, com a dor e os riscos associados, e é considerada por muitos como causadora de dor e estresse desnecessários. Fazendas de peixes trabalham com altas densidades, o que impede comportamento normal e aumenta o risco de parasitas e outras doenças. Os criadores, especialmente aqueles que recebem consumidores em sistema pesque-pague ou na venda varejista, não praticam a insensibilização nesses animais. Desta forma, a observação de peixes ainda conscientes sendo manipulados para remoção de escamas, barbatanas e de seus órgãos internos é comum nesse tipo de criação. Um novo procedimento para abater crustáceos é apresentado por Hugh Wirth, presidente da Royal Society for the Prevention of Cruelty to Animals: ao invés de jogar lagostas vivas em panelas de água fervente para matá-las, método cruel e que envolve grande sofrimento para o animal, Wirth sugere que as lagostas sejam adormecidas num refrigerador ou freezer e depois mortas - partidas ou perfuradas. Esse método já é seguido há muitos anos por Jill Mure, cuja família mantém restaurantes na Tasmânia há quase 30 anos, e ele garante que há tempos utiliza a prática de resfriar e adormecer as lagostas no freezer, estando convencido de ser esse um modo bem melhor de abate. Perus geralmente são criados em ambientes intensivos e controlados, em instalações iluminadas artificialmente (similares àquelas utilizadas para frangos de corte), e em densidades de lotação muito altas, freqüentemente excedendo 60 kg de ave por metro quadrado de espaço de piso. Perus são muito mais agressivos a outros aves do mesmo grupo que frangos de corte e, desta forma, têm de ser mantidos em níveis muito baixos de luz, usualmente com menos de 1 lux. Altas densidades de lotação e iluminação escassa impedem a maior parte do comportamento normal. Coelhos são geralmente criados em gaiolas comerciais similares àquelas de poedeiras e, da mesma forma, sofrem com ambientes estéreis, espaço de piso inadequado e gaiolas muito baixas, que os impedem de manter uma posição em pé normal. Patos são freqüentemente criados em ambientes intensivos e controlados, em instalações iluminadas artificialmente (similares àquelas utilizadas para frangos de corte), em densidades de lotação muito altas. Além disso, algumas raças sofrem de traumas por bicos e unhas pontiagudos. Geralmente não têm acesso à água para se banhar, que é uma necessidade para seu comportamento normal. Em alguns países, gansos e patos são alimentados de maneira forçada durante as últimas semanas de vida, para a obtenção de fígados com acúmulo de muita gordura, para a produção final de ‘patê de foie gras’. Um tubo é inserido em seu trato digestivo através da boca e uma mistura de milho, gordura e sal é colocada diretamente no estômago. Vários países têm leis que proíbem a produção de foie gras, entre eles Dinamarca, Alemanha, Luxemburgo, Noruega e Polônia. Em 2003 entrou em vigor, no quarto produtor mundial de foie gras, Israel, legislação proibindo a atividade. As ações do médico veterinário naqueles países onde esse tipo de produção ainda não é proibida devem envolver esclarecimentos sobre a atividade para legisladores, conscientização do público consumidor e uma explicação dos procedimentos utilizados aos produtores com intenção de adotar o sistema. No Brasil, o Decreto Federal nº 24.645/34 considera maus-tratos, e proíbe em seu artigo 3º inciso XXV, “engordar aves mecanicamente”. Patos são freqüentemente criados em ambientes intensivos e controlados, em instalações iluminadas artificialmente (similares àquelas utilizadas para frangos de corte), em densidades de lotação muito altas. Além disso, algumas raças sofrem de traumas por bicos e unhas pontiagudos. Geralmente não têm acesso à água para se banhar, que é uma necessidade para seu comportamento normal Em alguns países, gansos e patos são alimentados de maneira forçada durante as últimas semanas de vida, para a obtenção de fígados com acúmulo de muita gordura, para a produção final de ‘patê de foie gras’. Um tubo é inserido em seu trato digestivo através da boca e uma mistura de milho, gordura e sal é colocada diretamente no estômago. Vários países têm leis que proíbem a produção de foie gras, entre eles Dinamarca, Alemanha, Luxemburgo, Noruega e Polônia. Em 2003 entrou em vigor, no quarto produtor mundial de foie gras, Israel, legislação proibindo a atividade. As ações do médico veterinário naqueles países onde esse tipo de produção ainda não é proibida devem envolver esclarecimentos sobre a atividade para legisladores, conscientização do público consumidor e uma explicação dos procedimentos utilizados aos produtores com intenção de adotar o sistema. No Brasil, o Decreto Federal nº 24.645/34 considera maus-tratos, e proíbe em seu artigo 3º inciso XXV, “engordar aves mecanicamente”. Resumo: questões de bem-estar Em resumo, um sistema de criação deve ser delineado para se adequar às necessidades de manutenção de saúde e bem-estar dos animais mantidos. Sete indicações-chave de que talvez esta não seja a situação são listadas abaixo. O bem-estar de animais em qualquer sistema de criação é provavelmentebaixo se mutilações de rotina são realizadas ou se existem ferimentos causados pelo sistema, como feridas de amarras ou de agressão. Se os animais têm baixo escore de condição corporal, geralmente visto em vacas de leite de alta produção alimentadas inadequadamente, ou apresentam estereotipias, tais como morder barras da gaiola em porcas, isto pode ser tomado como evidência conclusiva que os animais estão num estado de bem-estar pobre. Um número de animais com locomoção prejudicada em uma fazenda, geralmente visto em granjas de frango de corte, é uma indicação clara de um sistema de bem-estar pobre. Qualquer sistema que requeira uso rotineiro de antibióticos para a manutenção de animais saudáveis, como em muitas granjas de suinocultura intensiva, provavelmente está escondendo comprometimentos do bem-estar. E, finalmente, das nossas sete pistas, qualquer sistema que requeira a manutenção dos animais com iluminação muito baixa não é adequado aos animais que abriga. Quando você entrar em qualquer fazenda, busque informações sobre mutilações de rotina, ferimentos do sistema ou por agressão, animais com baixo escore de condição corporal, estereotipia, locomoção comprometida, uso de antibióticos de rotina e instalações escuras. Dirão a você que são “inevitáveis” ou que, se os antibióticos e as mutilações não forem empregados rotineiramente, o resultado será um comprometimento maior do bem-estar dos animais. Isto pode ser o caso para aquele sistema de criação específico – mas é o sistema que não é adequado aos animais e é o sistema de criação que deve ser mudado. Em outras palavras, aquele sistema de criação específico tem baixo potencial de bem-estar. Avaliação do bem-estar de animais de produção – o que verificar: •Mutilações de rotina •Ferimentos do sistema/de agressões •Condição inadequada dos animais •Estereotipias •Locomoção prejudicada •Uso de antibióticos de rotina •Instalações escuras Avaliação – resumo Avaliação do bem-estar animal na fazenda: • Avaliar o bem-estar com base nas Cinco Liberdades – quais são os problemas? • Para cada problema – por que está acontecendo? • É um problema inerente ou evitável? • Que ações podem ser tomadas para a sua prevenção? Em resumo, se você for consultado para avaliar o bem-estar de uma fazenda, utilize as Cinco Liberdades, modificadas para se adequarem ao sistema de produção que você está avaliando. A melhor forma de se avaliar cada Liberdade é examinar o animal, observar as instalações e os equipamentos, observar os dados da fazenda e os sistemas de manejo ou pela observação ou entrevista do tratador. Para cada problema de bem-estar, você têm de discernir uma causa. Será devido a pressões por produção, negligência, falta de conhecimentos ou treinamento dos tratadores, inadequação genética dos animais para o sistema ou falta de recursos? Você deve então decidir se o problema é inerente ao sistema ou evitável. Mesmo problemas inerentes podem ser melhorados com fornecimento de enriquecimento ambiental, mais espaço ou novo grupamento de animais. Agora você está em posição de decidir o que pode fazer para melhorar o bem-estar dos animais da fazenda em questão. Melhoria de bem-estar • Assessoria – Melhoria do sistema de criação – Mudança do sistema de criação • Legislação – Requisitos mínimos para cada sistema – Proibição de certos sistemas • Mercado – Consumidores podem buscar padrões de bem-estar mais altos Médicos veterinários têm um papel claro quanto à assessoria de seus clientes no impacto de bem-estar do sistema de criação. Este apoio pode ser no sentido de melhorar o sistema atual ou de mudar o sistema de forma mais fundamental. Para animais de produção, esta assessoria deve ser dentro de um contexto econômico. Entretanto, em muitas situações, melhorias no bem-estar (ex.: redução nos níveis de doença) culminarão em melhorias na lucratividade. A legislação (desde que associada à aplicação e fiscalização) pode trazer melhorias reais no bem-estar, através da proibição de sistemas de baixo potencial de bem-estar e da criação de requisitos mínimos para cada sistema. O mercado é uma outra influência significativa. Alguns consumidores buscam produtos associados a padrões mais altos de bem-estar. Varejistas em muitos países também estão incluindo demandas crescentes para os fornecedores no sentido de melhorar o padrão de bem-estar. A motivação principal para os varejistas é evitar publicidade negativa em relação ao bem-estar animal. Médicos veterinários podem ter uma influência em todas essas áreas Bibliografia • WEBSTER, J., 1995: Animal Welfare: A Cool Eye towards Eden. Oxford, Blackwell Science ISBN 0632039280 • FRASER, A. F. & BROOM, D. M. 1996: Farm Animal Behaviour and Welfare. 3rd Ed. CABI Publishing, ISBN 0851991602 • Farm Animal Welfare Council (FAWC) reports on website www.fawc.org.uk • Compassion in World Farming website at www.ciwf.co.uk
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