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HISTORIA DA AFRICA I web (1)

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História da África I 
 TROL 
História da África I 
Érika do Nascimento Pinheiro 
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çã
o 
História da África I 
 
 
P654hPinheiro, Érika do Nascimento. 
História da África I / Érika do Nascimento Pinheiro ; 
revisão de Walter P. Valverde Júnior. 1. ed. – Niterói, RJ: 
EAD/UNIVERSO, 2011. 
264 p. : il 
 
 1. África - História. 2. Escravidão - África - História. 3. 
Escravos - Tráfico. 4. África - Política social. I. Valverde Júnior, 
Walter P. II. Título. 
 
 CDD 960 
 
DIREÇÃO SUPERIOR 
Chanceler Joaquim de Oliveira 
Reitora Marlene Salgado de Oliveira 
Presidente da Mantenedora Wellington Salgado de Oliveira 
Pró-Reitor de Planejamento e Finanças Wellington Salgado de Oliveira 
Pró-Reitor de Organização e Desenvolvimento Jefferson Salgado de Oliveira 
Pró-Reitor Administrativo Wallace Salgado de Oliveira 
Pró-Reitora Acadêmica Jaina dos Santos Mello Ferreira 
Pró-Reitor de Extensão Manuel de Souza Esteves 
 
DEPARTAMENTO DE ENSINO A DISTÂNCIA 
Assessora Andrea Jardim 
 
FICHA TÉCNICA 
Texto: Érika do Nascimento Pinheiro 
Revisão Ortográfica: Walter P. Valverde Júnior 
Projeto Gráfico e Editoração: Ruan Carlos Vieira Fausto 
Supervisão de Materiais Instrucionais: Janaina Gonçalves de Jesus 
Ilustração: Eduardo Bordoni e Fabrício Ramos 
Capa: Eduardo Bordoni e Fabrício Ramos 
 
COORDENAÇÃO GERAL: 
Departamento de Ensino a Distância 
Rua Marechal Deodoro 217, Centro, Niterói, RJ, CEP 24020-420 www.universo.edu.br 
 
Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca Universo – Campus Niterói 
 
 
Bibliotecária: ANA MARTA TOLEDO PIZA VIANA – CRB 7/2224 
 
© Departamento de Ensino a Distância - Universidade Salgado de Oliveira 
Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta publicação pode ser reproduzida, arquivada ou transmitida de nenhuma forma 
ou por nenhum meio sem permissão expressa e por escrito da Associação Salgado de Oliveira de Educação e Cultura, mantenedora 
da Universidade Salgado de Oliveira (UNIVERSO). 
História da África I 
 
 
 
Informações sobre a disciplina 
 
Nome da disciplina: História da África 
Carga horária : 75 h 
Créditos: 04 
Ementa: 
África: mitos e a-historicidade. O continente africano: mulheres e homens e a 
paisagem. Questões teóricas e metodológicas para o estudo da história africana. 
África em movimento: a expansão Banto. A penetração do Islã e comércio 
transaariano. As diferentes escravidões. A formação das sociedades subsaarianas. 
Os contatos com os europeus. Antigas e novas rotas comerciais. A formação do 
Mundo Atlântico e os africanos como sujeitos históricos na formação do Novo 
Mundo. 
Objetivo: 
O curso pretende discutir questões postas para a História da África. Debater 
sobre a existência de uma identidade africana, as possibilidades de um ponto de 
vista africano para a construção dessa história e como fazer história da África a 
partir do Brasil. Para tanto, propõe identificar e discutir a dinâmica dos processos 
culturais, sociais e políticos próprios ao continente africano entre os séculos XI e 
XIX. Problematizar concepções associadas ao continente, como afrocentrismo e 
eurocentrismo. Pensar nos desafios teóricos e metodológicos para estudar sua 
história. Analisar as transformações ocorridas com a penetração do cristianismo e 
do Islã, pelo deserto do Saara, assim como os contatos com os europeus, pelo 
Atlântico. Entender que a expansão do amálgama religioso-cultural do Islã trouxe 
transformações para as sociedades convertidas e identificar a noção anacrônica de 
que os europeus colonizaram o continente já nos primeiros contatos sem levar em 
conta que africanos foram sujeitos históricos nas novas relações estabelecidas. 
História da África I 
 
 
Conteúdo Programático: 
 
UNIDADE 1: A África inventada: preconceitos, desafios e métodos 
 África: mitos e a-historicidade. 
 Desafios: eurocentrismo, etnocentrismo e afrocentrismo. 
 Métodos e fontes: a busca de um ponto de vista africano. 
 
UNIDADE 2: O continente africano 
 África, berço da humanidade. 
 O continente: mulheres e homens e a paisagem. 
 A África na Antiguidade 
 
UNIDADE 3: Instituições políticas e sociais da África Ocidental 
 Comércio, cristianismo e islamismo. 
 Formações políticas da África Ocidental: Dogon, Gana, Mali, Songhai, 
Iorubas, Haussa. 
 
UNIDADE 4: Expansão Banto e instituições políticas e sociais da África Central 
 África em movimento: Expansão Banto. 
 Formações políticas da África Central: Congo, Luba, Ndongo e 
Monomotapa. 
 Desvendando o outro: africanos e europeus: o encontro, da escravidão 
à comercialização atlântica de escravos e a formação do Mundo Atlântico: 
africanos como sujeitos históricos. 
História da África I 
 
 
Referências 
 
Bibliografia básica: 
 
FAGE, J. D. História da África. Lisboa: Edições 70, 1995. 
M’BOKOLO, Elikia. África Negra: História e Civilizações. Lisboa: Editora Vulgata, 
2003. 
SILVA, Alberto da Costa. A enxada e a lança: a África antes dos 
portugueses. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2006. 
 
Bibliografia complementar: 
 
GIORDANI, Mário Curtis. História da África, anterior aos descobrimentos. 5 ed. 
Petrópolis, RJ: Vozes, 2007. 
LOVEJOY, Paul. A escravidão na África: uma história de suas transformações. 
Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002.NIANE, D.T. (Coord.). História Geral da 
África. São Paulo: Ática,1985. Vol. 4. 
SARAIVA, José Flávio. Formação da África Contemporânea. São Paulo: Ática, 
1990. 
SOUZA, Marina de Mello e. África e Brasil Africano. São Paulo: Ática, 2006. 
THORNTON, John. África e os africanos na formação do mundo Atlântico, 1400-
1800. Rio de Janeiro: Campus, 2003. 
História da África I 
 
 
História da África I 
 
 
Palavra da Reitora 
 
Acompanhando as necessidades de um mundo cada vez mais complexo, 
exigente e necessitado de aprendizagem contínua, a Universidade Salgado de 
Oliveira (UNIVERSO) apresenta a UNIVERSO Virtual, que reúne os diferentes 
segmentos do ensino a distância na universidade. Nosso programa foi 
desenvolvido segundo as diretrizes do MEC e baseado em experiências do gênero 
bem-sucedidas mundialmente. 
São inúmeras as vantagens de se estudar a distância e somente por meio 
dessa modalidade de ensino são sanadas as dificuldades de tempo e espaço 
presentes nos dias de hoje. O aluno tem a possibilidade de administrar seu próprio 
tempo e gerenciar seu estudo de acordo com sua disponibilidade, tornando-se 
responsável pela própria aprendizagem. 
O ensino a distância complementa os estudos presenciais à medida que 
permite que alunos e professores, fisicamente distanciados, possam estar a todo 
momento ligados por ferramentas de interação presentes na Internet através de 
nossa plataforma. 
Além disso, nosso material didático foi desenvolvido por professores 
especializados nessa modalidade de ensino, em que a clareza e objetividade são 
fundamentais para a perfeita compreensão dos conteúdos. 
A UNIVERSO tem uma história de sucesso no que diz respeito à educação a 
distância. Nossa experiência nos remete ao final da década de 80, com o bem-
sucedido projeto Novo Saber. Hoje, oferece uma estrutura em constante processo 
de atualização, ampliando as possibilidades de acesso a cursos de atualização, 
graduação ou pós-graduação. 
Reafirmando seu compromisso com a excelência no ensino e compartilhando 
as novas tendências em educação, a UNIVERSO convida seu alunado a conhecer o 
programa e usufruir das vantagens que o estudar adistância proporciona. 
 
Seja bem-vindo à UNIVERSO Virtual! 
Professora Marlene Salgado de Oliveira 
Reitora
História da África I 
 
História da África I 
 
 
 
 
Sumário 
 
Apresentação da disciplina ............................................................................................................. 10 
Plano da disciplina .............................................................................................................................. 11 
Unidade 1 –A África inventada: preconceitos, desafios e métodos................................. 14 
Unidade 2 – O Continente africano.............................................................................................. 71 
Unidade 3 –Instituições políticas e sociais da África Ocidental......................................... 128 
Unidade 4 –.Expansão Banto e instituições políticas e sociais da África........................ 194 
Considerações finais........................................................................................................................... 254 
Conhecendo a autora ........................................................................................................................ 256 
Referências............................................................................................................................................. 257 
Anexos ................................................................................................................................................... 258 
 
História da África I 
10 
 
Apresentação da Disciplina 
 
A Disciplina História África I propõe introduzir-nos nos estudos sobre a História 
da África, de modo a problematizar as visões comumente associadas ao continente 
pelo senso comum. Debater sobre alguns mitos e preconceitos que apareceram na 
literatura sobre a África e até hoje se encontram presentes nos livros didáticos e no 
senso comum. 
Discutir aspectos do continente africano do ponto de vista físico e histórico. 
Lançar um novo olhar sobre as diferentes formas de narrativas deixadas por 
africanos ao longo do tempo e compreendê-las como produção historiográfica 
legítima e singular. A diversidade lingüística e a nova regionalização africana: as 
seis macrorregiões. Refletir sobre a África na Antiguidade: as relações entre religião, 
poder e arte. 
Alisar os contatos das diversas sociedades africanas com o exterior pelos 
mares Vermelho e Mediterrâneo e o Oceano Índico. Perceber como a expansão do 
cristianismo e do islamismo no continente trouxe mudanças significativas. Como 
os diversos amálgamas cultural-religiosos contribuíram para mudar as relações 
sociais e na construção de novas práticas sociais assim como mudanças na 
arquitetura. Refletir sobre as formações políticas e sociais da África Ocidental e 
Centro-Ocidental possibilitando a formação de um olhar crítico sobre os que 
procuram ver essas sociedades como uma coisa só. 
Compreender o funcionamento da instituição escravista no continente 
africano, objetivando a identificação os diferentes tipos de escravidão praticados 
no continente e compreender as mudanças que a instituição sofreu com a chegada 
dos muçulmanos no século VIII e dos europeus no século XV. Entender como se 
deram os primeiros contatos entre africanos e portugueses a partir do século XV, 
desmistificar a noção anacrônica de que os europeus colonizaram ou civilizaram o 
continente desde os primeiros contatos, como também jogar luz nas discussões 
sobre os diversos sujeitos históricos que se estabeleceram nessas relações. 
Utilizaremos, para tanto, a metodologia da micro-história e dos jogos de 
escala. A conjunção dos dois métodos permite olhar para o micro sem perder de 
vista o macro. Analisar uma dada sociedade africana não significa isolá-la de seu 
contexto mais amplo tanto dentro do continente como as ligações 
transcontinentais. 
História da África I 
11 
 
Plano da Disciplina 
 
Esta disciplina tem como objetivo discutir questões postas para a História da 
África. Debater sobre a existência de uma identidade africana, as possibilidades de 
um ponto de vista africano para a construção dessa história e como fazer história 
da África a partir do Brasil. Para tanto, propõe identificar e discutir a dinâmica dos 
processos culturais, sociais e políticos próprios ao continente africano entre os 
séculos XI e XIX. Problematizar concepções associadas ao continente, como 
afrocentrismo e eurocentrismo. Pensar nos desafios teóricos e metodológicos para 
estudar sua história. Analisar as transformações ocorridas com a penetração do 
cristianismo e do Islã, pelo deserto do Saara, assim como os contatos com os 
europeus, pelo Atlântico. Entender que a expansão do amálgama religioso-cultural 
do Islã trouxe transformações para as sociedades convertidas e identificar a noção 
anacrônica de que os europeus colonizaram o continente já nos primeiros contatos 
sem levar em conta que africanos foram sujeitos históricos nas novas relações 
estabelecidas 
Assim esta disciplina foi subdividida em quatro unidades, das quais faremos 
um pequeno resumo de seus respectivos objetivos para lhe dar uma visão geral do 
que será abordado no conteúdo. 
 
Na Unidade 1 - A África inventada: preconceitos, desafios e métodos 
Em nossa primeira unidade refletiremos sobre questões teóricas que envolvem 
a produção da história da África e percorreremos o ponto de vista africano uma 
análise dessa história. Desconstruiremos mitos e preconceitos que obstaculizam os 
estudos mais profundos sobre o continente. 
Objetivos: 
 Analisar a construção de mitos e preconceitos forjados por uma 
produção historiográfica baseada no evolucionismo e no pensamento 
conservador do século XIX. 
 Desconstruir a concepção de que a África seria um continente a-
histórico. Refletir sobre os desafios metodológicos que se colocam para 
História da África I 
12 
 
uma produção historiográfica do ponto de vista africano – 
eurocentrismo, etnocentrismo, afrocentrismo, fontes orais e cronologia. 
 
Na Unidade 2 - : O continente africano 
Em nossa segunda unidade debateremos sobre aspectos do continente do 
ponto de vista físico e histórico. Como a Geografia, a Linguistica e a Arqueologia 
podem contribuir para os estudos africanos. Compreender características gerais da 
África na antiguidade. 
Objetivos: 
 Analisar as relações estabelecidas entre os aspectos físicos do 
continente e as formações sociais: possibilidades, dificuldades e 
movimentos. 
 Refletir sobre as concepções de tempo nas sociedades tradicionais e 
as diferenças linguísticas. 
 Compreender que a ideia de África como berço da humanidade foi 
utilizada, também, para uma valorização da história africana. Por fim, não 
menos importante, discutiremos o papel da África na Antiguidade. 
 
Na Unidade 3 - Instituições políticas e sociais da África Ocidental 
Em nossa terceira unidade faremos um estudo mais vertical sobre as 
sociedades da África Ocidental. Conheceremos os dogons, os mandingas, 
soninquês, haussas e iorubas, por exemplo e como estabeleceram-se como 
formações políticas e sociais. 
Objetivos: 
 Analisar as diversas relações estabelecidas entre africanos e 
estrangeiros. Compreender como ocorreu a expansão do Islã e do 
cristianismo no território africano. 
 Refletir sobre as formações sociais e políticas da África Subsaariana. 
As suas singularidades, práticas culturais, concepções de poder e relações 
História da África I 
13 
 
sociais. Como o comércio contribuiu para o fortalecimento ou não dessas 
sociedades. 
 
Na Unidade 4 - Expansão Banto e instituições políticase sociais da África 
Central 
Em nossa ultima unidade faremos um passeio pela África Centro-Ocidental e 
veremos os bantos, inclusive no momento de sua grande dispersão, a chamada 
Expansão Banto. Veremos como ocorreram os diversos contatos com os 
mercadores europeus e como os africanos participaram na formação do Mundo 
Atlântico. 
Objetivos - 
 Analisar como a Expansão Bantu como um dos movimentos 
migratórios mais importantes do continente africano. 
 Discutir sobre os aspectos gerais que formam as sociedades da 
África centro-ocidental. 
 Compreender como era o funcionamento da instituição escravista 
no continente e as transformações que ocorreram a partir dos contatos 
com muçulmanos e europeus. 
 Entender como ocorreram os primeiros contatos com os europeus e 
desconstruir a noção de que colonizaram e civilizaram o continente 
desde o início. 
 
 
Bons Estudos! 
História da África I 
14 
A África inventada: 
preconceitos, desafios e 
métodos 
África: mitos e a-historicidade. 
Desafios: eurocentrismo, etnocentrismo e afrocentrismo. 
Métodos e fontes: a busca de um ponto de vista africano 
1 
História da África I 
 
15 
 
Nesta unidade, Introduzir os alunos nos estudos sobre a História da África, de 
modo a problematizar as visões comumente associadas ao continente pelo senso 
comum. Discutiremos alguns mitos e preconceitos que apareceram na literatura 
sobre a África e até hoje se encontram presentes nos livros didáticos e no senso 
comum. A importância de se refletir sobre conceitos como eurocentrismo, 
etnocentrismo e afrocentrismo, assim como as relações estabelecidas entre a 
produção historiográfica e os mesmos. Pensar na produção de uma História da 
África a partir do ponto de vista africano, ou seja, que possibilite a compreensão 
das lógicas internas das diversas sociedades e quais as fontes privilegiadas para tais 
análises, como a tradição oral. As propostas para uma cronologia africana que 
possibilite compreender os processos históricos como diferenciados e não como 
subordinados aos fatos importantes europeus Desta forma, falar sobre a África 
constitui-se como um desafio para pesquisadores e professores e por isso a 
importância de começarmos um estudo abordando questões teóricas e 
metodológicas. 
 
Objetivos: 
 Analisar a construção de mitos e preconceitos forjados por uma 
produção historiográfica baseada no evolucionismo e no pensamento 
conservador do século XIX. 
 Desconstruir a concepção de que a África seria um continente a-
histórico. 
 Refletir sobre os desafios metodológicos que se colocam para uma 
produção historiográfica do ponto de vista africano – eurocentrismo, 
etnocentrismo, afrocentrismo, fontes orais e cronologia. 
História da África I 
 
16 
 
Plano da unidade: 
 África: mitos e a-historicidade. 
 Desafios: eurocentrismo, etnocentrismo e afrocentrismo. 
 Métodos e fontes: a busca de um ponto de vista africano 
 
 
 
 
 
Bons Estudos! 
História da África I 
 
17 
 
África: mitos e a-historicidade 
 
Para começo de conversa... 
Certa vez, em uma entrevista para a TV Brasil o apresentador, chamado 
Marcus, me questionou sobre a forma como os livros didáticos trabalhavam as 
questões da história indígena. Meu primeiro pensamento foi a Lei 10639/2003 que 
foi modificada, em 2008, pela Lei 11645. A última acrescentava ao Currículo Oficial 
a obrigatoriedade do ensino da História e Cultura Indígena. Devolvi a pergunta ao 
apresentador da seguinte forma: a promulgação de Leis mostra que foram histórias 
negligenciadas durante muito tempo. 
A implementação da Lei 10639/2003 possibilitou tratar de um tema que 
aparecia sempre de forma marginal no currículo escolar. Ausência injustificável, 
pois somos, em nossa grande maioria, descendentes de africanos. Há muito “afro” 
no âmbito particular e pouca “África” nos espaços coletivos e sociais (LOPES & 
ARNAUT, 2005, p. 7). Definia-se também uma data para a comemoração da 
“consciência negra” no calendário escolar, dando uma tradição cívica ao conteúdo 
que deveria ser trabalhado em sala de aula. 
Tarefa nada fácil, concorda?. Por muito tempo, o estudo da história brasileira 
tem deixado de lado uma de suas principais influências: aquela resultante da 
massiva presença, na América Portuguesa e no Brasil independente, de centenas 
de milhares de africanos escravizados, cujos costumes, visões de mundo e 
tradições ajudaram a moldar novas formas culturais que se mostraram marcantes 
no processo de definição da cultura e da identidade brasileiras. Devemos enfrentar 
tal desconhecimento, entendendo tanto como ele foi constituído como a 
multiplicidade de experiências que ele encobre. 
VAMOS REFLETIR 
Que África é essa? 
E como olhá-la a partir do Brasil? 
História da África I 
 
18 
 
Mitos 
Quando se fala em África, uma série de imagens e estereótipos vem a nossa 
cabeça. Visto como uma unidade, o continente costuma ser definido a partir de 
projeções feitas por um olhar estrangeiro que desconsidera, quase sempre, a 
imensa variedade de povos, culturas e costumes compreendidos numa 
determinada região. O primeiro passo será confrontar tais imagens (LOPES & 
ARNAUT, 2005, PP. 9-11). 
Quem nunca ouviu falar da maldição de Cã? Conta a Bíblia, em Gêneses, que 
da arca de Noé saíram seus três filhos: Sem, Cã e Jafet. A Terra fora povoada por 
eles e Cã era o pai de Canaã. Noé teria se embriagado e Cã viu seu corpo nu. Ao 
contar o fato aos irmãos, estes tomaram uma capa e cobriram o corpo do pai com 
os rostos voltados para não verem sua nudez. Quando despertou, soube o que fez 
seu filho mais novo e o amaldiçoou e a sua descendência a se tornarem escravos 
dos seus irmãos. Esta foi, por muito tempo, a justificativa ideológica dos europeus 
para a escravidão de negros. 
 
Maldito seja Canaã, disse ele; que ele seja o último dos 
escravos de seus irmãos! E acrescentou bendito seja o senhor Deus 
de Sem, e Canaã seja seu escravo. Que Deus dilate a Jafet; e este 
habite nas tendas de Sem, e Canaã seja seu escravo! 
(http://www.bibliacatolica.kit.net, acesso em 20/02/2011, 16h) 
 
Desta forma, os camitas, habitantes da África, tornaram-se os “naturais” 
escravos dos europeus, pois estavam marcados pelo pecado. E nos dias de hoje? 
Qualquer um que frequente salas de cinema ou assista televisão já se deparou com 
representações do continente africano que o define, de maneira geral, como o 
avesso da civilização, partindo de uma associação direta entre a África e o mundo 
da natureza. Produzidas a partir dos primeiros contatos dos europeus com a África, 
tais imagens ganharam traduções mais claras entre o final do século XIX e o início 
do XX – ao longo do processo de partilha da África, no bojo da corrida imperialista 
História da África I 
 
19 
 
que marcou a Europa no período. Vejamos como o pensamento conservador, 
apoiado na ciência do século XIX e seu viés racialista, forjou imagens da África. 
 
O pensamento conservador 
O conservadorismo, na segunda metade do século XIX, estabelece relações 
com o pensamento racial e passa a escalonar as sociedades. As explicações sobre o 
mundo deixam de ser dadas pelo sobrenatural, lugar do pensamento religioso, e 
passam a ser dadas pelo natural, lugar da ciência. A ciência definiu novos saberes e 
atribuiu a eles um sentido universal, posto que estivessem baseados na razão: 
como exemplo temos o saber médico que luta por legitimar seu campo frente a 
outras formas de cura (SILVEIRA, 1999, PP. 90-93). A ciência forjada como fruto 
desse processo, longe de se limitar às esferas biológicas da vida, viria a estenderseu alcance sobre as esferas sociais e políticas. 
 
“Organizar cientificamente a humanidade é, portanto a última 
palavra da ciência moderna é a sua audaciosa, porém legítima 
pretensão.” Ernest Renan (1823-1892) 
 
A ciência, no Oitocentos, transformou-se em forma privilegiada não só de 
interpretar, mas de gerir o mundo. Queria atribuir uma ordem à realidade de 
diferenças do mundo social, para tanto, adotou critérios das ciências naturais. 
Pretendia, também, estabelecer uma relação de causalidade entre as diferenças 
sociais e diagnosticar a realidade. Conseguiu isso com a utilização do conceito de 
raça. A nova ciência racial tinha uma perspectiva muito delimitada e por mais que 
se pretendesse neutra e objetiva ela partia de um pressuposto claro: a supremacia 
da raça branca europeia sobre os demais povos. 
Para tanto, utilizava o sistema classificatório forjado em fins do século XVIII 
quando o Homo sapiens foi: 
“[...] classificado em cinco variedades, cujas principais delas são 
sumariadas em seguida: 
História da África I 
 
20 
 
1-Homem selvagem. Quadrúpede, mudo, peludo. 
2-Americano. Cor de cobre, colérico, ereto. Cabelo negro, liso, 
espesso; narinas largas; semblante rude; barba rala; obstinado, 
alegre, livre. Pinta-se com finas linhas vermelhas. Guia-se por 
costumes. 
3- Europeu. Claro, sanguíneo, musculoso; cabelo louro, 
castanho, ondulado; olhos azuis; delicado, perspicaz, inventivo. 
Coberto por vestes justas. Governado por leis. 
4- Asiático. Escuro, melancólico, rígido; cabelos negros; olhos 
escuros, severo, orgulhoso, cobiçoso. Coberto por vestimentas 
soltas. Governado por opiniões. 
5- Africano. Negro, fleumático, 
relaxado. Cabelos negros, crespos; 
pele acetinada; nariz achatado, lábios 
túmidos; engenhoso, indolente, 
negligente. Unta-se com gordura. 
Governado pelo capricho” (BURKE apud HERNANDEZ, 2005, P. 19). 
Este sistema classificatório informou os discursos político-idelógicos que 
pretendiam hierarquizar o mundo a partir da proximidade ou não do padrão racial 
das elites europeias. No contexto da expansão do imperialismo pelo mundo, Le 
Bon advoga uma “classificação psicológica das raças” que hierarquiza os diferentes 
povos do planeta, de modo a estabelecer a supremacia incontestável dos brancos 
europeus. A evolução industrial moderna daquele século teria levado a uma 
progressiva divisão do trabalho que tenderia a reduzir a inteligência daqueles que 
se dedicam à produção, ou seja, os trabalhadores. 
Um representante exemplar desse momento foi o filósofo Friedrich Hegel. Na 
perspectiva de Hegel, os povos negros eram incapazes de se desenvolverem e 
receberem uma educação. A África subsaariana não teria condições de produzir 
história. Esta a-historicidade defendida por Hegel é constada em sua obra Filosofia 
de La historia natural. Nela o filósofo defende que a África propriamente dita 
(subsaariana) pode ser deixada de lado por não possuir interesse histórico. Nesta 
parte da África, classificada como a verdadeira África por ele, os homens viveriam 
na barbárie e na selvageria, sem fornecer elementos à civilização, “[...] é o país 
Fleumático : calmo, sereno, 
impassível 
Túmidos : inchados 
História da África I 
 
21 
 
criança, envolvido na escuridão da noite, aquém da luz da história consciente” 
(HEGEL, 1928, p. 187). Durante muito tempo pesquisadores e professores parecem 
ter partilhado as ideias de Hegel, pois é recente a avalanche de pesquisas sobre tal 
tema. A situação de grande parte do material didático é mais periclitante, pois 
salvo momentos pontuais, africanos e afrobrasileiros desaparecem dos livros sem 
deixar vestígios. 
 
Outra noção era fortemente partilhada – a ausência de códigos escritos de 
linguagem, principalmente na parte subsaariana. Soma-se ao fato de que a História 
estava se constituindo quanto disciplina obcecada pelo progresso e tinha nos 
documentos escritos sua verdadeira fonte legítima. Tornou-se natural, aos olhos 
dos historiadores, acreditar na impossibilidade de produção histórica da maioria
História da África I 
 
22 
 
dos povos africanos. Como o modelo de progresso europeu não se aplicava à 
África, foi tido como um continente a-histórico. Partindo desse pressuposto, a 
história produzida sobre o continente não foi a de suas sociedades e sim dos 
europeus nele. 
Esse ponto de vista imperou mesmo quando a história da África se tornou um 
campo legítimo de estudos. O grande interesse não era sobre os africanos e seu 
continente e sim sobre os europeus e suas modificações, o quanto de progresso 
haviam levado para os primeiros. A noção de uma África que precisava ser 
civilizada assombrava grande parte da literatura sobre o continente. 
O século que se iniciara sob o entusiasmo de um ideário iluminista, que 
negou com veemência as ordenações sociais do Antigo Regime, aproximava-
se, assim, de seu fim testemunhando a rearticulação do pensamento 
conservador, capaz de oferecer uma alternativa autoritária e ainda mais 
excludente ao mundo criado pelo liberalismo. 
O pensamento conservador e a filosofia hegeliana contribuíram muito para 
uma ideia de África estereotipada. Não por acaso, em 1912, Edgar Rice cria “Tarzan, 
o rei dos macacos”. Ele trazia a representação da supremacia europeia, 
representada por Tarzan, sobre o mundo africano. A sua origem europeia foi 
suficiente para que se destacasse entre os africanos. Este personagem fez e faz um 
grande sucesso, consagrando a imagem de um continente definido como espaço 
da natureza, do exótico, incivilizado e imóvel. 
Mais recentemente, outras imagens se juntaram a esta para definir o 
continente: aquelas que o ligam à miséria, à corrupção e à guerra. Imagens que 
insistem em mostrar a África como lugar da barbárie, avessa a qualquer forma de 
civilização. E temos como exemplo Hotel Ruanda filme fruto de um olhar 
preconceituoso e distanciado que trata a história africana como uma tragédia. 
Além de filmes, propagandas televisivas veiculam imagens do continente que 
ligam seus habitantes ao canibalismo, atraso e exótico. Muitas vezes são 
ridicularizados de forma aberta havendo pressão por parte de afrodescendentes 
para a interrupção das aparições. 
História da África I 
 
23 
 
 
Essas imagens estão longe de mostrar a grande diversidade de povos e 
culturas existentes no território africano. Continente que possui cerca de 30 
milhões de quilômetros quadrados onde se encontram diversas paisagens que vão 
desde as florestas e savanas, popularizadas nos filmes, até desertos, zonas de clima 
mediterrâneo e regiões de altas montanhas cobertas de neve (caso do monte 
Kilimanjaro, no Quênia). Nessas diversas paisagens habitam mais de 800 milhões 
de pessoas, que fazem da África o segundo continente em termos populacionais. 
Como resultado, tornou-se berço das mais diferentes culturas e tradições que se 
expressam nas distintas identidades de seus habitantes: são faladas 
aproximadamente duas mil línguas, diversas opções religiosas, políticas, sociais e 
econômicas. 
História da África I 
 
24 
 
O que se constata é a impossibilidade de se definir para a África um perfil 
homogêneo como aquele que aparece nos filmes. 
 
IMPORTANTE 
A África deve ser vista como um continente multifacetado e 
complexo. Este é o grande objetivo e desafio desse curso, propor uma reflexão 
sobre como o conhecimento de África foi construído a partir de uma ideia de 
homogeneidade que encobriu a diversidade de experiências do continente. 
 
Para tanto, convido o leitor a fazer uma pausa e refletir sobre o que parece 
óbvio: o termo África. Paremos um instante para conjeturarsobre o título de nossa 
unidade. Debatemos até o momento sobre alguns preconceitos que envolvem tal 
tema. Chegou o momento, haja vista que a discussão está amadurecendo, de parar 
para questionar o termo que nomeia nosso conteúdo. Por trás dessa ideia, há uma 
série de simplificações e uma forma monolítica de tratar a história. O que 
entendemos por África? 
 
África 
Se nos aproximarmos do continente, falaremos de suas características físicas, 
suas florestas, rios, lagos e desertos. A descrição continuará incompleta. A África 
construída desta forma, pode ser colocada nas estantes de história natural ao lado 
da história da zebra, do leão ou elefante. E as pessoas? O que buscamos aqui são 
pessoas vivendo em grupo, organizando instituições, criando cultura, amando, 
mudando a natureza, logo, uma descrição física do continente não nos satisfaz 
completamente. 
O termo África foi usado por muito tempo para designar um recorte 
geográfico definido por áreas de relações comerciais ou de expansão colonial. 
História da África I 
 
25 
 
Vejamos mais de perto. Os gregos denominavam os 
povos africanos de Aithiop.Com esse termo, 
Heródoto, em seu livro História, denominou os 
habitantes ao sul do Egito. Os gregos também 
chamavam a região norte de Líbia. A África do Norte, 
desde a Antiguidade, destacou-se por ser palco de diversas conquistas promovidas 
por povos do Oriente e da Europa. Foi, também, caminho para a expansão islâmica 
em direção à Península Ibérica, no século VIII d.C.. O reino mítico de Preste João 
povoava, neste período, o imaginário ocidental. Seria um reino cristão que faria 
frente ao avanço muçulmano, em território africano. 
Segundo o mito que conta a história do reino de Preste João, ele teria sido o 
sucessor de Baltazar, um dos três reis magos e o rico e poderoso imperador da 
Etiópia. Neste reino, os cristãos eram batizados e marcados a ferro para se 
diferenciarem dos infiéis localizava-se na Abssínia e teria sido evangelizado pelo 
apóstolo Tomás. Acreditava-se que ele poderia ajudar na reconquista de Jerusalém, 
com seu poderoso exército e poderes sobrenaturais que faziam com que tanto as 
águas do Nilo como seres fantásticos o obedecessem. O sonho acabou quando os 
portugueses chegaram à Abssínia e viram uma sociedade totalmente diferente do 
mito e nada das esperadas maravilhas: corpos nus, poligamia, e punições severas 
aos criminosos (corte de mãos e pés, por exemplo). 
Foi a designação romana que se estendeu para todo o continente. Os fenícios 
denominavam por afri os cartagineses, esta denominação latina que ficou para a 
posteridade, pois os gregos não utilizavam, como vimos, um único termo para 
designar os povos desse continente. Percebemos, desta maneira, a longa duração 
na forma genérica de tratar essas sociedades. Falamos até aqui da África do Norte. 
E ao sul do Saara? Esta teve um surgimento tardio, como África. 
Foi a regionalização do continente africano, pelos europeus, que fez com que 
a África surgisse. Logo, essa é uma denominação externa. Os seus habitantes não 
se viam como africanos. A definição geográfica da África Atlântica está 
intimamente ligada ao avanço português na área compreendida entre a Alta Guiné 
– Senegâmbia – e Angola. Segundo Alberto da Costa e Silva (2006), a invenção da 
África Atlântica foi uma competição entre o camelo e a caravela. Desde a Idade
Aithiops: Rosto queimado e 
nome antigo para certos óxidos e 
sulferetos metálicos escuros) 
(LOPES & ARNAUT, 2005, p. 16). 
História da África I 
 
26 
 
 Média, grande parte do ouro que circulava nos mercados europeus tinha origem 
no que no futuro seria a África Atlântica. Região que também era palco de um 
lucrativo comércio de marfim e escravos, porém um comércio dominado por 
berberes e muçulmanos. 
Os portugueses tiveram de enfrentar um duplo obstáculo para chegarem às 
rotas de comércio do ouro, marfim e escravos. Por um lado estavam os italianos, no 
Mediterrâneo, defendendo o caminho marítimo, e de outro, os muçulmanos, no 
norte da África, defendendo o trajeto continental. Os portugueses lançaram-se ao 
Atlântico e conquistaram, em 1416, as Ilhas Canárias; em 1419-1425, Ilha da 
Madeira; em 1427, os Açores; em 1434, o Cabo Bojador (DEL PRIORE & VENÂNCIO, 
2004, p.33). 
Antão Gonçalves foi o precursor do tráfico de negros para a Europa, em 1445. 
Na ilha de Aguim, ele troca mercadorias europeias por ouro e nove africanos de 
pele negra (DEL PRIORE & VENÂNCIO, 2004, p. 36). Esta região atlântica, 
caracterizada pelo comércio de ouro, transformar-se-á num imenso mercado de 
escravos. E foi assim que as caravelas venceram os camelos muçulmanos na luta 
pela abertura de rotas comerciais. 
Avanço português 
 
Fonte: DEL PRIORE & VENÂNCIO, 2004, p. 32. 
História da África I 
 
27 
 
VAMOS REFELTIR: 
Outra noção muito utilizada na historiografia é a de “continente 
negro”. As pessoas começam a aparecer! Mas todos os africanos são negros? 
 
Na maioria dos livros, a África negra refere-se à parte do continente que fica 
abaixo do Saara, a África subsaariana. Habitantes descritos pela cor da sua 
epiderme parecem pertencer mais à ordem da natureza, como um elemento seu, 
do que criadores de cultura, sociedade, estética ou qualquer outra criação 
tipicamente humana. A difícil penetração no continente, devido à resistência de 
seus povos e do meio ambiente, transformou o desconhecido em exótico e bestial. 
A dificuldade de interpretar o “outro” sempre foi uma constante ao longo da 
história universal. 
As dificuldades e fabulações não permitiram um estudo sistemático do 
continente. Este só começou com o expansionismo do século XVIII. No entanto, a 
África foi e ainda é, em grande medida, qualificada como uma unidade selvagem, 
pobre e inculta. A perspectiva de Hegel, de que “os povos negros são incapazes de 
se desenvolverem e receberem uma educação”, ainda prevalece. 
O que entendemos por africano? 
Africanos 
Outra questão que devemos enfrentar: o que entendemos por africano? O que 
entendemos por brasileiro? Latino? Resposta óbvia, habitantes da África, do Brasil e 
da América Latina respectivamente. Mas o que entendemos por habitantes da 
África? Deve ser uma resposta cuidadosa para não cairmos em simplificações 
tentadoras. São seres humanos que vivem em sociedade, criam padrões 
comportamentais, linguísticos, culturais, alimentares, religiosos, de honra, de 
virilidade. São essas produções que nos interessam, ou deveriam interessar. 
História da África I 
 
28 
 
Mas eis que surge outro problema: africano nos sugere a ideia de unidade e 
um de padrão comum aos habitantes que habitam o continente chamado África. E 
a diversidade, nosso interesse privilegiado? As denominações “África” e “africanos” 
não podem ofuscar as diferenças. Essa ideia de unidade entre esses povos é tardia, 
quando no século XIX inaugurou-se o pan-africanismo. 
Pensemos no que escreveu Eçá de Queiroz em sua obra Carta aos Ingleses, no 
século XIX: 
Em toda a parte onde o inglês domine e impere, todo o esforço 
consiste em reduzir as civilizações estranhas ao tipo da sua 
civilização anglo-saxônica. O mal não é grande quando eles operam 
sobre a Zululândia e sobre a Cafraria, nessas vastidões da Terra 
Negra, onde o selvagem e a sua cubata (casa) mal se distinguem das 
ervas e das rochas, e são meros acessórios da paisagem: aí 
encontram apenas uma matéria bruta, onde nenhuma anterior 
forma de beleza original se estraga, quando eles a refundem para a 
fazer a sua imagem. 
Como o europeu se julgava a medida e o referencial da humanidade, ao não 
ver sua imagem refletida deduziu imediatamente que não seencontrava diante de 
seres humanos. E mais, que os africanos deveriam ser guiados, educados, 
civilizados e cristianizados para serem moldados à imagem e semelhança dos 
europeus – de Deus. 
E quando conferiram humanidade aos africanos? Se os negros eram humanos 
os europeus eram mais que humanos e a humanidade foi dividida em raças. Por 
mais que os negros fossem humanos, eles tinham outra natureza, inferior, porque 
eram de outra raça. Estabeleceu-se, desta forma, no século XIX, a subordinação da 
cultura à biologia, nascendo o racismo, viés da ciência do Novecentos. 
História da África I 
 
29 
 
Representação europeia de africanos 
 
Fonte: HERNANDEZ, 2005, p. 55. 
Espero que o objetivo mínimo que nos orientou até aqui tenha sido alcançado 
e que meus interlocutores possam refletir de forma mais rica, plural e instigante 
sobre o continente africano. Geralmente, nossa produção intelectual só opera com 
essas culturas na medida em que interferem no Ocidente, no nosso caso, formando 
o afrobrasileiro. A proposta é estabelecer uma relação entre Brasil e África que se 
distancie das óticas apresentadas, que consigamos (re)construir uma história 
baseada numa perspectiva plural possibilitando acabar com o desconhecimento 
sobre o assunto no espaço escolar e enriquecer, sobretudo, a história do Brasil ao 
mostrar que a história dos ancestrais africanos não foi de escravidão e sim de 
liberdade. 
História da África I 
 
30 
 
Desafios: eurocentrismo, etnocentrismo e afrocentrismo 
 
Faraó divindade do Egito 
“Eu falei faraó 
êeeee faraó 
Eu clamo Olodum Pelourinho 
êeeee faraó 
É pirâmide da paz e do Egito 
Despertai-vos para 
Cultura egípcia no Brasil 
Em vez de cabelos trançados 
Veremos turbantes de Tucamom 
E nas cabeças 
Enchei-se de liberdade 
O povo negro pede igualdade 
Deixando de lado as separações 
Que Mara Mara 
Maravilha Ê 
Egito, Egito Ê”. 
(Luciano Gomes dos Santos) 
Esta música foi um dos primeiros sucessos do grupo Olodum, o mais 
importante grupo afro da Bahia. A partir da leitura da letra da música intitulada 
“Faraó Divindade do Egito”, podemos dar início a nossa conversa sobre 
eurocentrismo, etnocentrismo e afrocentrismo e as armadilhas que tais 
posicionamentos teóricos representam. 
História da África I 
 
31 
 
Vencemos alguns obstáculos que se apresentam para o estudo da África, 
como mitos e preconceitos e historicisamos o próprio termo África. Que outros 
obstáculos poderemos encontrar pela frente? Chegamos ao momento em que a 
história coloca desafios para a teoria. O desconhecimento sobre a lógica que 
alimenta a dinâmica interna das sociedades africanas nos leva, em muitos 
momentos, a olhá-las com um olhar distante e acabamos por imprimir em nossas 
conclusões sentidos que estão longe de se aproximar da experiência dos africanos. 
Adotamos, desta forma, uma perspectiva eurocêntrica e buscamos nos modelos 
europeus modelos teóricos que expliquem a história africana. 
Eurocentrismo 
O momento imediatamente posterior à Segunda Guerra Mundial foi 
significativo para os povos africanos. Houve o surgimento de diversos movimentos 
políticos e sociais que pleiteavam a independência das colônias africanas. Num 
contexto de luta contra o imperialismo, muitos historiadores se debruçaram sobre 
a História da África, mas a olharam com o olhar europeu e projetaram sobre o 
continente as sociedades europeias e suas instituições: Estados, Impérios, Reinos e 
Classes. Acarretou numa produção historiográfica marcada por equívocos e 
distorções. 
A produção historiográfica do Brasil não escapou de tais armadilhas. A História 
da Europa foi e ainda é tida como a História Geral e outras localidades ficam 
relegadas ao segundo plano, como Ásia e África. Essa é uma visão eurocêntrica que 
relega pouco espaço aos estudos africanos nos livros didáticos de História, como 
vimos anteriormente. O autor que faz uma excelente análise sobre o diálogo ou 
falta dele entre livros didáticos de História e a academia é Anderson Oliva (2003). 
Ele analisou a produção de material didático da década de 1980, mostrou como 
muitos livros didáticos distorcem essa história e a apresentam como uma 
incompletude em relação à europeia. 
Mesmo quando livros procuram enfrentar o assunto o fazem de forma 
deformada. A História da África aparece como um apêndice da História Mundial. 
Sendo assim, fica difícil desconstruir mitos e preconceitos, pois a imagem que se 
tem do continente não consegue ser modificada. Além de pouco espaço nos 
depararemos com outro problema: como essa história é contada? 
História da África I 
 
32 
 
Ao aceitarem o desafio de escrever sobre a história africana, muitos autores o 
fazem a partir de uma perspectiva europeia. Como se este fosse o modelo a ser 
buscado nas sociedades de uma forma geral. Ao explicar a história africana diante 
desse arcabouço teórico-metodológico, os autores aproximam de forma ligeira e 
superficial as formações políticas e sociais africanas das europeias. Identificam 
“reis” e suas “cortes” sem nenhuma preocupação em compreender a lógica interna 
dessas sociedades e buscam, a todo custo, inventariar as sociedades africanas a 
partir da lógica que movia a sociedade europeia. 
A consequência é que, analisada a partir de um padrão europeu, as sociedades 
africanas aparecem nessas obras de modo frágil, como se constituíssem exemplos 
imperfeitos e atrasados de um desenvolvimento que continuava a ter na Europa o 
seu modelo. 
Esses autores, mesmo numa tentativa de valorizar a história da África, usam 
um vocabulário que acaba por colocá-la na perspectiva do atraso. Como nomear 
organizações distintas das já conhecidas como Estado, Reino ou Império? E termos 
como povos, aldeias e tribos passam a pulular nestes textos. Conceitos que 
expressam, principalmente o último, a noção de primitivismo e atraso. O último 
passa a ser visto como um dado quase natural de análise sobre o continente. Este é 
um vocabulário que coloca em evidência a perspectiva eurocêntrica e que ainda é 
um obstáculo para a compreensão das lógicas internas das sociedades africanas. 
Representação europeia sobre o Reino do Dahomé 
História da África I 
 
33 
 
 
Vimos até aqui que o eurocentismo é uma armadilha analítica na qual muitas 
vezes caímos sem sentir. Ora reproduzimos em nossas aulas expositivas ora em 
nossos textos. Claro! Podemos justificar colocando a questão sobre a falta de 
termos específicos para as formações sociais africanas e a difícil tarefa de se colocar 
no lugar do outro, no momento da análise. Acabamos sempre por considerar nossa 
comida a mais gostosa, nossos costumes os mais lógicos, nossa arte a mais bela. 
Porém, existe um limite entre apreciar o que nos é familiar e caro e desvalorizar os 
outros projetos de vida e soluções diferentes para desafios que aparentemente são 
parecidos. O etnocentrismo turva o olhar do observador e nos acende um sinal de 
alerta, pois é uma característica condenável e inevitável. 
Etnocentrismo 
O etnocentrismo pode ser entendido como uma característica comum entre as 
culturas e ao mesmo tempo algo que deve ser evitado, pois traz em seu bojo a 
noção de superioridade. Nada substitui a familiaridade que temos com nossos 
História da África I 
 
34 
 
hábitos, mas devemos aprender a nos familiarizar com o estranho a ponto de não o 
segregarmos. Mas tal exercício intelectual nem sempre foi a ordem. Como vimos 
no começo de nossa unidade, Hegel, no início do século XIX, escreveu que “A África 
não é um continente histórico, não demonstra nem mudança, nem 
desenvolvimento”. Essa sentença foi acatadaem sua autoridade por muitos 
intelectuais daquele século. 
Ao negar dimensão histórica aos povos africanos estes passaram a ser 
estudados por linguistas, antropólogos e etnólogos informados pelo olhar 
eurocêntrico. Estamos falando do auge do racismo científico, da vitória do 
pensamento conservador, que anunciava a inferioridade biológica dos negros. A 
popularização dessas ideias foi conveniente, pois encobria os atrasos de suas 
próprias sociedades (AMAURI PEREIRA, 2002, p. 10). 
Uma forma muito instigante para se pensar o etnocentrismo é visitar o 
conceito do intelectual palestino-americano Edward Said (1990): orientalismo. Este 
conceito serviu para que críticas, para além de somente políticas e econômicas, 
fossem elaboradas ao colonialismo. Estabeleceram-se críticas culturais 
contundentes nas sociedades que tiveram um passado colonial recente, como 
grande parte dos Estados africanos. 
Em sua obra Orientalismo – O Oriente como invenção do Ocidente, Said faz uma 
análise de obras literárias inglesas e francesas dos séculos XVIII e XIX, que 
retratavam o Oriente e o oriental. O autor defendeu a ideia de que o espaço 
geográfico denominado “Oriente” correspondia a uma longa tradição de imagens 
idealizadas sobre a Ásia e o Oriente Médio produzidas pelo etnocentrismo 
ocidental sobre o outro. Narrativas que intencionavam justificar a dominação do 
outro, principalmente o árabe muçulmano. Usou, para tanto, o argumento 
foucaltiano de que saber é uma forma privilegiada de poder. 
Said usou como exemplo a ocupação do Egito pelos franceses em 1798. 
Napoleão levou vários sábios para estudarem o Egito. Com a dominação inglesa, foi 
feita a mesma coisa e desta forma surgiu o egiptólogo. Este especialista passara a 
conhecer o Egito melhor que seus habitantes. O autor faz uma citação que 
exemplifica o olhar etnocêntrico desse momento: 
História da África I 
 
35 
 
 O europeu é um raciocinador conciso; suas declarações de 
fato são desprovidas de qualquer ambiguidade; ele é um lógico 
natural, mesmo que não tenha estudado lógica; é por natureza 
cético e requer provas antes de aceitar a verdade de qualquer 
proposição; sua inteligência treinada trabalha como a peça de um 
mecanismo. A mente oriental, por outro lado, assim como suas 
pitorescas ruas, é eminentemente carente de simetria. Embora os 
antigos árabes tenham adquirido em um grau um tanto mais alto a 
ciência da dialética, seus descendentes são singularmente 
deficientes de faculdades lógicas. São muitas vezes incapazes de 
tirar as conclusões mais óbvias de qualquer simples premissa cuja 
verdade possam admitir. Tente-se arrancar uma declaração de fato 
direta de qualquer egípcio normal. Sua explicação será em geral 
longa e carente de lucidez. Ele provavelmente entrará em 
contradição uma dúzia de vezes antes de acabar sua história. Com 
frequência sucumbirá ao mais brando método de análise. 
(Lord Crommer. O Egito Moderno apud SAID, 1990, PP. 48-49) 
O Egito passou a ser objeto de análise da ciência positiva produzida no 
Ocidente que não encontrava paralelo no Oriente. Assim ficava provada a 
incapacidade de o oriental, como vimos no exemplo acima, de produzir um 
pensamento coerente ou mesmo o autoconhecimento. Precisava ser tutelado por 
civilizações mais “iluminadas” pelo saber racional. Poder e saber, na análise de Said, 
se entrelaçavam. Os egípcios demonstravam não conseguir estabelecer domínio 
sobre seu destino histórico. 
Os ocidentais enfatizaram, nas representações sobre o Oriente, as paixões, sua 
arquitetura incompreensível, seu mundo sem razão e controle. O Oriente surge, 
portanto, como uma “invenção” do Ocidente que passara a narrar os atributos e 
características dos orientais. 
História da África I 
 
36 
 
 
Fonte: DEL PRIORE & VENÂNCIO, 2004, p 62. 
Como vimos, o etnocentrismo surge de um olhar maculado a ponte de 
impossibilitar a compreensão de costumes que não lhes sejam familiares. Ao 
desqualificar o modo de ser e de agir do outro, valoriza-se aquele que observa. Ao 
criar o Oriente, “inventava-se”, ao mesmo tempo, o Ocidente. Falar do outro, de 
suas incapacidades e limites, foi a forma encontrada para exaltar as capacidades e 
autonomia atribuídas a si mesmo, como fica claro no texto de Lod Crommel, citado 
acima. 
As atitudes etnocêntricas, como mostra a análise de Edward Said, não atingem 
a um indivíduo específico e sim a um grupo de pessoas culturalmente ligadas. É 
uma dupla construção identitária – do “eu” e do “outro”. Por isso, afirmamos acima 
que o etnocentrismo na sua forma de pensamento eurocêntrico, serve para 
mascarar os próprios limites. Ao afirmar a irracionalidade do outro, reafirmo a 
minha racionalidade. No Brasil, podemos pensar na eliminação da “mancha negra”, 
como uma tentativa de etnocídio (CLASTRES, 1982). Este conceito nos ajuda a 
pensar as diversas tentativas não de um genocídio, com a morte física, mas a 
História da África I 
 
37 
 
tentativa de destruição cultural. Tentativa, pois a história mostrou a 
impossibilidade da aculturação. 
E quando a África conquista o direito à história? 
Apagar das Ciências Sociais o racismo científico, hegemônico no século XIX, 
não seria tarefa fácil. Ele teimava em perdurar. A luta pela conquista do direito á 
história partira dos africanos com a ajuda dos negros da diáspora. Foi no campo da 
política que deram os primeiros passos para resolverem tais questões. Com o 
intuito de valorizar uma história que leve em conta a perspectiva dos africanos, 
acabaram por afirmar novas mitologias sobre 
o continente. Estavam, em grande parte, 
baseadas na naturalização de uma 
identidade africana, mas não impossibilitou a 
discussão sobre os problemas e o processo 
de construção dessa identidade. 
 
 
IMPORTANTE 
A definição de identidades, de quem somos “nós” e de quem são os 
“outros”, varia conforme o contexto em que estamos inseridos e segundo 
quais características privilegiamos nas buscas pelas semelhanças e diferenças. 
 
Vimos até aqui que o eurocentrismo foi uma forma etnocêntrica de se 
constituir a história de africanos e orientais. Outro obstáculo, que afirma novas 
mitologias sobre o continente e naturaliza outro tipo de ideia comum hoje, a 
existência de uma identidade que liga os diversos povos do continente africano, é 
o afrocentrismo. 
A identidade emerge em uma 
situação de contraste, manifesta-se no 
coletivo, não isoladamente, 
caracterizando-se pelo estabelecimento de 
fronteiras entre grupos quando se afirma o 
“Nós” – a identidade – em relação aos 
“Outros” – “Eles” (MANUELA CUNHA, 1986, 
pp. 115-16).
História da África I 
 
38 
 
Afrocentrismo 
A identidade ampla forjada entre africanos e descendentes precisa ser 
historicisada. Refere-se principalmente à África subsaariana. É uma ideia 
importante por ter um sentido político, mas só faz sentido na atualidade e não 
pode ser tomada como uma definição que explique os processos históricos das 
muitas sociedades africanas em séculos anteriores. O afrocentrismo foi a forma 
como muitos autores passaram a enfrentar a tarefa de explicar a história do 
continente africano e confrontar a lógica eurocentrista. 
O afrocentrismo foi uma forma encontrada por intelectuais para fazer uma 
análise da história africana em que os africanos aparecessem como sujeitos e não 
como vítimas. Foi uma postura teórica assumida para fugir das amarras da cultura 
ocidental. Visava valorizar a herança africana, vista, pelo Ocidente, como sinônimo 
de atraso e barbárie. Se caracteriza, desta forma, como uma corrente historiográfica 
que se contrapõe às análises eurocentristas que por muitotempo hegemonizaram 
os estudos sobre a África. 
Foi no contexto das independências africanas que surgiu o afrocentrismo. 
Proposta de um novo posicionamento, tanto para a história africana, que deveria 
ser pensada do ponto de vista africano como para a história mundial, que também 
deveria ser feita a partir do ponto de vista africano. 
Os afrocentristas, para realizarem seu projeto, retomaram a ideia de que a 
civilização surgiu na Grécia Antiga e colocaram a África como berço da 
humanidade. A ideia de uma sociedade branca e europeia como centro da 
civilização marginalizava todos aqueles que não são europeus, como a África, que 
ficaria relegada a um papel secundário. O filósofo, George James (1954), nascido na 
Guiana, estuda na Inglaterra e lá descobre a identidade negra ao redor do mundo. 
A partir de sua experiência, e que informa sua obra, como Legado Roubado, que são 
dadas as bases para o florescimento do afrocentrismo. O filósofo afirmava que 
houvera uma falsificação histórica, alimentada pelo eurocentrismo, ao colocar a 
Grécia como ponto de partida para a civilização. No subtítulo de seu livro, James 
escreveu o seguinte: “Os gregos não são os autores da filosofia grega, e sim as 
pessoas do Norte da África, geralmente chamadas egípcias.” (GEORGE JAMES, 
1954). 
História da África I 
 
39 
 
Vários autores seguiram os passos de James e questionaram a historiografia 
ocidental. Em contra partida, afirmavam a primazia do continente africano no 
desenvolvimento da civilização. Para eles, a separação entre a cultura europeia e a 
africana seria um equívoco, pois ambas teriam uma mesma origem na civilização 
do Egito. Os discursos racistas do século XIX que fizeram tal separação, ou seja, a 
civilização da barbárie, sociedades europeias das africanas ao sul do Saara. A 
consequência foi a produção de uma perspectiva histórica que negava suas bases. 
A intenção era afirmar a ideia de uma civilização negra, negada pelas análises 
eurocentristas. Um dos primeiros militantes do movimento negro na América 
Central, o jamaicano Marcus Garvey partiu para a Inglaterra em 1912 e lá conheceu 
outros negros de diversas localidades que tinham as mesmas dificuldades que as 
suas. Essa experiência partilhada e marcada por problemas, impulsionou Garvey a 
defender a existência de uma identidade africana e de seus descendentes em todo 
o mundo. Levando-o a lutar pela tomada de consciência dos negros a respeito do 
valor de suas culturas. Afirmava que o tipo de ensino a que estavam submetidos 
garantia o sucesso dos brancos em detrimento dos negros. Para reverter este 
quadro, seria necessário um sistema de ensino que valorizasse e mostrasse a 
superioridade da cultura de africanos e seus descendentes. 
Marcus Garvey 
Os afrocentristas responderam aos apelos de Garvey e observamos isso na 
análise, citada acima, do filósofo James. A adoção de tal perspectiva seria uma 
forma de afirmar o orgulho étnico entre os africanos e seus descendentes, 
rompendo com as barreiras impostas pelo pensamento racista. O que observamos 
é a transformação de uma perspectiva política, que afirma a necessidade de 
valorização da cultura africana, que se transforma numa perspectiva acadêmica. A 
partir dessa perspectiva, afirma-se a legitimidade da herança africana. O 
afrocentrismo surgiu como doutrina a partir da valorização da cultura africana e 
intelectuais negros tentaram se apropriar de uma história que os colocava num 
papel secundário, a história produzida a partir de uma visão eurocêntrica. 
História da África I 
 
40 
 
Começamos a perceber as armadilhas tanto do eurocentrismo como do 
afrocentrismo, concorda? Umas das críticas mais interessantes dessas duas 
doutrinas que se opõem pelo vértice foi feita por Kwame Appiah. Filósofo filho de 
ganenses, Appiah mostra as proximidades entre as duas doutrinas. Fosse para 
valorizar a identidade africana ou para colocá-la como sinônimo de atraso, ambas 
as doutrinas assumiram como dado histórico inquestionável a existência de uma 
identidade negra expressa na ligação com o continente africano. Tal identidade foi 
construída ao longo do século XIX, como nos chama a atenção Appiah para a sua 
historicidade. Foi no Oitocentos, que descendentes de africanos tanto na América 
como na Europa, que experimentavam cotidianamente a exclusão e o racismo, 
passaram a postular seus laços de criação com o continente africano. 
Foi dentro da lógica europeia 
que tal identidade foi forjada. 
Informado por essas ideias, 
Alexandre Crummel, pastor 
afroamericano nascido nos EUA 
em 1818, defendeu em meados 
do século XIX, uma ação conjunta 
de africanos de todas as regiões. 
Segundo ele, a “raça africana” 
como um todo deveria se unir na 
luta contra a discriminação. Ele 
tornou-se um dos inventores do 
sentimento nativista africano. 
Em 1853, Crummel muda-se 
para a Libéria, onde foi atuar 
como missionário. A defesa que 
fazia de uma identidade africana 
era baseada em concepções 
europeias e isso fica claro na sua 
História da África I 
 
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atuação como missionário. Objetivava evangelizar e converter os nativos, 
afastando-os de suas religiões tradicionais. Defendeu a adoção da língua inglesa 
pelos africanos como uma forma de evolução. Postulava que as diversas línguas 
faladas por africanos eram atrasadas. Para ele, a colonização seria uma forma de 
desenvolver a África. 
Appiah analisa a atuação de Crummel como exemplar desse momento, século 
XIX, de uma identidade africana. Não partia da lógica das culturas locais, que eram 
por eles menosprezadas. Era uma construção externa aos povos dos continentes. 
Em sua base estava um conceito desconhecido pelas sociedades ao sul do Saara, o 
conceito de raça. Como essa identidade não pôde ser construída com base na 
cultura, a saída foi estabelecê-la com base em um elemento natural, a cor da pele. 
Porém a cor da pele não conseguiu estabelecer um elo inquebrantável entre 
diferentes sujeitos e grupos. 
Foi sobre o conceito de raça que intelectuais como Crummel forjaram o 
conceito de identidade africana. Não partiam de uma efetiva compreensão da 
lógica e das culturas dos povos do continente, capazes de mostrar uma diversidade 
muito diferente da ideia de unidade que queriam construir. Tal ideia estava 
pautada na oposição entre negros e brancos vivenciadas na América, sem levar em 
conta as diferentes vivências na diáspora. No século XX, diversos movimentos 
culturais se apropriaram de tais ideias para mostrar a singularidade dos africanos 
frente aos europeus, como o pan-africanismo e a negritude. Foi com base em uma 
ideia essencialista a respeito da África e seus habitantes que tal identidade foi 
edificada. 
Kwame Appia jogou uma luz sobre as discussões a respeito do eurocentrismo 
e afrocentrismo. Segundo o autor, os autores que utilizam a perspectiva 
afrocêntrica, ou seja, a suposição de que existe uma identidade inata entre os 
africanos, que se estenderia do Egito antigo aos negros escravizados na América, 
baseiam-se nos mesmos conceitos e ideias que autores eurocêntricos usam para 
desconsiderar a História da África. 
A produção historiográfica resultante dessas análises não é tão diferente das 
decorrentes do olhar eurocêntrico. Ambas trabalham com a noção de uma 
identidade ontológica para os povos africanos. São os valores da sociedade 
História da África I 
 
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ocidental que continuam sendo reforçados e estes são muito diferentes das 
diversas sociedades constituídas no continente africano. São dois modelos 
analíticos que não dão conta de compreender os modos de viver e pensar próprios 
dos muitos africanos ao longo desua história. 
 
Métodos e fontes: a busca de um ponto de vista africano 
 
Problemas da História Única 
Nascida em 1977, a escritora nigeriana Chimamanda Adichie deu, em 2009, um 
belo depoimento sobre o processo de descoberta de um ponto de vista africano 
nas histórias que contava. É um belo testemunho para iniciarmos nossa conversa 
sobre a produção de uma história da África feita efetivamente do ponto de vista 
africano e a força assumida pela oralidade no continente, de modo a refletir sobre a 
validade desse testemunho no contexto africano. 
Veja! 
“Eu sou uma contadora de história e gostaria de contar a você 
algumas histórias pessoais sobre o que eu gosto de chamar "o 
perigo de uma história única". Eu cresci num campus Universitário 
no Leste da Nigéria. Minha mãe diz que eu comecei a ler com dois 
anos, mas eu acho que quatro é provavelmente mais próximo da 
verdade. Então, eu fui uma leitora precoce. E o que eu lia eram livros 
infantis britânicos e americanos. Eu fui uma escritora precoce. E 
quando comecei a escrever, por volta dos sete anos, histórias com 
ilustrações em giz de cera que minha mãe era obrigada a ler. 
Eu escrevia exatamente os tipos de história que lia. Todos os 
meus personagens eram brancos de olhos azuis. Eles brincavam na 
neve. Comiam maças. (Riso da plateia) Eles falavam muito sobre o 
tempo, como era maravilhoso o sol ter aparecido (risos). Eu nunca 
havia estado fora da Nigéria. Nós não tínhamos neve, nós comíamos 
mangas. E nós nunca falávamos sobre o tempo porque não era 
necessário. Meus personagens bebiam muita cerveja de gengibre 
porque as personagens dos livros britânicos que eu lia bebiam 
cerveja de gengibre. Não importava se eu não tinha a mínima ideia 
do que era cerveja de gengibre. (risos) 
História da África I 
 
43 
 
E muitos anos depois, eu desejei desesperadamente 
experimentar cerveja de gengibre. Mas isso é uma outra história. A 
meu ver, o que isso demonstra é como nós somos impressionáveis e 
vulneráveis face a uma história, principalmente quando somos 
crianças. Porque tudo que havia lido eram livros nos quais as 
personagens eram estrangeiras. Convenci-me de que os livros, por 
sua própria natureza, tinham que ter estrangeiros e tinham que ser 
sobre coisas com as quais eu não podia me identificar. Bem, as 
coisas mudaram quando eu descobri os livros africanos. Não haviam 
muitos disponíveis e eles não eram tão fáceis de encontrar quanto 
os livros estrangeiros, mas devido a escritores como Chinua Achabe 
e Camara Laye passei por uma mudança mental em minha 
percepção da leitura. Percebi que pessoas como eu, meninas com a 
pele cor de chocolate, cujos os cabelos crespos não podiam formar 
rabos-de-cavalo, também podiam existir na literatura. Eu comecei a 
escrever sobre coisas que eu reconhecia. Bem, eu amava aqueles 
livros britânicos e americanos que eu lia. Eles mexiam com a minha 
imaginação, me abriam novos mundos. Mas, a consequência 
inesperada foi: não sabia que pessoas como eu podiam existir na 
literatura. Então, o que a descoberta de escritores africanos fez por 
mim foi: salvou-me de ter uma única história sobre o que os livros 
são. 
Eu venho de uma família nigeriana, de classe média. Meu pai 
era professor. Minha mãe era administradora. Tínhamos, como era 
normal, empregadas domésticas, que frequentemente vinham das 
aldeias rurais próxima. Então, quando fiz oito anos, arranjamos um 
novo menino para a casa. Seu nome era Fide. A única coisa que 
minha mãe nos disse sobre ele foi que sua família era muito pobre. 
Minha mãe enviava arroz, inhame e nossas roupas usadas para sua 
família. E quando eu não comia tudo no jantar, minha mãe dizia: 
"Termine sua comida! Você não sabe que pessoas como a família de 
Fide não tem nada?" Então eu sentia uma enorme pena da família 
de Fide. 
Um sábado, nós fomos visitar sua aldeia e sua mãe nos 
mostrou um cesto com um pão lindo, feita de ráfia seca por seu 
irmão. Eu fiquei atônita! Nunca havia pensado que alguém em sua 
família pudesse ter feito esse cesto. Tudo que eu tinha ouvido sobre 
eles era como eram pobres, assim havia se tornado impossível para 
História da África I 
 
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 eu vê-los como alguma coisa além de pobres. Sua pobreza era a 
minha história única sobre eles. 
Anos mais tarde, pensei nisso quando deixei a Nigéria, para 
cursar a universidade nos Estados unidos. Eu tinha dezenove anos. 
Minha colega de quarto americana ficou chocada comigo. Ela 
perguntou onde eu tinha aprendido a falar inglês tão bem e ficou 
confusa quando eu disse que, por acaso, a Nigéria tinha o inglês 
como sua língua oficial. Ela perguntou se podia ouvir o que ela 
chamou de minha "música tribal" e, consequentemente, ficou muito 
desapontada quando eu toquei minha fita da Mariah Carey. (risos) 
Ela presumiu que eu não sabia como usar o fogão. O que me 
impressionou foi que ela sentiu pena de mim antes mesmo de ter 
me visto. Sua posição padrão para comigo, como uma africana, era 
um tipo de arrogância bem intencionada, piedade. Minha colega de 
quarto tinha uma única história da África. Uma única história de 
catástrofe. Nesta única história não havia possibilidade de os 
africanos serem iguais a ela, de jeito nenhum. Nenhuma 
possibilidade de sentimento mais complexo do que piedade. 
Nenhuma possibilidade de uma conexão como humanos iguais. 
Eu devo dizer que antes de ir para os Estados Unidos, eu não 
me identificava, conscientemente, como uma africana. Mas nos 
Estados unidos, sempre que o tema África surgia as pessoas 
recorriam a mim. Não importava que eu não sabia nada sobre 
lugares como Namíbia. Mas eu acabei por abraçar essa nova 
identidade. E, de muitas maneiras, agora eu penso em mim mesma 
como africana. Entretanto, fico um pouco irritada quando referem-
se à África como um país. O exemplo mais recente foi o meu 
maravilhoso voo de Lagos dois dias atrás, não fosse um anuncio de 
um voo da Virgin sobre o trabalho de caridade na "Índia, África e 
outros países." (Risos) 
Após ter passado vários anos nos Estados unidos como uma 
africana, eu comecei a entender a relação de minha colega para 
comigo. Se eu não tivesse crescido na Nigéria e se tudo que eu 
conhecesse sobre a África viesse das imagens popularizadas eu 
também pensaria que a África era um lugar de lindas paisagens, 
lindos animais e pessoas incompreensíveis lutando em guerras sem 
sentido, morrendo de pobreza e AIDS, incapazes de falar por eles 
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 mesmo e esperando serem salvos por uma estrangeiro branco e 
gentil. Eu veria os africanos do mesmo jeito que eu, quando criança, 
havia visto a família de Fide. Eu acho que essa única história da 
África vem da literatura ocidental 
Aqui temos uma citação de um mercador Jonh Locke, quando 
navegou até o oeste da África em 1561 e manteve um fascinante 
relato de sua viagem. Após referir-se aos negros africanos como 
"bestas que não tem casas," ele escreve "Eles também são pessoas 
sem cabeças, que tem sua boca e olhos em seus seios". Eu rio toda 
vez que leio isso, e alguém deve admirar a imaginação de Jonh 
Locke. Mas o que é importante sobre a sua escrita é que ela 
representa o início de uma tradição de contar histórias africanas no 
Ocidente. Uma tradição da África subsaariana como um lugar 
negativo, de diferença, de escuridão, de pessoas, que nas palavras 
do maravilhoso poeta, Rudyard Kipling, são "metade Demônio, 
metade crianças." 
E então eu comecei a perceber que minha colega de quarto 
americana deve ter, por sua vida, visto e ouvido diferentes versões 
de uma única história. Como um professor, que uma vez me disseque meu romance não era "autenticamente africano". Bem, eu 
estava completamente disposta a afirmar que havia uma série de 
coisas erradas com o romance, que ele havia falhado em vários 
lugares. Mas eu nunca teria imaginado que ele teria falhado em 
alcançar alguma coisa chamada autenticidade africana. Na verdade, 
eu não sabia o que era "autenticidade africana". O professor disse 
que as minhas personagens pareciam-se muito com ele, um 
homem educado de classe média. Minhas personagens dirigiam 
carros, elas não estavam famintas. Por isso elas não eram 
autenticamente africanas. 
Devo acrescentar que eu também sou culpada na questão da 
história única. Alguns anos atrás, eu visitei o México saindo dos EUA. 
O clima político nos EUA àquela época era tenso. E havia debate 
sobre a imigração. E, como frequentemente acontece na América, 
imigração tonou-se sinônimo de Mexicanos. Havia histórias 
infindáveis de mexicanos como pessoas que estavam espoliando o 
sistema de saúde, passando as escondidas pela fronteiras, sendo 
presos, esses tipos coisas. Eu lembro andar, no meu primeiro dia em 
Guadalajara, vendo as pessoas indo trabalhar, enrolando tortilhas 
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 no supermercado, fumando, rindo. Eu lembro que o meu primeiro 
sentimento foi surpresa. E então eu fiquei oprimida pela vergonha. 
Eu percebi que eu estava tão imersa na cobertura da mídia sobre os 
mexicanos que eles haviam se tornado uma coisa em minha mente: 
"o imigrante abjeto”. Eu tinha assimilado a história única sobre os 
mexicanos e não podia estar mais envergonhada de mim mesma. 
Então, é assim que se cria uma história única: mostre um povo com 
uma só coisa, como somente uma coisa, repetidamente, e verá que 
eles se tornarão. 
É impossível falar sobre uma única história sem falar sobre o 
poder. Há uma palavra, uma palavra da tribo Igbo, que eu lembro 
sempre que penso sobre as estruturas de poder do mundo. A 
palavra é "Nkali". É um substantivo que livremente se traduz: "ser 
maior do que o outro", como nosso mundo econômico e político, 
histórias também são definidas pelo principio do "nkali". Como são 
contadas, quem as conta, quando e quantas histórias são contadas, 
tudo realmente depende do poder. Poder é a habilidade de não só 
contar a história de uma outra pessoa, mas de fazê-la a história 
daquela pessoa. O poeta palestino Mourid Barghouti escreve que se 
você quer destruir uma pessoa, o jeito mais simples é contar sua 
história e começar com "em segundo lugar". Comece uma 
história com as flechas dos navios americanos, e não com a chegada 
dos britânicos, e você tem uma história totalmente diferente. 
Comece a história com o fracasso do estado africano e não com a 
criação colonial do estado africano e você tem uma história 
totalmente diferente. 
Recentemente, eu palestrei numa universidade onde um 
estudante disse-me que era uma vergonha que homens nigerianos 
fossem agressores físicos como a personagem do pai no meu 
romance. Eu disse a ele que eu havia terminado de ler um romance 
chamado "Psicopata Americano" - (risos) - e que era uma grande 
pena que jovens americanos fossem assassinos em série. (riso) 
(Aplausos) É óbvio que eu disse isso num leve ataque de irritação. 
(riso) - Nunca havia me ocorrido pensar que só porque eu havia lido 
um romance no qual uma personagem era um assassino em série, 
que isso era, de alguma forma, representativo de todos os 
americanos. E agora, isso não é porque eu sou uma pessoa melhor 
História da África I 
 
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 do que aquele estudante, mas, devido ao poder cultural e 
econômico da América, eu tinha muitas histórias sobre a América. 
Eu havia lido Tyler, Updike, Steinbeck e Gastskill. Eu não tinha 
uma única história sobre a América. Quando eu soube, alguns anos 
atrás, que escritores deveriam ter tido infâncias realmente infelizes 
para ter sucesso, eu comecei a pensar sobre como eu poderia 
inventar coisas horríveis que meus pais teriam feito comigo. (riso) – 
Mas, na verdade, eu tive uma infância muito feliz, cheia de risos e 
amor, em um família muito unida. Mas, também tive avós que 
morreram em campos de refugiados. Meu primo Polle morreu 
porque não teve assistência médica adequada. Um dos meus 
amigos mais próximos, Okoloma, morreu num acidente aéreo 
porque nossos caminhões de bombeiros não tinham água. 
Eu cresci sob governos militares repressivos que 
desvalorizavam a educação, então, por vezes, meus pais não 
recebiam seus salários. E, então, ainda criança, eu vi a geleia 
desaparecer do café-da-manhã, depois a margarina desapareceu, 
depois o pão tornou-se muito caro, depois o leite ficou racionado. E, 
acima de tudo, um tipo de medo político normalizado invadiu 
nossas vidas. Todas essas histórias fazem-me quem eu sou. Mas 
insistir somente nessas histórias negativas é superficializar minha 
experiência e negligenciar as muitas outras histórias que me 
formaram. 
A história única cria estereótipos. E o problema com 
estereótipos não é que eles sejam mentiras, mas que eles sejam 
incompletos. Eles fazem uma história tornar-se a história única. 
Claro, a África é um continente repleto de catástrofes. Há as 
enormes, como as terríveis violações no Congo. E há depressivas, 
como o fato de 5.000 pessoas candidatarem-se a uma vaga de 
emprego na Nigéria. Mas, há outras histórias que não são sobre 
catástrofes. É muito importante, é igualmente importante, falar 
sobre elas. 
Eu sempre achei que era impossível relacionar-me 
adequadamente com um lugar ou uma pessoa sem relacionar-me 
com todas as histórias daquele lugar ou pessoa. A consequência de 
uma única história é essa: ela rouba das pessoas sua dignidade. Faz 
o reconhecimento de nossa humanidade compartilhada difícil. 
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 Enfatiza como nós somos diferentes ao invés de como somos 
semelhantes. E se antes de minha viagem ao México eu tivesse 
acompanhado os debates sobre imigração de ambos os lados, dos 
Estados Unidos e do México? E se minha mãe nos tivesse contado 
que a família de Fide era pobre. E trabalhadora? E se nós tivéssemos 
uma rede televisiva africana que transmitisse diversas histórias 
africanas para todo o mundo? O que o escritor nigeriano Chinua 
Achebe chama "um equilíbrio de histórias". E se minha colega de 
quarto soubesse do meu editor nigeriano, Mukta Bakaray, um 
homem notável que deixou seu trabalho em um banco para seguir 
seu sonho e começar uma editora? 
Bem, a sabedoria popular era que nigerianos não gostavam de 
literatura. Ele discordava. Ele sentiu que pessoas que podiam ler, 
leriam se a literatura se tornasse acessível e disponível para eles. 
Logo após ele publicar meu primeiro romance, eu fui a uma estação 
de TV em Lagos para uma entrevista. E uma mulher que trabalhava 
lá como mensageira veio a mim e disse: "Eu realmente gostei do seu 
romance, mas não gostei do final. Agora você tem que escrever 
uma sequência e isso é o que vai acontecer...." (riso) - E continuou a 
me dizer o que escrever na sequência. Agora eu não estava apenas 
encantada, eu estava comovida. Ali estava uma mulher, parte das 
massas comuns de nigerianos, que não se supunham ser leitores. 
Ela não tinha só lido o livro, mas ela havia se apossado dele e sentia-
se no direito de me dizer o que escrever na sequência. 
Agora, e se minha colega de quarto soubesse de minha amiga 
Fumi Onda, uma mulher destemida que apresenta um show de TV 
em Lagos e que está determinada a contar as histórias que nós 
preferimos esquecer? E se minha colega de quarto soubesse sobre a 
cirurgia cardíaca que foi realizada no hospital de Lagos na semana 
passada? E se

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