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22/06/2016 fenomenologia ­ Sofos
http://sofos.wikidot.com/fenomenologia 1/4
 
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fenomenologia
A fenomenologia
1. A fenomenologia é um idealismo.
2. Existe na fenomenologia uma tensão (ou mesmo uma
contradição) entre um mundo que precede a consciência
(a consciência é vista como estritamente humana), por um
lado, e por outro lado a consciência (humana) que dá todo
o sentido ao mundo.
3. A fenomenologia coloca em causa o absoluto da
consciência — seja esse absoluto imanente (Hegel), seja
transcendente.
Embora a fenomenologia tenha sido útil em áreas da ciência
cognitiva, na psiquiatria ou na sociologia, sob ponto de vista da
filosofia (e por ser um idealismo) não é uma corrente filosófica
que me mereça especial atenção.
Quando se fala aqui de fenomenologia, refere­se à
fenomenologia segundo Edmund Husserl. Ademais, os conceitos
de imanência e de transcendência não correspondem aos
conceitos clássicos utilizados pela teologia e filosofia católicas
da Idade Média (Escolástica).
Este texto pretende ser um resumo, e não, como é óbvio,
uma abordagem exaustiva a um tema que é complexo e
até polémico.
A fenomenologia, segundo Edmund Husserl, pode­se dividir em
quatro áreas, por assim dizer:
1. A filosofia como “ciência rigorosa”;
2. O regresso à “vivência originária”, ou “intencionalidade”
da consciência;
3. A “redução fenomenológica”, ou Epoché;
4. A intersubjectividade.
A filosofia como "ciência rigorosa", segundo Edmund Husserl,
deve ser analisada no contexto da época em que Husserl viveu
(princípios do século XX), em que reinava, na cultura europeia,
o “império da Física”, o positivismo e o cientismo. A filosofia de
Edmund Husserl retoma o desafio que a ciência positivista
triunfante do início do século XX lança à filosofia, e restitui a
esta última um lugar ameaçado e contestado pelo positivismo
(neopositivismo). É neste sentido que Husserl concede à
filosofia um estatuto de “ciência rigorosa”, em um contexto de
crise da filosofia.
Esta crise atinge simultaneamente a matemática e a filosofia.
No dealbar do século XX, o psicologismo e o positivismo
Sofos
Expressões filosóficas
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22/06/2016 fenomenologia ­ Sofos
http://sofos.wikidot.com/fenomenologia 2/4
dominam, e propalam, na cultura, a ideia segundo a qual as leis
lógicas estão reduzidas a leis psicológicas que regem a natureza
particular do espírito humano, e que, por outro lado, a verdade
só pode ser encontrada no campo das ciências. Existe aqui um
duplo perigo: por um lado, a redução ao silêncio por parte da
filosofia, e, por outro lado, o relativismo que recusa obedecer
ao conceito de verdade como possuindo um carácter absoluto. É
neste contexto que Edmund Husserl pugna pela filosofia como
“ciência rigorosa”.
O regresso à “vivência originária” pretende ser a vontade de
descrever, de uma maneira simples, a forma como uma coisa (o
objecto) se apresenta à consciência (humana) – o modo como
as coisas (os objectos) se manifestam. Ou seja: as coisas (os
objectos) existem como fenómenos. E vem daqui a denominação
de “fenomenologia”, segundo Husserl.
Segundo Edmund Husserl, é um contra­senso interpretar os
fenómenos (as coisas, os objectos) como meras aparências
(realismo de Husserl), cuja essência (dos fenómenos) seria
necessário captar: pelo contrário, a fenomenologia é uma
descrição das essências: ela descreve “o que se passa”
quando a consciência “visa” um determinado objecto. Para isso,
a consciência utiliza aquilo a que Husserl chama de “variação
eidética”1, que consiste em fazer variar imaginariamente as
percepções da essência (do fenómeno) de forma a fazer surgir
uma invariante2.
Por exemplo, o triângulo tem três lados, e não seria um
triângulo se não tivesse três lados. Mas a essência do triângulo
não existe independentemente do acto da consciência que o
“visa”3: se a visão da essência – neste caso, o triângulo – é
originária e não derivada (como pretende o empirismo e/ou o
psicologismo), a essência – segundo Edmund Husserl – não é
separável do acto que a “visa” e à semelhança do platonismo
e/ou dos defensores de um realismo das essências.
Para acentuar a correlação entre o acto da consciência que visa
um objecto – a intencionalidade –, por um lado, e o objecto
visado, por outro lado, Edmund Husserl utiliza os termos
“noese” para o primeiro, e “noema” para o segundo. O objecto
visado é o noema, e o acto da consciência que o visa é a
noese.
A “redução fenomenológica” é a suspensão do juízo
(avaliação, julgamento) acerca do mundo e daquilo a que
se convencionou que seja significação do mundo.
Nada é mais certo do que a existência de um mundo que
ultrapassa a simples visão que dele eu possa ter, ou a simples
consciência que dele eu tenho. A questão será, então, a de
compreender essa certeza, apoiando­me não em um primeiro
nível de evidência, simplesmente factual ou empírica – mas
antes em uma evidência mais “originária” e apodíctica que
(alegadamente) a fundamenta.
Edmund Husserl retoma o cogito de Descartes: a única
certeza que eu tenho é a de que eu existo.
Em função dessa certeza, Husserl suspende todo o juízo de
existência acerca do mundo, e pratica a Epoché4. A existência
do mundo é colocada entre parêntesis. Através desta “redução
fenomenológica”, Husserl alcança a certeza apodíctica da
existência do sujeito, ou o “Eu Transcendental”. Ora, mesmo
suspendendo toda a crença no mundo, o sujeito “visa” um
objecto que não se esgota nessa visão; é o que demonstra a
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22/06/2016 fenomenologia ­ Sofos
http://sofos.wikidot.com/fenomenologia 3/4
sua análise da percepção.
Por exemplo, uma casa – qualquer casa –, quando percebida
(percepção) revela­me uma superfície, mas, enquanto objecto
“visado”, essa casa, que é captada pela minha percepção e pela
minha consciência, também tem uma profundidade, etc. – é a
forma ou a essência da casa que é captada pela consciência, e
esta excede em todos os sentidos o que é percebido como
simples facto ou conjunto de sensações. Edmund Husserl
demonstra como a temporalidade (o espaço­tempo) só é
possível em um duplo movimento de presença­ausência, de
imanência e de transcendência.
A intersubjectividade é o que une o Eu ao Outro.
Se a redução fenomenológica faz aparecer o sujeito
transcendental como aquilo a partir do qual se podem
manifestar significações (valores) e um mundo apreendido
através delas, ela (a redução fenomenológica) não desemboca
nem em um relativismo, nem em um solipsismo.
A redução fenomenológica não isola o sujeito ou Eu
Transcendental em um mundo à sua medida: pelo contrário, é o
Outro que ocupa aqui um lugar primordial. A constituição do
mundo, na sua transcendência (ou seja, segundo Husserl, na
sua dimensão simplesmente humana), pressupõe de facto o
Outro – porque o Outro não é um simples objecto, mas antes é
também um sujeito, um alter ego. O Outro apreende um mundo
a partir de uma perspectiva e de um ponto de vista diferentes
dos meus; contudo, é o mesmo mundo que é “visado” e
apreendido. O Outro completa e enriquece a minha percepção do
mundo: sem essa partilha e sem essa troca – ou seja, sem essa
intersubjectividade –, nenhuma cultura (seja científica, artística,
histórica ou política) seria possível.
Editado por (OBraga)
Fenomenologia (aditamento)
No século XVIII, fenomenologia designavao estudo das
“aparências” ou dos “fenómenos” em sentido kantiano. O seu
emprego especifico por Hegel5 deriva daqui. Hegel descreve
histórica e psicologicamente as “aparições” pelas quais o
espírito passa de sensação individual até à ideia absoluta,
encarnada pela razão universal.
Hoje, fenomenologia é o método e sistema – fenomenologia
transcendental – próprios de Husserl. Edmund Husserl (1859­
1938) quis fazer da filosofia uma "ciência rigorosa"6. Formado à
base de estudos matemáticos, Husserl experimentou a
influência de Brentano que o orienta para a psicologia. Brentano
encontrou nos Escolásticos a ideia de intencionalidade: a
consciência psicológica nunca está vazia: ela é sempre
consciência de alguma coisa de exterior a si.
Transpondo esta noção de intencionalidade para o domínio da
lógica, Husserl afirma que a consciência do matemático ou do
lógico não age a partir de dados empíricos, mas de certas
“essências” ou “objectos ideais”. Por exemplo, se segurarmos
uma mão­cheia de fósforos, não podemos imaginar claramente
os quarenta fósforos que ela tem, pois que nos servimos
correntemente do número 407.
O discurso husserliano consiste, mediante a transposição destes
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22/06/2016 fenomenologia ­ Sofos
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“objectos ideais” para a lógica, fazê­los “apanhar” pela
consciência munida de intencionalidade. Rejeita o modelo da
aproximação psico­fisiológica, depois rejeita o modelo histórico
e a formalização aritmética. Conclui com a renovação da
psicologia do ego, enriquecida com a distinção entre o “vivido
real” e o “vivido inactual”8, sendo o actual tomado tanto no
sentido temporal como no sentido aristotélico.
A existência do concreto9 aparece como a tomada de
consciência de uma percepção que se inclui a ela mesma, que
Husserl chama o “mundo”. É aqui que se situa a sua articulação
com os filósofos existencialistas que Husserl10 não subscreveu.
Mas a própria consciência possui uma essência: para a atingir é
preciso fazer uma operação que Husserl chama de Epoché
fenomenológica. Esta operação delimita, ao mesmo tempo, a
consciência como subjectividade transcendental e o campo de
análise a que Husserl reduz a filosofia.
Em resumo, a consciência nunca teve conteúdo: ela é para
si mesma “acto puro” que constitui o objecto e o faz
aparecer.
Esta concepção de consciência, segundo Husserl11 , aproxima­
se da concepção de consciência da filosofia quântica segundo
Eugene Wigner e/ou Bernard D'Espagnat.
Editado por (OBraga)
Notas
1. do grego Eidos, que significa “forma”, “ideia”.
2. em matemática, uma invariante é uma constante ou
invariável
3. aqui, estou em desacordo com Edmund Husserl, talvez porque
eu seja um “hiper­realista”, mas isso é outro problema
4. Epoché: do grego, “suspensão do juízo”
5. Fenomenologia do Espírito, 1807
6. principais obras: Investigações Lógicas, 1900­1901; Ideias e
Directrizes para uma Fenomenologia Pura, 1913; Meditações
Cartesianas, 1931
7. um argumento análogo existe na Lógica de Port­Royal a
propósito do “quiliágono” ou polígono de mil ângulos, que
podemos conceber mas não representar.
8. o meio­ambiente do objecto do "percepto" ou "recebido",
"colhido".
9. o “vivido”, em geral
10. Heidegger, por exemplo, que foi aluno de Husserl
11. a fenomenologia husserliana influenciou gente como
Heidegger, Merleau­Ponty e ainda mais Sartre; Max Weber, Max
Scheler, e mesmo Suzanne Bachelard.
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