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Vf TEXTO. fl\J ENCONTRO COM O RAPAZINHO Ser homens não é um empreendimento fácil. De foto, homens não nascem, mas assim se tornam, por meio cie um aprendizado duro e difícil ainda que apaixonante. Porém, por sorte, é possível. Vamos ver como. O HOMEM: UMA IDENTIDADE MUITO DISCUTIDA , Imaginemos um rapazinho cie quatorze anos (o clobro de meu filho menor) muito esperto e que começa a escutar as conversas que estão circulando, na mídia, jornais, televisão. Ele terá ficado sabendo há pouco, por exemplo, do último encontro (são numerosíssimos) no qual importantes professores de todo o mundo decretaram que o cérebro masculino funciona muito pior cio que o cérebro feminino. Os clois hemisférios não estão alinhados, comunicam-se entre si de modo impreciso, não se pode comparar com o que acontece com as mulheres.' A comunicação mais rápida e completa cio cérebro feminino permite, pois (salientam com entusiasmo os jornalistas), uma melhor integração entre pensamento e emotividade, sensibiliza e potencializa os processos de intuição na resolução dos "A comunicação entre o hemisfério direito e esquerdo", disse, por exemplo (durante o Encontro 'Cérebro masculino e feminino' realizado em Roma em j u n h o de 1999), Paolo Pancheri. professor de psiquiatria na Universidade 'La Sapienza' de Roma, "é mais rápida e completa no cérebro feminino." problemas e dilui a rigidez sequencial do pensamento masculino. "É mais ativa também a parte frontal do cérebro que controla o comportamento e a avaliação crítica."2 OS HOMENS, RAÇA INFERIOR Qual é a conclusão diante desta superioridade feminina a 360 graus, sancionada pela ciência, segundo as melhores tradições cie todo racismo "sério" (uso aqui o termo "racismo" no seu sentido de "conjunto de crenças que justificam a discriminação sobre a base cie uma suposta inferioridade de um grupo")?3 "O clia no qual a mulher gerir em tudo e por tudo a sua maternidade com a fecundação artificial", disse o professor Paolo Pancheri, da Universidade La Sapienza de Roma, "para o homem será a derrota total. Relegado a ser um carregador de malas, um jardineiro, o faxineiro ou o instrumento sexual, o pobre homem acabará por viver em uma gaiola dourada"/' Declarações do mesmo Paolo Pancheri no Encontro já citado. 3 T.F. Pettigrew, RAV.Meertens. Lê mcisine voilé: dimensioiKet inésure(O racismo velado: dimensões e medidas), in M. Wievorka. Racisme et modernité (Racismo e modernidade). Paris: Kcl. I.a Découvene, 1993. 4 Palestra no Encontro acima citado. Colocações sucessivas valorizadas pelos jornais completavam o quadro reportando as conclusões de não melhores precisos "cientistas USA os quais 'asseguravam que ainda que se o cérebro feminino pese cerca de 137 gramas a menos, "a densidade e concentração da massa cinzenta é maior na mulher em relação ao homem". Ver também o meu artigo: Modesta protesta in nome dal nuiscbio (Modesto protesto em nome dos homens), in 'Liberal', 8 de julho de 1999. Mas u campanha jornalística sobre a inferioridade biológica do homem ainda continuou; no caderno 'Saúde' cio Corriere delia Será de domingo 21 cie maio 2000, na primeira página em caracteres grandes, o lítulo: Pensate come lei. La donna ragioiia meglio (IclViiomo. Recenli slndi banno scoperto Ia particolarità dei cervello femminile (Pensem como ela. A mulher raciocina melhor que o homem. Recentes estudos descobriram a particularidade do cérebro feminino); nas páginas internas a reportagem de Adriana Gasparini e nas várias seções se traziam as declarações sempre de Paolo Pancheri que assegura entre outras coisas: "O cérebro feminino é mais refinado, mais sofisticado do que o masculino, mais completo. Em síntese, é como uma máquina altamente sofisticada. O cérebro masculino é mais comparável a um trator". Sobre outros aspectos da campanha, ver as páginas Razzismo oggi. L'uomo, essere inferiore (Racismo hoje. O homem, ser inferior) no site www.maschiselvatici.it. Se, por acaso, o nosso rapazinho depara-se com esta previsão de seu futuro não tem muita coisa cio que se alegrar. Nós, porém, se queremos lhe dar uma mão, devemos entender para que servem estas indefectíveis e científicas certezas sobre a superioridade cia nova raça eleita pela mídia e pela ciência "midiatizada", o género feminino e sobre o consequente poder das mulheres no terceiro milénio. Será que, cie verdade, a sociedade tardo-moclerna tem tocla esta simpatia pelas mulheres? Então, por que as transveste cie homens, lhes enxuga os humores vitais, as circunda de solidão e por fim as abandona a algum psiquiatra especializado no tratamento ultraquímico da depressão, alegria das empresas cio setor? As histórias destes seres potentes e superiores, as mulheres, são na realidade tristes e muitas vezes dramáticas, tanto quanto as histórias cios homens. Por exemplo, Donna. primeira clama da capital do mundo, mulher do prefeito cie Nova Iorque, Rudolph Giuliani, teria gostado, depois de anos cie solidão afetiva e traições do marido com as secretárias, cie representar a si mesma nos Monólogos da Vagina em um teatro cia Grande Maçã. Não pode fazer nem mesmo isto porque Giuliani declarou publicamente ter um câncer na próstata e a vagina precisou, ainda uma vez, calar a sua solidão. Um feminino abandonado que fala a si mesmo e uma virilidade doente: é esta a situação autêntica dos dois géneros no fim da modernidade ocidental. Mas então por que tocla esta glorificação do feminino, este grande alarde cia "superioridade"da mulher? Uma primeira resposta pocle ser dada talvez pelo comunicado difundido no tempo da fusão entre as multinacionais farmacêuticas Wyeth, Cyanamid e Irbi, da qual surgiu a Wyeth- Lederle que foi, precisamente, a patrocinadora do Congresso de Roma, acima citado, no qual o professor Paolo Pancheri apresentou as suas perspectivas sobre o futuro dos dois sexos. "Um papel importante nas atividades de pesquisa cio grupo" CLÁUDIO RISE afirma o comunicado, "é assinalado pelo desenvolvimento de produtos farmacêuticos biotecnológicos para as mulheres: engenharia genética e biotecnologia são, de fato, clois setores sobre os quais são colocadas muitas esperanças". Esperanças fundadas com a condição de que as mulheres aceitem fecundar- se sozinhas. É esse, de fato, como clisse Paolo Pancheri, o último obstáculo e é, portanto, aquele que precisa ser aniquilado para permitir uma ulterior e decisiva cartada das utilidades de Wyeth- Lederle e de tantos outros. Naturalmente, avidamente atentos ao grande mercado cio futuro, o único ainda disponível e receptivo a novos produtos — o mercado cia vida. Se as mulheres, como dizem os cientistas empenhados na pesquisa de mercado do futuro, aceitarem não ser mais fecundadas biologicamente (salvo aquelas costumeiras retrógradas, marginalizadas), os destinos das multinacionais estão assegurados por um bom tempo pois estará se abrindo diante delas um imenso mercado de fabricação da vida. Para que isto aconteça, porém, é preciso tirar de circulação um velho animal: o homem. E convencer a mulher de sua própria grandeza, ou até mesmo, onipotência. Depois de tê-la separado de seu antigo companheiro, fechada em um universo de solidão, gratificada com um estilo de poder que não é o seu, constrangida a monologar com a própria vagina, é chegada a hora de fazê-la enlouquecer, de fazê-la acreditar que é um indivíduo superior, onipotente. A serpente que tenta Eva, convencenclo-a a tomar o lugar cie Deus e a perder, desta maneira, o mundo, é, no fim da modernidade ocidental, o complexo das grandes multinacionais que apostam tudo sobre o último consumo, o único não ainda "maduro", o único que pode ainda "expandir-se" - aquele da venda cios seres humanos fabricados artificialmente. Mas a abertura deste mercado depende do definitivo fechamento da vagina, assim como cio coração cia mulher. Para que isto ocorra SER HOMENS a virilidade em um mundo feminilizndo é necessário fazê-la crer que é uma individualidade superior, como Deus, antes Deus mesmo e assim abra a bolsa aos produtos da engenharia genética e feche todo o resto. OS BOLETINS DA DERROTA Neste ponto o nosso rapazinho começará a juntar algumas impressões. Que na escola as meninas são mais "espertas" que os meninos como ele, isto ele já percebeu há tempos. E as estatísticas que a mídia publicará a três por dois confirmam isto. Como disse triunfalmente um outro "boletim da derrota" anunciado, como sempre, por um cientista homem: "Nos Estados Unidos (mas não só), as mulheres batem os homens em quase todas as frentes educativas. Atualmente 55% cios estudantes universitários americanos são mulheres".5 Nem mesmo lhe escapou que em casa muitas mães comandam com vara, decidindo tuclo, desde a marca do televisor até a escola de seus amiguinhos. Que a mulher do presidente dos Estados Unidos, a senhora Hillary Rodham Clinton, seja definida por todos "bela e inteligente" enquanto de seu marido fala-se como cie um cretino, ele ouviu afirmar nas conversas em sua casa. Certa vez em que suplicava a uma menina para deixá-lo brincar com ela chegou a ouvir a própria avó comentar com uma babá com ar de vanglória: "Os meninos são fáceis de enganar, são tão estúpidos, pobrezinhos!" Terá notado também, o nosso rapazinho, desta vez com certo estupor, que os homens exultam cacia vez que as mulheres -j "A disparidade a favor das mulheres se corna ainda mais clara nas populares de cor. E a tendência vai num crescendo." E a opinião de M.Piu t te l l i Palmarini li professoi'S diventa opera f ore multimediale(Q professor se torna operador m u l t i d i a l ) in 11 Corriere delia Senr, Ediçào especial de Ano Novo 2000, p.18. batem um recorde precedente: "Sexo forte" anuncia o Corriere delía Será, edição especial para o Ia de Ano de 2000. ''O recorde da tripla travessia cio canal cia Mancha (34 horas) pertence a unia nadadora inglesa."6 E triunfa o articulista, Cláudio Colombo, no artigo cie acompanhamento: "A partir de recentes estudos realizados em institutos cie ciências motoras do munclo resulta que as mulheres progridem a uma velocidade tal que deixa prever, em alguns casos, até mesmo a ultrapassagem". Neste momento o rapazinho começa a ter uma estranha sensação. O munclo o está olhando, ele e todos aqueles como ele, ou seja, os homens, grandes e pequenos. Mas não com benevolência, antes com um olhar semelhante àquele, um pouco sádico, cios espectadores das lutas de boxe de terceira categoria, que observam os sinais cia próxima queda cia vítima predestinada, do clesafiante desesperado, com o sangue que escorre pela boca, o olhar que embaça à espera da contagem final. Se o nosso rapazinho for sadio ele decidirá a não se preocupar, esperando tempos melhores, mas é difícil hoje ser muito sadio em qualquer idade. A solução mais provável é, pois, que aquele rapazinho comece a olhar ao seu redor para ver como reagem os outros homens diante do olhar questionador e pouco benévolo que o munclo lhes dirige. PERDÃO Ele perceberá então que a maior parte dos homens diante daquele olhar pouco amigável se comporta como (é uma expressão de um filósofo que ele ainda não conhece: Michel Foucault) um "animal de confissão". Confessa toda culpa e pede perdão. Ibiclein, p. 41. Pode ainda acontecer que o nosso inocente não tenha conseguido escutar as confissões e os pedidos de perdão via satélite do presidente dos Estados Unidos por causa dos favores que gostava cie receber da estagiária da Casa Branca, de seios mais volumosos do que os de Hillary, chamada Mônica Levinski. Talvez não tenha nem mesmo percebido o perdão pedido repetidamente pelo Papa às mulheres, nos últimos anos, por causa de mil grosserias ou perversidades recebidas cios homens da Igreja nos séculos cios séculos. Talvez ainda fosse muito pequeno quando então o prefeito de Bologna, Vitali, disse que todo homem eleve somente se envergonhar pois esconde em si um estuprador. Mas provavelmente tenha lhe passado sob o nariz algum artigo recente intitulado Que vergonha ser homem, desde aquele espirituoso de Curzio Maltese que comentava os últimos filmes de Veneza na primeira página da "Repubblica" até outros que mais curiosamente anunciavam que Mata mais o estupro que o câncer.' E então entenderá logo o ponto central. O homem deve pedir perdão. Não importa cie quê. HOMEM FAZEDOR DE GUERRA De fazer as guerras, por exemplo. "Mas se a única coisa a que eu assisti" poderia dizer o nosso herói, se fosse um pouco mais assíduo na leitura cios jornais, "aquela guerra 'Sérvia contra o Resto do Mundo' do inverno de 1999 tinha sido fortemente desaconselhada por todos os generais e soldados e firmemente querida exatamente por três mulheres: Hillary Clinton, para desviar a atenção daquilo que acontecia sob a mesa da Sala Oval, a Secretária de Estado In 'Brescia Oggi'. Madeleine Albright, que quando pequena, foi libertada das perseguições nazistas, justamente por uma família servia, e Margareth Thatcher, favorável a todo tipo de guerra e escolhida para a ocasião como conselheira do "dócil" chefe do Governo inglês Tony Blair, o homem soft que quer fechar os clubes privados para homens enquanto violadores de oportunidades iguais?"(E os clubes somente para mulheres? Destes não se fala. Melhor não se fazer mal.) ''As suas observações são irrelevantes, rapaz" confirmaria qualquer extcnsor de artigos de fundo. Sabe-se que as mulheres são contra a guerra enquanto os homens ficam felizes como um rebanho ao partir para o fronte. Contudo, poderia dizer o pai (se não estivesse assistindo a um daqueles costumeiros seriados nos quais o homem interpreta regularmente a figura do bobo) como é que fazemos com 'mulheres negras? O que dizer de todas aquelas mulheres, mães em sua maioria, estudiosas de mulheres e feministas (de esquerda, além disto) como Maria Antonietta Macciocchi e Adele Cambria descreveram como a base mais fiel do Duce,K que levavam todas fielmente as alianças de ouro para trocar por alianças de ferro de modo que, também graças ao seu 'ouro à Pátria' o chamado Duce,9 ajudado pelos maridos suados, colocasse finalmente sob os pés aquelas dengosas abissínias? Mas o pai, como sempre, não diz nada e de resto lê pouco. O pai, que segundo respeitáveis filósofos e também segundo os fundadores cia psicanálise, seria, pois, o representante do Logos, da Palavra, assiste silenciosamente à televisão que, entre Yvr M. A.Macciocchi La donna ;/í?;r/(A mulher negra), Fekrinelii, Miiano, 1972. !) II Duce <Ji C.E. Gadda in Eros e Priapo, Garzanti (Miiano), que confirma plenamente com quinze anos cie antecipação a análise cie Macciocchi. SER HOMENS n viri l idade em um mundo femintlizndo risadas de públicos verdadeiros e falsos, propositalmente convocados nos estúdios cie televisão, representa todos os pais e maridos como perfeitos cretinos. Mas também, se por acaso, em um momento de extrema rebelião, dissesse: "Calado, desgraçado, é assim e pronto" seria, em todo caso. o veredito da consciência-preconceito coletivo. O homem ama a guerra e é violento. Mas (suponhamos que o nosso rapazinho dê uma olhada nos jornais. De resto, é a sua única chance, mesmo se não considerem certo para ele) e a diretora da penitenciária cli Sassari que autoriza os guardas a bater nos detentos até sangrarem?10 E a ministra da Justiça dos Estados Unidos, Janet Reno, que em 1993 deu ordem para atacar e matar todos os seguidores cia seita de David, compreendendo mulheres e crianças (uns 70) fechados em seu refúgio de Waco, Texas? E sete anos depois, sempre ela, Janet, guia o rapto do pequeno Elian Gonzalez, à mão armada por razões diplomáticas? E a lendária agente Bette Mills que rapta o menino que chora assustado protegida pelas armas dos colegas Federais e com um sorriso brilhante o eleva como uma presa diante dosfotógrafos já prontos para imortalizar a cena?" ... Não é que também'as mulheres... talvez... Mas o que diz, louco, suicida? São sempre e somente os homens os verdadeiros violentos!Confessa-o ou prepare-se para confessá-lo. E, sobretudo, arrependa-se. Ou, pelo menos, declare-se arrependido. Você não vai querer remar contra a corrente, ser o grosseirão, o 'politicamente incorreto? Lembre-se do seu cérebro mal feito e de sua falta de útero: às multinacionais não lhes importam nem um pouco um tipo como este. Você é um mercado maduro, a sua imagem é velha. Não atrapalhe. Adapte-se. Confesse tudo. Dos jornais diários de 9 e 10 de junho de 2000. . Dos jornais diários de 24 e 25 de abril de 2000. ÍM "l CLÁUDIO KISÉ SEM VERGONHA, ME AGRADA Se fosse somente isto, não seria muito agradável, mas o nosso rapazinho, talvez, pudesse se adaptar. Certamente a condenação social gera mal-estar e violência. A sociedade não faz, pois, seguramente um bom negócio em não poupar ao jovem homem um comportamento desfavorável, quase tocando ao desprezo que, ao contrário, busca justamente evitar (para manter a paz social) aos árabes ou aos chineses que vêm morar conosco. Mas este é um problema da sociedade. E, agora, pelo menos agora, eu gostaria de voar baixo, baixo como aquele menino. Deixemos a Sociedade ao seu destino de mentirosa e trapaceira.12 A mim, por enquanto, interessa aquele rapazinho, o dobro maior que o meu pequeno, que poderia ainda adaptar-se a ser um cidadão de série B, assim como se adaptaram, durante séculos, as mulheres, os escravos e todas as minorias étnicas, raciais e sexuais. No fundo, também ele pertence a uma minoria, mesmo sendo a mais numerosa do país. Mas existe um problema a mais. O fato é que a mensagem não é somente: "Homem é feio". A mãe, por exemplo, fica a cada momento horrorizada: as brigas com os amigos, os pêlos que crescem, a sujeira, os dedos no nariz ou as mãos a coçar o saco. Mas, outras vezes, fica também surpreendentemente maravilhada. Quem sabe até pelas mesmas coisas, mas normalmente por outras mais 'graciosas': os brincos cio seu pequeno, a sua 'sensibilidade', o fato cie que as 'outras' mulheres, meninas ou moças, correm atrás dele e ele nem percebe. A mãe não aceita e faz-lhe algumas chamadas mais facilmente que o pai, mas pouco tempo depois está pronta para seduzir. Como a mãe cie Agostinho cia qual escreve Moravia: "O semblante pálido e distante parecia olhá- lo com olhos lisonjeiros e a boca a sorrir-lhe tentadora".13 Para não falar cias mães, numerosíssimas em uma sociedade cie separados que chamam o filho para sua cama porque faz frio ou porque não é agradável ficar sozinha.'1 Ou como aquela mãe desta carta de vim adolescente que me escrevia exasperado: "Quando ela se despe ou se veste para sair cada vez mais frequentemente deixa a porta de seu quarto aberta e me chama para dizer-me as coisas que devo fazer. Enquanto isto experimenta as meias-calças ou troca, quem sabe, três calcinhas, observando no espelho e em várias posições como lhe ficam e assim por diante".11 E além disto, existem, é claro, meninas e moças, compreendendo dentre elas as irmãs que, às vezes, o rejeitam e às vezes o procuram até de modo muito íntimo. E então, como ficamos? Se sou um porco nojento o que você quer cie mim? A mensagem contraditória exerce o seu clássico efeito como se seguisse um manual: dividir em dois o destinatário, fazer dele um pobre 'escaldado'. O menino-rapaz começa assim a pensar que muito provavelmente ele não é somente um, mas dois. De um lado, é um porco nojento e, de outro, é um objeto de desejo das mulheres. Depende dos momentos. Mas como distinguir então entre o homem bom, aquele que é desejado e o mau, o porco nojento, deprezado e rejeitado? Ver .sobre isso o importante trabalho desenvolvido nos últimos anos pelo site: Pari dirilii per g/i noinini (Direitos iguais para os homens), endereço: \v\v\v. í reeweb.org/politica/iiomini/. iiiíí •/<••' ' A. Moravia. Agostino. Milano: Bompiani, 1977. 14 Ver os testemunhos A letto con Ia mamma (o con Ia nonna) (No leito com mamãe (ou com a vovó) no número de abril/maio de www.maschiselvatici.it. Disponível no arquivo do site. 15 Em C. Risé. Da uomo a iiomo. llomini chescrímno alio psicanalista (De homem para homem. Homens que escrevem ao psicanalista). Molano: Sperling e Kupfer, 1998. CLÁUDIO RISE PAPAI, DIGA-ME VOCÊ! E aqui que a necessidade do pai se torna mais angustiante. O menino-rapaz tem uma necessidade vital que um homem adulto, o pai possivelmente, lhe forneça uma orientação para olhar dentro cie si, não só para admirar-se, mas também para criticar-se quando convém. Uma orientação nascida cia cultura da qual o seu corpo, os seus instintos e a sua psique provêm: a cultura masculina. Ele tem necessidade das palavras cie um homem que falem dele conhecendo-o, sabendo como o seu corpo é feito, sabendo por um conhecimento direto cios seus impulsos, dos seus orgulhos e cios seus medos. Precisa de palavras que saibam ser colocadas no seu sistema simbólico, aincla inconsciente, distante, socialmente removido e, no entanto, vivo. Mas o pai não existe. O pai não lhe clirá nada de nada e menos ainda o que deve fazer, o que pensar das mulheres e de si mesmo enquanto homem. Não lhe dirá nada porque não saberia o que dizer pois, também para ele, o seu pai, não lhe disse nada sobre tudo isto. É também por isso que a vida sentimental, sexual, afetiva do pai foi uma navegação sem instrumentos, somente com a vista, e por isso na maioria das vezes temerosa e vil. Isto é descrito sem piedade e cie modo hostil, mas muitas vezes verdadeiro, na literatura feminina. Ou se pode ver no cinema, sobretudo americano, como, por exemplo, no filme Magnólia de Paul Anderson no qual é mostrada a vergonha dos pais que se deixam engolir pelo megacaprichoso narcisístico da sociedade dominada pela Grande Mãe cie todos os consumos. Desde o sbowman, molestador da filha ao outro que manda o filho inteligente aos jogos de azar cia televisão para poder comprar com os prémios o carrão e aplicar na bolsa, ao 'pai em fuga' que deixa a mulher SER HOMENS u viri l idade cm um mundo ícminilizado e filho porque o câncer dela lhe causa horror e medo.16 Assim são muito frequentemente os pais. O DESAPARECIMENTO DO PAI De fato, é uma história já antiga de pelo menos meio século. É desde então, do final cia Segunda Guerra Mundial em diante e pela primeira vez na sua história que o filho cio homem não tem mais um pai que lhe 'inicie' em sua condição de jovem homem. O pai está na firma, no escritório, na informações de espetáculos, nas finanças, ele se preocupa com o dinheiro e não com os princípios ou com a educação dos filhos. Ele se preocupa com as ações, obrigações, investimentos. Coisas concretas e não abstraçòes do 'tipo' seu próprio filho, o seu corpo e suas possíveis relações com o corpo dos outros. O corpo de seu filho está cotado na bolsa? Não! E então, o que você quer do pai? Ele é um homem prático, pragmático, concreto, racional, um homem cio século XX. É especialista em produtos e não em corpos ou almas, velhas histórias de uma civilização primitiva. Ele, o pai, poderia ter crescido na nova escola do ministro Berlinguer, baseada em testes cie múltipla escolha e computadores, tanto que para ele, na verdade não existem e não lhe importa, cie forma alguma, esta coisa da Idade Média (que precisamente não se estuda mais): o corpo, o género, o simbólico, as iniciações... Mas estamos loucos? Coisas de selvagens! U) Mas os verdadeiros protagonistas de Mctgnólia são, porém, os íilhos. os jovens. Problemáticos, certo, mas também corajosos e, a sen modo. leais: do f i lho génio dos jogos da televisão ao enfermeiro do velho que por sua vez está para morrer de câncer, ao jovem policial que parece ter saído de Promise Keepers, ao humaníssimo, perfeito, 'soberanoabsoluto do sexo". Tom Cruise. ti '• : CLÁUDIO HJSÉ : '%-vE, então, se com seu pai pocle-se falar somente de coisas cotadas na bolsa e você é um rapazinho, não cotado, existe somente uma figura à qual se referir — a figura feminina. O menino aprende assim que o critério para entender se aquilo que ele faz está certo ou eirado (o único que lhe é proposto) é o feminino. Da mãe, das outras mulheres. As meninas, as moças, as irmãs, as professoras. As mulheres, enfim. São elas, as mulheres, que decidem quando ele vai bem ou não. Se é um bravo menino, um bravo 'maschietto'17 (homenzinho) quem vai decidir é mãe. E atrás e junto com ela as outras mulheres. DAS PARTES DO PRAZER Não é agradável tanto mais que existem outros mistérios. Por exemplo: como pode ser que todos discutam na escola, na mídia, na TV sobre o horrível poder masculino se depois, olhando bem, você percebe que em todas as situações que se sucedem na vida, na família, nos casais, nas festinhas ou nas discotecas, quem está guiando o jogo dos sentimentos e do poder que deriva daqueles sentimentos, são as mulheres? E como pode ser que os homens, a começar por seu pai, não lhe dizem nada de tudo isto e fazem cara de mandar, enquanto quem decide são evidentemente as suas mulheres e as suas mães das quais eles temem durante toda a vida ser abandonados ou traídos? E enfim, jovem homem empenhado a considerar penosamente os seus sentimentos emergentes, que diabo você Agora também 'maschieito' (homenzinho) é uma palavra que não se diz (por soite) quase nunca; equivaleria a sublinhar uma diferença que existiria de per si antes da culpa de torná-la pessoal. é? Que autonomia você tem daquilo que pensam e daquilo que lhe pedem as mulheres? E, então, o que você poderá se tornar? Como diria ainda o costumeiro Foucault, que provavelmente você não conhecerá nunca porque nenhum mestre lhe falará disto (de fato era um filósofo sério e não um maítre ã penser 18 por rotogravura), qual é o seu saber específico que lhe conferir o seu poder específico. Seria aquele cie conhecer em detalhes os vícios e as virtudes dos jogadores de futebol e dos treinadores dos principais times cie futebol? Por mais jovem e profundamente ignorante que você seja, percebe também que este não é um grande saber e que dificilmente lhe dará qualquer poder a menos que você se torne um jogador cie futebol e que, para dizer a verdade, não é a sua vocação mais forte. Ou quem sabe se você for comprar um time: mas ciai precisam-se de muitos bilhões e isto não é um caminho, é um ponto de chegada. E o saber que se refere ao ter prazer com o seu pênis? Ali, bastam as risadinhas e os embaraços que surgem quando se fala dele para você entender que, provavelmente, há escondido algo mais forte e mais misterioso. O FALO, O GRANDE REMOVIDO Ainda que, cie fato, imagens de vaginas se vejam circulando em quantidades industriais mesmo nos jornais honestos que andam pela casa enquanto imagens de pênis quase nunca sejam vistas e quando acontece nunca aparecem eretos, isto lhe faz pensar. Como pode ser que o seu sexo, que agora é a coisa que mais lhe interessa (porque é a que lhe diz mais respeito) é a única imagem que não aparece na "sociedade da Imagem"? Em francês no original. N.T. t; CLÁUDIO RISE Exceto que nos elevadores, em grafites feitos com o estilete dos rapazes que transformam por um instante as paredes de um instrumento tão tecnológico nas paredes cias cavernas do neolítico? Ali, justamente tias partes do seu sexo, o rapazinho sente obscuramente, que, com efeito, existe um saber ao qual corresponde (ou poderia corresponder) uni poder. Não sabe, naturalmente, que é próprio por aquele poder-saber do Falo, símbolo masculino, que o grande psicanalista Jacques Lacan o chamava lê signifiant dês signifiants,19 o significante por excelência, o símbolo máximo cio qual descende toclo o sistema simbólico e, portanto, todo o saber e todo o poder. E, no entanto, não entende como, estranhamente, os homens adultos, a começar por seu pai, nunca lhe falaram nacla a não ser soltando-lhe alguma coisa um tanto boba como: "Cuide- se para não ficar com muitas olheiras". Se aquele é o seu poder-saber por que ninguém lhe diz senão sob a forma de uma palavra feia? Mesmo um rapaz de quinze anos, de pouca leitura, é, cie fato, obrigado a perceber que "fálico" significa "prepotente" e "falocrata" significa quase-nazista. Mas então, quem sabe, é propriamente o seu poder-saber, a sua própria força que está errada. Um grande problema. Tudo isto significa somente que, no fundo, você é mau. A ideia não lhe traz, em verdade, nenhuma alegria. Ao contrário, você começa a ficar um pouco deprimido. Por outro lado, também você entende que as mulheres, as únicas que falam cio pênis-falo, não podem lhe ajudar (mesmo se quisessem) por que elas não têm pênis. Não é completamente certo que elas ainda o desejem, como pensava o velho Freud (o Em francês no original. N.T. SER HOMENS n virilidade em um mundo ícmini l iz i ido barbudo fundador da psicanálise que você viu zombar em diversos filmes e em 'gag' cie televisões 'cultas'). Mas, enfim, elas não o têm. E se entende também que o fato de que você possa conseguir prazer por própria conta, sem pedir-lhes permissão, isto lhes causa incómodo quando ficam sabendo. Às vezes, pode causar até mesmo desgosto como certas amigas que falam disto entre elas torcendo a boca como se masturbar-se fosse uma coisa de maníacos persas. Ou como certas mães que espiam entre os lençóis, como se não quisessem nada, procurando pistas culpáveis ou entram no quarto na hora H olhando-o como se você fosse o monstro de Londres e tratando-lhe depois como se cie fato o fosse. Mais frequentemente, porém, o uso que o homem pode fazer cie seu pênis parece ridículo. Ei-lo, ali, o antigo símbolo do poder reduzido a uma brincadeira de criança que deve ficar escondido, lavando-se rapidamente os sinais: coisa cie rir para não chorar. Tanto mais que elas, as meninas, enquanto você crê que vai morrer com o seu pênis na mão, aprendem de memória equações dificílimas que você verdadeiramente não entenderá nunca como já lhe haviam predito os cientistas especialistas de cérebros masculinos e femininos. Portanto, por fim, também o sexo, o seu sexo lhe confere um saber (quando o aprende e não é nada fácil) ao qual não corresponde, segundo parece, nenhum poder (ao contrário daquilo que fala Foucault). Ao contrário, a ele corresponde gozação, embaraço e desgosto. O sinal que marca a sua identidade, a sua diferença, o pênis entre as pernas, é, portanto, algo ridículo. Nem sempre o foi, mas hoje é assim. Pode lhe ser então útil saber quando isto aconteceu. TRANSFORMAÇÃO DO FALO EM "OBJETO RIDÍCULO" O pênis se tornou definitivamente um objeto ridículo enquanto se fundava o mundo cie hoje, isto é, com o Iluminismo. Um movimento filosófico que você certamente estudará, ainda que mal como todo o resto, porque é um pouco o pai dos poderes-saberes cie hoje que justamente o glorificam como o servo canta os louvores do patrão. Ainda que o façam no seu modo banal, mediático-prepotente, que quer mais que tudo fazê-lo entender rapidamente que você é a favor (do Iluminismo e daquilo que ele significa em termos cie gestão do poder) ou que você é um mentecapto e, portanto, não vai entrar nunca no jogo. Quem apresentou pela primeira vez o "significante máximo" o Falo, como um objeto ridículo é de fato um dos pais do Iluminismo, Jean Jacques Rousseau em suas Confissões. Um tipo, Rousseau, que não tinha de modo algum uma boa relação nem com seu pênis, nem com o uso dele e nem com o significado dele.20 Por exemplo, sempre nas Confissões, descreve a própria companheira como um mulher simples e honesta que lhe cleu cinco filhos que foram por ele rapidamente abandonados no orfanato. Segundo outros testemunhos (entre os quais a escritoraGeorge Sanei cuja avó o conhecia bem), Jean Jacques não deixou nenhuma prole porque era completamente impotente. Os filhos, que o pai cia pedagogia iluminista abandonava regularmente no orfanato, eram filhos dos criados cia estrebaria ou da cozinha com os quais Thérèse No âmbito de sua geral hipocondria (ideias obsessivas de doenças imaginárias) era entre outras coisas ufetaclo de litomania ou convicção de ter cálculos, pedras ou outros objetos no aparelho urinário, nos rins e nu uretra (neurastenia da bexiga, segundo o médico Guyon). Isso levou Rousseau a submeter-se muitas vezes a dolorosas sondas uretrais (prática aclotada por outros, mais sinceros, como perversão consciente), naturalmente sem resultado, como foi depois confirmado também pela sua autópsia. se fazia acompanhar publicamente. Por tanto , aquela cie Rousseau, mais do que uma 'confissão' contrita, era antes uma vanglória na qual ele se apropriava dos filhos cios outros para libertar-se do fantasma da impotência que o obsessionava. Seja como for, o nosso maítre ãpenser21 conta em suas Confissões que quando jovem exibia às lavadeiras que voltavam cio trabalho (na avenidas de Genebra, à tareie, escondido atrás dos plátanos) o seu pênis, que, precisamente, define o seu 'objeto ridículo', esperando dentro cie si que alguma delas o punisse pelo seu comportamento.22 É, portanto, ali, sob os plátanos cie Plainpalais, nas noites frias genebrinas do início do século XVIII, que o Falo, o antigo símbolo do saber, do poder e do prazer se torna o objeto ridículo, o objet ridicule.2i Quem o fez assim foi Jean Jacques, futuro mestre de Robespierre e cia Revolução francesa, mas por enquanto aquele que abre caminho para a categoria destinada a tornar-se numerosa na modernidade por ele inaugurada, cios 'filhos sem pai' os fatherless,2{ como virão a ser chamados pelos assistentes sociais e psicólogos americanos obrigados a cuidar de seus múltiplos problemas e coisas mal feitas. Uma mãe que gostava cie trasvestir-se de homem e um pai que abandona Jean Jacques aos cuidados de uma tia: eis dois ingredientes que serão importantes mesmo para a época da modernidade que Rousseau inaugura, aquela do pênis como Em francês no original. N .T. 22 Como observa Jean Starobinsky in Jean Jacques Rousseau e il pericolo delia riflessione'in Tre letture di Rousseau. Bari: Laterza, 1994: o seu é um desejo de passividade, uma masculinidade que se manifesta de modo ofensivo, para retirar-se e esperar pela reação feminina, possivelmente uma punição ou uma rejeição. 23 Em francês no original. N.T. 24 Em inglês no original. N.T. CLÁUDIO K1SÉ objetridiciáe^ Certamente insuficientes como sabiam bem dois pensadores verdadeiros como Bertrand Russell e Sigmund Freud, que transformaram Jean Jacques em um pensador profundo. Suficiente, porém, para rapidamente fazer dele um personagem destinado a marcar profundamente a sensibilidade moderna, da qual inaugura, com sucesso, os piores aspectos. UMA SAÍDA: FAZER DE CONTA QUE NÃO É NADA Mas então, se o sinal da sua identidade não é outro que um 'objelo ridículo', talvez seja melhor não ficar pensando muito sobre o que seja esta identidade. Inútil atormentar-se pensando se haveria um seu saber e, portanto, um poder específico. Você deve fazer como fazem todos os outros homens, fazer de conta que não é nada. Viva. Procure sair-se bem. Prepare-se para ver muitos jogos cie futebol e esforce-se para entender o que acontece, ali dentro, no campo, e de apaixone-se por tudo aquilo (ou pelo menos faça de conta). Com as mulheres arrisque.- quando puder faça-se de prepotente, caso contrário deixe que elas o façam e siga-as, como já contava a mãe de Parsifal, quando justamente não conseguia mais segurá-lo na fazenda onde o havia fechado para que não fugisse. Não confie nos outros homens como muitas vezes já lhe ensinou sua mãe: eles não são, pois, assim tão brilhantes e pode ser também que eles venham lhe procurar porque lhes é cómodo. De resto, o que vem a ser o universo somente de homens também você pode ver: algum sobrevivente velho restaurante mal cheiroso, os jogos com os filhos da mamãe apinhados a gritar: "Sangue, Em francês no original. N.T. SER HOMENS 11 virilidade cm um mundo rcminilizado sangue", ou os cinemas pornográficos de onde saem velhos cambaleantes. Tudo isto é coisa que certamente não poderá levar você muito longe. Encontre precisamente, e logo, uma moça legal, que organize a sua vida e as ideias em função daquilo que realmente interessa: o dinheiro, o sucesso profissional, uma boa imagem social, cia qual, as mulheres de família, que em todo caso irão viver mais cio que você, possam justamente aproveitar. F. o mínimo que você pode lhes dar. Elas o aceitaram, a você e ao seu objeto ridículo. Não pesaram as suas médias baixas na escola, nem mesmo os arrotos e os peidos que a cada pouco lhe escapam, o seu sempre presente cheiro de homem que reaparece inexorável depois de cada shampoo ou desodorante. Um odor indestrutível por qualquer perfume da grife de um estilista mesmo que tenha sido suntuosamente anunciado por homens musculosos seminus ajoelhados diante cie negras de saia. Essa perspectiva (a moça, o dinheiro, a vicia de trabalho, a herança aos herdeiros) não lhe entusiasma? Pocle ser. Mas você não tem escolha. É a vida, beleza! Como dizia o velho Bogart (você pode comprar ainda algum filme vendido juntamente com um pesado jornal que logo se joga fora) enquanto os pais já estavam começando a anelar sozinhos por aí. Isso lhe diriam também muitos psicanalistas de outro modo: é o 'plano cia realidade'. Portanto, passe por cima disto tudo e não fique fazendo muita história. A VERDADEIRA SOLUÇÃO: ENTENDER ALGUMA COISA E ao contrário, não, porque ninguém pode ser feliz se não conhece o próprio valor. Mesmo aos sérvios ou aos austríacos de Carínzia ou até, quem sabe, aos indianos não agrada pensar que, no futuro, se agirem corretamente, poderão se tornar como verdadeiros americanos. E assim você não pode ser feliz pensando que, se fizer verdadeiramente tudo certo, seguindo o conselho das mulheres, quem sabe poderá se tornar o filho perfeito, marido, companheiro de uma delas. Come tu miuiioi,2h da homónima comédia de Pirandello às canções e aos filmes americanos mais vergonhosamente açucarados sempre houve uma declaração mentirosa, um programa de autocastração. Ainda que a promessa/ameaça cie se tornar como o outro pede, venha dos lábios de um homem ou de uma mulher, o fato é que ninguém deve ser como agrada aos outros. As mulheres não devem ser como os homens querem e fizeram muito bem em tirar cia cabeça dos homens esta estranha ideia. TORNAR-SE SI MESMOS Mas também os homens devem encontrar em si mesmos o próprio estilo, a própria beleza, o próprio saber ao qual corresponde o próprio específico poder. Isto não quer dizer que, depois, será tudo mais fácil. Ao contrário. Tornar-se si mesmos é um empenho que lhe carrega de uma nova responsabilidade.27 É então, cie fato, que você descobre que não tem somente responsabilidade para com os outros mas, sobretudo, para com você mesmo, começando por aquela, dificílima e solitária, cie realizar o seu Si mesmo. Uma batalha solitária, porque realizar o Ser masculino não interessa em nada à maioria dos outros homens que seguem o conselho cia mamãe, cia namorada, cio padre ou cio psicanalista. Eles vão ao jogo cie futebol, não falam e não pensam em si, não querem saber nada disto, procuram evitar.2* Realizar o Si mesmo lhe coloca em uma estrada com alguns poucos, os happvfew,w os poucos felizes prontos a morrer com Henrique V na tragédia de Shakespeare.30 "Ó nós, poucos, nós poucos e felizes, nós bando de irmãos..." Serão também bappv estes few mas numa visão menos sagrada e mais televisiva poderiam parecer sobretudo grandes frustrados. Combater no barro, sem nenhuma segurança de vencer,ao contrário, com a quase certeza cie perder... Qual é então a vantagem de não fazer de conta que nada acontece? O que se ganha ao levar-se ã sério, como homens? O que se ganha ao procurar reconhecer qual seja o próprio específico valor dos homens, cie defendê-lo cie quem o torna vil, cie propô-lo aos outros? A vantagem consiste no privilégio (em relação à dissimulação, mas também a certa depressão que ao contrário corrói a vida cie quem faz cie conta que nada acontece) de sentir, sempre mais frequentemente, que a sua vicia tem um sentido. De sentir que você é depositário (por certo: ainda frágil, inseguro) cie uma força que lhe ajuda não só a ir em frente, mas ir em uma direção precisa. Um sentido, precisamente. A VIDA DO HOMEM E O SEU SENTIDO Você descobre então que a sua vida tem um sentido, uma direção e um interesse, precisamente enquanto é a sua própria vida, sua como ser humano cie género masculino. Nome de uma peça — Como você me quer. N.T. Cf. o meu Divenla teslesso. Como: Red Edizioni, 1999. 28 E depois, em iodo caso, o Si mesmo possui um componente de género (e de cultura, em sentido antropológico: aquele sérvio é diferente do americano) e uma parte individual, unicamente própria. 29 Em inglês no original. N.T. 30 Na extraordinária interpretação Hlmogrática de Kenneíh Brannagh. ; V O sentido está ligado também àquele sinal que você tem em seu corpo e que não é um objeto ridículo e não é nem me.smo somente um sinal. Mas ele é justamente um símbolo, o símbolo do Falo, a representação cia força vital da qual você é o portador. O significante máximo,31 o símbolo dos símbolos que você deve aprender a conhecer, cio qual você deve administrar o saber porque a ele corresponde o seu poder. O Falo lhe ensina. Antes de tudo quando de pênis ele se torna, precisamente, Falo, semelhante àquele grafite nas cavernas ou nos elevadores e aponta para o alto. E assim lhe cliz, rapidamente, que o seu poder específico, de homem, não é o poder sobre os outros, aquele poder ao qual pensam precisamente os escravos recém-libertados. Ou como pensam as mulheres quando se metem a fazer-se de homens: justamente [Iorque não têm o Falo, elas o imitam e o interpretam por aquilo que parece do lado de fora e não por aquilo que é, desde dentro. O poder sobre os outros não lhe importa nada enquanto homem, você somente o deseja quando se está inseguro, fraco e assustado. O PODER SOBRE SI MESMO Aquilo que importa cie verdade e do que depende o sentido de sua vicia é o poder sobre você mesmo. O poder de fazer crescer e exprimir o seu saber ou simplesmente as suas qualidades: a sua força, a sua inteligência, a sua intuição. O sémen do qual você é o portador enquanto portador do Falo e do qual o mundo pode servir-se, nutrir-se. Fazê-lo circular, trocar, mas, sobretudo, doá-lo. É esta a sua vocação e a sua condenação. Ou você aceita, com confiança, de tornar o seu ser capaz cie conhecer e exprimir este mundo simbólico, instintivo e transcendente ao mesmo tempo representado pelo Falo, ou você pode jogar fora esta sua cabeça sexuada porque não lhe servirá para nada. Quem sabe, você seja um ganhador, terá sucesso, terá alguma mulher, alguma esperteza, mas não saberá nem mesmo quem você é. Não terá nem mesmo a vaga icléia de qual sentido tenha a sua vicia. Não saberá nunca porque um clia ela terá começado e porque um dia terminará. Ainda quando você, à noite, ficar rindo diante da televisão, não será feliz em seu coração. Se você tiver ao seu redor uma mulher, filhos, você não terá nunca se declarado verdadeiramente a eles, nunca terá falado até o mais profundo, porque você não sabe, na verdade, quem é (no fundo do seu coração você se sente como os homens cie Brett Eston Ellis — less tbcin zero K - menos que zero"). E entre vocês haverá sempre um embaraço, um sentido sutil de falsidade mais ou menos evidente. Quem é verdadeiramente este homem? Pense em quem está a seu lado. Você foge à sua pergunta como um ladrão que não quer se fazer conhecer porque não se conhece. E, por f im, você ficará com medo de viver. E, sobretudo, de morrer. Se, portanto, você não quer viver como um escravo medroso você deve encontrar a coragem de saber quem é, mesmo se até o seu pai não lhe fala disto, porque nem mesmo ele o sabe. Como diz um sábio bizarro, o gnóstico Silvano: ''Bala em si mesmo como em uma porta e caminhe sobre si mesmo como Em inglês no original. N .T. Ver a tradução italiana. Meno cli zero (Menos de ^.ero). í íompiani. Milano. em uma estrada reta. Porque se você caminhar sobre si mesmo como em uma estrada é impossível que vá para fora". Caminhar sobre nós mesmos como em uma estrada, estar em nosso caminho, isto é a "realização cio Si mesmo". Coloque-se sobre a sua estrada de homem e encontre quem você é. RE-ENCONTRE O SEU SÍMBOLO TORNE-SE UM HOMEM A sua estrada de homem começa desde muito longe. Começa nas cavernas do neolítico. Sobre as suas paredes, duras mãos masculinas, inspiradas por ritos cios quais perdemos os traços, incidiram com extraordinária força e intensidade a forma do Falo. Ali começa a sua estrada de homem, que termina, por enquanto, nos centros cias grandes metrópoles da tardia modernidade onde os arquitetos mais geniais reproduzem a mesma forma nas torres que se levantam para o céu, como que a procurá-lo. De fato, a estrada do homem é marcada por um símbolo. Como também a estrada das mulheres é marcada pela forma sagrada do Yoni, da Vulva. Elas a tomaram, a Vulva, e fizeram dela justamente o sinal do feminismo e marcharam pelas ruas das capitais com os ditos conjuntos a repetir o antigo sinal.1 Se bem que também esse esforço das mulheres possa se dizer, por enquanto, coroado de sucesso. Como recorda G. Greer em La donna ititcra (Trad. hras. - A mulher inteira. Rio de Janeiro, São Paulo: Editora Redord, 2001. N.T.), Mondadori, Milano, 2000: "A expoliaçào dos genitais femininos de toda sacralidade e mistério é um processo longo tanto quanto a própria civilização. A mandala da iconografia cristã na qual estão fechados os santos em visita ao céu como em uma auréola de bem-aventurança paradisíaca, é um símbolo do útero. O jardim do Éden é geralmente representado como um hoilits conclusas, um jardim fechado, um outro símbolo do útero". Depois de ter lembrado o seu esforço pessoal e do movimento feminista para restituir força e honra aos símbolos do útero e da vagina e por meio deles às mulheres, Greer deve. todavia, concluir: "Houve um tempo em que os seres humanos imaginaram o útero como uma entidade poderosa e positiva em vez de uma nulidade. Hipócrates considerava a fisiologia reprodutiva feminina como algo cie energético e ativo e o útero como uma criatura voraz, curiosa, capaz de invadir outras partes cio corpo..." Hoje não se acredita mais... Mas o que ganharam com isto as mulheres? "A vagina, higienizada, desodorada, esterilizada, sempre acessível e o útero são hoje mais passivos do que nunca tenham sido", observa Greer.
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