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Texto Aprendizagem Sérgio Luna

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APRENDIZAGEM
Sergio V. de Luna
Dificuldades para a definição da aprendizagem
 Como costuma ocorrer com a maioria dos conceitos da Psicologia, a dificuldade de se falar sobre a aprendizagem começa com a sua definição. Há muitas razões contribuindo para essa dificuldade e a maioria delas está ligada ao papel que a teoria desempenha na pesquisa e na explicação dos resultados que obtemos com ela. Por esta razão, vamos começar tentando entender este papel para, posteriormente, verificar de que modo a teoria pode complicar a definição de aprendizagem.
 Toda vez que nos exprimimos, oralmente ou por escrito, nós o fazemos incompletamente, como se fosse um esboço, um esquema. O relato que fazemos para um amigo da festa à qual ele não compareceu não é a festa; é apenas um esboço, um resumo daquilo que nos chamou a atenção ou que acreditamos que interesse a ele. Outra pessoa, quase certamente, faria um relato diferente da mesma festa.
 É importante lembrar que nem por isto nosso reato é necessariamente falso ou mentiroso. O fato de estarmos presentes à festa não nos permite participar de tudo, estar presente em todos os lugares, conversar com todas as pessoas, ouvir tudo o que foi dito e observar tudo o que ocorreu. Mesmo que isto fosse possível, entretanto, outro fator tornaria o nosso relato diferente dos demais: a interpretação. O fato de sermos amigos de João provavelmente faria com que interpretássemos sua ausência como decorrência de um impedimento, enquanto outra pessoa poderia interpretá-la como uma ofensa deliberada ao dono de casa.
 Algo muito semelhante ocorre com o cientista em seu trabalho de pesquisa. Como você, ao fazer um relato da festa, ele também esboça, esquematiza a realidade quando pensa sobre ela. Assim, como não foi possível a você estar presente em todos os lugares da festa, em todos os momentos, ele também não consegue olhar o problema que tenta resolver de todos os ângulos possíveis. Finalmente, também como você, ele faz a única coisa que lhe resta: seleciona aspectos que lhe parecem mais importantes. Falta alguma coisa em nossa comparação? Sem dúvida! Em primeiro lugar, o fato de que outro pesquisador talvez fizesse uma seleção diferente e, com isto, chegasse a resultados diferentes. Em segundo lugar, como você, o pesquisador também sofre influências que o levam a interpretar seus resultados de uma determinada maneira.
 Certamente há diferenças importantes no modo como o nosso relato de uma festa pode ser influenciado por uma série de circunstâncias, em relação às alterações que o trabalho do cientista sofre, até porque se espera que ele tenha sido treinado o suficiente para eliminar as influências mais óbvias. Mas ele é certamente afetado e o principal fator de influência, como você já deve ter percebido, é a teoria.
 Ao iniciar uma pesquisa, um pesquisador já leu muito do que se escreveu a respeito do seu problema de investigação. E as informações que recolhe começam a dirigir a sua atenção para determinados aspectos do problema. Mais tarde, ao concluir a pesquisa, o cientista acaba se defrontando com resultados que ele não sabe explicar muito bem. Novamente, ele recorre à teoria ou a uma teoria que lhe permita explicar (interpretar) esses resultados. Ao divulgar suas descobertas, ele provavelmente irá influenciar outros pesquisadores, quer por acreditarem nele, quer por colocarem em dúvida a verdade de suas afirmações.
 O importante a ressaltar, disto tudo, é que cada pesquisador trabalha com um pedaço da realidade que estuda, um esboço dela. Consequentemente, sua visão desta realidade é a interpretação que sua teoria permite e tem como base as informações que ela sugeriu que ele recolhesse. Sendo um esboço, esta visão da realidade funciona exatamente como um mapa. O melhor mapa para você chegar a um local desconhecido deveria conter todos os detalhes do percurso que você deverá percorrer, mas, neste caso, ele perderia a sua função: seria tão grande que provavelmente você não poderia carregá-lo; ao mesmo tempo, seria tão detalhado que seria difícil usá-lo como guia. Seguindo o mesmo raciocínio, você entenderá porque a teoria esquematiza, esboça a realidade. Embora estejamos sempre com a esperança da que a cada novo conjunto de pesquisas nós saibamos cada vez mais, a verdade é que nem sempre eles são complementares (teorias diferentes podem levar a resultados conflitantes). Além disso, para cada resposta que encontramos, novas perguntas aparecem, obrigando à revisão de teorias ou à criação de outras.
Alguns conceitos introdutórios
 Nesse tópico pretendemos apenas introduzir conceitos básicos que, acreditamos, facilitarão a compreensão e a análise de tópicos subseqüentes.
Hereditariedade X Ambiente
 Desde o nascimento a criança demonstra reações a determinadas situações sem que tenha havido qualquer possibilidade de que ela as tenha aprendido. Tais reações são denominadas reflexos: por exemplo, a estimulação da região da boca de um recém-nascido fará com que ele volte a boca em direção à fonte de estimulação; se sua cabeça cair para trás, ele abre os braços para fora e os traz de volta em direção ao peito, como se pretendesse agarrar-se a algo.
 A existência de reflexos é possibilitada, em cada espécie, pela transmissão hereditária. Herdamos uma estrutura biológica cujo desenvolvimento garante a emissão de reações específicas a estimulações ambientais específicas: o aumento ou diminuição da luminosidade produzirá uma contração ou dilatação da pupila; a presença de determinados sabores na língua (limão, por exemplo) produzirá salivação. Especialmente no ser humano, esta estrutura biológica é razoavelmente incompleta no nascimento; parte dela precisa passar por um processo de maturação biológica de modo que certas reações possam ocorrer. Isto é verdade tanto em relação ao reflexo (alguns só aparecerão com o tempo), quando em relação a outras manifestações não reflexas (andar, coordenar as mãos, etc.).
 Observações sobre as rápidas transformações por que a criança passa ao longo do processo de maturação biológica levaram pesquisadores a enfatizar o papel da hereditariedade e da maturação biológica na aprendizagem. Na medida em que seus estudos concentravam-se essencialmente em atividades motoras específicas (engatinhar, andar, pressão de objetos, equilíbrio, etc.), seus resultados tendiam a confirmar o grande peso que atribuíam à hereditariedade e à maturação na determinação da aprendizagem.
 Por outro lado, era evidente que mesmo a maturação biológica dependia de um exercício constante, de uma relação com o ambiente que proporcionasse o desenvolvimento e o fortalecimento das estruturas biológicas. Uma criança não anda de uma hora para outra, mas pratica e coordena uma série de movimentos antes de conseguir andar.
 Os efeitos produzidos pelas relações da criança com o seu meio eram suficientemente fortes para convencer outros pesquisadores de que o grande responsável pela aprendizagem da criança era o meio ambiente. Como você pode ter adivinhado, tendiam a estudar fenômenos onde a influência da maturação era menos sensível e, como conseqüência, foram enfatizando a influência do meio (você se lembra da nossa discussão na introdução deste texto?).
 Esta polêmica sobre que fator – hereditariedade ou meio – seria o grande responsável pela aprendizagem da criança durou aproximadamente até a metade deste século, quando começou a ser superada pela compreensão de que ambos os fatores complementam-se, nenhum deles podendo ser considerado condição suficiente para produzir aprendizagem, ainda que sejam necessários para isso.
 A concepção atual é a de que os fatores genéticos garantem a existência, dentro de cada espécie, de uma estrutura cujo desenvolvimento permite ao indivíduorelacionar-se com seu ambiente. É fácil perceber este tipo de interdependência com um exemplo concreto: a altura costuma ser considerada uma característica facilitadora para um jogador de basquetebol; entretanto, não só ela é suficiente para que o indivíduo seja um bom jogador, como também o treino é capaz de fazer outro jogador, considerado baixo, superar suas limitações. Não custa lembrar que o contrário também é verdadeiro: esta estrutura pode produzir limitações que nenhum treino superará, tanto dentro de uma mesma espécie (um cego poderá compensar sua deficiência, mas não enxergará), como entre espécies (não conseguimos voar sem um auxilio de instrumentos).(*)
A relação entre o individuo e o meio
 Em vários momentos fizemos menção à relação entre o individuo e o meio. É preciso, agora, esclarecer um pouco mais a expressão.
 No tópico anterior foi mencionada a existência de reflexos. Eles ocorrem essencialmente como uma reação, uma resposta do organismo a uma ação do meio. Não existe um reflexo sem alguma alteração no ambiente que o provoque; da mesma forma, em um organismo sadio, a ocorrência de uma alteração ambiental capaz de produzir um reflexo irá produzi-lo inevitavelmente (um sopro súbito no olho produz um piscar incontrolável). Note que a recíproca não é verdadeira: o fato de haver uma alteração qualquer no ambiente não implica necessariamente a ocorrência de um reflexo. Apenas situações específicas produzem reflexos específicos.
 Mas já sabemos mais algumas coisas sobre reflexos que nos ajudarão a distingui-lo de ações não reflexas.
O tipo de reflexo que estamos considerando aqui (mais tarde falaremos de outro tipo) deve ocorrer com todos os indivíduos sadios de uma mesma espécie, de forma razoavelmente homogênea; retome os exemplos já dados e verifique se isto é verdade.
 Quanto mais intensa for a estimulação ambiental, mais intensa será a reação, e mais rapidamente ela ocorrerá: quanto maior a concentração do limão colocado na língua, mais abundante será a salivação e mais rapidamente ela será produzida. Igualmente, a contração pupilar será tanto maior e mais rápida, quanto mais intensa for a luz que incide sobre o olho.
 Podemos resumir o que dissemos até aqui sobre os reflexos da seguinte maneira:
nossa estrutura biológica capacita-nos a responder a determinadas estimulações ambientais, desde o nascimento, sem que precisemos aprender a fazê-lo;
estas reações – denominadas reações reflexas ou simplesmente reflexos – são uma resposta do organismo à estimulação ambiental; dada uma estimulação adequada, a resposta é inevitável;
os reflexos até agora discutidos tendem a ocorrer de forma semelhante em todos os membros sadios de uma mesma espécie;
a magnitude (grandeza) e a velocidade da resposta dependem da intensidade da estimulação.
 Há um segundo tipo de relação entre indivíduo e o ambiente com características suficientemente diferentes daquelas verificadas na situação envolvendo o reflexo. Comecemos a ilustrá-lo com um exemplo. Consideremos um comportamento comum, tal como chamar uma pessoa pelo seu nome, e comparemos o que ocorre quando fazemos isto com as características do reflexo, que resumimos acima.
Leva algum tempo antes de sermos capazes de chamar alguém pelo nome. Se considerarmos um adulto, é provável que isto seja rápido devido ao seu treino anterior com outras pessoas; de qualquer forma, é preciso que alguém lhe ensine o nome antes de chamar a pessoa (se isto não estiver suficientemente claro, para você, imagine que a pessoa tem um nome como Eberhardt!). De qualquer modo, a idéia importante é que, ao contrário dos reflexos; este é um comportamento que precisa ser aprendido.
Não há nenhuma relação inevitável entre a estimulação e ambiental e a ocorrência do comportamento. A presença de uma pessoa cujo nome você conhece não implica absolutamente que você ira chamá-la pelo nome, mesmo que você vá chamá-la.
Certamente, todos os humanos falantes chamarão pessoas pelo nome, até por uma questão de necessidade de comunicação. Entretanto, a relação com o reflexo pára aqui: independentemente de conhecerem ou não o nome de uma determinada pessoa, indivíduos diferentes irão chamá-la ou não pelo seu nome se ela estiver presente.
Finalmente, o fato de uma pessoa ser alta ou baixa, gorda ou magra, não nos levará a dizer seu nome em tom mais alto ou baixo, nem mais rápida ou lentamente.
 Em vários momentos nós nos referimos ao reflexo como uma resposta do organismo ao meio. Entretanto, não é possível considerar o caso acima como uma resposta, pelo menos no sentido em que empregamos o termo no caso do reflexo. A contração pupilar e a salivação, por exemplo, são inevitáveis dadas as devidas estimulações. Mas não há nada de inevitável na presença de uma pessoa em relação ao fato de nós a chamarmos ou não pelo nome. Contudo, ao longo do desenvolvimento da Psicologia, comportamentos como este foram também chamado de respostas. Isto levou (e ainda leva) pessoas a associarem as duas situações como envolvendo o mesmo tipo de relação, na qual o organismo é passivo frente ao ambiente. Nós procuraremos mostrar no que esta interpretação é incorreta.
	A este segundo tipo de relação indivíduo-ambiente nós chamamos de inter-ação. Grifamos inter como uma forma de enfatizar que as ações são recíprocas. Vamos ilustrar esta reciprocidade com exemplo. Você se encontra isolado em uma festa por não conhecer quase ninguém. De repente, percebe outra pessoa igualmente isolada e aproxima-se dela (seu isolamento na festa e a presença de alguém na mesma condição levaram você a comportar-se). Dirigir-se à pessoa e falar com ela afetam-na de alguma forma. Esta alteração que você produz na pessoa vai se reverter sobre você: a pessoa aceita a aproximação e mantém você conversando; ou, de uma forma ou de outra, ela desestimula você (quer por ser pouco receptivo, quer por ser pouco interessante). Este é um exemplo típico de uma interação onde cada elemento sofre a ação do outro e, por sua vez, age sobre ele. Do ponto de vista do conceito de interação, porém, não é necessário imaginar que apenas outra pessoa ou ser vivo possa constituir um dos elementos do par que interage. Se você estiver consertando um aparelho quebrado (foi o fato de ele não funcionar que levou você a consertá-lo), cada ação sua afeta o aparelho de algum modo; por sua vez, os resultados das suas ações determinam as próximas até que você o conserte, ou desista de fazê-lo. Revendo os exemplos que demos até aqui você poderá se perguntar:
a) mas, então, o que me leva a chamar uma pessoa pelo nome ou a não fazê-lo?
b) o que me leva a abordar uma pessoa na festa e a me manter conversando com ela?
c) o que leva uma pessoa a não se comportar de uma forma que sabe e pode fazer, num momento em que isto seria “adequado”?
Questões como esta fazem parte do problema da aprendizagem e serão analisadas daqui para frente. Sugerimos, porém, que antes de prosseguir na leitura você reveja o que já foi apresentado.
Uma conceituação de aprendizagem
 Feitas as considerações acima, podemos tentar conceituar a aprendizagem. Antes de prosseguir na leitura do texto, pense em várias situações bastante diferentes, nas quais, em sua opinião, houve aprendizagem. Analise-as e procure identificar o que poderia haver de comum em todas elas e que permite afirmar que houve aprendizagem.
 Apesar de todas as possíveis diferenças entre teóricos da aprendizagem, parece haver um ponto de concordância entre eles: a aprendizagem implica uma alteração no modo de o individuo pensar, sentir, dizer, fazer alguma coisa, enfim, comportar-se. A maioria das transformações pelas quais passamos ao longo da vida é decorrente da aprendizagem(*): aprendemos a gostar de determinadas comidas e a evitar outras; aprendemos em que circunstâncias dizer ”obrigado” ou ”desculpe-me” e adar vazão a nossas emoções ou escondê-las; aprendemos a controlar nossos esfíncteres e a apreciar a pintura moderna; aprendemos a mentir e a jogar xadrez.
 O que parece haver de comum entre todas estas situações (e provavelmente entre aquelas nas quais você pensou) é o fato de o indivíduo passar a comportar-se em relação a seu meio ambiente de modo diferente daquele como costumava fazê-lo. Mais do que isto, a ocorrência da aprendizagem implica a possibilidade dele voltar a relacionar-se com seu ambiente de forma semelhante quando possível e necessário e/ou útil. Note que esta última afirmação indica, por exemplo, que a criança que aprendeu a pedir desculpas em determinadas situações poderá voltar a fazê-lo em condições semelhantes, mas não indica que ela o fará com certeza. Esta possibilidade de o indivíduo não exibir o que aprendeu criou a necessidade de distinguir aprendizagem de desempenho.
 Suponha que um professor esteja ensinando seus alunos como extrair uma raiz quadrada, e que ele opte por duas atividades de ensino: aula expositiva e demonstração de exercícios no quadro. Ao final da aula, estritamente falando, ele deverá admitir que ninguém aprendeu nada já que não foi capaz de constatar qualquer alteração na habilidade de extrair uma raiz quadrada de seus alunos (aprendizagem). Isto só poderá ser verificado com a demonstração, por parte do aluno, daquilo que sabe (desempenho). Esta distinção obriga-nos a admitir a possibilidade de uma pessoa aprender alguma coisa sem dar-nos conhecimento do fato; entretanto, deixa claro, também, que é apenas através do desempenho que podemos avaliar se e quanto ela aprendeu. Nós voltaremos mais tarde a esta questão porque ela te implicações importantes no ensino e, de modo mais geral, na avaliação do que uma criança sabe ou pode aprender.
Dois procedimentos básicos geradores de aprendizagem
 A maneira como apresentamos os reflexos, até agora, permite perguntar que relação eles têm com a aprendizagem. Se esta exige uma transformação na maneira do indivíduo relacionar-se com o meio, e se os reflexos são garantidos pela maturação da estrutura biológica, não há transformação alguma na ocorrência de reflexos. A questão é que se alguns reflexos não são aprendidos, eles constituem uma importante base para a aprendizagem.
 Relações reflexas não aprendidas, como as que mencionamos aqui, estão associadas a estruturas biológicas que controlam importantes funções internas, todas elas voltadas para o ajustamento do organismo (como, por exemplo, digestão, regulação de temperatura e produção de hormônios). Em especial, já se demonstrou que o controle das reações emocionais está associado a mecanismos reflexos e que estes desempenham função importante sobre o comportamento emocional. Alem disto, há alguns anos pesquisadores vêm estudando como aproveitar os conhecimentos acumulados sobre os reflexos no ensino do controle de fenômenos como alterações da pressão arterial e das ondas cerebrais.
 Vejamos, agora, de que modo os reflexos estão implicados na aprendizagem, entendida como uma transformação no modo do indivíduo relacionar-se com o ambiente.
 Inicialmente, precisamos esclarecer uma questão. Já dissemos que o indivíduo reage às transformações do ambiente ou interage com ele. Contudo, nem todas as transformações do ambiente constituem estimulações para reação ou interação. Há situações que nos entusiasmam e outras que nos causam aversão; porém, somos indiferentes a outras, incapazes de provocar reação ou interação. Além disto, as estimulações são capazes de produzir determinadas reações, mas não outras (por exemplo, limão na língua produz salivação, mas não produz transpiração). Estas considerações são importantes porque parte do fenômeno da aprendizagem consiste em permitir que situações ambientais originalmente neutras (isto é que não produziam uma reação) passem a fazê-lo, ou em promover a interação entre o indivíduo e situações ambientais originalmente neutras, isto é, com as quais não interagia. Ao primeiro caso chamaremos de criação de novos reflexos; ao segundo, de ampliação das interações individuo – ambiente.
A criação de novos reflexos
 Para ilustrar a criação de novos reflexos usaremos m famoso e antigo estudo do fisiólogo russo Ivan Pavlov. Pavlov colocava pó de carne na língua de um cão e media a quantidade de saliva produzida. Depois de algum tempo, Pavlov passou a fazer com que o som de uma campainha precedesse imediatamente a administração de pó de carne: em outras palavras, Pavlov em emparelhou som e pó de carne, o que, em Psicologia é chamado de pareamento. Após ter realizado alguns pareamentos entre a campainha e o pó de carne, Pavlov apresentou apenas a campainha. Antes de continuar a ler, reflita sobre o seguinte:
O que efeitos poderia ter o som da campainha sobre o cão, antes do pareamento?
O que relação poderia haver entre o som e a salivação, antes do pareamento?
O que deve ter acontecido quando, após o pareamento, Pavlov apresentou apenas o som da campainha?
 A resposta à primeira pergunta é discutível, já que provavelmente você não dispõe de detalhes sobre o procedimento de Pavlov. Em todo o caso, é muito provável que um som inesperado faça uma pessoa ou um animal voltar-se em direção à fonte sonora. Neste sentido, não é possível considerá-lo neutro, já que é capaz de produzir uma reação.
 A segunda pergunta parece mais fácil de responder. A menos que tivesse havido algum tipo de pareamento anterior, que Pavlov desconhecesse, não deveria haver relação entre som e salivação. Neste caso, porém, poderíamos dizer que o som era neutro em relação à salivação.
 Mesmo desconhecendo o estudo de Pavlov, é possível adivinhar o resultado do seu estudo (embora tenha levado muito tempo para alguém fazer essa descoberta!): à simples apresentação do som, após o pareamento, o cão começava a salivar. Desta maneira, havia sido demonstrada uma nova relação entre o cão e o meio, inexistente até então, caracterizando a aprendizagem.
 Esta nova relação e também um reflexo e Pavlov denominou-se de reflexo condicionado: por analogia, o reflexo original (que vínhamos chamando de não aprendido) foi chamado de reflexo incondicionado (por não precisar de condicionamento para provocar a resposta). Entre as possíveis diferenças entre os dois tipos de reflexos, uma merece ser comentada. A considerável homogeneidade dos reflexos incondicionados ente os membros sadios de uma espécie não se verifica em relação aos reflexos condicionados. A explicação é simples: na medida em que os primeiros são determinados pela estrutura biológica garantida pela herança genética, é de se esperar que todos os indivíduos com as mesmas características apresentam reações semelhantes. Por outro lado, as estimulações ambientais que provocam os reflexos condicionados eram originalmente neutras para aquela reação, só serão comuns a pessoas que, por qualquer circunstância, tiveram a mesma história de pareamento. 
 Pavlov fez mais uma descoberta importante: se o novo reflexo for suficientemente forte (por exemplo, se tiver havido muitos pareamentos) ele pode ser usado para criar novos reflexos, e assim por diante.
 Não temos possibilidade de nos estender mais neste assunto e, com isto, corremos o risco de não lhe dar oportunidade de julgar, por você mesmo, alcance das descobertas de Pavlov. Mas é possível, pelo menos, analisar duas implicações que permitirão avaliar o potencial do condicionamento pavloviano.
 Em primeiro lugar, note que o fato de Pavlov ter provocado o condicionamento através de um pareamento feito em laboratório não significa que esta seja a única forma de produzi-lo. De fato, o próprio Pavlov demonstrou que outros objetos sistematicamente presentes no laboratório durante o condicionamento podiam adquirir propriedadessemelhantes àquelas adquiridas pela campainha. A situação natural está repleta de exemplos deste tipo e os exemplos mais famosos ainda parecem ser os relacionados ao dentista e ao médico: o barulho do motor funcionando ou a visão da seringa pode provocar as mesmas reações que a dor; para algumas crianças, o simples avental branco pode colocá-las em pânico.
 A segunda implicação importante é a possibilidade de eliminar reações. Se uma particular reação foi gerada por um pareamento, então talvez seja possível eliminá-la (ou mesmo preveni-la) pelo procedimento inverso (ou seja, impedindo que as duas estimulações apareçam juntas). Procedimentos deste tipo já foram desenvolvidos e vêem sendo estudados e aplicados.
A ampliação das interações indivíduo–ambiente
 Um grande número de ações que realizamos diariamente afeta nosso meio ambiente de alguma forma: apertamos interruptores de luz, abrimos torneiras, respondemos a perguntas ou reclamamos do volume do rádio. Dificilmente algum desses comportamentos deixará de produzir um efeito e, qualquer que seja, ele deverá afetar-nos de volta (mesmo que, por exemplo, falte força elétrica ou água, ou que a pessoa a quem nos dirigimos não responda). Estes efeitos recíprocos entre o indivíduo e o ambiente podem produzir aprendizagem na medida em que permitem ampliar a possibilidade de interação entre ambos.
 Por questão de facilidade, analisemos os dois primeiros exemplos dos quatro que demos acima. O que nos mantém apertando interruptores de luz e abrindo torneiras é, certamente, o fato de isto produzir luz ou água (ou interromper seu fluxo). É pouco provável que alguém abra uma torneira ou aperte um interruptor fora destas situações; por outro lado, é extremamente provável que ele faça isto se precisar de água ou luz (ou não precisar mais delas). Alguma certeza sobre o que o individuo fará em situações como as descritas? Não! Tudo o que podemos afirmar é que, no caso de:
a) ele conhecer a função de um interruptor (ou de uma torneira), isto é, se ele souber o que ocorre quando ele é acionado;
b) ele precisar de luz (ou de água);
c) existir um interruptor (ou uma torneira) à disposição;
d) ele dispor de condições físicas e maturacionais para manipular o interruptor (ou a torneira) (uma criança pequena poderia não alcançá-los ou não ter coordenação ou força para acioná-los);
Então, seria extremamente provável que ele apertasse o interruptor (ou abrisse a torneira). Ou seja, a probabilidade de um indivíduo comportar-se de uma maneira particular e uma determinada situação depende, entre outras coisas,
de sua história passada de interação com aquela situação particular ( ou com situações semelhantes);
de condições motivacionais (que razões ele tem para comportar-se daquela maneira);
da disponibilidade de meios para comportar-se (embora, nestes casos seja óbvia a necessidade da existência de um interruptor ou de uma torneira, nem sempre é tão fácil identificar de que meios o indivíduo precisa para comportar-se);
do seu quadro genético e da sua maturação biológica (como vimos, dependendo da criança, tais comportamentos poderiam não ser possíveis).
 Com um pouco de análise você verá que o que dissemos para os dois primeiros exemplos vale também para os dois seguintes (responder perguntas e reclamar do volume do rádio). Experimente fazer isso. À medida que prosseguirmos você verá oportunidade de testar sua análise.
 Nós citamos, acima, quatro condições importantes para avaliar a probabilidade de uma pessoa comportar-se de uma determinada maneira. Vamos, agora, analisar cada uma delas.
a história passada de interação com o ambiente.
Ao nascimento, pessoas e objetos que nos circundam tem pouca ou nenhuma possibilidade de interagirem conosco. Já vimos que, neste período, a relação da criança com o ambiente é estabelecida basicamente através de reações (reflexos). Mas já está presente uma atividade muito útil para as finalidades que discutimos: movimentos musculares desordenados que prenunciam o que, mais tarde, será chamado de comportamento exploratório. Através desta atividade, a criança altera seu ambiente e pode sofrer os efeitos disso. Por exemplo, o primeiro contato da criança com o chocalho colocado em seu berço pode ser puramente acidental. Durante sua movimentação no berço, um de seus braços poderá bater no chocalho e, com isto, produzir som.
 A questão importante que esta situação suscita é: houve ou não interação? Sabemos que a interação exige efeitos recíprocos. Sem dúvida alguma, a criança alterou o meio (balançou o chocalho e o fez produzir som). Mas sofreu algum efeito? Em caso afirmativo, como sabemos disso? Dependendo do nível de desenvolvimento da criança, é possível que ela sorria ou mostre sinais de medo. Mas como distinguir, nestes comportamentos, uma reação de uma interação?
 A resposta está questão está na conceituação de aprendizagem que apresentamos logo no início. Dissemos que ela consistia em alterações na forma de o indivíduo reagir ao ambiente ou interagir com ele; mas dissemos, também, que o indivíduo deveria ser capaz de comportar-se de forma semelhante (mantidas as mesmas condições) quando fosse possível, necessário, útil. Consequentemente, só com o tempo será possível avaliar se houve ou não interação entre a criança e o chocalho. Se for possível demonstrar que seu contato com o chocalho não passa de acidente, então parece não ter havido qualquer interação entre ambos; por outro lado, se formos observando que ela passa mais tempo olhando ara o chocalho, dirige seus braços em direção a ele, e, finalmente, consegue tocá-lo cada vez mais, então começa a se evidenciar uma aprendizagem decorrente de uma interação entre a criança e seu meio.
 Cada nova interação que a criança estabelece com o meio cria condições para novas interações e, portanto, para novas aprendizagens, gerando o que podemos chamar de conhecimento. É a esta experiência acumulada que chamamos de história passada de interações com o ambiente. 
Condições motivacionais
Motivação é o segundo dos fatores que listamos como condições determinantes da probabilidade de o indivíduo comportar-se. Trata-se de um dos mais antigos e controversos termos da Psicologia.
 Se você voltar ao exemplo da interação criança – chocalho, talvez perceba uma lacuna que deixamos em nosso raciocínio. Dissemos lá que o primeiro empurrão da criança no chocalho provavelmente seria acidental e deixamos implícito que daí por diante ela começaria a aperfeiçoar seus movimentos, tornando-os mais precisos e eficientes. Falta, porém, questionar por que ela faria isto, e porque outra criança talvez não o fizesse?
 Considerações explicativas das razões de um indivíduo interagir ou não com o seu meio – ou da maneira particular dessa interação – tradicionalmente têm envolvido o conceito de motivação. Diferentes teorias, contudo, desenvolveram formulações diferentes para ele. Nós procuraremos discutir a questão sem entrar nestas divergências.
 Já vimos que o quadro genético de cada espécie dota seus membros de uma estrutura capaz de se ajustar ao ambiente com respeito a sua preservação, sem que seja necessário haver aprendizagem. Neste sentido, pelo menos parte da questão motivacional não apresenta dificuldade de compreensão, mesmo que não seja tão fácil explicá-la; as razões desses comportamentos estariam na evolução das espécies e na hereditariedade, e a questão da motivação encontraria aí a sua explicação. 
 Entretanto, à medida que subimos na escala evolutiva (isto é, que passamos das espécies biologicamente inferiores às superiores), aumenta a complexidade das estruturas neurológicas dos indivíduos e, portanto, dos atos que eles podem realizar, mas diminui o seu preparo inato para o desempenho das funções de ajustamento. Os animaisnascem mais bem preparados do que o homem para reconhecer o perigo e fugir dele e para localizar aquilo de que precisam para sobreviver. Ainda assim, os animais (e, sobretudo, o homem) precisam aprender parte considerável dos comportamentos de adaptação.
 Um bebê automaticamente virará o rosto se algo lhe obstruir a respiração (reação reflexa). Mas uma criança precisará aprender – de alguma forma - que determinados objetos podem estar quentes e queimar-lhe as mãos, ou que certos vegetais não são comestíveis. Da mesma forma, se uma moça evita ter relações sexuais antes do casamento, não é difícil imaginar que a virgindade possa ser um dos valores de seu sistema motivacional (embora outros valores possam igualmente estar em jogo). A questão a analisar é como este valor foi incorporado ao seu sistema.
 Deve estar clara, agora, pelo menos uma das dificuldades que geram a controvérsia sobre a motivação. Por um lado, é um conceito extremamente difundido na Psicologia como necessário para a explicação do comportamento e da aprendizagem, por outro lado, a sua própria explicação envolve a aprendizagem, na medida em que os fatores motivacionais são, freqüentemente, aprendidos. 
 Um sistema motivacional complexo vai sendo formado à medida em que a criança vai interagindo com o ambiente. Tal sistema incluirá valores e princípios capazes de explicar a maneira pela qual o indivíduo se comporta. O desenvolvimento deste sistema motivacional está fora do âmbito deste livro; entretanto, muitos dos aspectos nele envolvidos serão analisados no capítulo referente à socialização. Deve ser registrado, porém, que ele começa a ser formado a partir das interações que a criança estabelece com o seu meio e leva em conta o resultado da sua interação passada.
 Vamos resumir alguns dos aspectos comentados até aqui.
 Indivíduo e ambiente alteram-se. Nem sempre, porém, estas alterações se revertem em efeitos sobre o outro, o que significa que nem sempre há interação. Suponha, por exemplo, que uma pessoa caia na rua, subitamente, e sem razão aparente. Isto fará com que outras pessoas:
a) passem indiferentes;
b) corram para ajudá-la;
c) afastem-se com medo da situação;
d) preocupem-se, mas apenas observem que porque “nunca sabem o que fazer nestas situações” ou porque “já há gente ajudando”.
 O que leva cada pessoa a comportar-se de uma ou outra maneira (note que no primeiro exemplo, aparentemente, não houve interação) depende da história de interações de cada um, mais os valores e princípios dela decorrentes. Mais especificamente, depende das conseqüências advindas do que cada um fez, no passado, em situações semelhantes e do modo como estas conseqüências foram se organizando em valores e princípios. Muitas pessoas recusam-se a ajudar acidentados de trânsito ou a servir de testemunhas em virtude das complicações que podem advir disso; outras, entretanto, fazem-no apesar das implicações.
A disponibilidade de meios para o indivíduo comportar-se
 Este item, aparentemente simples, contém uma implicação que deve ser ressaltada. De um modo geral, ele apenas afirma que, se o comportamento em questão depender de recursos (nos nossos exemplos, torneira e interruptor), estes devem estar disponíveis, o que é obvio! O que não é tão obvio é o fato de a presença ou ausência de recursos no ambiente facilitar (ou limitar) as instruções possíveis do indivíduo. Se, como apontamos, a história passada de interações de um indivíduo cria condições para novas interações (e, portanto, para a aprendizagem), é fácil entender que o meio do indivíduo controla sua aprendizagem.
 Considere a realidade de duas crianças. Uma delas vive constantemente exposta a um ambiente cujas solicitações tendem a facilitar o desenvolvimento de comportamentos semelhantes (se não idênticos) aqueles esperados pela escola: a linguagem é a mesma, há exposição a situações culturais estimuladoras (teatro, cinema, museus, livros, revistas e viagens), e o contato com situações que, se não reproduzem as propostas pela escola, provavelmente serão compatíveis com elas (regras de conduta, por exemplo).
 A outra criança vive em um ambiente igualmente estimulador (não há ambiente neutro) e, por isso, interagirá com ele. Entretanto, o que ela aprende da interação com este ambiente tem pouca (ou nenhuma) relação direta com as atividades propostas pela escola formal: buscar dinheiro ou alimento a cada dia, tomar conta de irmãos menores (embora seja, também, uma criança pequena), descobrir possibilidades novas de trabalho ou mesmo trabalhar junto com os pais. Na medida em que o que aprendeu com seu ambiente não se assemelha com o que é proposto pela escola, é pouco provável que ela se saia bem nas atividades escolares. Dito de uma forma mais correta, é pouco provável que a escola saiba aproveitar o que esta criança aprendeu como ponto de partida para novas aprendizagens.
 Juntando o que já dissemos sobre a importância das interações passadas e sobre os fatores motivacionais, deduz-se com quem está a desvantagem em relação à escola. Pode-se dizer desta última criança que
vive em um ambiente cuja solicitação não promove comportamentos relevantes para a escola;
sua história de interações, portanto, será limitada em relação a tais comportamentos;
terá dificuldade para estabelecer novas interações, já que a história passada facilita ou limita as interações futuras;
finalmente, segundo a mesma linha de raciocínio, é provável que sua motivação seja pouca para enfrentar as novas atividades, quer pela dificuldade que elas lhe apresentam, quer pela pouca relação que mantêm com sua história de vida.
O quadro genético e a maturação biológica
	Acreditamos que a relação entre aprendizagem e os fatores genéticos e maturacionais já tenha sido suficientemente analisada.
Retomando a questão das relações entre indivíduo e meio
 Temos elementos suficientes, agora, para avançar na análise da aprendizagem.
 Os procedimentos de condicionamento de reflexos e de ampliação das interações indivíduo-ambiente foram apresentados como processos distintos, o que, de fato, são. Há, porém, grandes aproximações entre eles, na medida em que certos comportamentos começam como reações ao ambiente e acabam sendo afetados pela interação com ele.
 Tomemos como exemplo ilustrativo, o caso das emoções. Há, pelo menos, quatro elementos envolvidos nas emoções:
as situações ambientais que as provocam (seja por reação ou por interação);
reações fisiológicas (choro, transpiração, elevação dos batimentos cardíacos, palidez, etc.);
comportamentos verbais e motores (expressão das emoções);
sentimentos não expressos.
 Alguns destes comportamentos são reflexos e exibidos desde o nascimento. Outros – como já vimos durante a discussão sobre o condicionamento de reflexos – serão construídos a partir de pareamentos. Até então, continuamos tendo o comportamento emocional como reação a situações ambientais. À medida em que estas reações vão sendo produzidas, vão afetando outras pessoas, produzindo interações. O choro de uma criança que se machucou afetará pessoas que procurarão confortá-la, tentarão fazê-la calar-se ou ridicularizarão sua fraqueza. Dependendo da consistência e da freqüência de cada um desses tipos de interação, é possível que esta criança se torne manhosa (porque isto, no passado, produziu alguma vantagem), ou contida (não por ter tido oportunidade de manifestar emoções). Algo semelhante ocorre com as formas e locais de demonstração de emoções proibidas ou censuradas socialmente, ou ainda com a discriminação sexual em relação às emoções (“menino não chora” ou “ homem não pode ser sensível”) que, apesar de tudo, persistem!
 Finalmente, a aprendizagem entra em mais um dos elementos envolvidos nas emoções que citamos há pouco.Uma das formas de expressão emocional é o comportamento verbal, e este deve ser aprendido. Embora não seja possível analisar, aqui, o problema em profundidade, devemos mencionar uma dificuldade particular que esta situação apresenta.
 O comportamento verbal, especialmente no que diz respeito ao vocabulário, é aprendido pela relação sistemática que a criança observa entre um objeto ou uma situação e o termo ou expressão empregada por alguém para expressar-se. No caso de emoções, torna-se difícil para o adulto ensinar-lhe exprimir o que sente: como a criança não tem vocabulário para descrever seus sentimentos (se tivesse, não seria necessário ensinar-lhe), resta ao adulto a alternativa de tentar inferir o que ela pode estar sentindo e, então, aplicar uma palavra que lhe pareça adequada. Por exemplo, um adulto que vê uma criança muito parada e calada depois que a criança com quem brincava foi embora, pode perguntar-lhe se está triste, quando, na verdade, ela pode estar ofendida por algo que a outra fez ou disse.
 
 Retomando nosso ponto principal, há uma interação entre os vários tipos de relação que se estabelecem entre o indivíduo e o ambiente, de tal modo que comportamentos que começaram como reações (incondicionadas ou condicionadas) podem interagir com o ambiente, alterando-o e sofrendo seus efeitos.
Alguns componentes essenciais da aprendizagem
 
 Não há duvida de que uma criança que sabe que seu animal é um cachorro aprendeu alguma coisa: emprega o termo em relação ao animal quando, antes, não era capaz de fazê-lo. Entretanto, isto não é suficiente: pouco adianta (a não ser como um começo) que ela apenas seja capaz de repetir “cachorro” quando alguém assim a instruir; ela deverá, como já dissemos antes, ser capaz de empregar o termo em relação ao animal sempre que for pertinente.
 Uma vez aprendido que aquele seu animal é um cachorro, a criança possivelmente fará algo que você já deve ter presenciado: chamará qualquer animal semelhante de cachorro! Além deste desempenho ser menos errado do que parece a principio, o fenômeno que aí ocorre é extremamente importante.
 Para entender o que acontece com a criança, suponho que alguém diga a você que um quadrado grande, azul e listrado é um DIF. Você necessitará de muitas tentativas para descobrir se o que caracteriza um DIF é algum dos elementos (por exemplo, o fato de ser listrado), uma combinação deles (por exemplo, DIF é qualquer azul) ou se DIF é uma soma de todos eles. Portanto, se a situação na qual a criança aprendeu a dizer cachorro não permitiu que ela distinguisse o que caracteriza aquele animal em relação a outros, não há porque chamá-los por nomes diferentes. Por outro lado, o processo é importante porque permite uma racionalização na maneira como lidamos com as coisas e pessoas, se não fosse por ele, precisaríamos aprender a mesma coisa a cada vez que aspectos não fundamentais fossem alterados; por exemplo: seria necessário aprender que um dobermann é um cachorro, que um pastor alemão é um cachorro, etc. Através deste processo, a partir do momento em que aprendemos o que define um objeto, pessoa ou situação, somos capazes de classificar todos os elementos com as mesmas características (todos são, no caso, cachorros).
 Você deve ter percebido que há, aqui, a presença de um outro processo. Assim como a criança deve aprender que características permitem agrupar vários elementos em um mesmo conjunto, ela deve aprender a reconhecer o que permite separar elementos de diferentes conjuntos (cães não são gatos). Mais, ainda, deverá aprender que, dependendo da característica que se escolhe, elementos diferentes segundo um critério (cães e gatos pertencem a espécies diferentes) passam a pertencer a um mesmo conjunto (ambos são animais).
	Os procedimentos que garantem estes processos são basicamente os mesmos. Consiste em prover informações claras e imediatas para o desempenho da criança, de modo que ela possa identificar, tão precisamente quanto possível, que aspectos ajudam a agrupar ou a separar elementos. Novamente, isto é feito, através das relações que o indivíduo estabelece com seu ambiente. 
	
	À medida que a criança vai adquirindo conhecimento (isto é, vai aprendendo a fazer agrupamentos e distinções, vai descobrindo como controlar seu ambiente, etc.), este conhecimento passa a ser um elemento importante nas suas relações com o meio. Chegará o momento em que, com base em experiências passadas, ela será capaz de prever efeitos de interações que ela não chegou a efetuar na prática (algo como “se eu fizer isto, deve acontecer tal coisa”) antes de agir sobre o ambiente. Se os resultados de sua ação forem usados para avaliar sua previsão, então ela estará aprendendo a pensar.
Aprendendo sobre si mesmo
 A comida que colocamos no prato é, em geral, decorrência da avaliação que fizemos da nossa capacidade de comer. O obstáculo que procuramos saltar foi medido em relação as nossas possibilidades. Se tivermos tempo para refletir, só enfrentaremos um inimigo depois de calcular nossas chances em relação a ele. Enfim, decisões sobre as nossas possibilidades são tomadas em relação ao conhecimento que adquirimos sobre nós mesmos, sobre nossas capacidades. Este conhecimento foi fruto dos sucessos e fracassos que obtivemos em nossas tentativas em situações semelhantes. Neste sentido, nossas decisões serão tanto mais corretas quanto melhor for o conhecimento que tivermos de nós mesmos e a avaliação que pudermos fazer da situação sobre a qual refletimos no momento. Este autoconhecimento pode ter influência bastante forte sobre a aprendizagem.
 Se a história de interações de uma criança incluir muito sucesso com tarefas à altura de suas possibilidades, então é muito provável que ela se disponha a enfrentar novas tarefas e seja capaz de avaliar adequadamente suas possibilidades. Por outro lado, uma história de fracassos constantes (provavelmente devidos a tarefas acima da suas possibilidades) poderá diminuir sensivelmente a disponibilidade da criança de engajar-se em atividades novas e levá-la a avaliar-se aquém de suas possibilidades.
Considerações finais
 O conhecimento que o indivíduo tem de si mesmo e do seu ambiente provem das suas relações com este. É verdade que boa parte deste conhecimento pode ser transmitida por outra pessoa não dependendo, portanto, de experiência direta. Ainda assim, a aprendizagem dependeu de experiência direta com seu meio.
 Ao longo da vida, novas relações vão sendo estabelecidas e servirão de base para futuras interações. Desta forma, as oportunidades oferecidas a cada pessoa marcarão o tipo de relação que ela mantém com seu meio e, portanto, influenciará sua aprendizagem.
 Cada interação implica a ocorrência de efeitos recíprocos; indivíduo e ambiente alteram-se e sofrem os efeitos dessas alterações. Dissemos que estes efeitos ajudam a entender porque continuamos ou não a nos comportar de uma determinada maneira. Por exemplo, deixamos de pedir informações a pessoas cujas respostas, no passado, estavam erradas e continuamos a procurar amigos em cuja companhia nos sentimos bem. Resta analisar um aspecto referente a estes efeitos recíprocos que consideramos fundamental.
 Há dois tipos diferentes de efeitos produzidos por uma interação: o que chamaremos de natural, e o que pode ser denominado artificial. Um efeito é natural quando é produto direto da nossa atuação sobre o meio: a água que sai da torneira é produto direto de nossa ação sobre a torneira; uma resposta (ou silêncio) é conseqüência da pergunta que fizemos a alguém. Se nos mantivermos abrindo torneiras ou fazendo perguntas àquela pessoa será, entre outras coisas, em virtude dos efeitos produzidos por nossas ações. Interações como estas capacitam-nos a lidar diretamente com o ambiente.
 Dizemosque um efeito é artificial quando ele foi decorrente de interferência de um outro elemento na interação que estabelecemos. A conseqüência natural que sofre uma criança que quebrou um brinquedo é ficar sem ele. O castigo que recebe da mãe é um efeito artificial, já que representa a interferência de um outro elemento na interação. Certamente deve ser argumento que a mãe faz parte do ambiente da criança e que, portanto, o comportamento dela deveria ser considerado natural, uma vez que a ação da criança afetou-a. Não podemos discordar desta última afirmação. O ponto importante, porém, é que a mãe interferiu na relação da criança com o brinquedo, e com relação a isto ela é um elemento estranho. Ao contrário do que descrevemos quanto ao primeiro exemplo, se a criança deixar quebrar brinquedos é muito possível que ela o faça por causa das conseqüências fornecidas pela mãe, não pelo efeito natural de sua ação.
 No entanto, não é possível considerar os efeitos artificiais como o vilão de história porque muito do que precisamos aprender depende deles. O efeito natural de escrita é a comunicação (ou, pelo menos, a expressão do que pensamos). Entretanto, se dependêssemos deste efeito natural para nos mantermos escrevendo, nunca chegaríamos a aprender; chegamos a isto através de efeitos artificiais (elogios da família inteira, por exemplo) quando rabiscamos ou começamos a desenhar letras. Da mesma forma, antes do coleguismo transformar-se em um valor em si mesmo, dependemos de interferências artificiais de outras pessoas que nos estimularão a ajudar um amigo e nos elogiarão por isto.
 Estas situações não chegam a nos preocupar se, de fato, constituem apenas um passo intermediário necessário para permitir que o indivíduo interaja diretamente som seu ambiente. O ponto importante é que se a história de interações do indivíduo for constituída basicamente por meio de efeitos artificiais, ele passará a ficar sob a dependência dos elementos que interferem em suas interações. Se os efeitos de suas interações foram sempre produzidos por outra pessoa, ele não tem razões próprias para se comportar, nem critérios pessoais para avaliar suas interações. É o aluno que estuda para não tirar nota baixa (e não porque assim aprende) e que depende do resultado da prova para saber se “foi bem”.
Esta é a melhor maneira de criar indivíduos dependentes. Mas o objetivo da educação deve ser o de formar indivíduos tanto quanto possível, autônomos.
(*) Se você tiver interesse na questão das relações entre genética e comportamento, sugerimos a leitura de dois artigos excelentes e acessíveis. Um do Prof. Frotta-Pessoa e o outro do Prof. César Ades, ambos no recém-lançado livro Psicologia no ensino de 2° Grau: uma proposta emancipadora. São Paulo: Edicon, 1986 (pp.41-59 e 60-73).
(*) Embora não pretendamos entrar neste tipo de detalhe, não custa mencionar o fato de que há transformações temporárias que não são consideradas como aprendizagem. É o caso, por exemplo, da habituação (após algum tempo no escuro, passamos a enxergar), da fadiga (um músculo submetido a esforço contínuo pode deixar de responder temporariamente) da febre (que pode produzir alucinações) ou do efeito de drogas.
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