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0 UNIDADE IV FILOSOFIA LÓGICA E ÉTICA 1 Caro estudante, Queremos lhe dar as boas-vindas e cumprimentá-lo pela oportunidade de participar dessa modalidade de ensino-aprendizagem presente no currículo do curso que escolhestes estudar. Você está participando de um momento importante na instituição e no nosso país, pois a Educação a Distância – EAD está se expandindo cada vez mais, por ser uma modalidade que busca atender as novas demandas educacionais decorrentes das mudanças na nova ordem econômica mundial. As características fundamentais da sociedade contemporânea que têm impacto sobre a educação são, pois, maior complexidade das relações sócio-produtivas, uso mais intenso de tecnologia, redimensionamento da compreensão das relações de espaço e tempo, trabalho mais responsabilizado, com maior mobilidade, exigindo um trabalhador multicompetente, multiqualificado, capaz de gerir situações de grupo, de se adaptar a situações novas e sempre pronto a aprender. Em suma, queremos que a partir do conhecimento das novas tecnologias de interação e do estudo independente, você, caro estudante, torne-se um profissional autônomo em termos de aprendizado e capaz de construir e reconstruir conhecimentos, afinal esse é o trabalhador que o mercado atualmente exige. Dessa forma, participe de todas as atividades e aproveite ao máximo esse novo tipo de relação com os seus colegas, tutores e professores, e nos ajude a construir uma FATE e uma sociedade cada vez melhor. Malverique Neckel – Diretor Acadêmico FATE 2 Unidade IV Objetivo da unidade 4 1. Definir o que é globalização e identificar as suas vantagens e desvantagens. 2. Analisar a influencia das idéias neoliberais no cotidiano dos cidadãos. 3. Ver até que ponto ela afeta a minha vida pessoal e profissional. O mundo globalizado O que é globalização Introdução Texto extraído do livro: Convite à filosofia. São Paulo, Ática, 1994 Se olharmos a história da humanidade, veremos que as sociedades tradicionais mudam muito lentamente, o que permite às novas gerações a adaptação segura à herança recebida. A extrema rapidez das mudanças, porém tem nos deixado perplexos. Na sociedade contemporânea, as noticias não chegam como antigamente, no “lombo dos burros”, ao contrário, podem se disseminar instantaneamente por todo o globo, pelas infovias. Do mesmo modo, as crenças solidificadas perdem a força que dava segurança às decisões importantes, enquanto a diversidade das culturas 3 oferece a possibilidade de adesão a idéias mais díspares, colocando em xeque a visão de mundo com aspirações à “verdade absoluta”. Vivemos o tempo da globalização, como se o mundo fosse uma grande aldeia. Globalização é um conjunto de transformações na ordem política e econômica mundial visíveis desde o final do século XX. Trata-se de um fenômeno que criou pontos em comum na vertente econômica, social, cultural e política, e que consequentemente tornou o mundo interligado, uma Aldeia Global. O processo de globalização é a forma como os mercados de diferentes países interagem e aproximam pessoas e mercadorias. A quebra de fronteiras gerou uma expansão capitalista onde foi possível realizar transações financeiras e expandir os negócios - até então restritos ao mercado interno - para mercados distantes e emergentes. O complexo fenômeno da globalização teve início na Era dos Descobrimentos e se desenvolveu a partir da Revolução Industrial. Foi resultado da consolidação do capitalismo, dos grandes avanços tecnológicos (Revolução Tecnológica) e da necessidade de expansão do fluxo comercial mundial. As inovações nas áreas das Telecomunicações e da Informática (especialmente com a Internet) foram determinantes para a construção de um mundo globalizado. 4 O surgimento dos blocos econômicos - países que se juntam para fomentar relações comerciais, por exemplo, Mercosul ou União Europeia - foi resultado desse processo econômico. O impacto exercido pela globalização no mercado de trabalho, no comércio internacional, na liberdade de movimentação e na qualidade de vida da população varia a intensidade de acordo com o nível de desenvolvimento das nações. A sociedade em rede Essa transformação radical ocorrida nas últimas décadas deve-se, principalmente, ao impacto das novas tecnologias eletrônicas, que revolucionaram os meios de comunicação de massa, tais como rádio, televisão, vídeo, jornal, revistas de grande circulação, redes informatizadas como internet etc. Os novos meio são responsáveis pela rápida e ampla difusão da informação, ao mesmo tempo que trazem o risco de massificar e homogeneizar, podendo descaracterizar as culturas tradicionais e diluir as diferenças individuais. Modernidade e liquidez: o diagnóstico de uma época Para Bauman (2001) o momento presente pode ser caracterizado como a era da liquefação do projeto moderno, a modernidade líquida. Desde o século XIX, já com Marx e Engels, mas também com muitos outros pensadores, a modernidade era tida como um processo social, econômico, político e cultural amplo que ao longo de sua marcha histórica derretia todos os sólidos existentes. O grupo de parentesco, a comunidade tradicional fechada e isolada, os laços e obrigações sociais fundados na afetividade e na tradição, a religião, dentre outros, foram, de certa forma, “derretidos” pelo progresso moderno. O momento atual da modernidade é caracterizado justamente pela dissolução das forças ordenadoras que permitiam ativamente reenraizar e reencaixar os antigos sólidos em novas formas sociais modernas. Os padrões sociais de referência que balizavam a ordem social da modernidade tornaram- 5 se liquefeitos, a classe, o Estado-nação, a cidadania, juntamente com a livre expansão global das forças de mercado e o retrocesso da veia totalitária da ordem moderna libertaram os indivíduos de seus grilhões atados a uma ordem rígida e racional-instrumental. Conforme Bauman: O “derretimento dos sólidos”, traço permanente da modernidade, adquiriu, portanto, um novo sentido, e, mais que tudo, foi redirecionado a um novo alvo, e um dos principais efeitos desse redirecionamento foi a dissolução das forças que poderiam ter mantido a questão da ordem e do sistema na agenda política. Os sólidos que estão para ser lançados no cadinho e os que estão derretendo neste momento, o momento da modernidade fluida, são os elos que entrelaçam as escolhas individuais em projetos e ações coletivas – os padrões de comunicação e coordenação entre as políticas de vida conduzidas individualmente, de um lado, e as ações políticas de coletividades humanas, de outro (BAUMAN, 2001, p. 12). Para Bauman (2001) a modernidade entrou numa fase aguda de privatização e individualização que desvinculou os poderes de derretimentos dos sólidos da tradição de seu reenraizamento na ordem moderna, e, dessa forma, possibilitou uma cisão entre a construção individual da vida, a “política- vida” e a construção política da sociedade. O fenômeno mais aparente dessa desvinculação é o processo de desregulamentação política, social e econômica que se manifesta na expansão livre dos mercados mundiais, no desengajamento coletivo e esvaziamento do espaço público. Na modernidade líquida os indivíduos não possuem mais padrões de referência, nem códigos sociais e culturais que lhes possibilitassem, ao mesmo tempo, construir sua vida e se inserir dentro das condições de classee cidadão. Chega-se no entender de Bauman (2001) a era da comparabilidade universal, onde os indivíduos não possuem mais lugares pré- estabelecidos no mundo onde poderiam se situar, mas devem lutar livremente por sua própria conta e risco para se inserir numa sociedade cada vez mais seletiva econômica e socialmente. 6 Para Aranha (1994) desde o final dos anos de 1960 e meados de 1970, teve início a revolução da tecnologia da informação, inaugurando o mundo novo da sociedade em rede. O sociólogo catalão Manuel Castelli cita alguns exemplos de redes, como seus conjuntos de nós interconectados, em que cada nó depende do tipo de rede em que se encontram. 1. Rede dos fluxos financeiros globais: mercados de bolda de valores e suas centrais de serviços auxiliares. 2. Rede global da nova mídia: sistemas de TV, estúdios de entretenimento, meios de computação gráfica, equipes para cobertura gráfica e equipamentos móveis. 3. Rede política que governa a União Europeia: conselhos nacionais de ministros e comissários europeus. 4. Rede de tráfico de drogas: campo de coca e de papoula, laboratórios clandestinos, pistas de aterrissagem financeiras para lavagem de dinheiro. E assim por diante, poderíamos dar uma infinidade de exemplos. Essa forma inédita de organização global em rede tem exercido influência capital em vários setores da atuação humana, gerando mesmo um novo tipo de sociedade. A arte da vida na modernidade líquida: a ilusão da felicidade consumidora O paradoxo é que sociedades como a nossa, que a cada dia tornam- se mais ricas, também tem a cada dia pessoas menos felizes. A riqueza parece não ser o principal motivo da felicidade, justamente parece ocorrer o contrário, a correlação entre riqueza e felicidade é inversa. O crescimento econômico acelerado parece não provocar um surto concomitante de felicidade, mas ao inverso, é a taxa de criminalidade que é crescente e uma ascendente sensação de incerteza quanto ao destino de cada um. Os bens necessários a uma vida feliz não podem ser comprados com dinheiro. Não se compra no shopping com cartão de crédito, o amor, a 7 amizade, os prazeres da vida doméstica, o companheirismo, a autoestima por um bom trabalho, o respeito mútuo etc. Tais bens, intangíveis por natureza, não podem ser adquiridos no mercado, por isso a felicidade não pode ser comprada. No entanto, os mercados vendem a felicidade, ou mais precisamente, vendem outros bens que podem substituir àqueles intangíveis e não-negociáveis. Um dos efeitos de manter a busca da felicidade atrelada ao consumo de mercadorias é tornar essa busca interminável e a felicidade sempre inalcançada. Se não se pode chegar a um estado de felicidade duradouro, então a solução é continuar comprando, com a esperança de que a próxima linha de produtos superfáceis de usar ou a nova tendência outono- inverno redima os incansáveis buscadores de felicidade. A grande cartada dos mercados foi transformar o sonho da felicidade de uma vida plena e satisfatória em uma busca incessante de “meios” para se chegar a isso. Os principais meios para atingir uma vida feliz são mercadorias, mas não apenas objetos que servem ao consumo. Quem busca uma marca, uma grife um logo, deseja o reconhecimento que isso irá lhe proporcionar perante os outros. Marcas e grifes são palavras de uma “linguagem de reconhecimento” (BAUMAN, 2009, p. 21). Essas são as principais preocupações para os buscadores da felicidade na época líquido-moderna. Essa característica da busca frenética da felicidade através do reconhecimento social tem impactos importantes na identidade. Na modernidade sólida, as identidades eram sim autoconstruídas, no entanto, eram também feitas para durar. No caso da experiência dos indivíduos na versão líquida da modernidade, a identidade é continuamente montada e desmontada. E tem de ser assim, visto que a busca fugaz da felicidade exige adaptabilidade e mudança constante, portanto prender-se a uma “identidade” pode ser o desfecho final de um destino infeliz. 8 Uma nova sociedade As grandes descobertas tecnológicas no campo da automação, da robótica e da mecroeletrônica transformaram radicalmente não só as fábricas, como o setor de serviços, a cidade e o campo, as residências, os transportes e a comunicação. A influência esmagadora da mídia e da informação no cotidiano das pessoas faz mudar a maneira de sentir e de pensar, devido ao predomínio da imagem e da informação abundante e fragmentada, fatores que provocam inclusive alterações na percepção de tempo e de espaço. Vejamos o que de fato mudou na produção, na política, nas relações interpessoais e na cultura, entre tantos outros campos que passaram por alterações significativas. Ser um indivíduo responsável por suas escolhas não é uma escolha, mas um destino. (aqui escutamos ecos de Sartre) A vida humana é uma perpétua luta contra as condições externas, contra a realidade e série de tentativa de superação dos desafios impostos em busca de uma “vida boa”. A imagem desta “vida boa” pode ser expressa na metáfora de Ricouer. A boa vida é uma nebulosa. Cheia de estrelas-guia e trilhas embaçadas pela poeira. Nada garante que a estrela escolhida para indicar o caminho seja a correta. Na nebulosa também não há caminho de volta, apenas um ir em direção ao caminho de uma de suas milhões de estrelas. Na nebulosa, a única saída é a responsabilidade de escolher qual estrela irá ser a guia do caminho. A diferença intergeracional se manifesta na experiência da arte da vida. Para as gerações antigas, a arte da vida girava em torno de um plano prévio, de coisas permanentes, as quais vinham se associar os eventos, as casualidades e os apetrechos descartáveis. Para as gerações jovens, a arte da vida funciona como os “ happenings ” e as “instalações”, tudo é movimentado, desmontado e montado, tendo em vista o momento presente e as incertezas, que são as únicas coisas permanentes. A arte da vida no mundo líquido-moderno caracteriza- se pelas 9 sublevações intermitentes. A modernidade líquida encontra-se em estado de “revolução permanente”. Esse golpe de sorte ao encontrarmos o destino, no entanto não vem acompanhado na modernidade líquida pela massa pesada de trabalho duro e esforço acumulado para se atingir os objetivos. Até o espírito de sacrifício, que marcava a arte da vida na modernidade sólida, tende a desaparecer substituído pelo “talento” excepcional a ser descoberto por um mecenas de muito dinheiro. Mas não apenas requer talento, a arte da vida líquida espera também dos seus artistas a contínua e ininterrupta mudança e adaptabilidade. Comunidade e identidade líquidas: o cabide dos ricos e a trincheira dos pobres Fonte: Só filosofia charge. Você deve estar se perguntando o que é realmente o que é Globalização, portanto, a Globalização é um dos processos de aprofundamento da integração econômica, social, cultural, política, que teria sido impulsionado pelo 10 barateamento dos meios de transporte e comunicação dos países do mundo. Mas, veja que na charge as pessoas ainda são desmoralizadas pelas suas aparências (Pessoas Pobres), tendo em vista que mesmo sendo uma festa em que poderia estar presente todas as pessoas só entrariam pela porta da frente pessoas da alta classe. http://portifoliodegeografialucianolucas.blogspot.com.br/2012/05/char ge-sobre-globalizacao.html Os significados atrelados à palavra “comunidade” sempre remetem a alguma coisa boa. Um lugar seguro, quente e aconchegante. A sociedade pode ser má,mas a comunidade não. Viver em comunidade possibilita a experimentação de prazeres que não se encontram mais acessíveis. Todos estão seguros e têm a certeza de que estão livres de perigos ocultos. Todos se entendem bem, não há a preocupação decorrente da falta de confiança ou da surpresa. Na comunidade pode-se contar com a ajuda alheia sempre que for necessário. A única obrigação na vida comunitária é ajudar uns aos outros. Por fim, a comunidade é o tipo de mundo altamente desejável, mas que não se encontra mais ao alcance, “paraíso perdido ou paraíso ainda esperado” (BAUMAN, 2003, p. 09). O preço a ser pago, portanto, para a vida em comunidade é a liberdade individual. Se desejares segurança (comunitária) abdica de tua liberdade (identidade) e seja fiel. Essa é a regra primeira de toda comunidade imaginada que se transformou em realmente existente. Para sobreviver à comunidade deve-se requerer a lealdade de seus membros, mas fazendo isso se sacrifica a própria liberdade e autonomia de construção da vida. Para ilustrar isso, Bauman (2003) nos conta mitos. Tântalo, filho de Zeus era um ser humano que ousou adquirir e compartilhar um conhecimento proibido, descobrindo coisas que estavam vedadas à humanidade, sendo apenas de sabedoria divina. A punição divina que recebeu foi ficar eternamente mergulhado num regato, mas quando ficasse com sede e tentasse beber a água, esta 11 desaparecia. Quando ficasse com fome e fosse pegar algumas frutas que estavam amarradas numa coroa em sua cabeça, o vento soprava e as levava para longe. A mensagem do mito é que a felicidade se encontra na inocência. Quando perderem a inocência, os seres humanos não serão mais felizes. Não se satisfarão com o que já tem, sempre buscando mais e cada vez menos satisfeitos quando conseguirem os seus desejos, pois quando os realizarem, o seu apetite não ficará satisfeito e procurarão outros objetos de apreço para buscar. O mito judeu do Gênesis é outra história parecida. Enquanto viviam na inocência do paraíso, os seres humanos não necessitavam realizar escolhas e perseguir seus objetivos, pois tudo estava à mão. Eles viviam sem problemas, porque não estavam conscientes de sua condição. Quando comeram o fruto proibido do conhecimento do bem e do mal, perderam a inocência e receberam o castigo de Deus de trabalharem para perpetuar sua própria vida. Do mesmo modo que Tântalo, Adão e Eva deveriam trabalhar para garantir seu sustento que jamais lhes estaria assegurado pelo resto de suas vidas. A diferença entre a comunidade antiga e a sociedade moderna em ascensão era um entendimento compartilhado por todos os membros. No entanto, esse entendimento era tácito, não-construído, espontâneo, evidente e natural. Tal entendimento estava na base de todos os acordos, o “ponto de partida” de qualquer união, era inquestionável porque comum e óbvio para todos. Na versão antiga da comunidade, as lealdades não eram dadas por uma relação de cálculo, mas por uma lógica social interna de compartilhamento. 12 O Pensador Moderno por Andy Singer (1965) Cartunista norte- americano. www.andysinger.com A charge em questão foi retirada do site http://catalogodeindisciplinas.wordpress.com/2011/03/06/os-cartuns-de-andy- singer Andy Singer é um cartunista americano nascido em 1965. O trabalho de Singer critica o mundo tecnológico e a indústria moderna, a poluição e o transporte urbano em particular. São dele os desenhos que ilustram o livro ?A Tirania do Automóvel?, Publicado pela Conrad. A cultura diante dos processos de globalização O processo de globalização cultural é fortemente marcado pela divulgação dos valores da indústria cultural ocidental, principalmente da norte- americana. Ou seja: como na economia e na política, os processos de globalização não são simétricos, não são abertos para todos, de modo igualitário. Pelo contrário, dão oportunidades para que o poder dos países centrais se exerça, alargando mercados, trazendo novos valores, modos de vida, sonhos de consumo. Para melhor compreender esses processos, vamos examinar dois modos complementares pelos quais se produz a globalização. 13 Para Aranha (1994) primeiro dele é o que o sociólogo Booaventura de Sousa Santos chama de localismo globalizado: quando determinado fenômeno cultural local [e globalizado com sucesso. É o caso da língua inglesa como língua mundial, especialmente na internet; da difusão do fart-food como modo de alimentação, não só em metrópoles, mas também nas pequenas cidades; dos padrões do cinema comercial de Hollywood, que também promove o “modo americano de viver” desde o final da Segunda Guerra Mundial; dos padrões de música popular; dos parques temáticos etc. O que se globaliza, nesse caso, é a cultura dos vencedores, que valorizam as manifestações culturais dos países centrais em detrimento da cultura dos lugares periféricos. A vitória traz a possibilidade de ditar os termos da integração, da competição e da exclusão de culturas diferentes, mas somente como subalternas e alternativas. Na verdade, esses processos de aculturação tanto podem ser assimilação quanto de incorporação. Fonte: Só filosofia charge. 14 A arte da vida na versão líquida da modernidade desincumbe o indivíduo de se identificar. Ele pega o que desejar e achar necessário e segue em frente. A potência de se transformar num pessoa diferente torna-se uma obrigação. A identidade individual encontra- se em contínuo estado de nascimento, não podendo se erguer muito além disso. Os ídolos servem para atestar a experiência comum de fluidez e instabilidade na autoconstrução da vida individual. Eles possibilitam aos seus fãs e admiradores a vivência do sonho de fazer parte quando na verdade estão todos solitários. Na comunidade estética, a experiência de união é sentida como real sem que os laços necessários à permanência da comunidade sejam de fato estabelecidos. A comunidade estética também pode ser entendida como um “cabide” onde os solitários construtores depositam seus sonhos de fazer parte de algo e amenizam os seus pesadelos de uma vida realmente solitária. No entanto, dada a natureza da construção da identidade, esses cabides são totalmente descartáveis e descartados. Por uma globalização alternativa Texto extraído do livro: Convite à filosofia. São Paulo, Ática, 1994 Vivemos hoje um tipo de globalização comandado pelas forças do capitalismo neoliberal, que apesar de ser um sistema econômico capaz de produzir riqueza e acelerar o processo, com significativo poder político, mostrou-se incapaz de destruí-la de maneira justa. O mundo sofre com problemas como fome, mortalidade infantil, falta de saneamento básico devido à concentração de renda e de terras nas mãos de poucos. A pobreza dos inúmeros países periféricos contrasta com a situação das nações poderosas, as quais não chegam a uma dezena: basta ler nos jornais quando os G7 ou G8-grupo dos sete países mais ricos mais a Rússia – reúnem-se para decidir nossos destinos. 15 Fonte: Só filosofia charge. As 20 profissões do futuro Estudo da empresa de tendência Sparks & Honey indica as 20 atividades que irão figurar no novo mercado de trabalho do presente e do futuro. São carreias mais complexas, colaborativas e especializadas. 16 A companhia indicou uma lista de 20 carreiras que farão sucesso nos próximos anos. A maior parte delas têm a ver com consultorias personalizadas ou que ajudam profissionais a se guiar no mundo virtual. Algumas já existem, mas terão uma demanda maiorno futuro. Outras têm um grande potencial e ainda deverão ser criadas. Uma das profissões é o conselheiro de produtividade. A atividade leva em consideração que as pessoas vão precisar, cada vez mais, de melhorar a sua produtividade, com a combinação de saúde, bem-estar, gestão do tempo e aconselhamento de carreira. O crescimento da visibilidade de moedas virtuais gera a oportunidade para um profissional que vá se dedicar a estudar esse mercado. Outra função apontada como tendência é o arquivista pessoal, que vai contratar um especialista para organizar, catalogar e tentar extrair o melhor dos conteúdos pessoais. Um faz tudo em 3D será um especialista bastante procurado pelas pessoas. Ele vai poder fabricar o que o cliente pedir em impressora 3D. Fonte: Jornal O Povo-23.09.13. A crítica da liberdade líquida O grande dilema da teoria crítica tradicional era conceber a possibilidade da libertação do indivíduo, diante do totalitarismo de Estado e da rotina embrutecedora da fábrica fordista. Na modernidade líquida, porém, a tarefa crítica deve assumir outro compromisso. A modernidade líquida pode ser entendida como um processo de individualização e privatização do espaço público, relacionado com a nova dominação econômica extraterritorial. A crítica deve então lidar primeiramente com a problemática da liberdade ilusória dos indivíduos produto do processo de individualização. 17 Por que ilusória? A tão sonhada liberdade, na modernidade líquida, assume a forma de uma liberdade compulsiva e obrigatória. Aos indivíduos é dada a tarefa de autoconstrução de sua vida sem qualquer apelação, visto que são culpados pelo que se tornam, sem qualquer garantia social contra os infortúnios que por vezes podem acontecer. Não existem mais parâmetros, condições e códigos que pudessem regular essa autoconstrução. A volatilidade identitária, a fluidez dos relacionamentos construídos no decorrer da vida, a dificuldade de vislumbrar um futuro seguro e estável (seja no trabalho ou em outros aspectos da vida), tornam a liberdade “líquida”, na verdade, uma sutil e ardilosa prisão. A tarefa da crítica diante dessa situação deve se concentrar no desmonte dessa liberdade ilusória. Para Bauman (2001) quanto mais o sistema capitalista avança no seu domínio dos espaços planetários, mais o fosso entre os chamados indivíduos de jure e indivíduos de facto aprofunda-se e alarga-se. Os primeiros são justamente os seres humanos comuns que foram na verdade condenados a serem livres. A sua autonomia e autodeterminação é pouca ou inexistente e ainda eles são culpados pelos seus próprios infortúnios (desemprego, pobreza, depressão, drogas). Os indivíduos de jure compõem a massa crescente da população mundial que se ilude com a expectativa de ser incluída na sociedade de consumo, mas que na verdade, apenas encontra-se incluída em sua própria solidão impotente. 18 Fonte: Só filosofia charge. Para refletir Fonte: Morin, Edgar, A cabeça bem feita; Repensar a reforma, repensar o pensamento. Bertrand Brasil, 2003. O desenvolvimento da inteligência geral requer que seu exercício seja ligado à dúvida, fermento de toda atividade crítica, que, como assinala Juan de Mairena, permite “repensar o pensamento”, mas comporta também “a dúvida de sua própria dúvida”. Deve recorrer à ars cogttandi, a qual inclui o bom uso da lógica, da dedução, da indução – a arte da argumentação e da discussão. Comporta também essa inteligência que os gregos chamavam de métis 3, “conjunto de atitudes mentais... que conjugam o „faro‟, a sagacidade, a previsão, a leveza de espírito, a desenvoltura, a atenção constante, o senso de oportunidade”. 19 Enfim, seria preciso partir de Voltaire e Conan Doyle, e, mais adiante, estudar a arte do paleontólogo ou do arqueólogo, para se iniciar na serendipididade. arte de transformar detalhes, aparentemente insignificantes, em indícios que permitam reconstituir toda uma história. Como o bom uso da inteligência geral é necessário em todos os domínios da cultura das humanidades – também da cultura científica – e, é claro, na vida, em todos esses domínios é que será preciso valorizar o “pensar bem”, que não leva absolutamente a formar um bem-pensante. O ensino matemático, que compreende o cálculo, é claro, será levado aquém e além do cálculo. Deverá revelar a natureza intrinsecamente problemática das matemáticas. O cálculo é um instrumento do raciocínio matemático, que é exercido sobre o problem settings o problem solving, em que se trata de exibir “a prudência consumada e a lógica implacável”. No decorrer dos anos de aprendizagem, seria preciso valorizar, progressivamente, o diálogo entre o pensamento matemático e o desenvolvimento dos conhecimentos científicos, e, finalmente, os limites da formalização e da quantificação. A filosofia deve contribuir eminentemente para o desenvolvimento do espírito problematizador. A filosofia é, acima de tudo, uma força de interrogação e de reflexão, dirigida para os grandes problemas do conhecimento e da condição humana. A filosofia, hoje retraída em uma disciplina quase fechada em si mesma, deve retomar a missão que foi a sua – desde Aristóteles a Bergson e Husserl – sem, contudo, abandonar as investigações que lhe são próprias. Uma cabeça bem-feita é uma cabeça apta a organizar os conhecimentos e, com isso, evitar sua acumulação estéril. Todo conhecimento constitui, ao mesmo tempo, uma tradução e uma reconstrução, a partir de sinais, signos, símbolos, sob a forma de representações, idéias, teorias, discursos. A organização dos conhecimentos é realizada em função de princípios e regras que não cabe analisar aqui 5; 20 comporta operações de ligação (conjunção, inclusão, implicação) e de separação (diferenciação, oposição, seleção, exclusão). O processo é circular, passando da separação à ligação, da ligação à separação, e, além disso, da análise à síntese, da síntese à análise. Ou seja: o conhecimento comporta, ao mesmo tempo, separação e ligação, análise e síntese. Nossa civilização e, por conseguinte, nosso ensino privilegiaram a separação em detrimento da ligação, e a análise em detrimento da síntese. Ligação e síntese continuam subdesenvolvidas. E isso, porque a separação e a acumulação sem ligar os conhecimentos são privilegiadas em detrimento da organização que liga os conhecimentos. Como nosso modo de conhecimento desune os objetos entre si, precisamos conceber o que os une. Como ele isola os objetos de seu contexto natural e do conjunto do qual fazem parte, é uma necessidade cognitiva inserir um conhecimento particular em seu contexto e situá-lo em seu conjunto. De fato, a psicologia cognitiva demonstra que o conhecimento progride menos pela sofisticação, formalização e abstração dos conhecimentos particulares do que, sobretudo, pela aptidão a integrar esses conhecimentos em seu contexto global. A partir daí, o desenvolvimento da aptidão para contextualizar e globalizar os saberes torna-se um imperativo da educação. O desenvolvimento da aptidão para contextualizar tende a produzir a emergência de um pensamento “ecologizante”, no sentido em que situa todo acontecimento, informação ou conhecimento em relação de inseparabilidade com seu meio ambiente – cultural, social, econômico, político e, é claro, natural. Não só leva a situar um acontecimento em seu contexto, mas também incita a perceber como este o modifica ou explica de outra maneira. Um tal pensamento torna-se, inevitavelmente, um pensamento do complexo, pois não basta inscrever todasas coisas ou acontecimentos em um “quadro” ou uma “perspectiva”. Trata-se de procurar sempre as relações e inter-retro-ações entre cada fenômeno e seu contexto, as relações de reciprocidade todo/partes: como 21 uma modificação local repercute sobre o todo e como uma modificação do todo repercute sobre as partes. Trata-se, ao mesmo tempo, de reconhecer a unidade dentro do diverso, o diverso dentro da unidade; de reconhecer, por exemplo, a unidade humana em meio às diversidades individuais e culturais, as diversidades individuais e culturais em meio à unidade humana. Enfim, um pensamento unificador abre-se de si mesmo para o contexto dos contextos: o contexto planetário. Para seguir por esse caminho, o problema não é bem abrir as fronteiras entre as disciplinas, mas transformar o que gera essas fronteiras: os princípios organizadores do conhecimento. Pascal já formulara a necessidade de ligação, que hoje é o caso de introduzir em nosso ensino, a começar pelo primário: “Sendo todas as coisas causadas e causadoras, ajudadas e ajudantes, mediatas e imediatas, e todas elas mantidas por um elo natural e insensível, que interliga as mais distantes e as mais diferentes, considero impossível conhecer as partes sem conhecer o todo, assim como conhecer o todo sem conhecer, particularmente, as partes...” (Pensamentos, Éd. Brunschvicg, II, 72). Para pensar localizadamente, é preciso pensar globalmente, como para pensar globalmente é preciso pensar localizadamente. O problema chave permanece: quais são os princípios que poderiam elucidar as relações de reciprocidade entre partes e todo, bem como reconhecer o elo natural e insensível que liga as coisas mais distantes e as mais diferentes? A filosofia da vida Para Morin (2003) o aprendizado da vida deve dar consciência de que a “verdadeira vida”, para usar a expressão de Rimbaud, não está tanto nas necessidades utilitárias – às quais ninguém consegue escapar –, mas na plenitude de si e na qualidade poética da existência, porque viver exige, de cada um, lucidez e compreensão ao mesmo tempo, e, mais amplamente, a mobilização de todas as aptidões humanas. 22 É para o aprendizado da vida que o ensino da filosofia deve ser revitalizado. Então, ele poderia fornecer o indispensável suporte dos dois produtos mais preciosos da cultura européia: a racionalidade crítica e a autocrítica, que permitem, justamente, a auto-observação e a lucidez; e, por outro lado, a fé incerta, que será objeto do capítulo seguinte. A filosofia, ao contribuir para a consciência da condição humana e o aprendizado da vida, reencontraria, assim, sua grande e profunda missão. Como já acusam as salas e os bares de filosofia, a filosofia diz respeito à existência de cada um e à vida quotidiana. A filosofia não é uma disciplina, mas uma força de interrogação e de reflexão dirigida não apenas aos conhecimentos e à condição humana, mas também aos grandes problemas da vida. Nesse sentido, o filósofo deveria estimular, em tudo, a aptidão crítica e autocrítica, insubstituíveis fermentos da lucidez, e exortar à compreensão humana, tarefa fundamental da cultura. A MAIOR CONTRIBUIÇÃO de conhecimento do século XX foi o conhecimento dos limites do conhecimento. A maior certeza que nos foi dada é a da indestrutibilidade das incertezas, não somente na ação, mas também no conhecimento. “Um único ponto quase certo no naufrágio (das antigas certezas absolutas): o ponto de interrogação”, diz o poeta Salah Stétié. Uma das maiores conseqüências desses dois aparentes defeitos – de fato, verdadeiras conquistas do espírito humano – é a de nos pôr em condição de enfrentar as incertezas e, mais globalmente, o destino incerto de cada indivíduo e de toda a humanidade. Aqui, convém fazer a convergência de diversos ensinamentos, mobilizar diversas ciências e disciplinas, para ensinar a enfrentar a incerteza. BIBLIOGRAFIA Aranha, Maria Lucia Arruda e Martins, Maria Helena. Temas de Filosofia. Moderna, 2005. 23 BAUMAN, Zygmunt. Modernidade líquida . Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2001. _____. Comunidade : a busca por segurança no mundo atual. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2003. _____. Arte da vida. Rio de janeiro: Jorge Zahar Ed., 2009. PALLARES-BURKE, Maria Lúcia Garcia. Entrevista com Zigmunt Bauman. Tempo social . São Paulo, v.16, n.1, 2004. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S010320702004000100 015&lng=en &nm=iso>. Acesso em: 12 dez. 2009. http://www.opovo.com.br/app/opovo/economia/2013/09/23/noticiasjornalecono mia,3134186/as-20-profissoes-do-futuro.shtml http://www.filosofia.com.br/historia_show.php?id=70 Chauí, Marilena. Convite à filosofia. São Paulo, Ática, 1994. Chauí, Marilena e outros. Primeira filosofia; lições introdutórias. São Paulo, Brasiliense, 1984. Morin, Edgar, A cabeça bem feita; Repensar a reforma, repensar o pensamento. Bertrand Brasil, 2003. Severino, Antonio Joaquim. Filosofia. São Paulo, Cortez, 1992. Aranha, Maria Lucia Arruda e Martins, Maria Helena. Temas de Filosofia. Moderna, 2005. Filosofia – Estudo e ensino I, Martins, Maria Helena Pires. II. Título. 24
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