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Introduc¸a˜o a` Ana´lise Funcional Espac¸os com produto interno e o problema de Sturm-Liouville Hamilton Prado Bueno Universidade Federal de Minas Gerais Departamento de Matema´tica A minhas filhas Franciele e Lilian Suma´rio 1 Espac¸os de Banach 1 1.1 Normas e espac¸os normados . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1 1.2 Aplicac¸o˜es lineares contı´nuas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 2 1.3 Espac¸os localmente compactos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 3 1.4 O completamento . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 6 1.5 Alguns espac¸os de Banach . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7 1.5.1 Espac¸os de aplicac¸o˜es lineares contı´nuas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7 1.5.2 Espac¸o de func¸o˜es integra´veis . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7 1.5.3 Espac¸os Lp . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 8 1.5.4 Espac¸os `p . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 8 1.6 Somabilidade em espac¸os normados . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 12 1.7 Exercı´cios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13 2 Espac¸os com produto interno 17 2.1 Produto Interno . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17 2.2 Geometria dos espac¸os pre´-hilbertianos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20 2.3 Projec¸o˜es ortogonais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 21 2.4 Bases em espac¸os pre´-hilbertianos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 24 2.5 Base de Schauder . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 28 2.6 O teorema de Riesz-Fischer . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 31 2.7 Se´ries de Fourier em L2([0,1]) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 34 2.8 Exercı´cios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 34 3 Operadores lineares compactos 37 3.1 Definic¸o˜es e propriedades ba´sicas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 37 3.2 O operador adjunto . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 38 3.3 O espectro dos operadores hermitianos compactos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 41 3.4 A alternativa de Fredholm . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 44 3.5 Operadores de Hilbert-Schmidt . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 47 3.6 Exercı´cios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 50 4 O problema de Sturm-Liouville 53 4.1 Definic¸o˜es e exemplos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 53 4.2 A func¸a˜o de Green . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 56 4.3 Autovalores do problema de Sturm-Liouville . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 60 i ii SUMA´RIO 4.4 Desenvolvimento em autofunc¸o˜es . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 63 4.5 A func¸a˜o de Green generalizada . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 66 4.6 Exercı´cios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 72 Capı´tulo 1 Espac¸os de Banach Nesse Capı´tulo introduzimos a noc¸a˜o de espac¸o de Banach e estudamos algumas propriedades elemen- tares de espac¸os normados. Nosso objetivo na˜o e´ o estudo da teoria de espac¸os de Banach - o que e´ feito nos cursos de Ana´lise Funcional - mas sim contrastar esses espac¸os com os espac¸os de Hilbert, que sera˜o apresentados no pro´ximo Capı´tulo. 1.1 Normas e espac¸os normados Denotaremos por R+ o intervalo [0,∞) ⊂ R e por K o corpo dos reais ou o dos complexos. Exemplo 1.1.1 Seja X um conjunto arbitra´rio (voceˆ pode supor que X 6= ∅). Denotamos por FK o conjunto de todas as func¸o˜es f : X → K. Esse conjunto e´ um espac¸o vetorial com as definic¸o˜es habituais da soma f + g e do produto por escalar λf , sendo f, g ∈ FK e λ ∈ K. Esse espac¸o tem dimensa˜o infinita quando X for um conjunto infinito (veja o exercı´cio 1). � Exemplo 1.1.2 Seja ` o conjunto de todas as sequ¨eˆncias (xn) de elementos do corpo K. Esse espac¸o vetorial de dimensa˜o infinita e´ um caso particular do exemplo anterior, uma vez que uma sequ¨eˆncia nada mais e´ do que uma func¸a˜o com domı´nio N. � Exemplo 1.1.3 Se X e´ um conjunto arbitra´rio, seja B(X,K) := {f : X → K : f(X) e´ limitado}. Esse conjunto e´ um subespac¸o do espac¸o vetorial FK. No caso particular em que X = N (estamos assim no exemplo 1.1.2) temos o espac¸o `∞ de todas as sequ¨eˆncias limitadas. � Exemplo 1.1.4 Seja P o conjunto de todos os polinoˆmios com coeficientes em K. Esse e´ um espac¸o vetorial de dimensa˜o infinita com a soma de polinoˆmios e a multiplicac¸a˜o de um polinoˆmio por um escalar definidas como habitualmente. � Definic¸a˜o 1.1.5 Seja X um espac¸o vetorial sobre o corpo K. Uma norma sobre X e´ uma aplicac¸a˜o ‖ · ‖ : X → R+ que satisfaz (i) ‖λx‖ = |λ| ‖x‖ para todo x ∈ X e todo λ ∈ K; 1 2 CAPI´TULO 1. ESPAC¸OS DE BANACH (ii) ‖x+ y‖ ≤ ‖x‖+ ‖y‖ para quaisquer x, y ∈ X (desigualdade triangular). (iii) ‖x‖ = 0⇒ x = 0, Dizemos enta˜o que o espac¸o X e´ um espac¸o normado. Quando considerarmos diversas normas no mesmo espac¸o X , denotaremos (X, ‖ · ‖j) para especificarmos que estamos munindo X com a norma ‖ · ‖j . Exemplo 1.1.6 Consideremos o espac¸o vetorial B(X,K), apresentado no exemplo 1.1.3. Se X 6= ∅, defina ‖f‖∞ = sup x∈X |f(x)|. ´E fa´cil verificar que ‖ · ‖∞ e´ uma norma nesse espac¸o. Em particular, se X = N (veja exemplo 1.1.2) temos o espac¸o `∞ de todas as sequ¨eˆncias limitadas: ‖(xn)‖∞ = sup n∈N |xn|. � Exemplo 1.1.7 Seja a, b ∈ R, com a < b. Denotaremos I = [a, b]. Consideremos o espac¸o vetorial de dimensa˜o infinita C1(I,R) = {f : [a, b]→ R : f ∈ C1}. Nesse espac¸o podemos considerar a norma ‖f‖C1 = max t∈[a,b] |f(t)|+ max t∈[a,b] |f ′(t)| = ‖f‖∞ + ‖f ′‖∞. Voceˆ seria capaz de definir outra norma nesse espac¸o? Podemos facilmente generalizar esse exemplo e considerar o espac¸o normado Ck(I,R) (qual e´ a adaptac¸a˜o da norma ‖ · ‖C1 para esse espac¸o?). � 1.2 Aplicac¸o˜es lineares contı´nuas Se X e Y sa˜o espac¸os vetoriais arbitra´rios, nem toda aplicac¸a˜o linear T : X → Y e´ contı´nua. Para mostrarmos esse fato, comec¸amos com a caracterizac¸a˜o das aplicac¸o˜es lineares contı´nuas: Teorema 1.2.1 SejamX e Y espac¸os normados e T : X → Y uma aplicac¸a˜o linear. Sa˜o equivalentes as propriedades: (i) T e´ contı´nua na origem; (ii) sup |x|=1 ‖Tx‖ = M <∞ (T e´ limitada); (iii) existe C > 0 tal que ‖Tx‖ ≤ C‖x‖ para todo x ∈ X; (iv) T e´ contı´nua. 1.3. ESPAC¸OS LOCALMENTE COMPACTOS 3 Demonstrac¸a˜o: A linearidade de T imediatamente nos garante que (iii) ⇒ (iv) ⇒ (i). Para mostrar (i) ⇒ (ii), suponhamos (ii) falsa. Enta˜o, para cada n ∈ N∗, existe yn ∈ X tal que ‖yn‖ = 1 e ‖Tyn‖ ≥ n. Definindo xn = yn/n, temos que xn → 0, enquanto ‖Txn‖ ≥ 1, contradizendo (i). Finalmente, (ii) ⇒ (iii), pois, se x 6= 0, enta˜o x/‖x‖ tem norma 1 e, portanto ‖T (x/‖x‖)‖ ≤ M . Mas enta˜o ‖Tx‖ ≤M‖x‖. 2 Exemplo 1.2.2 SejaK[t] o espac¸o vetorial de todos os polinoˆmios (com coeficientes emK) na varia´vel t. Para p ∈ K[t], definimos ‖p‖ = sup t∈[0,1] |p(t)|. O Teorema Fundamental da ´Algebra garante que ‖ · ‖ e´ uma norma em K[t]. Definimos agora T : K[t] → R por T (p) = p(2). Claramente T e´ linear. Mostraremos que T e´ descontı´nua no polinoˆmio p = 0. De fato, tomando � = 1/2, consideremos o polinoˆmio pn := (t/2)n. Claramente ‖pn − 0‖ = 1/2n, mas |T (pn)− 0| = |T (pn)| = 1. � 1.3 Espac¸os localmente compactos Definic¸a˜o 1.3.1 Suponhamos que‖ · ‖0 e ‖ · ‖1 sejam duas normas sobre o espac¸o X . Dizemos que ‖ · ‖0 e´ mais fina que a norma ‖ · ‖1 e escrevemos ‖ · ‖0 � ‖ · ‖1 toda vez que a aplicac¸a˜o identidade I : (X, ‖ · ‖0)→ (X, ‖ · ‖1) e´ contı´nua. Dizemos que duas normas ‖ ·‖0 e ‖ ·‖1 sa˜o equivalentes se, simultaneamente, sa˜o va´lidas ‖ · ‖0 � ‖ · ‖1 e ‖ · ‖1 � ‖ · ‖0. A continuidade da aplicac¸a˜o identidade I e´ caracterizada pelo Teorema 1.2.1. Se ‖ · ‖0 � ‖ · ‖1, note que todo aberto em (X, ‖ · ‖1) tambe´m e´ aberto em (X, ‖ · ‖0). Proposic¸a˜o 1.3.2 Sejam ‖ · ‖0 e ‖ · ‖1 duas normas no espac¸o X . Enta˜o sa˜o equivalentes as duas afirmac¸o˜es: (i) ‖ · ‖0 � ‖ · ‖1; (ii) existe uma constante κ tal que, para todo x ∈ X , ‖x‖0 ≤ κ‖x‖1. Demonstrac¸a˜o: A aplicac¸a˜o identidade I : (X, ‖ · ‖0) → (X, ‖ · ‖1) e´ contı´nua se, e somente se, ‖x‖1 ≤ κ‖x‖0, de acordo com o exercı´cio 8. 2 O seguinte corola´rio e´ consequ¨eˆncia imediata da proposic¸a˜o anterior: Corola´rio 1.3.3 Duas normas ‖ · ‖0 e ‖ · ‖1 num espac¸o vetorial X sa˜o equivalentes se, e somente se, existem constantes κ > 0 e ` > 0 de modo que κ‖x‖0 < ‖x‖1 ≤ `‖x‖0. Lema 1.3.4 Seja X um espac¸o vetorial me´trico de dimensa˜o finita. Um conjunto K ⊂ X e´ compacto se, e somente se, for limitado e fechado. 4 CAPI´TULO 1. ESPAC¸OS DE BANACH Demonstrac¸a˜o: Como X tem dimensa˜o finita, X e´ isomorfo a Kn para algum n. Seja T : Kn → X um isomorfismo. Se y = (y1, . . . , yn) ∈ Kn, consideramos em Kn a norma ‖y‖∞ = max 1≤i≤n |yi| e, no espac¸o X , a norma ‖x‖0 = ‖T−1x‖∞. (Note que isso implica, em particular, que sempre podemos definir uma norma num espac¸o vetorial de dimensa˜o finita). Com essas normas T : (Kn, ‖ · ‖∞) → (X, ‖ · ‖1) e´ uma isometria linear e, portanto, o mesmo acontece com T−1. Em outras palavras, T e´ um homeomorfismo1 linear. Seja K ⊂ X um conjunto limitado e fechado. Como T e´ contı´nua, T−1(K) e´ fechado. Como T−1 e´ contı´nua, T−1(K) e´ limitado. Assim, T−1(K) ⊂ Kn e´ um compacto. Como T e´ contı´nua, T (T−1(K)) = K e´ um compacto. Reciprocamente, num espac¸o me´trico todo conjunto compacto e´ limitado e fechado. (Veja o exercı´cio 9). 2 Proposic¸a˜o 1.3.5 Todas as normas num espac¸o vetorial X de dimensa˜o finita sa˜o equivalentes. Demonstrac¸a˜o: Seja v1, . . . , vn uma base do espac¸o X e x = x1v1 + . . . + xnvn. Vamos mostrar que qualquer norma ‖ · ‖0 e´ equivalente a` norma ‖ · ‖∞, definida por ‖x‖∞ = max 1≤i≤n |xi|. De fato, se ` := ‖v1‖0 + . . .+ ‖vn‖0, temos, para todo x ∈ X , ‖x‖0 = ‖x1v1 + . . .+ xnvn‖0 ≤ n∑ i=1 |xi| ‖vi‖ ≤ `‖x‖. Isso mostra que a aplicac¸a˜o (X, ‖ · ‖∞)→ R+ dada por x 7→ ‖x‖0 e´ contı´nua, atingindo, portanto, um mı´nimo κ no conjunto compacto S := {x ∈ X : ‖x‖∞ = 1}. Temos que κ > 0, pois ‖ · ‖0 e´ uma norma. Assim, se 0 6= x ∈ X , temos (x/‖x‖∞) ∈ S e∥∥∥∥ x‖x‖∞ ∥∥∥∥ 0 ≥ κ ⇔ κ‖x‖∞ ≤ ‖x‖0, concluindo a demonstrac¸a˜o da equivaleˆncia das normas ‖ · ‖∞ e ‖ · ‖0. 2 Corola´rio 1.3.6 Sejam X e Y espac¸os normados de dimensa˜o finita. Toda aplicac¸a˜o linear T : X → Y e´ contı´nua. Demonstrac¸a˜o: Se v1, . . . , vn e´ uma base de X , enta˜o Tx = ∑n i=1 xiTvi e, portanto, ‖Tx‖ ≤ `‖x‖1, em que ` := max1≤i≤n ‖Tvi‖ e ‖x‖1 := ∑n i=1 |xi|. A afirmac¸a˜o decorre enta˜o da Proposic¸a˜o 1.3.5. 2 1Ou seja, uma aplicac¸a˜o contı´nua com inversa contı´nua 1.3. ESPAC¸OS LOCALMENTE COMPACTOS 5 Corola´rio 1.3.7 Se X e´ um subespac¸o vetorial de dimensa˜o finita de um espac¸o normado, enta˜o X e´ completo e localmente compacto (isto e´, bolas fechadas sa˜o compactas). Demonstrac¸a˜o: Decorre do Lema 1.3.4 que X e´ localmente compacto. Se T : X → Kn e´ um isomorfismo, T e´ contı´nuo e tem inversa contı´nua, de acordo com o Corola´rio 1.3.6. Logo, (xn) e´ uma sequ¨eˆncia de Cauchy de X se, e somente se, (Txn) e´ uma sequ¨eˆncia de Cauchy de Kn. Isso garante que X e´ completo. 2 Definic¸a˜o 1.3.8 Um espac¸o de Banach e´ um espac¸o normado completo, isto e´, toda sequ¨eˆncia de Cauchy nesse espac¸o e´ convergente. Espac¸os de Banach de dimensa˜o infinita diferem bastante de nossa concepc¸a˜o usual do espac¸o Kn. Por exemplo, dado um subespac¸o fechado Y de um espac¸o de Banach X , na˜o necessariamente existe um ponto x ∈ B1(0) ⊂ X tal que d(x, Y ) = 1 (veja o exercı´cio 11). Temos, entretanto, Proposic¸a˜o 1.3.9 Seja Y ⊂ X um subespac¸o fechado de um espac¸o normado X , com Y 6= X . Enta˜o, dado � > 0, existe x� ∈ X , com ‖x�‖ = 1, tal que dist (x�, Y ) > 1− �. Demonstrac¸a˜o: Escolha arbitrariamente x ∈ X tal que x 6∈ Y . Seja δ := dist (x, Y ) > 0. Dado � > 0, escolha y0 ∈ Y tal que δ ≤ ‖x− y0‖ ≤ δ(1 + �). Definimos enta˜o x� := x− y0 ‖x− y0‖ . Vale ‖x�‖ = 1 e, para todo y ∈ Y , ‖y − x�‖ = ∥∥∥∥y + y0 − x‖x− y0‖ ∥∥∥∥ = 1‖x− y0‖ ∥∥∥∥y‖x− y0‖+ y0 − x∥∥∥∥ ≥ δ‖x− y0‖ ≥ δ δ(1 + �) > 1− �. (A primeira desigualdade decorre de dist (x, Y ) ≥ δ e y‖x− y0‖+ y0 ∈ Y ; a segunda, do desenvol- vimento de Maclaurin de (1 + z)−1). 2 Corola´rio 1.3.10 (F. Riesz) Um espac¸o normado X e´ localmente compacto se, e somente se, for de dimensa˜o finita. Demonstrac¸a˜o: “⇒” Suponhamos que X na˜o tenha dimensa˜o finita. Tome 0 < � < 1. A aplicac¸a˜o da Proposic¸a˜o 1.3.9 garante enta˜o a existeˆncia de uma sequ¨eˆncia xn ∈ X , com ‖xn‖ = 1 e ‖xn − xm‖ > 1 − � para m 6= n. De fato, escolha x1 com norma unita´ria e, supondo escolhidos indutivamente x2, . . . , xn, defina Y como o espac¸o vetorial de dimensa˜o finita gerado por x1, . . . , xn. Tome enta˜o o vetor unita´rio xn+1 ∈ X com dist (xn+1, Y ) > 1 − �. Enta˜o ‖xn+1 − xm‖ ≥ dist (xn+1, Y ) > 1 − � para m = 1, . . . , n. Como a sequ¨eˆncia assim escolhida na˜o possui subsequ¨eˆncia convergente, vemos que B1(0) ⊂ X na˜o e´ compacta (veja exercı´cio 3). As propriedades de invariaˆncia por translac¸a˜o e homotetia garantem que o mesmo acontece com qualquer bola fechada. “⇐” ´E a afirmac¸a˜o do Corola´rio 1.3.7. 2 6 CAPI´TULO 1. ESPAC¸OS DE BANACH 1.4 O completamento Definic¸a˜o 1.4.1 Seja (X, ‖ · ‖) um espac¸o normado. Definimos o completamento de X como um par (X˜, φ) consistindo de um espac¸o de Banach (X˜, ‖ · ‖0) e uma aplicac¸a˜o linear φ : X → X˜, tal que φ preserva a norma, isto e´, ‖ϕ(x)‖0 = ‖x‖, ∀ x ∈ X, e φ(X) e´ denso em X˜ . Teorema 1.4.2 Todo espac¸o normado (X, ‖ · ‖) possui um u´nico completamento. Heuristicamente, nada e´ mais natural do que pensar que o completamento de X sera´ o pro´prio espac¸o X unido ao conjunto dos pontos limites das sequ¨eˆncias de Cauchy. O problema e´ que estes pontos limites ainda na˜o esta˜o definidos! Para defini-los, temos que considerar uma sequ¨eˆncia de Cauchy como algo intrinsecamente ligado ao “ponto” para o qual ela vai convergir. Mas isto coloca um outro problema, de fa´cil resoluc¸a˜o: podemos ter duas sequ¨eˆncias convergindo para o mesmo “ponto”!; igualamos estas sequ¨eˆncias ao definirmos uma relac¸a˜o de equivaleˆncia: duas sequ¨eˆncias pertencem a uma mesma classe se seus elementos se aproximam arbitrariamente - isto e´, se convergem para o mesmo “ponto”. Tal procedimento permite pensar em cada “ponto” como uma sequ¨eˆncia de Cauchy, e vice-versa. ´E o que faremos na demonstrac¸a˜o seguinte. Demonstrac¸a˜o: Defina X∗ := {ξ = (xj) : (xj) e´ uma sequ¨eˆncia de Cauchy em X}. Em X∗ definimos a relac¸a˜o de equivaleˆncia: (xj) ∼ (yj)⇔ lim j→∞ ‖xj − yj‖ = 0. (No contexto de ana´lise matema´tica e´ usual denotar a relac¸a˜o ∼ por =). Consideremos o espac¸o quociente X˜ := X∗/ ∼. Em outras palavras, considere a partic¸a˜o de X∗ gerada por esta relac¸a˜o de equivaleˆncia. Denotaremos [ξ] a classe de equivaleˆncia de ξ = (xk). Assim, se (yk) e (zk) sa˜o dois representantes da classe [ξ], enta˜o limk→∞ ‖yk − zk‖ = 0. O conjunto X˜ e´ o conjunto das classes de equivaleˆncia (disjuntas) de X∗. Definimos enta˜o [ξ] + [η] = [xj + yj] e c[ξ] = [cξ]. ´E claro que X˜ e´ um espac¸o vetorial com essas operac¸o˜es. Em X˜ definimos‖ [ξ] ‖0 := lim j→∞ ‖xj‖. Temos que ‖ · ‖0 esta´ bem definida (lembre-se que toda sequ¨eˆncia de Cauchy e´ limitada!) e que (X˜, ‖ · ‖0) e´ um espac¸o normado. (Mostre!). 1.5. ALGUNS ESPAC¸OS DE BANACH 7 Seja φ : X → X˜ definida por φ(x) = [γ], em que γ = (x), a sequ¨eˆncia com todos os termos iguais a x. ´E claro que φ preserva normas. Ale´m disto, [ξ] = lim n→∞ φ(xn). Isto mostra que φ(X) e´ denso em X˜ . Resta provar que X˜ e´ completo. Para isto, considere uma sequ¨eˆncia de Cauchy ([ξ]n) de elementos de X˜ . (Cada elemento [ξ]n e´ representado por uma sequ¨eˆncia de Cauchy (xni ) de elementos de X). Para cada n existe xn ∈ X tal que ‖ [ξ]n − φ(xn) ‖0 < 1/n, pois φ(X) e´ denso em X˜ . Afirmamos que a sequ¨eˆncia (xn) assim formada e´ uma sequ¨eˆncia de Cauchy em X . De fato, temos ‖xn − xm‖ = ‖φ(xn)− φ(xm)‖0 ≤ ‖φ(xn), [ξ]n‖0 + ‖ [ξ]n − [ξ]m‖0 + ‖ [ξ]m − φ(xm)‖0, provando que (xn) e´ uma sequ¨eˆncia de Cauchy em X . Seja ξ = (xn). Afirmamos que ([ξ]n) converge a [ξ]. De fato, dado � > 0, temos ‖ [ξ]n − [ξ] ‖0 ≤ ‖ [ξ]n − φ(xn)‖0 + ‖φ(xn)− [ξ] ‖0 < 2� para n suficientemente grande. Isto mostra que X˜ e´ completo. Quanto a` unicidade, veja o exercı´cio 18. 2 Espac¸os de Banach sa˜o muitas vezes construı´dos por meio do Teorema 1.4.2 e uma das construc¸o˜es usuais do conjunto dos nu´meros reais tambe´m e´ feita por esse processo. Os espac¸os Lp da teoria da integrac¸a˜o (veja a pro´xima sec¸a˜o) podem ser obtidos por esse processo. A grande dificuldade na utilizac¸a˜o do Teorema 1.4.2 na construc¸a˜o dos espac¸os Lp consiste em identificar os elementos do completamento (que sa˜o, em u´ltima instaˆncia, sequ¨eˆncias de Cauchy) com verdadeiras func¸o˜es. Para ilustrar esse tipo de construc¸a˜o dos espac¸os Lp, veja, por exemplo, [1] e [11]. 1.5 Alguns espac¸os de Banach 1.5.1 Espac¸os de aplicac¸o˜es lineares contı´nuas Sejam X, Y espac¸os normados. Denotamos L(X, Y ) o espac¸o das aplicac¸o˜es lineares contı´nuas de X para Y . Nesse conjunto, dado T ∈ L(X,Y ), definimos ‖T‖ := sup ‖x‖≤1 ‖Tx‖. Verifica-se facilmente que L(X, Y ) e´ um espac¸o vetorial normado. Denotamos X ′ = L(X,K) o espac¸o dual de X e L(X) = L(X,X). Quando Y e´ um espac¸o completo, temos que L(X, Y ) e´ um espac¸o de Banach (veja exercı´cio 15). 1.5.2 Espac¸o de func¸o˜es integra´veis Seja C0([a, b],K) o espac¸o vetorial das func¸o˜es contı´nuas f : [a, b]→ K. 8 CAPI´TULO 1. ESPAC¸OS DE BANACH Nesse conjunto, definimos a norma2 ‖f‖L1 := ∫ Ω |f(x)|dx. Denotamos C0L1([a, b],K) o espac¸o vetorial C0([a, b],K) com a norma ‖ ·‖L1 Uma vez que esse espac¸o na˜o e´ completo (veja exercı´cio 17), consideramos o completamento desse espac¸o com a norma ‖ · ‖L1 . Esse espac¸o completo sera´ denotado L1 = L1([a, b]). Pode-se mostrar que o conjunto L1 e´ constituı´do por (classes de equivaleˆncia) de func¸o˜es f : [a, b]→ R, com a identificac¸a˜o f = g se f e g diferem apenas num conjunto de medida nula, denotado por f = g q.t.p.3 (veja as refereˆncias [15], [16], [18]). Da mesma forma que acontece na passagem dos racionais para os reais, as func¸o˜es em L1 que podemos explicitamente integrar sa˜o basicamente aquelas que integra´vamos nos cursos de Ca´lculo4. A importaˆncia do espac¸o L1 deve-se a` riqueza de suas operac¸o˜es com limites. 1.5.3 Espac¸os Lp Seja 1 < p <∞. Para f ∈ C0([a, b],K), definimos ‖f‖Lp = (∫ b a |f(x)|pdx )1/p . Definimos tambe´m ‖f‖L∞ = ‖f‖∞ = sup x∈[a,b] |f(x)|. A desigualdade de Minkowsky 1.5.4(que nada mais e´ do que a desigualdade triangular no caso de ‖ · ‖Lp) garante que ‖ · ‖Lp e´ uma norma se 1 < p <∞. Mostraremos mais abaixo essa desigualdade. Com a norma ‖ ·‖Lp , denotamos o espac¸o vetorial em C0([a, b],K) por CLp([a, b],K). Esse espac¸o na˜o e´ completo. O seu completamento e´ o espac¸o Lp([a, b]). Em geral, para os nossos propo´sitos, podemos considerar o espac¸o CLp([a, b],K) ao inve´s do espac¸o Lp([a, b]). A definic¸a˜o do espac¸o L∞([a, b]) na˜o sera´ abordada nesse curso. Tambe´m esse e´ um espac¸o de Banach completo, mas ele na˜o surge como completamente de C0([a, b],K) com a norma ‖ · ‖L∞ . 1.5.4 Espac¸os `p Consideremos o espac¸o ` considerado no exemplo 1.1.2. Em ` definimos ‖(xn)‖p = ( ∞∑ n=1 |xn|p )1/p , 2A integral denota a integral de Riemann dos cursos de Ca´lculo. 3Um conjunto U ⊂ [a, b] tem medida nula se, dado � > 0, existe uma colec¸a˜o enumera´vel de intervalos abertos de raio δi (isto e´, do tipo (c− δi, c+ δi)) que cobre o conjunto U e tem comprimento total menor ou igual a �. O exemplo ba´sico e´ o conjunto Q dos racionais em [0, 1]: tome uma enumerac¸a˜o {q1, . . . , qn, . . .} desses racionais, considere os intervalos (qi − �/2i, qi + �/2i), que cobrem Q. A soma total dos comprimentos desses intervalos e´ justamente �, mostrando que Q tem medida nula. 4Note que so´ operamos explicitamente com nu´meros racionais; a soma √ 2 + pi representa um nu´mero real com uma se´rie de propriedades: √ 2 + pi = pi+ √ 2, tem inverso, possui raiz n-e´sima, pode ser aproximado por racionais, etc. Mas a soma √ 2 + pi na˜o pode ser, na pra´tica, efetuada... 1.5. ALGUNS ESPAC¸OS DE BANACH 9 em que 1 ≤ p <∞. Denotamos por `p o conjunto de todas as sequ¨eˆncias (xn) tais que ‖(xn)‖p < ∞. Considerando tambe´m o espac¸o `∞ definido no exemplo 1.1.6, obtemos os espac¸os `p. Afirmamos que os espac¸os `p sa˜o espac¸os de Banach. Para provarmos essa afirmac¸a˜o comec¸amos com Definic¸a˜o 1.5.1 Dado 1 ≤ p ≤ ∞, denotaremos p′ o elemento de [1,∞] tal que 1 p + 1 p′ = 1. Dizemos enta˜o que p e p′ sa˜o expoentes conjugados. Lema 1.5.2 Desigualdade de Young Para todo a, b ≥ 0 vale: ab ≤ 1 p ap + 1 p′ bp ′ . Demonstrac¸a˜o: Basta considerar o caso a > 0 e b > 0. Usando a concavidade da func¸a˜o logaritmo5, obtemos ln(ab) = ln a+ ln b = 1 p ln ap + 1 p′ ln bp ′ ≤ ln ( 1 p ap + 1 p′ bp ′ ) . A afirmac¸a˜o e´ obtida ao se tomar a exponencial em ambos os lados. 2 Teorema 1.5.3 (Desigualdade de Ho¨lder) Considere expoentes conjugados p, p′ ∈ [1,∞]. Enta˜o vale: (i) se x ∈ `p e y ∈ `p′ , enta˜o ∞∑ n=1 |xnyn| ≤ ( ∞∑ n=1 |xn|p )1/p( ∞∑ n=1 |yn|p′ )1/p′ se 1 < p <∞ e, se p = 1, ∞∑ n=1 |xnyn| ≤ ( ∞∑ n=1 |xn| ) sup n∈N∗ |yn|. (ii) Dados f, g ∈ C0([a, b],C), enta˜o ‖fg‖L1 ≤ ‖f‖Lp‖g‖Lp′ , isto e´, se 1 < p <∞,∫ b a |f(x)g(x)|dx ≤ (∫ b a |f(x)|pdx )1/p(∫ b a |g(x)|p′dx )1/p′ e, se p = 1, ∫ b a |f(x)g(x)|dx ≤ (∫ b a |f(x)|dx ) sup x∈[a,b] |g(x)|. 5Um subconjunto A ⊂ R e´ convexo se, dados x, y ∈ A, enta˜o tx + (1 − t)y ∈ A para todo 0 ≤ t ≤ 1. Uma func¸a˜o f : A→ IR e´ convexa se f(tx+ (1− t)y) ≤ tf(x) + (1− t)f(y). Se a desigualdade contra´ria se verifica, dizemos que a func¸a˜o e´ coˆncava. Verifique que a func¸a˜o logaritmo ln : (0,∞)→ R e´ coˆncava! 10 CAPI´TULO 1. ESPAC¸OS DE BANACH Demonstrac¸a˜o: (i) O caso p = 1 e´ evidente. Da mesma forma, podemos supor x 6= 0 e y 6= 0. Aplicando a desigualdade de Young aos pares an := |xn| ‖x‖p e bn := |yn| ‖y‖p′ (n = 1, . . . , n) obtemos |xnyn| ‖x‖p‖y‖p′ ≤ 1 p |xn|p ‖x‖pp + 1 p′ |yn|p′ ‖x‖p′p′ . Somando membro a membro todas as desigualdades obtidas, vem ∞∑ n=1 |xnyn| ‖x‖p‖y‖p′ ≤ 1 p‖x‖pp ∞∑ n=1 |xn|p + 1 p‖x‖p′p′ ∞∑ n=1 |xn|p′ = 1 p + 1 p′ = 1. (ii) O resultado e´ evidente para p = 1 ou p = ∞. Para 1 < p < ∞, o resultado e´ o´bvio se f ≡ 0 ou g ≡ 0. Defina enta˜o a(x) := |f(x)| ‖f‖Lp e b(x) := |g(x)| ‖f‖Lp′ . Aplicando a desigualdade de Young, segue-se |f(x)g(x)| ‖f‖Lp‖g‖Lp′ ≤ 1 p |f(x)|p ‖f‖pLp + 1 p′ |g(x)|p′ ‖g‖p′ Lp ′ . O resultado e´ obtido integrando essa desigualdade em [a, b]. 2 Teorema 1.5.4 (Desigualdade de Minkowsky) Sejam p ∈ [1,∞] e p′ seuexpoente conjugado. Enta˜o (i) Para quaisquer x, y ∈ `p, temos ‖x+ y‖p ≤ ‖x‖p + ‖y‖p; (ii) Para quaisquer f, g ∈ C0([a, b],C), temos ‖f + g‖Lp ≤ ‖f‖Lp + ‖g‖Lp . Demonstrac¸a˜o: (i) Para p = 1 ou p = ∞ a demonstrac¸a˜o e´ evidente. Se 1 < p < ∞ e x, y ∈ `p, afirmamos inicialmente que x + y ∈ `p. De fato, se x = (xn) e y = (yn), vale para todo n que6 |xn + yn| ≤ 2max{|xn|, |yn|} e, portanto, |xn + yn|p ≤ 2pmax{|xn|p, |yn|p} ≤ 2p(|xn|p + |yn|p). Assim, ∞∑ n=1 |xn + yn|p ≤ 2p ( ∞∑ n=1 |xn|p + ∞∑ n=1 |yn|p ) <∞. (1.1) 6Veja exercı´cio 19. 1.5. ALGUNS ESPAC¸OS DE BANACH 11 Temos enta˜o ∞∑ n=1 |xn + yn|p = ∞∑ n=1 |xn + yn|p−1|xn + yn| ≤ ∞∑ n=1 |xn + yn|p−1|xn|+ ∞∑ n=1 |xn + yn|p−1|yn| ≤ ( ∞∑ n=1 |xn + yn|(p−1)p′ ) 1 p′ ( ∞∑ n=1 |xn|p ) 1 p + ( ∞∑ n=1 |xn + yn|(p−1)p′ ) 1 p′ ( ∞∑ n=1 |yn|p ) 1 p = ( ∞∑ n=1 |xn + yn|p )1− 1 p (‖x‖p + ‖y‖p). (1.2) Note que a u´ltima igualdade, na qual e´ usada a relac¸a˜o (p− 1)p′ = p, justifica a aplicac¸a˜o da desigual- dade de Ho¨lder. Logo, cancelando ∑∞ n=1 |xn+yn|p em ambos os lados da desigualdade (1.2), chegamos ao resultado desejado. (ii) A prova e´ ana´loga a de (i). 2 Teorema 1.5.5 Os espac¸os `p, 1 ≤ p ≤ ∞ sa˜o espac¸os de Banach. Demonstrac¸a˜o: Seja (xm) uma sequ¨eˆncia de Cauchy em `p, com xm = (xm1, xm2, . . . , xmi, . . .). Para todo i ∈ N∗ temos |xmi − xni| ≤ ‖xm − xn‖p, o que garante que (xmi)m∈N∗ e´ uma sequ¨eˆncia de Cauchy em K. Assim, para cada i ∈ N∗, existe ai = limn→∞ xni. Dado � > 0, tome n0 ∈ N tal que ‖xm − xn‖p < � para quaisquer m,n ≥ n0. Suponhamos p ∈ [1,∞). Temos enta˜o, para qualquer k ∈ N∗ fixo e m,n ≥ n0 temos k∑ i=1 |xmi − xni|p < �p. Se k e n ≥ n0 sa˜o mantidos fixos, tomando o limite com m→∞ na desigualdade acima, obtemos que k∑ i=1 |ai − xni|p ≤ �p. Fazendo agora k →∞, obtemos ∞∑ i=1 |ai − xni|p ≤ �p (1.3) para todo n ≥ n0. Isso garante que a− xn ∈ `p se n ≥ n0. Mas enta˜o a = (a− xn) + xn ∈ `p. Uma vez que (1.3) significa que a = limn→∞ xn em `p, mostramos que esse espac¸o e´ completo. Para p =∞, veja o exercı´cio 22. 2 12 CAPI´TULO 1. ESPAC¸OS DE BANACH 1.6 Somabilidade em espac¸os normados Uma vez que um espac¸o normado e´ provido de uma noc¸a˜o de convergeˆncia, a definic¸a˜o usual de se´rie convergente estende-se naturalmente a espac¸os normados: a se´rie ∑∞ i=1 xi converge a x ∈ X se a sequ¨eˆncia de somas parciais sn = ∑n i=1 xi converge a x. Algumas vezes, entretanto, temos que considerar somas ∑ i∈I xi definidas num conjunto de ı´ndices I diferente do conjunto N. No caso de I ser enumera´vel, podemos reordenar esse conjunto de modo a recair no caso habitual. Mas, mesmo nesse caso, chegamos a um impasse: como se sabe, se a se´rie∑ xi de nu´meros reais na˜o for absolutamente convergente, reordenac¸o˜es da sequ¨eˆncia (xn) produzem se´ries que convergem para qualquer nu´mero real r (veja [13], p. 120). Assim, mesmo no caso de conjunto enumera´veis I , a convergeˆncia da se´rie ∑i∈I xi parece depender de como reordenarmos o conjunto de ı´ndices I . A pro´xima definic¸a˜o e´ motivada pela seguinte propriedade de nu´meros reais: uma se´rie ∑∞ i=1 xi e´ comutativamente convergente para x ∈ R (quer dizer, independe da ordem em que as somas parciais sa˜o tomadas) se, e somente se, dado � > 0, existe um conjunto finito F� ⊂ N tal que, para todo conjunto finito F ⊂ N, com F� ⊂ F , temos ∣∣x−∑i∈F xi∣∣ < �. Definic¸a˜o 1.6.1 Uma famı´lia {xi}i∈I de elementos no espac¸o normado X e´ soma´vel e tem por soma x ∈ X se, dado � > 0, existe um subconjunto finito F� ⊂ I tal que, para todo conjunto finito F ⊂ I , com F� ⊂ F , temos ‖x− ∑ i∈F xi‖ < �. Denotamos enta˜o ∑ i∈I xi = x. Proposic¸a˜o 1.6.2 SejamX e Y espac¸os normados e T ∈ L(X, Y ). Dada uma famı´lia {xi}i∈I soma´vel com soma X 3 x =∑I xi, enta˜o {Txi}i∈I e´ soma´vel em Y , com soma Tx. Demonstrac¸a˜o: Basta notar que∥∥∥∥∥Tx−∑ i∈F Txi ∥∥∥∥∥ = ∥∥∥∥∥T ( x− ∑ i∈F xi )∥∥∥∥∥ ≤ ‖T‖ ∥∥∥∥∥x−∑ i∈F xi ∥∥∥∥∥ . 2 Definic¸a˜o 1.6.3 Uma famı´lia {xi}i∈I satisfaz a condic¸a˜o de Cauchy se, dado � > 0, existe um con- junto finito F� ⊂ I tal que, para todo conjunto finito F ′ ⊂ I , com F ′ ∩ F� = ∅, temos∥∥∥∥∥∑ i∈F ′ xi ∥∥∥∥∥ < �. Lema 1.6.4 Se a famı´lia {xi}i∈I satisfaz a condic¸a˜o de Cauchy, enta˜o o conjunto I∗ := {i ∈ I : xi 6= 0} e´ enumera´vel. Demonstrac¸a˜o: Defina In := {i ∈ I : ‖xi‖ ≥ 1/n}. De acordo com a condic¸a˜o de Cauchy, In e´ um conjunto finito. Mas I∗ = ∪∞n=1In, o que mostra o lema. 2 Teorema 1.6.5 Seja X um espac¸o de Banach. Enta˜o uma famı´lia {xi}i∈I em X e´ soma´vel se, e somente se, satisfaz a condic¸a˜o de Cauchy. 1.7. EXERCI´CIOS 13 Demonstrac¸a˜o: Suponhamos {xi}i∈I soma´vel com soma x. Dado � > 0, tome F� tal que ‖x −∑ i∈F xi‖ < � para todo conjunto finito F ⊃ F�. Tome F ′ ⊂ I finito, com F ′ ∩ F� = ∅. Enta˜o∥∥∥∥∥∑ i∈F ′ xi ∥∥∥∥∥ = ∥∥∥∥∥ ∑ i∈F ′∪F� xi − x− (∑ i∈F� xi − x )∥∥∥∥∥ ≤ ∥∥∥∥∥ ∑ i∈F ′∪F� xi − x ∥∥∥∥∥+ ∥∥∥∥∥∑ i∈F� xi − x ∥∥∥∥∥ < 2�. Reciprocamente, consideremos, como no Lema 1.6.4, o conjunto In = {i ∈ I : ‖xi‖ ≥ 1/n}. Definimos enta˜o yn := ∑ i∈In xi. Vamos mostrar que (yn) e´ uma sequ¨eˆncia de Cauchy. Dado � > 0, existe um conjunto finito F� ⊂ I∗ tal que, para todo F ′ ⊂ I∗, com F� ∩F ′ = ∅, temos ‖∑i∈F ′ xi‖ < � (note que xi = 0 se i 6∈ I∗). Uma vez que no conjunto finito {xi : i ∈ F�} todos os elementos tem norma positiva e, portanto, maior que 1/n0 para algum n0), temos F� ⊂ In0 . Para m > n ≥ n0 temos F ′ := Im \ In ⊂ {F� e, assim, ‖ym − yn‖ = ‖ ∑ i∈F ′ xi‖ < �. Seja x = limn→∞ yn. Temos ‖x − yn‖ ≤ � para n ≥ n0. Vamos mostrar que ∑ i∈I xi = x. De fato, para todo F ⊂ In0 temos F ′ := F \ In0 ⊂ {F� e, portanto,∥∥∥∥∥x−∑ i∈F xi ∥∥∥∥∥ = ∥∥∥∥∥∥x− ∑ i∈In0 xi − ∑ i∈F ′ xi ∥∥∥∥∥∥ = ∥∥∥∥∥x− yn0 −∑ i∈F ′ xi ∥∥∥∥∥ ≤ ‖x− yn0‖+ ∥∥∥∥∥∑ i∈F ′ xi ∥∥∥∥∥ < 2�. 2 Observac¸a˜o 1.6.6 Note que a implicac¸a˜o direta independe de X ser completo. � 1.7 Exercı´cios 1. Seja X um conjunto qualquer. Mostre que FK e´ um espac¸o vetorial de dimensa˜o infinita se, e somente se, X for um conjunto infinito. Seja X um espac¸o normado. 2. Seja X um espac¸o normado. Mostre que, se dist (·, ·) : X ×X → R+ e´ uma distaˆncia7 gerada por uma norma, enta˜o ela satisfaz (a) dist (x+ z, y + z) = dist (x, y) para todos x, y, z ∈ X (invariaˆncia por translac¸a˜o); (b) dist (λx, λy) = |λ|dist (x, y) (homotetia). Reciprocamente, mostre que se dist e´ uma distaˆncia que satisfaz essas propriedades, enta˜o dist e´ gerada por uma norma. Definic¸a˜o 1.7.1 Seja (X, dist) um espac¸o me´trico. Dizemos que um subconjunto F ⊂ X e´ totalmente limitado se, para todo � > 0, existem pontos x1, . . . , xm ∈ F (em que m depende de �) tais que F ⊂ m⋃ i=1 B�(xi). 7Uma distaˆncia e´ uma aplicac¸a˜o dist (·, ·) : X ×X → R+ que satisfaz: i) dist (x, x) ≥ 0 e dist (x, x) = 0 ⇔ x = 0; ii) dist (x, y) = dist (y, x); iii) dist (x, z) ≤ dist (x, y) + dist (y, z) para todos x, y, z ∈ X . Um espac¸o me´trico e´ um conjunto X munido de uma distaˆncia. 14 CAPI´TULO 1. ESPAC¸OS DE BANACH 3. Mostre que sa˜o equivalentes as seguintes afirmac¸o˜es sobre um subconjunto F de um espac¸o me´trico (X, dist): (i) F e´ compacto; (ii) F e´ sequ¨encialmente compacto, isto e´, toda sequ¨eˆncia de pontos em F possui uma sub- sequ¨eˆncia que converge para um ponto de F ; (iii) (F, dist) e´ completo e totalmente limitado. 4. Mostre que sa˜o equivalentes as seguintes afirmac¸o˜es a` respeito de um conjunto F ⊂ X , em que X e´ um espac¸o me´trico completo: (i) F e´ relativamente compacto8 em X; (ii) Toda sequ¨eˆncia de pontos em F possui uma subsequ¨eˆncia convergente; (iii) F e´ totalmente limitado. 5. Sejam X um espac¸o me´trico e A ⊂ X . Suponha que, dado � > 0,e exista um subconjunto totalmente limitado K ⊂ X tal que dist (a,K) ≤ � para todo a ∈ A. Mostre que A e´ totalmente limitado. 6. Mostre que todo espac¸o me´trico X totalmente limitado e´ separa´vel. Conclua que todo espac¸o me´trico compacto e´ separa´vel. Considere enta˜o o conjunto enumera´vel 7. Mostre que a aplicac¸a˜o x ∈ X 7→ ‖x‖ ∈ R+ e´ uma aplicac¸a˜o contı´nua. Mostre que, se xn → x ∈ X , enta˜o ‖xn‖ → ‖x‖. Mostre que as aplicac¸o˜es (x, y) ∈ X × X 7→ x + y ∈ X e (λ, x) ∈ C × X 7→ λx ∈ X sa˜o contı´nuas (os espac¸os X × X e C × X esta˜o providos da topologia produto). 8. Sejam X1, . . . , Xn e Y espac¸os normados e T : X1× · · · ×Xn → Y uma aplicac¸a˜o n-linear. Se (x1, . . . , xn) ∈ X1 × · · · ×Xn, mostre que sa˜o equivalentes as propriedades: (a) T e´ contı´nua; (b) T e´ contı´nua na origem; (c) sup ‖x1‖=...=‖xn‖=1, ‖T (x1, . . . , xn)‖ = M <∞ (T e´ limitada); (d) existe C > 0 tal que ‖T (x1, . . . , xn)‖ ≤ C[‖x1‖ · · · ‖xn‖] para todo (x1, . . . , xn) ∈ X1 × · · · ×Xn; Conclua que tanto a func¸a˜o determinante como a multiplicac¸a˜o de um vetor por um escalar sa˜o aplicac¸o˜es contı´nuas. 9. Seja (X, dist) um espac¸o me´trico, isto e´, um conjunto X dotado de uma me´trica. Mostre que qualquer conjunto compacto K ⊂ X e´ um conjunto limitado e fechado. Verifique tambe´m que a imagem de um compacto por uma func¸a˜o contı´nua e´ um conjunto compacto. Finalmente, mostre que a imagem de um conjunto limitado por uma func¸a˜o contı´nua e´ limitada. 8Um conjunto F ⊂ X e´ relativamente compacto se F for compacto. 1.7. EXERCI´CIOS 15 10. O que garante que o conjunto S da demonstrac¸a˜o da Proposic¸a˜o 1.3.5 seja compacto? 11. Deˆ exemplo de um espac¸o de Banach X que possui um subespac¸o fechado Y de modo que na˜o exista x ∈ B1(0) ⊂ X tal que dist (x, Y ) = 1. 12. Seja X 6= ∅ um conjunto qualquer e Y um espac¸o de Banach. Mostre que o espac¸o B(X,Y ), definido no exemplo 1.1.3, e´ um espac¸o de Banach. 13. Seja S ⊂ Kn um compacto. Considere o espac¸o vetorial C0(S,K) = {f : S → K : f e´ contı´nua}. Mostre que C0(S,K) e´ um subespac¸o fechado do espac¸o de Banach B(S,K) e, portanto, um espac¸o de Banach. 14. Seja (X, dist) um espac¸o me´trico e Y um espac¸o de Banach. Seja A ⊂ X um conjunto denso9. Mostre que toda aplicac¸a˜o uniformemente contı´nua f : A ⊂ X → Y possui exatamente uma extensa˜o uniformemente contı´nua F : X → Y . Quando X e´ um espac¸o vetorial e f : A→ Y e´ linear, mostre que F : X → Y e´ linear. 15. Mostre que o espac¸o L(X, Y ) e´ um espac¸o de Banach, se Y for um espac¸o de Banach. 16. Sejam X, Y, Z espac¸os normados. Se S ∈ L(Y, Z) e T ∈ L(X, Y ), mostre que S ◦ T = ST ∈ L(X,Z) e ‖ST‖ ≤ ‖S‖ ‖T‖. 17. Mostre que o espac¸o C([a, b],R) com a norma ‖ · ‖L1 na˜o e´ completo. 18. Mostre a existeˆncia de um u´nico completamento de um espac¸o normado X , isto e´, se (X˜, φ) e (X¯, ψ) sa˜o ambos completamentos de X , enta˜o existe um isomorfismo linear contı´nuo entre X˜ e X¯ . Para isso, fac¸a uso do exercı´cio 14. 19. Para x, y ∈ K, mostre a desigualdade |x+ y|p ≤ 2p−1(|x|p + |y|p). 20. Mostre que `p e´ um subespac¸o pro´prio de `q, se 1 ≤ p < q ≤ ∞. 21. Mostre que a norma ‖ · ‖p (do espac¸o `p) e´ uma norma no espac¸o Kn. Voceˆ consegue deduzir isso imediatamente do que ja´ foi feito? 22. Mostre que `∞ e´ completo. 23. Seja 1 ≤ p < ∞. Mostre que um subconjunto K ⊂ `p e´ totalmente limitado se, e somente se, K e´ limitado e, dado � > 0, existe um subconjunto finito F ⊂ N tal que, para todo x ∈ K vale∑ i6∈F |xi|p ≤ �p. idem 24. Considere o espac¸o de Banach X = C0([0, 1]). Deˆ exemplos de subconjuntos A, convexos e completos, tais que, se δ = infa∈A ‖a‖, enta˜o (a) existem infinitos pontos a ∈ A tais que ‖a‖ = δ; 9Isto quer dizer que A = X . 16 CAPI´TULO 1. ESPAC¸OS DE BANACH (b) existe uma sequ¨eˆncia (an) em A tal que ‖an‖ → δ, mas nenhuma de suas subsequ¨eˆncias e´ de Cauchy; (c) na˜o existe a ∈ A tal que ‖a‖ = δ. 25. Mostre que uma se´rie ∑∞ n=1 xn e´ comutativamente convergente para x ∈ X se, e somente se, dado � > 0, existe um conjunto finito F� ⊂ N tal que, para todo conjunto finito F ⊂ N, com F� ⊂ F , temos ∣∣x−∑i∈F xi∣∣ < �. 26. Sejam {xi}i∈I e {yi}i∈I duas famı´lias soma´veis em X , com soma x e y, respectivamente. Seja λ ∈ K. Mostre que as famı´lias {xi + yi}i∈I e {λxi}i∈I sa˜o soma´veis e teˆm somas x + y e λx, respectivamente. 27. Uma famı´lia {xi}i∈I num espac¸o normado X e´ absolutamente soma´vel quando {‖xi‖}i∈I for soma´vel. Mostre que, num espac¸o de Banach, toda famı´lia absolutamente soma´vel e´ soma´vel. Deˆ um exemplo mostrando que a recı´proca nem sempre e´ verdadeira. Capı´tulo 2 Espac¸os com produto interno 2.1 Produto Interno Definic¸a˜o 2.1.1 Seja E um espac¸o vetorial sobre K. Um produto interno em E e´ uma func¸a˜o 〈·, ·〉 : E × E → K satisfazendo as seguintes propriedades: (i) 〈·, ·〉 e´ linear na primeira varia´vel, isto e´, 〈x1 + λx2, y〉 = 〈x1, y〉+ λ〈x2, y〉, para todos x1, x2, y ∈ E e λ ∈ K; (ii) 〈·, ·〉 e´ hermitiana, isto e´, 〈x, y〉 = 〈y, x〉, para todos x, y ∈ E; (iii) 〈·, ·〉 e´ positiva-definida, isto e´, 〈x, x〉 ≥ 0 para todo x ∈ E e 〈x, x〉 = 0 ⇔ x = 0. Um espac¸o vetorial munido de um produto interno e´ chamado espac¸o com produto interno ou espac¸o pre´-hilbertiano. Dizemos que x e y sa˜o ortogonais (ou perpendiculares) se 〈x, y〉 = 0. Nesse caso, escrevemos x ⊥ y. Note que a condic¸a˜o (ii) implica, quando K = C, que 〈x, y1 + λy2〉 = 〈x, y1〉+ λ〈x, y2〉; no caso real, essa condic¸a˜o significa que 〈·, ·〉 e´ sime´trica, isto e´, 〈x, y〉 = 〈y, x〉. Exemplo 2.1.2 Os espac¸os Rn e Cn sa˜o espac¸os com produto interno, com a definic¸a˜o usual. � Denotaremos ‖x‖ = 〈x, x〉1/2. Vamos mostrar que essa notac¸a˜o se justifica, isto e´, que 〈x, x〉1/2 realmente define uma norma. Comec¸amos justificando a definic¸a˜o de perpendicularidade dada acima. Teorema 2.1.3 (O Teorema de Pita´goras) Seja E um espac¸o com produto interno e x, y ∈ E. Denotando ‖x‖ = 〈x, x〉1/2, se x ⊥ y, enta˜o temos ‖x+ y‖2 = ‖x‖2 + ‖y‖2. (2.1) Se E for um espac¸o vetorial real, enta˜o vale a recı´proca. 17 18 CAPI´TULO 2. ESPAC¸OS COM PRODUTO INTERNO Demonstrac¸a˜o: Basta desenvolver ‖x+ y‖2: ‖x+ y‖2 = 〈x+ y, x+ y〉 = 〈x, x〉+ 〈x, y〉+ 〈y, x〉+ 〈y, y〉 (2.2) = ‖x‖2 + ‖y‖2, pois x e y sa˜o ortogonais. Reciprocamente, se E for real e (2.1) for va´lida, a igualdade (2.2) mostra que 〈x, y〉+ 〈y, x〉 = 2〈x, y〉 = 0, o que implica 〈x, y〉 = 0. 2 Note que, se E for um espac¸o complexo, a recı´proca do Teorema de Pita´goras na˜o vale: basta considerar y = ix. Proposic¸a˜o 2.1.4 (Desigualdade de Cauchy-Schwarz) Seja E um espac¸o com produto interno. Enta˜o, se ‖x‖ = 〈x, x〉1/2, temos para todos x, y ∈ E, |〈x, y〉| ≤ ‖x‖ ‖y‖. Demonstrac¸a˜o: A prova que apresentaremos e´ bem geome´trica (interprete!). Se x = λy, enta˜o |〈x, y〉| = |λ| 〈y, y〉 = |λ| ‖y‖2 = ‖x‖ ‖y‖. Se x 6= λy, existe α ∈ K tal que |〈y − αx, x〉| = 0. (De fato, basta tomar α := 〈y, x〉/‖x‖2; note que ‖x‖ = 0 esta´ incluı´do no caso anterior). Enta˜o, pelo Teorema de Pita´goras, ‖αx‖2 < ‖y‖2. Substituindo o valor de α, obtemos |〈y, x〉|2 ‖x‖4 ‖x‖ 2 < ‖y‖2, e a desigualdade de Cauchy-Schwarz segue-se imediatamente daı´, pois |〈y, x〉| = |〈x, y〉|. 2 Corola´rio 2.1.5 Todo espac¸o com produto interno e´ um espac¸o normado, com ‖x‖2 = 〈x, x〉. Demonstrac¸a˜o: Vamos verificar a desigualdade triangular, pois as outras propriedades que definem uma norma sa˜o imediatas. Denotando por Re z a parte real de z ∈ C e aplicando a desigualdade de Cauchy-Schwarz, temos que ‖x+ y‖2 = 〈x+ y, x+ y〉 = ‖x‖2 + 〈x, y〉+ 〈x, y〉+ ‖y‖2 = ‖x‖2 + 2Re 〈x, y〉+ ‖y‖2 ≤ ‖x‖2 + 2|〈x, y〉|+ ‖y‖2 ≤ ‖x‖2 + 2‖x‖ ‖y‖+ ‖y‖2 = (‖x‖+ ‖y‖)2 . 2 Definic¸a˜o 2.1.6 Um espac¸o de Hilbert e´ um espac¸o com produto interno, que e´ completo com relac¸a˜o a` sua norma. Chamaremos, de agora em diante, um espac¸o com produto interno de espac¸o pre´-hilbertiano.2.1. PRODUTO INTERNO 19 Exemplo 2.1.7 O espac¸o `2, das sequ¨eˆncias de quadrado soma´vel (tomando valores emK), e´ dado por `2(K) := { x = (xn)n∈N : ∞∑ n=0 |xn|2 <∞ } . Ja´ vimos que `2 e´ um espac¸o de Banach. Nesse espac¸o vetorial definimos 〈x, y〉 := ∑∞n=0 xnyn. (A desigualdade |xnyn| ≤ (1/2) (|xn|2 + |yn|2) garante que a se´rie e´ absolutamente convergente). ´E fa´cil verificar que 〈·, ·〉 e´ um produto interno e que ‖ · ‖2 prove´m desse produto interno. � Exemplo 2.1.8 Seja C0L2([a, b],C) o espac¸o vetorial C0([a, b],C) considerado com o produto interno 〈x, y〉 := ∫ b a x(s)y(s)ds. Denotamos ‖ · ‖L2 a norma correspondente a esse produto interno. Esse espac¸o na˜o e´ completo. Seu completamento e´ o espac¸o L2[(a, b)], definido no Capı´tulo 1. � Corola´rio 2.1.9 SeE for um espac¸o pre´-hilbertiano e y ∈ E, enta˜o a func¸a˜o fy, definida por fy(x) := 〈x, y〉, pertence ao espac¸o dual E∗, isto e´, fy : E → K e´ linear e contı´nua. Demonstrac¸a˜o: A linearidade e´ o´bvia. Consideremos x ∈ E com ‖x‖ ≤ 1. Enta˜o fy(x) = 〈x, y〉 ≤ ‖y‖, o que mostra que ‖fy‖ ≤ ‖y‖. Isso mostra a continuidade. ´E fa´cil verificar, entretanto, que ‖fy‖ = ‖y‖. De fato, tomando x = y, obtemos ‖y‖2 = 〈y, y〉 = fy(y) ≤ ‖fy‖ ‖y‖. 2 Corola´rio 2.1.10 Seja {xα}α∈A uma famı´lia soma´vel no espac¸o pre´-hilbertiano E, tendo como soma x ∈ E. Enta˜o, para todo y ∈ E, a famı´lia {〈xα, y〉}α∈A no corpo K e´ soma´vel e tem por soma 〈x, y〉. Demonstrac¸a˜o: Decorre imediatamente da Proposic¸a˜o 1.6.2. 2 Corola´rio 2.1.11 A aplicac¸a˜o 〈·, ·〉 : E × E → K e´ contı´nua. Em particular, se xn → x e yn → y em E, enta˜o 〈xn, yn〉 → 〈x, y〉. Demonstrac¸a˜o: Temos que |〈x, y〉 − 〈x¯, y¯〉| = |〈x, y〉 − 〈x¯, y〉+ 〈x¯, y〉 − 〈x¯, y¯〉| ≤ |〈x− x¯, y〉|+ |〈x¯, y − y¯〉| ≤ ‖x− x¯‖ ‖y‖+ ‖x¯‖ ‖y − y¯‖. 2 20 CAPI´TULO 2. ESPAC¸OS COM PRODUTO INTERNO 2.2 Geometria dos espac¸os pre´-hilbertianos A proposic¸a˜o abaixo tem demonstrac¸a˜o direta, desenvolvendo o lado esquerdo da equac¸a˜o: Proposic¸a˜o 2.2.1 Em todo espac¸o pre´-hilbertiano vale a identidade do paralelogramo: ‖x+ y‖2 + ‖x− y‖2 = 2 (‖x‖2 + ‖y‖2) . ´E interessante notar que a recı´proca da Proposic¸a˜o 2.2.1 tambe´m e´ va´lida: se, num espac¸o normado, vale a identidade do paralelogramo, enta˜o sua norma prove´m de um produto interno (veja exercı´cio 1). A proposic¸a˜o seguinte, tambe´m de demonstrac¸a˜o imediata, escreve o produto interno em termos de normas: Proposic¸a˜o 2.2.2 (A identidade de polarizac¸a˜o) Se E for um espac¸o pre´-hilbertiano complexo, vale 〈x, y〉 = 1 4 (‖x+ y‖2 − ‖x− y‖2 + i‖x+ iy‖2 − i‖x− iy‖2) . Se E for um espac¸o pre´-hilbertiano real, vale 〈x, y〉 = 1 4 (‖x+ y‖2 − ‖x− y‖2) . Definic¸a˜o 2.2.3 Um subconjunto A de um espac¸o vetorial V e´ convexo se, para todos x, y ∈ A e λ ∈ [0, 1], tivermos λx+ (1− λ)y ∈ A. Proposic¸a˜o 2.2.4 Seja A um conjunto convexo e completo de um espac¸o pre´-hilbertiano E. Enta˜o existe um u´nico ponto a0 ∈ A tal que, para todo a ∈ A, ‖a0‖ ≤ ‖a‖. Em geral, essa proposic¸a˜o e´ utilizada quanto E e´ um espac¸o de Hilbert. Nesse caso, basta supor que A seja um subconjunto fechado e convexo. Demonstrac¸a˜o: Seja δ = infa∈A ‖a‖. Pela definic¸a˜o de δ, existe uma sequ¨eˆncia (an) em A tais que ‖an‖ → δ. Vamos mostrar que (an) e´ uma sequ¨eˆncia de Cauchy. De fato, da identidade do paralelogramo 2.2.1 decorre que ‖an − am‖2 = 2‖an‖2 + 2‖am‖2 − ‖an + am‖2. (2.3) Uma vez que A e´ convexo, temos que (an + am)/2 ∈ A. Logo ‖(an + am)/2‖ ≥ δ, isto e´, ‖an + am‖2 ≥ 4δ2. Pela definic¸a˜o de (an), dado � > 0, existe n0 ∈ N tal que ‖an‖ ≤ δ + �, para todo n ≥ n0. Logo, substituindo essas relac¸o˜es em (2.3), temos, para n,m ≥ n0, ‖an − am‖2 ≤ 2(δ + �)2 + 2(δ + �)2 − 4δ2 = (8δ + 4�)�, 2.3. PROJEC¸O˜ES ORTOGONAIS 21 provando o afirmado. Como A e´ completo, existe a0 ∈ A tal que an → a0. Resta mostrar a unicidade de a0. Suponhamos que ‖a1‖ = δ. A convexidade de A garante que (a0 + a1)/2 ∈ A e, portanto, ‖(a0 + a1)/2‖ ≥ δ. Mas a identidade do paralelogramo nos da´ que δ2 ≤ ∥∥∥∥a0 + a12 ∥∥∥∥2 = 12‖a0‖2 + 12‖a1‖2 − ∥∥∥∥a0 − a12 ∥∥∥∥2 = 12δ2 + 12δ2 − ∥∥∥∥a0 − a12 ∥∥∥∥2 < δ2, se a1 6= a0. 2 Corola´rio 2.2.5 Seja B um conjunto convexo e completo de um espac¸o pre´-hilbertiano E. Para todo x ∈ E, existe um u´nico elemento x0 ∈ B tal que, para todo b ∈ B, dist (x, x0) ≤ dist (x, b). Demonstrac¸a˜o: Basta considerar o conjunto A := B − x = {b− x : b ∈ B}. Pelo exercı´cio 14, A e´ um conjunto convexo. O afirmado decorre enta˜o de distaˆncia dist (·, ·) ser invariante por translac¸a˜o. 2 2.3 Projec¸o˜es ortogonais Definic¸a˜o 2.3.1 Dado um conjunto A ⊂ E definimos A⊥ := {x ∈ E : x ⊥ a para todo a ∈ A} = {x ∈ E : x ⊥ A}. Lema 2.3.2 Sejam E um espac¸o pre´-hilbertiano e < A > o subespac¸o gerado pelo conjunto A, isto e´, o conjunto de todas as combinac¸o˜es lineares (finitas!) de elementos de A ⊂ E. Enta˜o A⊥ ⊥ A, isto e´, se x⊥ ∈ A⊥ enta˜o x⊥ ⊥ A. Mais ainda, A⊥ ⊥ < A >, o fecho de < A >. O conjunto A⊥ e´ um subespac¸o fechado de E. Demonstrac¸a˜o: Se x = α1x1 + . . . + αnxn ∈< A > (com α1, . . . , αn ∈ K e x1, . . . , xn ∈ A) e se x⊥ ⊥ A, isto e´, x⊥ ⊥ a para todo a ∈ A, enta˜o e´ claro que x⊥ ⊥ < A >. Se x ∈ < A >, enta˜o existe uma sequ¨eˆncia (xn) em < A > tal que xn → x. Mas enta˜o 〈x⊥, x〉 = limn→∞〈x⊥, xn〉 = 0. Claramente A⊥ e´ um subespac¸o de E. Seja (x⊥n ) uma sequ¨eˆncia em A⊥, com x⊥n → x⊥0 . Enta˜o, se a ∈ < A >, 〈x⊥0 , a〉 = limn→∞〈x⊥n , a〉 = 0. Assim, A⊥ e´ um subespac¸o fechado de A. 2 Lema 2.3.3 Seja E um espac¸o pre´-hilbertiano e A,B ⊂ E. Enta˜o vale: (i) Se A ⊂ B, enta˜o B⊥ ⊂ A⊥; (ii) A¯ ⊂ A⊥⊥ := (A⊥)⊥. Demonstrac¸a˜o: (i) ´E imediato. (ii) Claramente A ⊂ A⊥⊥. Tomando o fecho nessa relac¸a˜o, temos o afirmado. 2 Teorema 2.3.4 Seja F um subespac¸o do espac¸o pre´-hilbertiano E. Sa˜o equivalentes as seguintes afirmac¸o˜es a respeito de z ∈ E \ F : 22 CAPI´TULO 2. ESPAC¸OS COM PRODUTO INTERNO (i) z ⊥ F ; (ii) ‖z‖ ≤ ‖z − y‖ para todo y ∈ F ; (iii) dist (z, F ) = ‖z‖. Demonstrac¸a˜o: (i)⇒ (ii) Seja y ∈ F . Do Teorema de Pita´goras 2.1 vem que ‖z + (−y)‖2 = ‖z‖2 + ‖y‖2 ≥ ‖z‖2. (ii)⇒ (i) Se z na˜o for ortogonal a F , existe f ∈ F tal que 〈z, f〉 6= 0. Claramente podemos supor ‖f‖ = 1. Enta˜o temos z − 〈z, f〉f ⊥ f e, do Teorema de Pita´goras, segue-se que ‖z‖2 = ‖z − 〈z, f〉f + 〈z, f〉f‖2 = ‖z − 〈z, f〉f‖2 + ‖〈z, f〉f‖2 > ‖z − 〈z, f〉f‖2. Achamos assim um elemento y = 〈z, f〉f ∈ F tal que ‖z‖ > ‖z − y‖. (ii)⇔ (iii) Essas afirmac¸o˜es sa˜o, obviamente, equivalentes. 2 Corola´rio 2.3.5 Seja F um subespac¸o do espac¸o pre-hilbertiano E. Dados os elementos x ∈ E e xF ∈ F , sa˜o equivalentes as seguintes afirmac¸o˜es: (i) x− xF ⊥ F ; (ii) Para todo y ∈ F , temos ‖x− xF‖ ≤ ‖x− y‖; (iii) dist (x, F ) = ‖x− xF‖. Ale´m disso, se F for completo, para todo x ∈ E existe um u´nico elemento xF ∈ F satisfazendo essas propriedades. (O elemento xF e´ a projec¸a˜o ortogonal de x em F ). Nesse caso, o espac¸o E decompo˜e-se ortogonalmente: E = F ⊕ F⊥. Demonstrac¸a˜o: Se x ∈ F , qualquer das propriedades (i) − (ii) − (iii) verifica-se apenas quando xF = x. Se x 6∈ F , a equivaleˆncia entre essas afirmac¸o˜es decorre do Teorema 2.3.4, ao se tomar z = x− xF . Se F for completo, a existeˆncia e a unicidade de xF decorrem do Corola´rio 2.2.5. Para verificar a existeˆncia da decomposic¸a˜o ortogonal E = F ⊕G, basta tomar x ∈ E e escrever x = xF + (x− xF ). O resultado enta˜o decorre de (i). 2 Observac¸a˜o 2.3.6 Suponhamos que E na˜o seja um espac¸o de Hilbert. Se F ⊂ E for completo, enta˜o E = F ⊕ F⊥. Note que o espac¸o F⊥ e´ fechado (Lema 2.3.2), mas na˜o e´ completo. Por outro lado, nem sempre existe uma decomposic¸a˜o E = F ⊕ F⊥, mesmo que F seja fechado. De fato, seja E o completamento de E. Tome h ∈ E \ E e considere F =< h >⊥ ∩E. O subespac¸o F e´ fechado em E. (Se fosse F = E, enta˜o E ⊂ < h >⊥ ⊂ E. Isto e´ um absurdo, pois < h >⊥ 6=E e´ subespac¸o fechado de E e E e´ denso em E.) O espac¸o F na˜o tem complemento ortogonal em E. � Corola´rio 2.3.7 Seja F ⊂ E um subespac¸o completo de um espac¸o pre´-hilbertiano E. Se F 6= E, enta˜o existe 0 6= z ∈ E tal que z ⊥ F . 2.3. PROJEC¸O˜ES ORTOGONAIS 23 Demonstrac¸a˜o: Seja x ∈ E \ F . Defina z = x − xF . Temos ‖z‖ 6= 0, pois x 6∈ F . Esse elemento e´ ortogonal a F . 2 No caso de espac¸os de Hilbert, temos uma recı´proca do Corola´rio 2.1.9. Teorema 2.3.8 (Teorema de Representac¸a˜o de Riesz) Seja E um espac¸o de Hilbert e f um elemento do espac¸o dual E∗, isto e´, f : E → K um funcional linear contı´nuo. Enta˜o existe um u´nico elemento y ∈ E tal que f(x) = 〈x, y〉, ∀ x ∈ E. Ale´m disso, ‖f‖ = ‖y‖. Demonstrac¸a˜o: A unicidade de y e´ imediata: se 〈x, y〉 = 〈x, y1〉 para todo x ∈ E, enta˜o 〈x, y−y1〉 = 0 para todo x ∈ E. Tomando x = y − y1, concluı´mos que y = y1. Se f(x) = 0 para todo x ∈ E, tome y = 0. Caso contra´rio, defina M := {x ∈ E : f(x) = 0}. Quer dizer, M e´ o nu´cleo do funcional f . Logo, M e´ um subespac¸o fechado de E. Como E = M ⊕M⊥ (pelo Corola´rio 2.3.5) e f(x) 6= 0 para algum x ∈ E, vemos que M⊥ 6= {0}. A linearidade de f garante a existeˆncia de 0 6= b ∈ M⊥ tal que f(b) = 1. Assim, para todo x ∈ E, temos x = [x− bf(x)] + bf(x) ∈M ⊕M⊥. Temos enta˜o 〈x, b〉 = 〈bf(x), b〉 = f(x)‖b‖2. Basta enta˜o tomar y := b/‖b‖2. Finalmente, ‖f‖ = sup ‖x‖=1 |f(x)| = sup ‖x‖=1 |〈x, y〉| ≤ sup ‖x‖=1 ‖x‖ ‖y‖ = ‖y‖. Por outro lado, ‖y‖2 = 〈y, y〉 = |f(y)| ≤ ‖f‖ ‖y‖. Assim, ‖f‖ = ‖y‖. 2 Exemplo 2.3.9 Consideremos o espac¸o de Hilbert L2([a, b]). Seja F : L2([a, b]) → C um funcional linear contı´nuo. O Teorema de Representac¸a˜o de Riesz garante a existeˆncia de uma u´nica func¸a˜o g ∈ L2([a, b]) tal que, para todo f ∈ L2([a, b]), temos F (f) = ∫ b a f(x)g(x)dx. � 24 CAPI´TULO 2. ESPAC¸OS COM PRODUTO INTERNO 2.4 Bases em espac¸os pre´-hilbertianos Para melhor compreender os resultados dessa sec¸a˜o, consideremos os dois exemplos ba´sicos a seguir. Exemplo 2.4.1 O espac¸o Rn ou o espac¸o Cn com o produto interno 〈x, y〉 = n∑ i=1 xiyi. � Exemplo 2.4.2 O espac¸o L2([0, 1]) com o produto interno 〈f, g〉 = ∫ 1 0 f(x)g(x)dx ou o seu subespac¸o CL2(T ), o conjunto das func¸o˜es contı´nuas f : [0, 1]→ C e perio´dicas com perı´odo 1. (A notac¸a˜o T designa o toro T = R/Z, que se identifica com esse espac¸o de func¸o˜es perio´dicas). � Definic¸a˜o 2.4.3 Dizemos que uma famı´lia {eα}α∈A e´ ortogonal se, para α 6= β ∈ A, temos eα ⊥ eβ . Se, ale´m disso, esses elementos forem unita´rios, isto e´, ‖eα‖ = 1 para todo α ∈ A, a famı´lia e´ ortonor- mal. Dizemos tambe´m que {eα : α ∈ A} e´ um sistema ortogonal ou ortonormal, respectivamente. No exemplo 2.4.1, a base canoˆnica {e1, . . . , en} e´ um sistema ortonormal. No exemplo 2.4.2, as func¸o˜es hk(t) = ei2pikt (k ∈ Z) formam um sistema ortonormal, o que decorre de 〈hj, hk〉 = 〈ei2pijt, ei2pikt〉 = ∫ 1 0 ei2pi(j−k)tdt = δjk em que estamos usando a notac¸a˜o de Kronecker δjj = 1, δjk = 0, se j 6= k. Definic¸a˜o 2.4.4 Dado um vetor unita´rio eα e x ∈ E, o escalar 〈x, eα〉 =: xα ∈ K e´ a componente de x na direc¸a˜o de eα. O vetor xαeα e´ a projec¸a˜o de x na direc¸a˜o eα. No exemplo 2.4.1, dado x = (x1, . . . , xn) ∈ Kn, xi = 〈x, ei〉 e´ a componente de x na direc¸a˜o ei. No exemplo 2.4.2, a componente de f na direc¸a˜o hk e´ dada por 〈f, hk〉 = 〈f, ei2pikt〉 = ∫ 1 0 f(t)e−i2piktdt, que e´ justamente o k-e´simo coeficiente de Fourier (complexo) de f . Por esse motivo, o nu´mero xα = 〈x, eα〉 tambe´m e´ chamado coeficiente de Fourier de x ∈ E. Nosso objetivo e´ estudar o espac¸o gerado pelos vetores eα, isto e´, se B = {eα : α ∈ A}, estudar < B >. Teorema 2.4.5 (Melhor aproximac¸a˜o) Sejam {eα}α∈A uma famı´lia ortonormal num espac¸o pre´-hilbertiano E e F ⊂ A um subconjunto finito. Para todo x ∈ E, se denotamos xα := 〈x, eα〉, temos que∥∥∥∥∥x−∑ α∈F xαeα ∥∥∥∥∥ ≤ ∥∥∥∥∥x−∑ α∈F λαeα ∥∥∥∥∥ , 2.4. BASES EM ESPAC¸OS PRE´-HILBERTIANOS 25 quaisquer que sejam os escalares λα ∈ K. A igualdade se verifica apenas quando λα = xα. O ele- mento ∑ α∈F xαeα e´ a projec¸a˜o ortogonal de x no espac¸o (de dimensa˜o finita) gerado pelo conjunto {eα}α∈F . Demonstrac¸a˜o: Para todo β ∈ F , temos que x −∑α∈F xαeα e´ ortogonal ao espac¸o vetorial gerado pelo conjunto {eα}α∈F . De fato,〈 x− ∑ α∈F xαeα, eβ 〉 = xβ − xβ = 0. O resultado segue-se enta˜o do Corola´rio 2.3.5. 2 Lema 2.4.6 Seja B = {eα}α∈A uma famı´lia ortonormal num espac¸o pre´-hilbertiano E. Sejam x, y ∈ E, xα = 〈x, eα〉 e yα = 〈y, eα〉, com α ∈ A. Suponhamos que as famı´lias (xαeα) e (yαeα) sejam soma´veis. Enta˜o 〈∑ α xαeα, ∑ α yαeα 〉 = ∑ α xαyα. Demonstrac¸a˜o: Sejam X =∑α xαeα e Y =∑α yαeα. (Note que na˜o podemos garantir que X = x e Y = y!) Para β ∈ A fixo, segue-se do Corola´rio 2.1.10 que a famı´lia (〈xαeα, eβ〉) e´ soma´vel e tem por soma 〈X, eβ〉. Assim, 〈X, eβ〉 = ∑ α 〈xαeα, eβ〉 = xβ. O resultado agora decorre do mostrado acima, aplicando novamente o Corola´rio 2.1.10. 2 Proposic¸a˜o 2.4.7 (Desigualdade de Bessel) Dada uma famı´lia ortonormal {eα}α∈A num espac¸o pre´-hilbertiano E, para todo x ∈ E vale∑ α∈A |xα|2 ≤ ‖x‖2, em que xα = 〈x, eα〉. Em particular, a famı´lia {|xα|2}α∈A e´ soma´vel. Ale´m disso, ∑ α∈A |xα|2 = ‖x‖2 ⇔ x = ∑ α∈A xαeα. Demonstrac¸a˜o: Seja F ⊂ A um conjunto finito. Temos, pelo Teorema de Pita´goras, ‖x‖2 − ∑ α∈F |xα|2 = 〈 x− ∑ α∈F xαeα, x− ∑ α∈F xαeα 〉 ≥ 0. Assim, temos a expressa˜o finita da Desigualdade de Bessel:∑ α∈F |xα|2 ≤ ‖x‖2. (2.4) 26 CAPI´TULO 2. ESPAC¸OS COM PRODUTO INTERNO Afirmamos agora que {|xα|2} e´ uma famı´lia soma´vel. Para isso, definimos In = {eα : α ∈ A e |xα|2 > 1/n2}. O conjunto In possui apenas um nu´mero finito de elementos. De fato, se e1, . . . , ek esta˜o em In, a definic¸a˜o desse conjunto e a desigualdade (2.4) nos garantem que k 1 n2 ≤ k∑ i=1 |xi|2 ≤ ‖x‖2 (estamos denotando xi = 〈x, ei〉) e, portanto, k ≤ n2‖x‖2 <∞. Como consequ¨eˆncia, I = {eα : α ∈ A e xα 6= 0} = ∞⋃ n=1 In e´ um conjunto enumera´vel. Assim, se {|xα|2} na˜o fosse soma´vel, existiria F ⊂ A finito tal que ∑ α∈F |xα|2 > M para todo M > 0, o que contradiz (2.4). Isso mostra o afirmado. Da desigualdade (2.4) segue-se imediatamente que sup F⊂A ∑ α∈F |xα|2 ≤ ‖x‖2, (2.5) em que o supremo e´ tomado sobre todos os conjuntos finitos F ⊂ A. Uma vez que {|xα|2} possui no ma´ximo um nu´mero enumera´vel de elementos na˜o nulos, segue-se imediatamente que supF⊂A ∑ α∈F |xα|2 = ∑ α∈A |xα|2, o que prova a desigualdade de Bessel. Quanto a` u´ltima afirmac¸a˜o, notamos que se F ⊂ A e´ finito,∥∥∥∥∥x−∑ α∈F xαeα ∥∥∥∥∥ = ‖x‖2 −∑ α∈F |xα|2. Assim, x = ∑ α∈A xαeα, se ‖x‖2 = ∑ α∈A |xα|2. A recı´proca e´ obtida ao se tomar y = x no Lema 2.4.6. 2 A desigualdade de Bessel e´ absolutamente trivial no exemplo 2.4.1:∑ i∈F⊂A |xi|2 ≤ ‖x‖2 = n∑ i=1 |xi|2, qualquer que seja o conjunto finito F ⊂ A = {1, . . . , n}. No exemplo 2.4.2 ela nos diz que∑ k∈Z ∣∣〈f, ei2pikt〉∣∣ =∑ k∈Z ∣∣∣∣∫ 1 0 f(t)e−i2piktdt ∣∣∣∣ ≤ ∫ 1 0 |f(t)|2dt. Na realidade, nesse exemplo, a igualdade se verifica, como mostraremos oportunamente (veja a Proposic¸a˜o 2.7.1 e aplique enta˜o o Teorema 2.4.11). 2.4. BASES EM ESPAC¸OS PRE´-HILBERTIANOS 27 Esco´lio 2.4.8 Seja {eα}α∈A uma famı´lia ortonormal num espac¸o pre´-hilbertiano E e x ∈ E. Enta˜o o conjunto Mx = {eα : α ∈ A e 〈x, eα〉 6= 0} e´ enumera´vel. Demonstrac¸a˜o: Seja n ∈ N∗ arbitra´rio. A demonstrac¸a˜o da desigualdade de Bessel garante que In = {eα : α ∈ A e 〈x, eα〉 = |xα|2 > 1/n2} e´ finito e que Mx = ∞⋃ n=1 In e´ enumera´vel. 2 Teorema 2.4.9 Sejam E um espac¸o de Hilbert, B = {eα}α∈A uma famı´lia ortonormal e {λα}α∈A uma famı´liade escalares tais que {|λα|2}α∈A seja soma´vel. Enta˜o a famı´lia {λαeα} e´ soma´vel. Em particular, se xα = 〈x, eα〉 ∈ K, enta˜o a famı´lia {xαeα}α∈A e´ soma´vel. Demonstrac¸a˜o: Uma vez que E e´ completo, o Teorema 1.6.5 garante que basta provarmos que {λαeα}α∈A e´ de Cauchy. Isto e´, dado � > 0, queremos provar que existe um conjunto finito F� ⊂ A tal que, para todo subconjunto finito F ′ ⊂ A, com F ′ ∩ F� = ∅, temos ‖∑α∈F ′ λαeα‖ < �. Mas isso decorre imediatamente de ‖∑α∈F ′ λαeα‖2 = ∑α∈F ′ |λα|2 e da hipo´tese de {|λα|2} ser soma´vel. No caso particular de xα, isso e´ consequ¨eˆncia da desigualdade de Bessel, que garante que ∑ α∈A |xα|2 e´ soma´vel. 2 Observac¸a˜o 2.4.10 O Teorema 2.4.9 simplifica o enunciado do Lema 2.4.6: as famı´lias (xαeα) e (yαeα) sempre sa˜o soma´veis! � Teorema 2.4.11 (da base) Seja B = {eα}α∈A uma famı´lia ortonormal num espac¸o pre´-hilbertiano E e F =< B >. Se xα = 〈x, eα〉, sa˜o equivalentes as seguintes propriedades: (i) para todo x ∈ E, temos x =∑α∈A xαeα; (ii) para quaisquer x, y ∈ E, vale a identidade de Parseval 〈x, y〉 = ∑ α∈A xαyα; (iii) para todo x ∈ E temos ‖x‖2 = ∑ α∈A |xα|2; (iv) F , o conjunto das combinac¸o˜es lineares finitas de elementos de B, e´ denso em E; 28 CAPI´TULO 2. ESPAC¸OS COM PRODUTO INTERNO (v) Todo funcional linear contı´nuo f : E → K que se anula em B e´ identicamente nulo; Quando E e´ um espac¸o de Hilbert, as propriedades anteriores sa˜o equivalentes a: (vi) o sistema {eα}α∈A e´ maximal, isto e´, na˜o existe elemento 0 6= e ∈ E tal que e ⊥ eα para todo α ∈ A. Demonstrac¸a˜o: (i)⇒ (ii) ´E o resultado mostrado no Lema 2.4.6. (ii)⇒ (iii) Tome y = x em (ii). (iii) ⇒ (iv) Como ‖x−∑α∈F xαeα‖2 = ‖x‖2 −∑α∈F |xα|2, dado � > 0 existe F ⊂ A finito de modo que o lado direito da igualdade acima seja menor do que �. Como∑α∈F xαeα ∈ F , o resultado esta´ provado. (iv) ⇒ (v) Dados x ∈ E e � > 0, existe F ⊂ A finito tal que ∥∥x−∑α∈F xαeα∥∥ < �. Mas |f(x)| ≤ ∣∣f (x−∑α∈F xαeα)∣∣ + ∣∣f (∑α∈F xαeα)∣∣ ≤ ‖f‖�, pois f se anula em F . Como � e´ ar- bitra´rio, f ≡ 0. (v) ⇒ (i). Suponhamos que x 6= X = ∑α xαeα para algum x ∈ E. Decorre da desigualdade de Bessel que ‖x‖2 −∑α∈A |xα|2 > 0. Seja Y =∑α yαeα e defina f : E → K por, f(y) = 〈y, x〉 − 〈∑ α∈A yαeα, ∑ α∈A xαeα 〉 = 〈y, x〉 − ∑ α∈A yαxα. O funcional f e´ claramente contı´nuo e f(eα) = xα − xα = 0 para todo α ∈ A (veja o Lema 2.4.6). Mas f(x) > 0, absurdo. (v) ⇒ (vi). Se existe e ⊥ eα para todo α, com e 6= 0, enta˜o f(y) := 〈y, e〉 se anularia na famı´lia {eα}α∈A, mas na˜o seria identicamente nulo, pois f(e) = ‖e‖ 6= 0. (vi) ⇒ (i). Dado x ∈ E, do Teorema 2.4.9 segue-se que {xαeα}α∈A e´ soma´vel. Defina e := x −∑α∈A xαeα. Para todo eα, temos 〈e, eα〉 = eα − eα = 0. A condic¸a˜o (vi) implica e = 0, isto e´, x = ∑ α∈A xαeα. 2 Observac¸a˜o 2.4.12 Observe que a implicac¸a˜o (v)⇒ (vi) na˜o exige que E seja completo; apenas para espac¸os de Hilbert temos (vi)⇒ (i). A equivaleˆncia entre (i) e (iii) garante que (xαeα) e´ soma´vel se, e somente se, (|xα|2) e´ soma´vel. (Compare com o Teorema 2.4.9.) Este resultado e´ chamado Teorema de Riesz-Fischer. Mais adiante daremos uma outra versa˜o desse teorema. � 2.5 Base de Schauder Definic¸a˜o 2.5.1 SejaE um espac¸o pre´-hilbertiano. Uma base de Schauder e´ um conjunto ortonormal satisfazendo qualquer das propriedades equivalentes listadas no Teorema 2.4.11. Vamos mostrar que todo espac¸o de Hilbert possui uma base de Schauder. Existem, entretanto, espac¸os pre´-hilbertianos que na˜o a possuem. Definic¸a˜o 2.5.2 Seja Z um conjunto qualquer e R uma relac¸a˜o definida entre alguns elementos de Z. O conjunto Z e´ parcialmente ordenado pela relac¸a˜o R (ou R e´ uma ordem parcial em Z) se (i) a relac¸a˜o R e´ reflexiva: zRz para todo z ∈ Z; 2.5. BASE DE SCHAUDER 29 (ii) a relac¸a˜o R e´ transitiva: zRy e yRw implicam zRw; (iii) se zRy e yRz enta˜o z = y. Se, para cada dois elementos z, y ∈ Z for va´lida uma das relac¸o˜es zRy ou yRz enta˜o dizemos que o conjunto Z e´ totalmente ordenado por R. Exemplo 2.5.3 Seja Z = R e com a relac¸a˜o ≤. Imediatamente verificamos que R e´ um conjunto totalmente ordenado pela relac¸a˜o ≤. � Exemplo 2.5.4 Seja X um conjunto qualquer e S ⊂ P um subconjunto qualquer do conjunto de todas os subconjuntos de X . Enta˜o ⊂ e´ uma ordem parcial em S, como se verifica imediatamente. � Definic¸a˜o 2.5.5 Seja Z um conjunto parcialmente ordenado pela relac¸a˜o R e A ⊂ Z um subconjunto. Um elemento a ∈ Z e´ uma cota superior para A se yRa, ∀ y ∈ A. O elemento a ∈ Z e´ maximal se aRy para algum y ∈ Z implicar a = y. Note que a definic¸a˜o na˜o exige que a ∈ A, mas pede que a seja “compara´vel” com todo elemento y ∈ A. O elemento maximal na˜o precisa ser “o maior elemento do conjunto Z”. ´E necessa´rio que na˜o exista um elemento maior do que ele! Exemplo 2.5.6 No exemplo 2.5.4, consideremos a relac¸a˜o de inclusa˜o definida em P e o conjunto S ⊂ P . ´E claro que a unia˜o de todos os conjuntos de S e´ uma cota superior para S e que qualquer outro conjunto em Z que contenha S tambe´m e´ outra cota superior para S. � Exemplo 2.5.7 Exemplo A.2, p. 158 Bachman-Narici. � Definic¸a˜o 2.5.8 Seja Z um conjunto parcialmente ordenado pela relac¸a˜o R. O conjunto Z e´ induti- vamente ordenado se qualquer subconjunto totalmente ordenado de Z possuir uma cota superior em Z. Podemos agora enunciar o Lema de Zorn, que sera´ utilizado como se fosse um axioma: Lema 2.5.9 (Zorn) Todo conjunto na˜o-vazio indutivamente ordenado possui um elemento maximal. O Lema de Zorn (que, na verdade e´ equivalente ao Axioma da Escolha) encontra muitas aplicac¸o˜es na Matema´tica. Atrave´s dele se prova a existeˆncia de ideais maximais em um anel com unidade, que todo espac¸o vetorial possui uma base (no sentido dos elementos do espac¸o serem combinac¸o˜es lineares (finitas) dos elementos dessa base) e tambe´m o Teorema de Hahn-Banach. Mostraremos como o Lema de Zorn e´ utilizado para se mostrar que todo espac¸o de Hilbert possui uma base de Schauder. 30 CAPI´TULO 2. ESPAC¸OS COM PRODUTO INTERNO Teorema 2.5.10 (Existeˆncia da base de Schauder) Seja H 6= {0} um espac¸o de Hilbert. Se B0 e´ uma famı´lia ortonormal, enta˜o existe uma base de Schauder S para H , com B0 ⊂ S. Demonstrac¸a˜o: Uma vez que H 6= {0}, existe x ∈ H tal que {x/‖x‖} e´ um conjunto ortonormal. Assim, um espac¸o de Hilbert na˜o trivial sempre possui uma famı´lia ortonormal. Definimos M = {B : B0 ⊂ B ⊂ H, B famı´lia ortonormal}. O conjunto M na˜o e´ vazio, pois B0 ∈M. No conjunto M introduzimos a relac¸a˜o: B1RB2 ⇔ B1 ⊂ B2. Claramente R e´ uma ordem parcial em M (veja exemplo 2.5.4). Seja T um subconjunto totalmente ordenado de M. Definimos enta˜o S0 = ⋃ B⊂T B. Temos enta˜o: (a) S0 ∈M, pois B0 ⊂ B para todo B ⊂ T . Assim, B0 ⊂ S0; (b) S0 e´ uma famı´lia ortonormal. De fato, sejam x1, x2 ∈ S0. Enta˜o existem conjuntos B1 e B2 em T tais x1 ∈ B1 e x2 ∈ B2. Mas enta˜o vale B1 ⊂ B2 ou B2 ⊂ B1. Suponhamos, portanto que x1, x2 ∈ B2. Como B2 e´ ortonormal, 〈x1, x2〉 = δij . (c) S0 e´ uma cota superior para T , pois se B ∈ T , enta˜o B ⊂ S0, ou seja, BRS0. Assim, de acordo com o Lema de Zorn, existe um elemento maximal S para M. Esse conjunto e´ uma famı´lia ortonormal. Afirmamos que ele e´ uma base de Schauder. De fato, se existisse 0 6= e ⊥ eα para todo eα ∈ S, podemos supor que ‖e‖ = 1 e enta˜o S ∪ {e} seria uma famı´lia ortonormal em H tal que S b S ∪ {e}, o que contradiz o fato de S ser maximal. Assim, S e´ uma base de Schauder, de acordo com o Teorema 2.4.11. 2 Vamos agora mostrar que podemos definir a dimensa˜o de um espac¸o de Hilbert. Teorema 2.5.11 Sejam S1 e S2 duas bases de Schauder no espac¸o de Hilbert H . Enta˜o S1 e S2 possuem a mesma cardinalidade, isto e´, existe uma aplicac¸a˜o bijetiva ϕ : S1 → S2. Demonstrac¸a˜o: Se a cardinalidade de S1 for finita,esse e´ um resultado conhecido da ´Algebra Linear. Sejam, portanto, S1 = {eα : α ∈ A} e S2 = {fβ : β ∈ B}, sendo A e B conjuntos infinitos. Enta˜o, fixado eα ∈ S1, o conjunto Seα = {fβ ∈ S2 : 〈fβ, eα〉 6= 0} na˜o e´ vazio: se esse fosse o caso, o Teorema 2.4.11 (vi) implicaria eα = 0, o que na˜o e´ possı´vel, pois ‖eα‖ = 1 para todo eα ∈ S1. 2.6. O TEOREMA DE RIESZ-FISCHER 31 Decorre imediatamente do esco´lio 2.4.8 que Seα e´ enumera´vel. Claramente vale⋃ α∈A Seα ⊂ S2. Por outro lado, se fβ ∈ S2, enta˜o fβ ∈ Seα para algum α ∈ A, de novo pelo Teorema 2.4.11 (vi). Logo, ⋃ α∈A Seα = S2. (2.6) Se ℵA e ℵB sa˜o as cardinalidades dos conjuntos A e B, respectivamente, e ℵ0 a cardinalidade de N, decorre de (2.6) que ℵB ≤ ℵ0ℵA. Como ℵ0ℵA = ℵA, provamos assim que ℵB ≤ ℵA. Revertendo o procedimento, obtemos ℵA ≤ ℵB. A prova esta´, assim, completa. 2 Definic¸a˜o 2.5.12 A dimensa˜o de um espac¸o de Hilbert H e´ a cardinalidade de uma de suas bases de Schauder. 2.6 O teorema de Riesz-Fischer Vamos considerar agora a seguinte pergunta: escolhido um conjunto, existe um espac¸o de Hilbert com dimensa˜o igual a` cardinalidade desse conjunto? Se o conjunto e´ finito e tem cardinalidade n, enta˜o a resposta e´ claramente sim: Kn e´ um espac¸o de Hilbert. Vamos mostrar que a resposta a` nossa pergunta e´ sempre afirmativa. Para isso, comec¸amos por generalizar o espac¸o `2. Definic¸a˜o 2.6.1 Seja A um conjunto qualquer com cardinalidade ℵA. Definimos `2(A) = {f : A→ K : {|f(t)|2}t∈A e´ soma´vel }. Note que, de acordo com o Lema 1.6.4, o conjunto {t ∈ A : f(t) 6= 0} e´ enumera´vel. Assim, a famı´lia {|f(t)|2}t∈A pode ser descrita por meio de uma se´rie ∑∞ n=1 |f(tn)|2. Como essa se´rie converge absolutamente, ela tambe´m e´ comutativamente convergente. O conjunto `(A) tem uma estrutura natural de espac¸o vetorial. Tambe´m podemos introduzir um produto interno: Teorema 2.6.2 Se f, g ∈ `2(A), definimos 〈f, g〉 = ∑ t∈A f(t)g(t). Com esse produto interno, `2(A) e´ um espac¸o de Hilbert de dimensa˜o ℵA e base ortonormal S = {et : t ∈ A}, sendo et(τ) = { 1 se t = τ 0 se t 6= τ, para todo τ ∈ A. 32 CAPI´TULO 2. ESPAC¸OS COM PRODUTO INTERNO Demonstrac¸a˜o: Para n ∈ N∗, sejam (tn) e (t′n) aqueles elementos emA tais que f(tn) 6= 0 e g(t′n) 6= 0, respectivamente. Definimos enta˜o, para k ∈ N∗, a sequ¨eˆncia τk por τ2k−1 = tk, τ2k = t′k. Segue de (1.1) a estimativa1 ∞∑ k=1 |f(τk) + g(τk)|2 ≤ 4 ∞∑ k=1 (|f(τk)|2 + |g(τk)|2) <∞. Assim, f + g ∈ `2(A). Claramente αf ∈ `2(A), se α ∈ K e f ∈ `2(A). ´E fa´cil verificar que 〈f, g〉 define um produto interno. Seja agora (fn) ⊂ `2(A) uma sequ¨eˆncia de Cauchy. Dado � > 0, existe n0 ∈ N∗ tal que, para quaisquer m,n ≥ n0, ‖fm − fn‖ = (∑ t∈M |fm(t)− fn(t)|2 )1/2 < �. (2.7) Assim, para cada t ∈ A, temos |fm(t) − fn(t)|2 ≤ �, o que garante que (fn(t)) e´ uma sequ¨eˆncia de Cauchy para todo t ∈ A fixo. Como K e´ completo, existe f(t) := limn→∞ fn(t). Esta´ assim definida uma func¸a˜o f : A→ K. Vamos mostrar que f ∈ `2(A). Como fn ∈ `2(A), o conjunto In = {t ∈ A : fn(t) 6= 0} e´ enumera´vel. Assim, I = ∞⋃ n=1 In tambe´m e´ enumera´vel. Afirmamos que If = {t ∈ A : f(t) 6= 0} ⊂ I, de onde decorre imediatamente que If e´ enumera´vel. Para provar a nossa afirmac¸a˜o, basta notar que se t 6∈ I , enta˜o fn(t) = 0 para todo n e, por consequ¨eˆncia, f(t) = 0. Escrevendo o conjunto I como uma sequ¨eˆncia (tj), a desigualdade (2.7) nos mostra que temos, para todo k ∈ N∗, k∑ j=1 |fm(tj)− fn(tj)|2 ≤ �2, se m,n ≥ n0. Tomando o limite quando m→∞, obtemos k∑ j=1 |f(tj)− fn(tj)|2 ≤ �2 e, quando k →∞, ∑ t∈I |f(t)− fn(t)|2 ≤ �2. 1De acordo com o exercı´cio 19, temos ∞∑ k=1 |f(τk) + g(τk)|2 ≤ 2 ∞∑ k=1 (|f(τk)|2 + |g(τk)|2) <∞. 2.6. O TEOREMA DE RIESZ-FISCHER 33 Daı´ segue-se que ∑ t∈A |f(t)− fn(t)|2 ≤ �2, pois fn(t) e f(t) se anulam quando t ∈ A \ I . Isso mostra que ‖f − fn‖ ≤ � (2.8) e, portanto, f − fn ∈ `2(A). Assim, f = fn + (f − fn) ∈ `2(A). Da desigualdade (2.8) segue-se que fn → f em `2(A), o que mostra que `2(A) e´ um espac¸o de Hilbert. Uma vez que 〈f, eτ 〉 = f(τ) e f(t) = ∑ τ∈A f(t)eτ (t), vemos que S e´ uma base ortonormal com cardinalidade A. 2 Definic¸a˜o 2.6.3 Sejam (E, 〈·, ·〉1) e (F, 〈·, ·〉2) espac¸os pre´-hilbertianos. Um isomorfismo entre E e F e´ uma aplicac¸a˜o linear bijetiva f : E → F tal que, para quaisquer x, y ∈ E, 〈x, y〉1 = 〈f(x), f(y)〉2. Teorema 2.6.4 (Riesz-Fischer) Seja H um espac¸o de Hilbert sobre o corpo K. Enta˜o existe um conjunto A tal que H e´ isomorfo a `2(A) (sobre o corpo K). Demonstrac¸a˜o: Seja S = {fα : α ∈ A} uma base de Schauder para H . (Essa base existe, de acordo com o Teorema 2.5.10.) Considere o espac¸o `2(A) e a base de Schauder S ′ = {eα : α ∈ A} dada pelo Teorema 2.6.2. Decorre do Teorema 2.4.11 que (|xα|2) e´ uma famı´lia soma´vel. Assim, existe∑ α∈A 〈x, fα〉eα. Definimos φ : H → `2(A) x 7→ ∑ α∈A 〈x, fα〉eα. (A imagem de φ no ponto x e´ a func¸a˜o g : A → K que assume o valor ∑α∈A〈x, fα〉eα(t) = xt no ponto t ∈ A.) O Teorema 2.4.11 nos garante que ‖φ(x)‖ = ∑α∈A |xα|2 = ‖x‖2. Isso garante que φ e´ uma isometria e, portanto, injetiva. (Veja o exercı´cio 9.) Seja g ∈ `2(A). O Teorema 2.4.11 garante que ‖g‖2 =∑β∈A |gβ|2 =∑β∈A |〈g, eβ〉|2. Considere y = ∑ β gβfβ . (Como se garante que (gβfβ) e´ soma´vel?) Enta˜o φ(y) = ∑ α∈A 〈∑ β∈A gβfβ, fα 〉 eα = ∑ α∈A gαeα = g, de acordo com o Lema 2.4.6 e o Teorema 2.4.11. Isso mostra que φ e´ sobrejetiva. 2 34 CAPI´TULO 2. ESPAC¸OS COM PRODUTO INTERNO 2.7 Se´ries de Fourier em L2([0,1]) ISSO FICA PARA DEPOIS. Proposic¸a˜o 2.7.1 O conjunto {ei2pikt : k ∈ Z} forma uma base de Schauder para o conjuntoL2([0, 1]). Demonstrac¸a˜o: Pela construc¸a˜o do espac¸o L2([0, 1]), temos que CL2(T ) e´ denso em L2([0, pi]). Basta, portanto, provar que {ei2pikt : k ∈ Z} e´ denso em CL2(T ). Assim, de acordo com a propriedade (iv) do Teorema 2.4.11, dados � > 0 e f ∈ CL2(T ), queremos provar que existe um subconjunto finito F ⊂ Z e escalares λk, com k ∈ F , tais que∫ 1 0 ∣∣∣∣f(t)−∑ k∈F λke i2pikt ∣∣∣∣2dt < �2. Mas isto e´ consequ¨eˆncia do Teorema de Stone-Weierstraß (veja [14], pp. 261-264). Alternativamente, veja a bela demonstrac¸a˜o dada em [16], 4.24. 2 2.8 Exercı´cios 1. Seja X um espac¸o normado no qual vale a identidade do paralelogramo. Mostre que X e´ um espac¸o pre´-hilbertiano, a norma de X sendo proveniente do produto interno nesse espac¸o. 2. Seja `0 o conjunto de todas as sequ¨eˆncia infinitas de nu´meros complexos (z1, z2, . . . , zn, . . .) tais que zn = 0 exceto para um nu´mero finito de ı´ndices n. Mostre que `0 e´ um subespac¸o pro´prio de `2. Ache uma base de Schauder para `0(C). 3. Seja X o espac¸o das func¸o˜es f : [a, b]→ C de classe C1. Defina, para f, g ∈ X , 〈f, g〉 := ∫ b a f ′(x)g′(x)dx. (a) 〈·, ·〉 e´ um produto interno? (b) Considere F = {f ∈ X : f(a) = 0}. Em F , 〈·, ·〉 e´ um produto interno? 4. Mostre que a norma em C0([a, b],C) na˜o e´ gerada por um produto interno. 5. Deˆ exemplo de um conjunto limitado e fechado, num espac¸o de Hilbert, que na˜o e´ compacto. Definic¸a˜o 2.8.1 Seja E um espac¸o pre´-hilbertiano. Uma sequ¨eˆncia (xn) em E converge fracamente para um vetor x ∈ E se, para todo funcional linear contı´nuo f : H → K, temos f(xn) → f(x). Denotamos enta˜o xn ⇀ x. 6. Mostre que xn ⇀ x implica que 〈xn, y〉 → 〈x, y〉 para todo y ∈ E. Se E e´ um espac¸o de Hilbert, vale a recı´proca. 7. Deˆ um exemplo mostrando que xn ⇀ x na˜o implica xn → x. 2.8. EXERCI´CIOS 35 8. Mostre que xn → x se, e somente se, xn ⇀ x e ‖xn‖ → ‖x‖. 9. Seja f : E → F e´ uma bijec¸a˜o linear entre os espac¸os pre´-hilbertianos E e F . Enta˜o f e´ um isomorfismo se, e somente se, e´ uma isometria, isto e´, ‖x‖1 = ‖f(x)‖2 para todo x ∈ E. 10. Mostreque todo espac¸o de Hilbert separa´vel (isto e´, ele possui um subconjunto enumera´vel denso) possui uma base de Schauder enumera´vel. 11. Mostre que se um espac¸o de Hilbert possui uma base de Schauder enumera´vel, enta˜o ele e´ se- para´vel. 12. Mostre que `2 = `2(N). Isto e´, a definic¸a˜o do espac¸o `2 coincide com a definic¸a˜o do espac¸o `2(A) quando A = N. 13. O Teorema de Representac¸a˜o de Riesz garante que, para todo funcional linear f ∈ H ′, existe um u´nico elemento xf tal que f(x) = 〈x, xf〉 para todo x ∈ H . Considere T : H ′ → H a aplicac¸a˜o que associada a cada f ∈ H ′ o elemento xf ∈ H . Mostre que T (f + g) = T (f) + T (g), T (αf) = αT (f), ‖Tf‖ = ‖f‖ e que T e´ sobre. 14. Mostre que todo subespac¸o de um espac¸o vetorial e´ convexo; que translac¸o˜es de conjuntos con- vexos sa˜o conjuntos convexos; que qualquer intersec¸a˜o de conjuntos convexos e´ um conjunto convexo (mesmo que vazio). Mostre tambe´m que, se p e´ uma semi-norma2 em E, enta˜o, para todo r ≥ 0, os conjuntos {x ∈ E : p(x) ≤ r} e {x ∈ E : p(x) < r} sa˜o convexos. 15. Seja F ⊂ E um subespac¸o completo do espac¸o pre´-hilbertiano E, com F 6= {0}. Como no Corola´rio 2.3.5 defina, para todo x ∈ E, piF (x) = xF . Mostre que pi : E → F e´ um operador linear tal que ‖piF‖ = 1, pi2F = piF e que x− piFx ∈ F⊥. Definindo piG = I − piF , mostre que piG tem as mesmas propriedades de piF . Esses operadores sa˜o as projec¸o˜es lineares nos subespac¸os F e G, respectivamente. 16. Lembramos que um conjunto X de um espac¸o vetorial V e´ linearmente dependente se existe um nu´mero finito de vetores e1, . . . , en ∈ X e escalares λ1, . . . , λn na˜o todos nulos, tais que λ1e1 + . . . + λnen = 0. Caso contra´rio, o conjunto X e´ linearmente independente. Mostre que se {eα}α∈A for uma famı´lia ortogonal, enta˜o ela e´ linearmente independente. 17. Considere o espac¸o de Banach X = R2 com ‖(x, y)‖ = max{|x|, |y|}. Mostre que X na˜o satisfaz a Proposic¸a˜o 2.2.4. 18. Considere o espac¸o de Hilbert H = L2([a, b]) e fixe t0 ∈ [a, b]. Defina F : H → K por F (f) = f(t0), para todo f ∈ H . Mostre que F e´ um funcional linear que na˜o e´ contı´nuo. 19. Seja F ⊂ H um subespac¸o fechado do espac¸o de HilbertH . Seja f : F → K um funcional linear contı´nuo. Mostre que existe um funcional linear f˜ : H → K que estende f , com ‖f˜‖ = ‖f‖. Esse resultado pode ser generalizado para espac¸os de Banach (chama-se Teorema de Hahn- Banach), mas a demonstrac¸a˜o enta˜o na˜o e´ trivial. 2Uma semi-norma e´ uma func¸a˜o na˜o-negativa p que satisfaz as propriedades (i) e (ii) da definic¸a˜o 1.1.5. 36 CAPI´TULO 2. ESPAC¸OS COM PRODUTO INTERNO 20. Deˆ uma demonstrac¸a˜o alternativa da igualdade supF⊂A ∑ α∈F |xα|2 = ∑ α∈A |xα|2 (veja a desi- gualdade de Bessel 2.4.7). Para isto, aplique o Lema 1.6.4 e enta˜o passe ao limite. 21. Seja H um espac¸o de Hilbert de dimensa˜o infinita. Mostre que uma base de Schauder em H nunca e´ uma base do espac¸o vetorial H . 22. Seja S = {en} um conjunto ortonormal num espac¸o de Hilbert e F o fecho do subespac¸o das combinac¸o˜es lineares (finitas) dos elementos de S. Mostre que todo x ∈ F e´ da forma x = ∑∞ n=1 cnen. 23. O cubo de Hilbert e´ o conjunto dos pontos x = (x1, . . . , xn, . . .) ∈ `2 tais que xi ≤ 1/i. Mostre que o cubo de Hilbert e´ um conjunto compacto. Capı´tulo 3 Operadores lineares compactos Seja B a bola unita´ria no espac¸o considerado. 3.1 Definic¸o˜es e propriedades ba´sicas Definic¸a˜o 3.1.1 Sejam X e Y espac¸os de Banach. Um operador linear T : X → Y e´ compacto1 se T (B) for compacto em Y . Seja K(X, Y ) o conjunto de operadores compactos. Decorre imediatamente da definic¸a˜o que K(X, Y ) ⊂ L(X,Y ). Teorema 3.1.2 Sejam X e Y espac¸os de Banach. As seguintes afirmac¸o˜es a respeito de T ∈ L(X,Y ) sa˜o equivalentes: (i) T e´ compacto; (ii) M ⊂ X e´ limitado ⇒ T (M) e´ compacto; (iii) Se (xk) for uma sequ¨eˆncia limitada emX enta˜o (Txk) possui uma subsequ¨eˆncia convergente em Y ; Demonstrac¸a˜o: (i) ⇒ (ii) Tome r > 0 tal que M ⊂ Br(0). A linearidade de T garante que T (B) e´ compacto se, e somente se, T (Br(0)) for compacto. Como T (M) ⊂ T (Br(0)) e´ fechado, temos que T (M) e´ compacto. (ii)⇒ (i) e´ o´bvio. (ii)⇔ (iii) Em espac¸os me´tricos, as noc¸o˜es de compacto e sequ¨encialmente compacto se identifi- cam. 2 Lema 3.1.3 Sejam X , Y e Z espac¸os de Banach. (i) Sejam T1 ∈ L(X, Y ) e T2 ∈ L(Y, Z). Se T1 ∈ K(X,Y ) ou T2 ∈ K(Y, Z), enta˜o T2T1 := T2 ◦ T1 ∈ K(X,Z). 1Operadores compactos tambe´m sa˜o chamados de completamente contı´nuos. Alguns livros, especialmente europeus, da˜o um outro significado para um operador compacto. 37 38 CAPI´TULO 3. OPERADORES LINEARES COMPACTOS (ii) K(X, Y ) e´ um subespac¸o fechado de L(X, Y ) e, portanto, um espac¸o de Banach. Demonstrac¸a˜o: (i) Seja (xn) uma sequ¨eˆncia limitada em X . Enta˜o (T1xn) e´ limitada em Y . Se T2 for compacto, existe enta˜o uma subsequ¨eˆncia (T2T1xnj) convergente. Se T1 for compacto, existe uma subsequ¨eˆncia (T1xnj) convergente, e como T2 e´ contı´nua, (T2T1xnj) converge. (ii) Suponhamos que Tn ∈ K(X, Y ) e ‖Tn − T‖ → 0 em L(X, Y ). Uma vez que L(X, Y ) e´ um espac¸o me´trico completo, para verificarmos que T ∈ K(X, Y ) basta mostrarmos que, dado � > 0, T (B) pode ser coberto por um nu´mero finito de bolas B�(yi) ⊂ Y . Fixe n tal que ‖Tn − T‖ < �/2. Como Tn(B) e´ relativamente compacto, Tn(B) ⊂ ⋃i0 i=1B�/2(yi). Mas enta˜o T (B) ⊂ ⋃i0 i=1B�(yi). 2 Observac¸a˜o 3.1.4 Notamos que a inversa de um operador linear compacto, caso exista, na˜o pode ser contı´nua, se estivermos em espac¸o de dimensa˜o infinita: a identidade seria enta˜o compacta! Veja o Corola´rio 1.3.10. Uma classe importante de operadores compactos e´ a dos operadores de dimensa˜o finita, isto e´, aqueles T ∈ L(X, Y ) tais que dim R(T ) < ∞, em que R(T ) denota a imagem do operador T . Se Y for um espac¸o de Hilbert, pode-se mostrar que todo operador T ∈ K(X, Y ) pode ser aproximado por operadores Tn de dimensa˜o finita2. O resultado e´ falso para espac¸os de Banach arbitra´rios. � 3.2 O operador adjunto Definic¸a˜o 3.2.1 Seja E um espac¸o pre´-hilbertiano e T : E → E um operador linear. Dizemos que um operador linear T ∗ : E → E e´ o adjunto de T se, para todos x, y ∈ E, temos 〈Tx, y〉 = 〈x, T ∗y〉. ´E imediato que o adjunto de T , quando existe, e´ u´nico. Nesse caso, T ∗∗ = (T ∗)∗ = T . Exemplo 3.2.2 Sejam E = Cn e (aij), i, j = 1, . . . , n, a matriz que representa o operador A : Cn → Cn com relac¸a˜o a` base canoˆnica. Assim, aij = 〈Aej, ei〉. Enta˜o o operador A∗ e´ a matriz adjunta de (aij). De fato, se denotamos B = (a∗ij) = (aji) a matriz adjunta de A, enta˜o 〈ei, Bej〉 = 〈Bej, ei〉 = a∗ij = aji = 〈Aei, ej〉. A unicidade de A∗ garante enta˜o que A∗ = (a∗ij). Proposic¸a˜o 3.2.3 Sejam E um espac¸o pre´-hilbertiano e T : E → E um operador limitado. Enta˜o ‖T‖ = sup ‖x‖=1 |〈Tx, x〉|. Demonstrac¸a˜o: Inicialmente, afirmamos que ‖T‖ = sup ‖x‖=1=‖y‖ |〈Tx, y〉|. 2Veja [3], p. 90. 3.2. O OPERADOR ADJUNTO 39 De fato, da desigualdade de Cauchy-Schwarz decorre |〈Tx, y〉| ≤ ‖Tx‖ ‖y‖ ≤ ‖T‖ ‖x‖ ‖y‖. Logo sup ‖x‖=1=‖y‖ |〈Tx, y〉| ≤ ‖T‖. Por outro, se ‖Tx‖ 6= 0, ‖T‖ = sup ‖x‖=1 ‖Tx‖ = sup ‖x‖=1 〈Tx, Tx/‖Tx‖〉 ≤ sup ‖x‖=1=‖y‖ |〈Tx, y〉|. Seja k := sup‖x‖=1 |〈Tx, x〉|. Como antes, |〈Tx, x〉| ≤ ‖Tx‖ ‖x‖ ≤ ‖T‖ ‖x‖2 e portanto k ≤ ‖T‖. Por outro lado, e´ imediato que Re 〈Tx, y〉 = 1 4 {〈T (x+ y), x+ y〉 − 〈T (x− y), x− y〉}. Decorre daı´, |Re 〈Tx, y〉| ≤ 1 4 {|〈T (x+ y), x+ y〉|+ |〈T (x− y), x− y〉|} ≤ 1 4 k(‖x+ y‖2 + ‖x− y‖2) = 1 2 k(‖x‖2 + ‖y‖2), pois |〈Tx, x〉| ≤ k‖x‖2. A igualdade final decorre da identidade do paralelogramo. Assim, para ‖y‖ = 1 = ‖x‖, temos |Re 〈Tx, y〉| ≤ k. Escolhendo y com ‖y‖ = 1 tal que 〈Tx, y〉 ∈ R, obtemos |〈Tx, y〉| ≤ k. Logo ‖T‖ = sup ‖x‖=1=‖y‖ |〈Tx, y〉| ≤ k. 2 Proposic¸a˜o 3.2.4 Sejam
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