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Aulas 9 e 10: limitações cognitivas 1 Limitações cognitivas e o comportamento dos agentes Bibliografia: Frank (1998), cap. 8 AULAS 9 e 10 Aulas 9 e 10: limitações cognitivas 2 1. Racionalidade limitada - I • Os agentes procuramos ser racionais. Todavia, nossas capacidades cognitivas limitadas podem impedir que consigamos agir dessa maneira. • Isto é o que na teoria econômica se conhece como racionalidade limitada. • Veja que além disso podemos ter outros problemas, como a falta das informações necessárias para tomar uma decisão, mas isso é outro problema. Aqui o que estamos discutindo é sobre as limitações para processar aquilo que já sabemos. • Dados esses limites, muitas vezes torna-se impossível ter um comportamento otimizador: as pessoas, nesses casos, adotamos um comportamento “satisfazedor” (satisficing). Aulas 9 e 10: limitações cognitivas 3 1. Racionalidade limitada - II • A incorporação dessas duas questões à teoria econômica foi obra de Herbert Simon. • Veja-se que essas críticas não são as únicas que dá para fazer ao modelo tradicional de racionalidade. • P.ex., nós podemos ter motivações não egoístas, ou podemos ter múltiplos objetivos, ou podemos enfrentar incerteza radical, ou podemos estar confusos sobre o que realmente desejamos, ou podemos agir movidos por paixões irracionais ou por instintos.isto não será o centro de nossas discussões. • A literatura que estuda como tomamos decisões com racionalidade limitada forma parte da área de “Economia Comportamental”. • Destacam-se aqui os nomes de Daniel Kahneman e Amos Tversky (K&T) como praticamente os fundadores deste campo de estudos. Aulas 9 e 10: limitações cognitivas 4 2. A função assimétrica do valor (FAV) - I • Para entender isto, temos que ver inicialmente a visão tradicional. • Ela diz que nós obtemos nossa utilidade levando em consideração os valores absolutos da renda. • Logo, se nós num certo dia ganhamos R$ 100, vamos estar tão satisfeitos como num outro dia em que ganhamos R$ 150 e perdemos R$ 50. • Todavia, segundo K&T, nós valoramos mais as perdas do que os ganhos:daqui sai a função assimétrica do valor (FAV). • Em lugar de falar de “utilidade”, K&T falam de “valor”, mas continua sendo uma escala subjetiva de prazer e desprazer. • A FAV é “mais inclinada” para perdas do que para ganhos. Aulas 9 e 10: limitações cognitivas 5 2. A função assimétrica do valor (FAV) - II • Esta abordagem também nos permite ver como ficam situações que combinam perdas e ganhos: a) Comparação de dois ganhos pequenos com um único ganho do mesmo valor. b) Comparação de duas perdas pequenas com uma única perda do mesmo valor. c) Comparação de uma perda pequena e um ganho grande com um único ganho do mesmo valor absoluto. d) Comparação de um ganho pequeno e uma perda grande com uma única perda do mesmo valor absoluto. • Obs.: Isto permite ver porque é razoável dar as noticias boas aos poucos, e as ruins todas de uma vez. Aulas 9 e 10: limitações cognitivas 6 3. Custos ocultos e FAV • Custos ocultos ou irrecuperáveis (sunk costs) correspondem a desembolsos já feitos. • A teoria diz que, dado que não podem ser recuperados, não deveriam afetar nossas decisões, mas há evidências de que as pessoas muitas vezes os levam em consideração. • Ex. das quadras de tênis. • Ex. do rodízio de pizza. • A FAV também permite interpretar estes fenômenos. • Ex. do corte de grama (ou de lavar o carro). • Isto decorre da diferença para a maioria dos agentes entre custos monetários (efetivos) e custos de oportunidade (potenciais), os quais seriam iguais para a teoria tradicional. Aulas 9 e 10: limitações cognitivas 7 4. Escolha sob risco e FAV - I • (muitos dos resultados abaixo correspondem a experiências feitas seguindo todos os padrões de amostragem, etc., aceitos na comunidade acadêmica; em outros lugares, os resultados podem ser diferentes; os valores em vermelho são os resultados experimentais). • Ex 1: escolha entre • A: um ganho certo de $240 (84%) • B: 25% de chances de ganhar $ 1000, 75% de ganhar 0%. (16%) • Este resultado faria supor que os agentes são avessos ao risco, mas: • Ex 2: escolha entre • C: uma perda certa de $750 (13%) • D: 75% de chances de perder $ 1000, 25% de perder 0%. (87%) • Aqui, os agentes agem como apreciadores de riscos. • A FAV permite entender essa mudança de atitude. Aulas 9 e 10: limitações cognitivas 8 4. Escolha sob risco e FAV - II • A teoria nos diz que se numa escolha (com ou sem risco) eu prefiro A a B (AⱣB), deduzindo uma parcela C de ambos lados não modificaria a escolha [(A-C) Ᵽ (B-C)], mas... • Ex 1: escolha entre: • A: $2500 com 33%, $2400 com 66%, $ 0 com 1% (VE: $ 2409) (18%) • B: $2400 com 100% (82%) • Ex 2: escolha entre • C: $2500 com 33%, $ 0 com 67% (VE: $ 825) (83%) • D: $2400 com 34%, $ 0 com 66% (17%) • Mas verifique-se que C e D são iguais a A e B, respectivamente, depois de tirar uma chance de 66% de ganhar $2400 em cada uma. Aulas 9 e 10: limitações cognitivas 9 5. Heurísticas - I • Muitas vezes, usamos regras simples para fazer inferências sobre um ambiente, elaborar previsões, etc. Essas regras, denominadas heurísticas, em geral dão resultados certos (caso contrário, não seriam empregadas), mas em algumas circunstâncias podem levar a enganos. • Vamos ver três heurísticas muito usadas: • A) Disponibilidade: há uma tendência a lembrar mais dos fatos mais recentes, mais marcantes, etc., mas isso nem sempre da certo. • Ex das mortes em Nova York. • Ex das palavras. • Ex. dos corretores de bolsa Aulas 9 e 10: limitações cognitivas 10 5. Heurísticas - II • B) Representatividade: muitas vezes precisamos saber qual é a chance de um agente apresentar determinada característica, mas não levamos em consideração a frequência relativa dessa característica na população global. • Ex: queremos saber se um indivíduo de mais de 2 metros é atleta profissional ou empregado no comércio. Há uma tendência a dizer que ele é atleta, mas imagine o seguinte caso, com números plausíveis: • A população é de 100 milhões, metade de sexo masculino; os atletas profissionais são 0,01% e no comércio trabalham 10%. • A percentagem de pessoas de mais de 2m na população em geral (e entre os comerciários) é de 0,1%; entre atletas profissionais, 20% têm mais de 2m. • Nesse caso, haveria 1000 atletas profissionais, e 5000 pessoas no comércio com mais de 2m. Logo, as chances de que um indivíduo específico de 2m ou mais seja comerciário são 5 vezes maiores que as de que seja atleta. Aulas 9 e 10: limitações cognitivas 11 5. Heurísticas - III • Esse erro com a representatividade origina o fenômeno conhecido como “reversão à média”. Um desempenho excepcional de alguém (p.ex., um esportista) muitas vezes é seguido por resultados piores. Isso é consequência de que o esportista não mudou sua capacidade, simplesmente teve um dia de sorte/inspiração. • C) Ancoragem e ajustamento: as pessoas tendem a fazer previsões em torno a um valor inicial (âncora) e depois ajustam em torno dele, mas esse valor inicial pode não ser representativo. • Ex dos países africanos (ou dos campeões no campeonato de futebol). • Outro ex: calcule em 5 segundos: • 3x4x5x6x7x8x9x10 (um grupo) e 10x9x8x7x6x5x4x3 (outro). Aulas 9 e 10: limitações cognitivas 12 6. As anomalias na percepção • A Lei de Weber-Fechner diz que as pessoas temos dificuldades em avaliar diferenças absolutas, apenas consideramos as relativas.• Ex: diferenças de 10W numa lâmpada de 15W e uma de 150W. • Isso se pode aplicar a algumas escolhas: • O agente deveria escolher comprar os dois produtos na mesma loja (seja qual for), mas muitas vezes isso não se verifica. Distância Perto Longe Produto Tablet R$ 1500 R$ 1450 Liquidificador R$ 100 R$ 50 Aulas 9 e 10: limitações cognitivas 13 7. Adição de alternativas irrelevantes • Muitas vezes temos que decidir em situações em que estamos indiferentes entre duas opções. A adição de uma alternativa dominada (i.e., pior do que as já existentes) não deveria modificar em nada nossa escolha, mas às vezes o faz. • Ex: queremos escolher um hotel para passar férias na praia. Há duas variáveis:número de dias que posso pagar e quantidade de estrelas. Temos duas alternativas que nos deixam indiferentes. • Hotel A: 6 dias, 5 estrelas. • Hotel B: 20 dias, 2 estrelas. • A adição às alternativas de um hotel C (5 dias, 4 estrelas) não deveria afetar a escolha (é dominado por A), mas há evidências de que ajuda a decidir (algo semelhante ocorreria com o hotel D, 15 dias e 1 estrela).
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