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Coleção de Direito Penal - Ney Moura - 09. Atipicidade

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ATIPICIDADE 
___________________________ 
 
9.1 ATIPICIDADE 
Se tipicidade é a relação de adequação perfeita, exata, total, entre o fato da vida e o 
tipo legal de crime, atipicidade é exatamente a falta, a ausência dessa relação de 
adequação completa, fiel, absoluta entre o fato e o tipo. 
Alguns doutrinadores mencionam uma atipicidade absoluta e outra específica. 
A atipicidade é absoluta quando o fato, à toda evidência, não for típico, como, por 
exemplo: o exercer o meretrício ou o praticar o incesto, uma vez que tais fatos não 
estão tipificados, descritos, em nenhuma lei penal. Não são fatos proibidos por 
nenhuma norma penal incriminadora. Então, o exercício da prostituição não é fato 
típico e essa atipicidade é absoluta. 
Se, porventura, o sujeito corrompe uma pessoa de 19 anos, e pratica com ela um 
ato de libidinagem, tal fato é atípico porque o tipo do art. 218 do Código Penal é claro: 
“Corromper ou facilitar a corrupção de pessoa maior de 14 (catorze) e menor de 18 
(dezoito) anos, com ela praticando ato de libidinagem, ou induzindo-a a praticá-lo ou 
presenciá-lo.” 
Para que o fato concreto fosse típico, era indispensável que a pessoa corrompida 
tivesse menos de 18 e mais de 14 anos. Conquanto tenha mais, faltou esse elemento 
objetivo, a idade do sujeito passivo. Essa tipicidade é a específica. 
Ora, a atipicidade, absoluta ou específica, é uma só, e consiste na ausência de 
correspondência, na falta do ajustamento, da adequação entre o fato natural e o modelo 
de conduta proibida: o tipo legal de crime. 
Atípico o fato concreto, não há crime, não interessa ao Direito Penal. 
Em algumas hipóteses, a atipicidade do fato decorre da incidência de princípios 
gerais de direito. 
2 – Direito Penal – Ney Moura Teles 
 
São o Princípio da Adequação Social e o Princípio da Insignificância. O Erro de 
Tipo é outra situação em que, por faltar consciência do fato e vontade de realizá-lo, a 
tipicidade altera-se ou não existe. 
 
9.2 PRINCÍPIO DA ADEQUAÇÃO SOCIAL 
Certos fatos naturais, aparentemente, ajustam-se a tipos legais de crime. Ana 
furou a orelha de sua filha, para nela colocar um brinco. Maria, cabeleireira, cortou os 
cabelos de Sandra, sua cliente. Joana, manicura, aparou as unhas de Alfredo, seu 
freguês. Todos esses fatos, aparentemente, formalmente, ajustam-se ao tipo do art. 129 
do Código Penal: “ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem”. 
Esses outros igualmente se ajustam ao mesmo tipo de lesão corporal: Sérgio, 
médico, fez uma incisão no abdome de Arnaldo, a fim de extrair um projétil de arma de 
fogo. Adilson Maguila Rodrigues, no ringue, desferiu violento golpe com seus punhos 
cerrados, contra o rosto de Evander Holyfield, causando-lhe lesão no supercílio 
esquerdo. Jorge aplicou um tapa nas nádegas de Jorge Jr., seu filho, punindo-o por um 
comportamento indevido. 
Durante a guerra, o soldado da nação A matou o soldado da nação B. Esse fato 
formalmente se ajusta a algum dos tipos de homicídio. 
Todas essas situações, do ponto de vista externo, formal, ajustam-se a tipos legais 
de crime; todavia, à toda evidência, não podem constituir nenhum ilícito penal. 
Antigamente, os doutrinadores consideravam que, em sua quase totalidade, tais 
fatos eram típicos, mas seriam lícitos, justificados por uma norma penal permissiva, 
daquelas que permitem a prática do fato. Assim, o pai corrigindo o filho, o médico 
fazendo a intervenção cirúrgica, a cabeleireira, a manicure e o boxeador estariam 
cometendo fatos no exercício regular de direito. O soldado, na guerra, estaria 
cumprindo estritamente um dever legal. 
Os fatos seriam típicos, segundo a doutrina tradicional, mas, justificados. 
Se tais fatos fossem típicos, seria necessário que as autoridades policiais, deles 
tomando conhecimento, instaurassem inquéritos policiais, destinados à apuração de 
sua materialidade e da autoria, remetendo-os ao Poder Judiciário. Sim, porque a lei 
processual penal manda que o delegado de polícia, sempre que tiver notícia da prática 
de uma infração penal – vale dizer, um fato definido como crime ou contravenção 
penal, um fato típico –, deve adotar uma série de providências, inclusive instaurar o 
competente procedimento. E o proíbe de arquivar o inquérito policial. 
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Dessa forma, a autoridade policial teria que trabalhar na apuração daqueles 
fatos, remeter os inquéritos ao juiz, que os mandaria ao promotor que, verificando 
então terem sido praticados ao amparo de uma norma permissiva, pediria ao juiz o 
arquivamento do inquérito. Haveria, assim, enorme, desnecessária, abusiva e absurda 
atividade policial. 
Não é, felizmente, verdade que tais fatos sejam típicos. Só na aparência eles o 
são, pois, naquelas situações, incide o Princípio da Adequação Social, construído para 
HANS WELZEL, cujo enunciado pode ser assim formulado: se o tipo delitivo é um 
modelo de conduta proibida, não é possível interpretá-lo em certas situações 
aparentes, como se estivessem também alcançando condutas socialmente aceitas e 
adequadas1. 
Não poderia ser diferente; o fato que é adequado e aceito socialmente não pode 
ser definido como crime, ainda que na aparência ajuste-se ao tipo. Até porque só incide 
a norma do tipo, quando houver lesão a bem jurídico, e, quando o fato é adequado e 
aceito, não há qualquer lesão. 
Por outro lado, não se pode esquecer que o fato deve ser praticado nos limites 
da aceitação e da adequação social. Se o pai, em vez de aplicar uma simples palmada no 
filho, agride-o com violência, com golpes, socos e pontapés, estará cometendo fato 
típico. O mesmo se diga do cirurgião que erra ao fazer a incisão, e do esportista que 
golpeia o adversário violando regras do esporte – batendo abaixo da linha da cintura, 
no boxe, ou após o final do round. 
O princípio não visa, nem poderia, à revogação de norma penal incriminadora, 
como alguns podem pensar, mas a excluir a tipicidade de fatos formalmente típicos e 
substancialmente adequados à vida em sociedade, por esta aceitos. 
 
9.3 PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA 
Paralelamente, outro princípio incide no mesmo sentido de excluir a tipicidade 
de certos fatos formalmente típicos, todavia com fundamento diverso do que inspirou o 
princípio da adequação social. 
Seu idealizador, CLAUS ROXIN, concebeu-o como complemento do princípio de 
HANS WELZEL, pois percebeu a insuficiência da adequação social para excluir outras 
espécies de lesões que, apesar de formalmente alcançadas pela norma do tipo, não 
interessariam, igualmente, ao Direito Penal. 
 
1 TOLEDO, Francisco de Assis. Princípios básicos de direito penal. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 1991. p. 131. 
 
4 – Direito Penal – Ney Moura Teles 
 
Aqui, cuida-se das lesões insignificantes, aquelas que ao Direito Penal, por sua 
natureza limitada, por seus objetivos tutelares, não interessa proibir, dada sua 
insignificante lesividade. 
A subtração de um pedaço de giz, pelo aluno ou pelo professor, que o leva para o 
filho brincar com ele, apesar de, formalmente, ajustar-se ao tipo de furto, do art. 155, 
não está alcançada pela proibição da norma contida na lei, porque “o Direito Penal, por 
sua natureza fragmentária, só vai até onde seja necessário para a proteção do bem 
jurídico. Não deve ocupar-se de bagatelas”2. 
Quando João diz para Antônio: “és um bobo”, tal comportamento não pode ser 
considerado uma injúria, como definida no art. 140 do Código Penal, pois que a honra 
de Antonio não pode ser atingida por uma “ofensa” tão irrelevante. Para que se 
configure o tipo de lesão corporal, não bastam simples contusões, das que não deixam 
vestígios exteriorizados,mas que resultam em apenas dores pequenas e momentâneas. 
Tais lesões são insignificantes. 
Nos tipos praticados exclusivamente contra o patrimônio, só haverá 
significância e, portanto, tipicidade, quando produzirem uma repercussão razoável no 
patrimônio da vítima, daí por que não se pode confundir insignificância com pequeno 
valor. 
A norma penal incriminadora – cuja razão de ser é a proteção dos bens jurídicos 
mais importantes das lesões mais graves – não poderia, por isso mesmo, alcançar 
lesões insignificantes, que, por sua dimensão, não só não são graves, como também não 
alcançam o mínimo da significação exigida para reclamar a intervenção da mais severa 
das sanções jurídicas. 
Chamar o Direito Penal a intervir em situações como as tais é o mesmo que 
pretender matar uma barata usando uma metralhadora. 
Para as lesões insignificantes, o titular do bem atingido pode valer-se dos outros 
ramos do direito para satisfazer a sua pretensão de reparar o dano causado. 
Não se deve confundir o princípio da insignificância, também denominado de 
princípio da bagatela, que exclui a tipicidade do fato formalmente típico, ajustado ao 
tipo, quando a lesão causada for insignificante, de escassa expressão, com a locução 
criminalidade de bagatela, ultimamente muito utilizada, que quer referir-se àquelas 
infrações penais de menor potencial ofensivo – locução constante da Constituição 
 
2 TOLEDO, Francisco de Assis. Op. cit. p. 133. 
 
 
 Atipicidade- 5 
 
Federal, no art. 98, I – e que foram recentemente definidas na Lei nº 9.099/95 como 
todas as contravenções penais e os crimes com pena máxima não superior a um ano. 
O princípio da bagatela exclui a tipicidade do fato, aplicando-se a todo e 
qualquer tipo legal de crime, ao passo que criminalidade de bagatela quer referir-se 
aos crimes de menor potencial ofensivo, crimes menos graves, crimes menores. 
Quando incide o princípio da bagatela, não há crime; na criminalidade de bagatela, o 
crime existe, todavia, o tratamento processual e penal é diverso, com a possibilidade da 
suspensão condicional do processo, transação com a vítima, reparação do dano, 
aplicação de pena não privativa de liberdade, e outros institutos de natureza 
processual. 
 
9.4 ERRO DE TIPO 
Procuram filósofos, cientistas sociais e juristas distinguir erro de ignorância. 
Erro seria a idéia falsa em lugar da verdadeira e ignorância, a falta de idéia sobre 
qualquer assunto. 
ALCIDES MUNHOZ NETTO ensina: 
“Ao direito, contudo, não interessam a ignorância e o erro em seu estado 
puro, como meras situações cognoscitivas, mas como estados intelectivos que 
se refletem na vontade da ação. Bem diverso é o erro do pensador, que 
permanece no campo da cogitatio, do erro do homem que age e traduz o seu 
defeito intelectivo na praxis. Pode-se falar nestas hipóteses de uma ignorância 
e de um erro ativo. Isto posto, erro e ignorância delineiam-se como uma 
inexata relação da consciência com a realidade objetiva. Em substância, um e 
outro constituem estados de desconformidade cognoscitiva. Não há, por isso 
mesmo, inconveniente em unificar, no terreno jurídico, os dois conceitos, dada 
a identidade das conseqüências que produzem: incidem sobre o processo 
formativo da vontade, viciando-lhe o elemento intelectivo, ao induzir o sujeito a 
querer coisa diversa da que teria querido, se houvesse conhecido a realidade.”3 
O erro, portanto, é uma falsa apreciação da realidade, próprio do ser humano e, 
conquanto esteja presente na vida de todos, não podia o Direito Penal ignorar sua 
existência, pelo que lhe dá um tratamento especial na teoria do crime. 
Muitas vezes, em sua vida, em seu dia-a-dia, o homem realiza certos 
 
 
3 A ignorância da antijuridicidade em matéria penal. Rio de Janeiro: Forense, 1978. p. 3. 
 
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comportamentos que violam a norma jurídica exatamente por ter apreciado a realidade 
de forma inexata, o que lhe vicia a consciência e, de conseqüência, a vontade. Nessas 
ocasiões, o homem age errando. 
Certa feita, durante uma caçada, ao final de uma tarde, quando o sol já se punha, 
Joaquim viu, a uns cem metros de distância, próximo de alguns arbustos, um vulto 
movendo-se e teve a certeza de que se tratava de um animal, e, de pronto, disparou sua 
arma de fogo contra o mesmo, acertando-lhe o corpo. Correndo para lá, deparou-se, 
surpreso, com o corpo morto de um homem. 
Evidente que Joaquim errou, pois apreciou mal a realidade, captando-a de modo 
diverso do que ela era. Viu um animal, onde havia um homem. De conseqüência, sua 
vontade formou-se com vício, pois acabou realizando algo que não faria, se não tivesse 
errado. Joaquim, sem querer, matou alguém. 
Seu erro incidiu sobre um dos elementos do tipo legal de homicídio: alguém. 
Queria matar um animal, mas matou um ser humano. Não era esse seu desejo, sua 
vontade. Joaquim não agiu dolosamente. Dolo é consciência do fato e a vontade de 
realizar o tipo legal de crime, ou, pelo menos, aceitar o resultado previsto. Ele nem 
tinha consciência de que, com sua conduta, causaria a morte de um homem – o 
resultado – nem, é lógico, tinha vontade de, com seu comportamento, produzir o 
resultado que causou – a morte de um homem. 
Sem consciência e sem vontade, não há dolo, isso já foi explicado. 
Se é assim, qual é o tratamento que o Direito Penal dispensa a situações como 
essa, em que o sujeito erra sobre elemento do tipo legal de crime? Exatamente este: “O 
erro sobre elemento constitutivo do tipo legal de crime exclui o dolo, mas permite a 
punição por crime culposo, se previsto em lei” (art. 20, CP). 
O erro de tipo é, portanto, o que incide sobre elemento do tipo legal de crime, 
podendo ser evitável ou inevitável, como se passa a demonstrar. 
 
9.4.1 Erro de tipo evitável 
O erro de tipo é evitável quando, nas circunstâncias em que o sujeito se 
encontrava, era-lhe possível evitá-lo, com a adoção das cautelas exigidas do homem 
comum, normalmente prudente. 
É só pensar no exemplo do caçador. Estando ele numa área povoada, onde era 
previsível a presença de pessoas transitando, deveria – ao avistar um vulto, a uns 100 
metros de distância, ao fim da tarde, quando a luz do sol já se ia, dificultando sua 
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visibilidade – certificar-se de que o que via era, efetivamente, um animal e não uma 
pessoa. O dever geral de cuidado objetivo impunha-lhe algumas atitudes concretas para 
alcançar um grau de certeza, aproximando-se mais do vulto, firmando melhor sua 
visão, procurando um ângulo onde a luminosidade lhe permitisse verificar detalhes do 
corpo do vulto, enfim, chegar ao máximo grau possível de certeza sobre ser o alvo um 
animal. 
Se o caçador não teve nenhum desses ou de outros cuidados, agiu com negligência 
e – apesar de não ter desejado alcançar aquele resultado, nem tê-lo aceito – poderia tê-
lo evitado, caso tivesse sido cauteloso. Se é óbvio que não agiu dolosamente, igualmente 
claro é que agiu culposamente. 
Por isso, o agente, laborando em erro evitável, responderá pelo tipo culposo, se 
previsto em lei. No caso do caçador, tendo matado a pessoa, sem dolo, mas 
culposamente, responderá pelo homicídio culposo do art. 121, § 3º do Código Penal, 
porque seu erro poderia ter sido evitado. 
Em algumas situações, o agente erra sobre um elemento do tipo, por negligência, o 
erro podia ter sido evitado, e, apesar disso, não responderá por infração penal. Na sala 
de aula, a aluna Maria subtrai para si o exemplar do Código Penal de Sílvia, pensando 
que é o de sua propriedade. São livros iguais, mesma capa, sem identificaçãoque os 
distinga. 
A subtração deveu-se a um erro sobre um dos elementos do tipo legal de furto, do 
art. 155: ser a coisa alheia. Tal erro poderia ter sido evitado, pois, numa sala de aula, 
onde dezenas de alunos possuem livros idênticos, é provável que, ao fim da aula, na 
pressa de irem todos para o trabalho ou para casa, um leve o livro do outro. Sendo 
provável, pode ser evitado tal erro. Trata-se de um erro de tipo evitável; todavia, Maria 
não será punida, porque não existe a previsão legal de punição do furto praticado 
culposamente. 
 
9.4.2 Erro de tipo inevitável 
O erro inevitável é aquele no qual, nas circunstâncias em que se encontrava o 
agente, qualquer pessoa normal também incorreria, mesmo utilizando todos os 
procedimentos recomendados pela cautela, mesmo com toda a atenção exigível ao 
comum dos homens. Na verdade, só há erro inevitável quando ausente a possibilidade 
de previsão do resultado. 
O mesmo caçador do exemplo anterior, estando agora, em outro lugar, num 
8 – Direito Penal – Ney Moura Teles 
 
clube de caça, numa área fechada por cercas eletrificadas, reservada apenas para sócios 
do clube, destinada exclusivamente a ele em determinado período, para o exercício de 
seu esporte preferido. Munido de sua arma, sabe que na área não existe ninguém mais 
a não ser ele e seus companheiros. 
Pois bem, estando todos juntos, avistam um vulto a distância, e, após certificar-se 
o caçador de que todos os caçadores presentes estão fora da linha de tiro, dispara e acerta 
uma pessoa que, inadvertidamente, ignorando todos os avisos, todas as normas, e 
conseguindo ludibriar toda a vigilância, conseguira penetrar no clube. 
Evidente que o caçador errou sobre um elemento do tipo legal de homicídio, e, 
nas circunstâncias mencionadas, esse é um erro invencível, inevitável, em que qualquer 
pessoa incorreria, pois que era impossível prever a invasão daquela área do clube pela 
vítima, não tendo o agente agido com negligência. 
Esse erro exclui o dolo e, também, a culpa. Não há tipicidade do fato. Não houve 
homicídio, mas uma fatalidade, um acidente, um caso fortuito. Nesse exemplo, não 
houve consciência, não houve vontade, não houve previsibilidade; logo, não houve nem 
dolo, nem culpa. Tal fato é atípico. 
Em conclusão, o erro de tipo evitável exclui o dolo, o inevitável exclui o dolo e a 
culpa, stricto sensu. 
 
9.4.3 Erro sobre a pessoa 
O erro que incide sobre a pessoa contra a qual se dirige a conduta do agente não 
lhe retira a consciência sobre o fato, tratando-se, pois, de um erro meramente 
acidental, que, por essa razão, não afeta o dolo. 
Nessa modalidade de erro, o sujeito queria voltar sua conduta contra João e, por 
falsa apreciação da realidade, atinge Antônio. O dolo é o mesmo, pois que, no tipo de 
homicídio, a proibição é de matar alguém, não importa se João, Antônio ou outra 
pessoa. No tipo de lesão corporal, a proibição é ofender a integridade corporal de 
outrem, qualquer que seja ele. 
Por isso, a norma do § 3º do art. 20, primeira parte, do Código Penal: 
“O erro quanto à pessoa contra a qual o crime é praticado não isenta de pena. Não se 
consideram, neste caso, as condições ou qualidades da vítima, senão as da pessoa 
contra quem o agente queria praticar o crime.” 
Assim, esse erro, além de não excluir a tipicidade do fato, ainda vai fazer com 
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que o agente responda pelo fato como se não tivesse errado. Se queria matar Pedro, seu 
pai, e acabou matando Mauro, um estranho, o agente vai responder como se tivesse 
matado, efetivamente, o próprio pai, com a agravante do art. 61, II, e. 
 
9.4.4 Erro na execução e resultado diverso do pretendido 
O erro na execução, aberratio ictus, e o resultado diverso do pretendido, 
aberratio criminis, de que tratam os arts. 73 e 74 do Código Penal, serão tratados no 
Capítulo 17, quando da abordagem do concurso de crimes. 
 
9.5 CONCLUSÃO 
A tipicidade do fato não pode ser uma simples aparência, mas deve ser 
completa, perfeita, fiel, acabada e exata. 
Conhecida a primeira nota característica do crime, a tipicidade – relação de 
adequação entre o fato concreto e o tipo legal de crime –, é preciso examinar se o fato 
se volta contra o ordenamento jurídico; analisar a segunda característica do crime, que 
é a ilicitude.

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