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Universidade Federal da Bahia Instituto de Ciência da Informação Graduação Arquivologia CARLOS EDUARDO SANTOS ARAGÃO O CONTRASTE ENTRE A TEORIA E A PRÁXIS: A VERDADEIRA FUNÇÃO EXERCIDA PELOS ARQUIVOS PÚBLICOS NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E NA SOCIEDADE Salvador 2008 CARLOS EDUARDO SANTOS ARAGÃO O CONTRASTE ENTRE A TEORIA E A PRÁXIS: A VERDADEIRA FUNÇÃO EXERCIDA PELOS ARQUIVOS PÚBLICOS NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E NA SOCIEDADE Monografia apresentada ao curso de graduação em Arquivologia, Instituto de Ciência da Informação, Universidade Federal da Bahia, como requisito parcial para obtenção do grau de bacharel em Arquivologia. Orientador: sob orientação da docente Marilene Lobo Abre Barbosa. Salvador 2008 A671 Aragão, Carlos Eduardo Santos O contraste entre a teoria e a práxis: a verdadeira função exercida pelos arquivos públicos na administração pública e na sociedade/ Carlos Eduardo Santos Aragão. – Salvador, 2008. 57 f. 30cm Orientadora: Profa. Marilene Lobo Abreu Barbosa Monografia (Graduação em Arquivologia) – Universidade Federal da Bahia, Instituto de Ciência da Informação. 1.Arquivos públicos. 2. Arquivos permanentes. 3. gestão documental. 4. gestão da informação e do conhecimento. 5. Memória organizacional. I Título. CDU 930.25 CDD 027 CARLOS EDUARDO SANTOS ARAGÃO O CONTRASTE ENTRE A TEORIA E A PRÁXIS: A VERDADEIRA FUNÇÃO EXERCIDA PELOS ARQUIVOS PÚBLICOS NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E NA SOCIEDADE Monografia apresentada ao curso de graduação em Arquivologia, Instituto de Ciência da Informação, Universidade Federal da Bahia. Aprovada em 1° de Julho de 2008. Banca Examinadora Marilene Lobo Abreu Barbosa – Orientadora________________________ Mestre Gilda Ieda Sento Sé de Carvalho__________________________________ Mestre Sergio Franklin Ribeiro da Silva__________________________________ Mestre A Meus pais e irmãs, por ter me ensinado a aprender. A minha namorada por me acompanhar nessa trajetória de aprendizado. AGRADECIMENTOS Primeiramente, agradeço a Deus, pela oportunidade de estar no mundo. Sem a fé em sua força e os seus ensinamentos, certamente eu teria desistido de meu caminho. Aos meus pais, Hamilton Cardoso Aragão e Maria Lêde Santos Aragão, que serei eternamente grato por propiciar excelentes condições para minha formação repleta de dedicação, amor e paciência. Leila e Leiliane minhas irmãs que amo demasiadamente, e sempre estiveram ao meu lado apoiando e incentivando nessa difícil e conturbada jornada. A minha querida Orientadora Marilene Lobo Abreu Barbosa pelos momentos incessantes de dedicação e presteza durante todo curso. Aos professores e funcionários do Instituto de Ciência da Informação da UFBA pela dedicação e compreensão. Aos meus Avós, tios e primos pelas palavras de carinho e conforto. Meus amigos de forma geral, que juntos vivemos momentos inesquecíveis e que ficarão guardados na memória para sempre. Meus colegas de trabalho que sempre compreenderam a difícil tarefa de conciliar meu horário de serviços com o estudo. Agradeço a dona Heloína, Verônica, Anderson, pelo apoio nessa caminhada. A minha querida Namorada Waleska que contribuiu significativamente para minha chegada triunfal, no qual durante a maior parte do percurso de minha vida acadêmica sempre esteve caminhando ao meu lado e me mostrando que poderia ir muito mais além do que eu imaginava. A todos que colaboraram direta ou indiretamente para a concretização deste sonho. Para vocês, ofereço esta página... Que os versos do dia-a-dia formem os mais belos poemas da poesia da vida... Muito obrigado a todos! Tão importante quanto a informação, é saber como acha - lá! confúcio RESUMO Esta pesquisa visa elucidar o contraste existente entre a teoria arquivística e a prática exercida. Durante o escopo deste material, identificamos a razão pelo qual, os arquivos públicos foram criados, relatando as reais necessidades do homem desde os primórdios até os dias de hoje, em registrar suas informações e armazená-las em locais de acesso restrito. Este material traz consigo, uma breve abordagem sobre as vertentes estratégicas da informação contidas nos arquivos públicos, bem como sua missão e evolução dentro da dinâmica social, através de uma reflexão sobre as políticas públicas arquivísticas existentes no período; identificando a descaracterização do valor gerencial e potencialmente estratégico das informações arquivísticas na fase permanente, replicando dessa forma para o público, uma imagem estereotipada dos arquivos públicos como apenas centros culturais. Este trabalho, procurou desvelar o papel exercido pelos arquivos públicos em sua atuação como órgão da engrenagem da administração pública, além descortinar o conceito e a missão de arquivo expressos na literatura, identificando as supostas ações e intervenções dos arquivos públicos, no sentido de mudar esta realidade diante da administração pública e da sociedade. Por fim, coletamos um estudo de caso, para verificar quais as estratégias usadas pelos Arquivos Públicos da cidade do Salvador, para mostrar sua real função na administração pública e na sociedade, a fim de apontar possíveis soluções, por meio de recursos de marketing, com qual possa modificar essa imagem. Palavras-chave: Arquivos Públicos Permanentes – Informação Estratégica. Visão estereotipada. ABSTRACT This research aims to clarify the contrast between the theory and practice archival exercised. During the scope of this material, identify the reason for which the public archives were created, reporting the real needs of man since the early days up to today, in registering their information and store them in places of restricted access. This material brings a short approach on the strategic aspects of the information contained in public files, and its mission and developments within the social dynamics, through a reflection on public policies arquivísticas existing in the period, identifying the adulteration of the value and management of potentially strategic information arquivísticas the permanent phase, thus replicating to the public, a stereotyped image of public archives and cultural centers only. This work, sought unveil the role played by public archives in its activities as a body of the gears of government, besides see the concept of mission and file expressed in literature, identifying the alleged actions and interventions of public archives in order to change this reality before the government and society. Finally, collect a case study, to see what the strategies used by the Public Archives of the city of Salvador, to show its real function in public administrationand in society in order to point out possible solutions, through resources, marketing, with which could alter that image. Keywords: Permanent Public Archives - Strategic Information. Vision stereotyped. LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS APB Arquivo Público da Bahia CONARQ Conselho Nacional de Arquivo DETRAN Departamento Estadual de Trânsito IPTU Imposto Predial e Territorial Urbano TCA Teatro Castro Alves SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO........................................................................................11 2 ARQUIVOS PÚBLICOS: Evolução e Definição..............................................................................18 2.1 EVOLUÇÃO............................................................................................18 2.2 DEFINIÇÃO............................................................................................19 3 A MISSÃO DOS ARQUIVOS PÚBLICOS COMO ÓRGÃO DE ESTADO E DIFUSOR DE INFORMAÇÃO PARA A SOCIEDADE .................................22 3.1 PARALELO ENTRE OS CONCEITOS PROMULGADOS PELA TEORIA E PELA LEGISLAÇÃO ARQUIVÍSTICA E A FUNÇÃO EXERCIDA PELOS ARQUIVOS PÚBLICOS NA PRÁTICA.....................................................22 4 POLÍTICAS PÚBLICAS.........................................................................29 5 OS ARQUIVOS PÚBLICOS COMO UMA FONTE DE INFORMAÇÃO ESTRATÉGICA PARA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA..................................32 6 ESTUDO DE CASO................................................................................36 6.1 ARQUIVO PÚBLICO MUNICIPAL DE SALVADOR................................36 6.2 ARQUIVO PÚBLICO DA BAHIA.............................................................40 7 UM PLANO DE MARKETING DIRECIONADO A MUDARA IMAGEM DOS ARQUIVO PÚBLICOS..............................................................................45 7.1 LINHAS MESTRAS DE UM PLANO DE MARKETING PARA OS ARQUIVOS PÚBLICOS.....................................................................................46 8 CONSIDERAÇÕES FINAIS....................................................................52 REFERÊNCIAS.......................................................................................55 INTRODUÇÃO A humanidade, desde os primórdios até os dias de hoje, sentiu a necessidade de registrar suas informações e o fez utilizando o suporte documental em voga no momento histórico em que vivia. Os arquivos, instituições sociais milenares, aparentemente pareciam predestinados a guardar estes registros, com o fim precípuo de narrar para a posteridade a odisséia da humanidade na Terra. No entanto, estudos e pesquisas modernos e contemporâneos revelam o caráter funcional destas instituições e seu atrelamento à gestão e à vida pública das cidades de origem, haja vista as noções de organicidade, identidade e autenticidade que os primeiros arquivos públicos detinham, a exemplo dos arquivos de Ebla e Ugarit, na Síria e de Mari, na Mesopotâmia, a constatação da aplicação destes princípios fazem compreender o papel destes acervos na administração das cidades referidas. Os arquivos não eram concebidos como meros depósitos ou reservas inertes de placas de argila. Eles constituíam já um complexo sistema de informação. Para além dos documentos, em si, havia uma estrutura organizacional, um critério seletivo de preservação e a disponibilização de um serviço determinado tanto pelo valor informativo das placas, como pelo rigor da sua integração sistêmica. (SILVA, 1998, p.48). Estes fatos evidenciam que os repositórios arquivísticos não tinham apenas a função contemplativa, eles tinham função ativa no gerenciamento das cidades antigas e também procuravam assegurar a legitimidade e a proteção dos direitos e interesses dos reis, sacerdotes, mercadores, consolidando e alargando seus poderes e suas influências através das futuras instituições que eles próprios criariam. A literatura arquivística é pródiga em concepções e aplicações que denotam a potencialidade estratégica das informações arquivísticas, ainda que estas informações estejam em arquivos permanentes, o que comprova, também, o conceito de que as informações não são naturalmente estratégicas, elas se tornam estratégicas, na medida em que demonstram sua aplicabilidade na resolução de uma questão, na explicação de um fato, no subsídio a uma decisão. 11 Por isso, o rei Hamurabi, da Babilônia, após conquistar a cidade de Mari, mandou inventariar todo o acervo de seu arquivo e levou como parte de seu acervo pessoal a correspondência internacional, “[...] para depois a usar como parte de seu próprio jogo diplomático”. (SILVA, 1998, p.48). Neste sentido, no Brasil, a Lei Federal nº. 8.159, de 8 de janeiro de 1991, é perfeita, ao promulgar que “é dever do poder público a gestão documental e a proteção especial a documentos de arquivos como instrumento de apoio à administração, à cultura, ao desenvolvimento científico e como elemento de apoio e pesquisa”. Bellotto (1996, p.54) pondera que, se o arquivo público, cujas funções precípuas são o recolhimento, o tratamento, a conservação, a difusão e o acesso à consulta de todos os documentos acumulados por determinada administração, estende, além disso, “suas potencialidades de ação em maior benefício da sociedade, está cumprindo, sem desvio e sem esmorecimento, seu real papel” . Paes enfatiza que os arquivos permanentes têm a função de manter sob sua custódia, conservar e possibilitar o acesso aos documentos não-correntes, mas que são úteis à administração pública e às organizações, à pesquisa histórica e a outras finalidades. Para ela, com o passar do tempo, vai diminuindo o uso administrativo, mas o documento guarda seu valor como potencial fonte de informação, se assim não o fosse ele deveria ser eliminado. A transferência e o recolhimento são feitos, pois, em razão da freqüência de uso e não do valor do documento. Assim, corrente, intermediário e permanente são gradações de freqüência de uso e seleção nessa oportunidade. (PAES, 2002, p.111). Corroborando este valor intrínseco do documento, em função de sua natureza informativa e de detenção do conhecimento, que guardam em si a possibilidade de um dia serem úteis, Barreto considera que os repositórios de informação têm a função de reunião, seleção, codificação, redução, classificação e armazenamento de informação, com o fim de organizar e controlar os estoques de 12 informação, para uso imediato ou futuro, tendo em vista o valor da informação como uma “estrutura significante” capaz de produzir conhecimento. Todas essas atividades orientam-se para a organização e controle de estoques de informação, para uso imediato ou futuro. Este repositório de informação representa um estoque potencial de conhecimento e é imprescindível para que este se realize no âmbito da transferência da informação. Contudo, por ser estático, não produz, por si só, qualquer conhecimento. As estruturas significantes armazenadas em bases de dados, bibliotecas, arquivos, museus possuem a competência para produzir conhecimento, mas que só se efetiva a partir de uma ação de comunicação mutuamente consentida entre a fonte (os estoques) e o receptor. Porém, a produção dos estoques de informação não possui um compromisso direto e final com a produção de conhecimento, que permite uma ação de desenvolvimentoem diferentes níveis. (BARRETO, 1995, p.2). Ainda na vertente do valor estratégico, que a informação pode ser alçada a qualquer tempo, Moresi ressalta que o valor da informação está relacionado com sua utilidade no processo decisório da organização; neste sentido, uma mesma informação pode ter valor estratégico para uma organização e ser considerada sem interesse para a outra, este valor está na razão direta do contexto organizacional e das contingências políticas, econômicas, sociais, sendo, também, a conjuntura de tempo e espaço decisiva para atribuir o valor à informação. [...] é possível admitir que a informação possua valor, é preciso definir parâmetros capazes de quantificá-lo, o que não é uma tarefa trivial. Uma das maneiras é realizada por meio dos juízos de valor, que, apesar de serem indefinidos, consideram que o valor varia de acordo com o tempo e a perspectiva. Podem, em certos casos, ser negativos, como acontece na sobrecarga de informação. (MORESI, 2000, p. 7). Há, no entanto, uma disparidade entre as assertivas enunciadas pela teoria arquivística e pela ciência da informação e o funcionamento efetivo dos arquivos públicos permanentes, diante da missão para a qual foram criados. Esta percepção do senso comum, oriunda da convivência, da interação com eles e da manifestação pública a respeito deles, é constatada por resultados de estudos e pesquisas a exemplo da afirmação de Ohira e Martinez (2002, p.4) “falta clareza a respeito do potencial informativo dos arquivos e de suas funções como apoio à administração”. 13 Já em 1964, Moreira afirmava que o Estado brasileiro usava erroneamente sua documentação administrativa, que, ao invés de “instrumento do Estado e da Administração”, os documentos eram usados como simples registros do passado. Pondera ainda que, na contemporaneidade, os arquivos permanentes tornaram-se: [...] instrumentos de real utilidade para os administradores no delineamento dos novos rumos da política administrativa. Os documentos deixam de constituir os resíduos das operações passadas para se tornar as ferramentas de trabalho da administração. (MOREIRA, 1964 apud BELLOTO, 2004). Esta linha de pensamento é reforçada pelo fato de os arquivos públicos estarem, quase sempre, vinculados às secretarias de cultura e de educação, desconhecendo o valor administrativo dos acervos arquivísticos e a função de repositório de informações produzidas pelo Estado, à disposição da sociedade, tornando transparente a administração pública e fazendo cumprir o dispositivo constitucional do livre acesso dos cidadãos às informações. Para Cortez, esta situação demonstra: [...] uma falta de conhecimento e definição de como e onde o cidadão tem acesso às informações produzidas pelo próprio Estado. Os arquivos são vistos muito mais com a função de apoio cultural do que como órgão básico da administração. (CORTEZ, 1996, p.81). O Conselho Nacional de Arquivos – CONARQ, em 1999, reuniu na cidade do Rio de Janeiro, representantes de diversas instituições arquivísticas públicas brasileiras, na Mesa-redonda Nacional de Arquivos, com fim de diagnosticar a situação dos arquivos públicos e privados brasileiros e traçar políticas públicas para estas instituições. Dentre os muitos problemas discutidos, mereceu destaque “a falta de visibilidade da importância dos arquivos, pelo cidadão, pelos governantes e pela sociedade” (CONARQ. CONSELHO NACIONAL DE ARQUIVOS). 14 1.1 PROBLEMATIZAÇÃO Pelo exposto, a administração pública brasileira compreende o arquivo como um aparato cultural, não como um aparelho do Estado, com potencialidade para contribuir com a tomada de decisão na administração pública. 1.2 HIPÓTESE Neste sentido, respaldados nos enunciados da teoria arquivística e da teoria da ciência da informação expressos por conceituados estudiosos da área, que estão citados neste texto, acima, pode-se afirmar que, ao desconsiderar o caráter gerencial e potencialmente estratégico das informações arquivísticas das fases, intermediária e permanente, a administração pública brasileira contemporânea demonstra ter uma visão estereotipada dos arquivos públicos, o que se reflete no tracejamento de políticas públicas dissociadas da verdadeira missão dos arquivos e que reforçam o conceito e a imagem estereotipada de arquivo púbico e permanente disseminados na sociedade. 1.3 PRESSUPOSTOS Neste contexto, cabe também questionar o que têm feito os arquivos para mostrar sua verdadeira função como instrumento operativo a serviço da administração pública e da sociedade. Quanto à administração pública, reitera-se a idéia de que ela enxerga os arquivos públicos apenas como aparatos culturais, desvirtuando a função precípua do arquivo de apoiar a administração pública na tomada de decisão, ressignificando o valor estratégico da informação, cada vez que ela é aplicada. Esta visão é replicada para o público e ajuda a cristalizar a imagem do arquivo apenas como aparato cultural no seio da sociedade, dando sentido à noção de arquivo que emana da sociedade, como um depósito de papel velho e 15 sem utilidade prática, uma instituição para servir à intelectualidade e não à cidadania, conforme apregoa Antunes Silva: [...] faz-se necessário o planejamento e o desenvolvimento de campanha de marketing, em mídia impressa, falada e televisada, sobre a importância dos arquivos para a cidadania e para a identidade nacional. Tendo em vista o exposto, e amparados nos conceitos de marketing e de suas ferramentas, adota-se como pressuposto que um programa intensivo de marketing pode contribuir para mudar a imagem que a administração pública e a sociedade têm dos arquivos públicos. 1.4 OBJETIVO: Este estudo objetiva, em primeiro lugar, averiguar a veracidade das afirmativas acima citadas nos arquivos públicos da cidade de Salvador-Bahia e, em segundo plano, verificar quais as estratégias usadas pelos arquivos para mostrar sua real função na administração pública e na sociedade e, por fim, apontar caminhos, por meio de recursos de marketing, que possam modificar essa imagem. Os objetivos específicos dessa pesquisa procuram a) desvelar o papel exercido pelos arquivos públicos em sua atuação como órgão da engrenagem da administração pública; b) descortinar o conceito e a missão de arquivo expressos na literatura; c) identificar as supostas ações e intervenções dos arquivos públicos, no sentido de mudar esta realidade diante da administração pública e da sociedade; d) apontar estratégias que caminhem na direção de uma mudança de mentalidade do governo e da sociedade em relação ao arquivo público. 1.5 METODOLOGIA 1.5.1 Método A pesquisa utiliza o método científico hipotético-dedutivo, tendo em vista que se apodera dos postulados da teoria arquivística e da ciência da informação para construir as variáveis da hipótese. Deste modo, conjeturou-se que o governo 16 brasileiro e a sociedade têm uma visão estereotipada dos arquivos públicos brasileiros, tomando como referencial, para esta afirmativa, os conceitos expressos por teóricos da Arquivologia e da Ciência da Informação; por outro lado comparou-se este referencial teórico com a patente percepção do senso comum sobre a missão do arquivo e seu papel na sociedade, ou seja, comparou-se o consenso reinante na comunidade a respeito do papel do arquivo com as afirmações expressas pela literatura. 1.5.2 Instrumentos Metodológicos Num segundo passo, buscando submeter ao crivo do método científico o conhecimento empírico que se tem sobre o real uso dos arquivos públicos na cidadede Salvador-Bahia, construíram-se dois estudos de caso: Um com o Arquivo Público da Bahia; e o outro com o Arquivo Municipal do Salvador. Os dados do referencial empírico serão levantados por meio da técnica da entrevista orientada, a qual foi enriquecida com uma pergunta usando a técnica de incidente crítico, a fim de realçar algum incidente que marcou as lembranças do entrevistado e por isso ajuda-o a lembrar os fatos ocorridos. Por fim, apurados os dados eles serão confrontados com o referencial teórico, e inferidas as conclusões e dadas às sugestões para o redirecionamento dos arquivos públicos em busca de sua verdadeira identidade e missão. 17 2 ARQUIVOS PÚBLICOS: evolução e definição Para conceituar Arquivo Público, deve-se fazer uma breve retrospectiva sobre sua evolução. Os arquivos surgiram com a missão de assegurar os direitos e privilégios das autoridades constituídas nos diversos momentos históricos; contudo, o verdadeiro conceito de arquivo público, com a missão de servir ao Poder Público, mas também à sociedade, só se consolida com a promulgação da Assembléia Nacional Constituinte Francesa, em 9 de julho de 1989, e a afirmação dos ideais da Revolução Francesa. 2.1 Evolução A humanidade, desde os primórdios até os dias de hoje, sentiu a necessidade de registrar suas informações independentemente do material utilizado como suporte, assegurando dessa forma a legitimidade e a proteção dos direitos e interesses dos mercadores, sacerdotes e reis, consolidando e alargando seus poderes e suas influências através das futuras instituições que eles próprios criariam. Acredita-se que esses acervos referiam-se a tratados, contratos, atos notariais, testamentos, promissórias, recibos e sentenças de tribunais. [...] os primeiros arquivos reúnem já ingredientes que vieram a tornar-se clássicos e hoje são ainda defendidos pela disciplina (Arquivística). A mais importante das revelações tem a ver com o respeito pelos aspectos orgânicos da estrutura arquivística, como se comprovou em Ebla (Síria). Mas havia também grandes cuidados com a identidade e a autenticidade dos próprios documentos. As placas sumérias evidenciam também, desde cedo, uma estrutura diplomática coerente e eficaz, a qual, em grande medida, servirá de modelo às chancelarias européias da época medieval e moderna. A correspondência e os contratos administrativos incluem, conforme os casos, a identificação das partes, o nome das testemunhas ou do escriba, a menção da data e, até, a estampagem dos selos de validação. A tipologia documental era muito variada, estando já então, definida as principais categorias que integram os arquivos de épocas mais recentes: cartas régias, tratados internacionais, atas, missivas, contratos, assentos contábeis, censos e etc. Nem mesmo estão ausentes os documentos cartográficos, como, por exemplo, a placa legendada em caracteres cuneiformes, do século XIII a.C.; com a representação da cidade de Nínive ou o papiro egípcio com a planta topográfica das minas de ouro de Gebel. (SILVA, 1999, p.46). 18 Com o desenvolvimento cientifico do homem, diversas mudanças foram ocorrendo na transição do suporte de registro informacional, passando-se do papiro para o pergaminho e posteriormente para o papel. Segundo PAES: “Paralelamente à evolução da escrita, o homem aperfeiçoou também o material sobre o qual gravava seus sinais convencionais, alterando, como conseqüência, lenta e progressivamente, o aspecto dos documentos, bem diferentes da forma pela qual hoje os conhecemos”. (PAES, 2002, p.15). Ao decorrer do tempo e com a emergência do governo constitucional, que tem como base fundamental a soberania dos cidadãos, os arquivos públicos passaram a assegurar os interesses de seu novo soberano: o povo, conforme corrobora a citação abaixo: [...] eles representam as fontes de informação mais seguras e mais completas relativas às instituições e ao seu papel na sociedade. Os arquivos das administrações públicas testemunham a experiência colectiva e muitas vezes a memória colectiva da comunidade nacional, constituindo assim uma componente fundamental da herança cultural. (COUTURE; ROUSSEAU, 1998 p.16-17). No entanto, a história dos arquivos públicos pode ser abordada sobre diversos aspectos, tendo eles sempre se constituindo como instrumento de base fundamental da administração, com a finalidade de testemunhar, decidir e proceder em virtude de seu caráter oficial e jurídico, as questões relativas aos aspectos sociais, históricos e culturais em diversas civilizações. 2.2 Definições Há dúvidas quanto à origem da palavra arquivo; alguns teóricos afirmam que a terminologia arquivo público é uma evolução da palavra grega archeion que significava o local de guarda e o depósito dos documentos públicos. Outros consideram que o termo é proveniente de archivum, palavra de origem latina, que no sentido antigo identifica o local de guarda dos documentos. Quanto à noção de arquivo Público ou arquivo de Estado, estudiosos afirmam que surgiu entre os séculos XVI e XVII, no tempo de Carlos V, na Espanha, com o movimento de transferência do tesouro dos diplomas de Castela 19 para Simancas; posteriormente esse arquivo foi constituído como o principal núcleo de acervos do Estado de Castela. Conforme PAES: As definições antigas acentuavam o aspecto legal dos arquivos, como depósito de documentos e papéis de qualquer espécie, tendo sempre relação com os direitos das instituições ou indivíduos. Os documentos serviam apenas para estabelecer ou reivindicar direitos. (PAES, 2004, p.19). Rousseau e Couture definem arquivos públicos de forma mais ampla, agregando em seu conceito várias correntes de pensamento, como: [...] o conjunto das informações, qualquer que seja a sua data, natureza, ou suporte, organicamente (e automaticamente) reunidas por uma pessoa física ou jurídica, pública ou privada, para as próprias necessidades da sua existência e o exercício das funções, conservadas inicialmente pelo valor primário, ou seja, administrativo, legal, financeiro ou probatório, conservadas depois pelo secundário, isto é, de testemunho ou, mais simplesmente, de informação geral. (ROUSSEAU e COUTURE, 1998, p.284). No entanto, os arquivos públicos, como instituição, só adquiriram forma no final do século XVIII na França, através da Assembléia Nacional Constituinte, quando, em 1789, foi aprovada a criação do Arquivo Nacional Francês, que tinha como preceito garantir a conservação dos registros dos processos de formação de um novo Estado. No Brasil, os arquivos públicos surgiram durante o regime imperial brasileiro, com a criação do Arquivo Nacional, em 1838. Contudo, o incentivo para a criação de arquivos públicos nas diversas províncias ocorreu apenas após a proclamação da República. A legislação arquivística brasileira, cuja expressão máxima é a lei 8.159 de 1991, entende como arquivos: [...] os conjuntos de documentos produzidos e recebidos por órgãos públicos, instituição de caráter público e entidades privadas, em decorrência do exercício de atividades específicas, bem como por pessoa física, qualquer que seja o suporte da informação ou da natureza dos documentos. (BRASIL, Lei 8.159, 1991). A partir de reflexões dos autores sobre o conceito de arquivos públicos, neste estudo, define-se arquivos públicos como o conjunto de documentos produzidos e recebidos por instituições públicas da esfera federal, estadual, municipal e do distrito federal em decorrência de suas funções executiva, legislativa e judiciária. Consideram-se também como documentos públicos os 20 arquivos produzidose recebidos por instituições de caráter público, como as entidades privadas encarregadas da gestão de serviços públicos no exercício de suas atividades, o qual implica o recolhimento de sua documentação à instituição arquivística pública ou a sua transferência à instituição sucessora. Na atualidade brasileira, os arquivos públicos obedecem a seu ciclo vital, distinguido através de seus valores primários e secundários como arquivos correntes, intermediários e permanentes, sendo considerado os de caráter histórico inalienável e imprescritível. Arquivo, como instituição de guarda de documentos, tem suas atribuições preconizadas em lei, que também assegura ao cidadão o direito de acesso à informação; neste sentido, a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, legisla em seu artigo 216: "cabem à administração pública, a gestão da documentação governamental e a consulta a quantos dela necessitem”. 20 21 3 A MISSÃO DOS ARQUIVOS PÚBLICOS COMO ÓRGÃO DE ESTADO E DIFUSOR DE INFORMAÇÃO PARA A SOCIEDADE A missão de um arquivo público depende significativamente do contexto social e político do Estado. Hierarquicamente, os arquivos públicos aqui, no Brasil, estão diretamente relacionados com as políticas arquivísticas estabelecidas por sua entidade máxima: CONARQ. Nesse sentido Matar afirma: O objetivo parece ser o de socializar o serviço de pesquisa histórica, hoje uma unidade restrita à demanda interna, na medida em que deveria atender aos pedidos de informação da imprensa, do público e dos Poderes da União. (MATAR, 2003, p.20). A missão precípua dos arquivos públicos brasileiros, hoje, é: a) O recolhimento dos documentos produzidos e recebidos pelas instituições da administração pública em sua esfera federal, estadual e municipal; b) O tratamento documental deste acervo, mediante aplicação de modernas técnicas de gestão da informação, inclusive aplicando soluções informatizadas; c) A disponibilização e a facilitação ao acesso aos documentos permanentes; d) Acompanhar, divulgar e implementar políticas de arquivos de âmbito nacional e estadual. Nesse sentido, cabe ao Poder Público estabelecer procedimentos para que a legislação arquivística, bem como as políticas de arquivos existentes no país, cumpram sua finalidade a partir dos conceitos e regulamentos estabelecidos para os arquivos públicos. 3.1 Paralelo entre os Conceitos Promulgados pela Teoria e pela Legislação Arquivística e a Função Exercida pelos Arquivos Públicos na Prática A História evidencia que os arquivos surgiram pelo desejo ou necessidade que os homens sentiram de registrar suas ações. Não obstante, e com o decorrer do tempo, surge nas antigas civilizações a necessidades de guardar os acervos de 22 interesses dos soberanos da época. Nos templos eram armazenados apenas os documentos de interesse público, como os tratados, leis, minutas de assembléias populares dentre outros documentos oficiais, conforme ratifica a citação abaixo: A missão de fornecer informações a partir de dados existentes, em qualquer suporte e em qualquer meio, é função dos profissionais das chamadas ciências documentais. Dentre essas ciências esta inserida a arquivologia, que prepara profissionais para atuar em arquivos cuja responsabilidade consiste em desempenhar um papel no processo social, cultural, histórico e administrativo de um país. (PAES, 2004, p.89). Pode-se asseverar, avaliando o contexto histórico, que os arquivos públicos, na Antiguidade, tinham a função de apoiar e servir de suporte informacional, às classes dominantes, sendo a documentação guardada em locais de acesso restrito, porém, tinham uma conformidade com a gestão pública, sendo considerado como um espelho das ações governamentais. Dessa forma, percebe-se que os arquivos públicos nasceram com a finalidade de fazer duradouras as ações realizadas pelo Poder Público, pela Igreja e pela iniciativa privada, ao mesmo tempo em que serviram como fonte de estudo para as gerações futuras. É com os princípios iluministas, expandidos a partir da Revolução Francesa, de liberdade, igualdade e fraternidade, que os arquivos públicos alcançam sua real missão de difusor de conhecimento para a população. São estes princípios que vão nortear a formação de uma mentalidade democrática e de direito de cidadania, que vão fortalecer o papel do arquivo público na sociedade. No entanto, no Brasil, apesar de estar estatuída em lei a missão dos arquivos públicos, a práxis demonstra que há um descompasso entre o que se prega e o que se faz, na medida em que o Poder Público concebe o arquivo público apenas como arquivo histórico e não como arquivo permanente, ou seja, aquele que custodia uma documentação que tem valor permanente para a administração pública, pois estes documentos encerram informações 23 potencialmente úteis, para resolver questões administrativas e jurídicas, que estão relacionadas com fatos que aconteceram no passado. Fazendo uma analogia com a moderna visão de gestão do conhecimento nas organizações, o arquivo público é uma base de dados de conhecimento sobre o governo e sua administração e sua relação com a sociedade, ou seja, sua memória organizacional, instrumento que possibilita o retorno ou recuperação de qualquer informação agregada ao conjunto, a qualquer momento. A este conjunto de informações arroladas, Barreto (1995, p.1) chama de estruturas de informação, que, por sua vez, são armazenadas em agregados de informação. Para ele, “O destino final, o objetivo da informação e de seus agregados é promover o desenvolvimento do indivíduo, de seu grupo e da organização”. Neste sentido, o arquivo é um repositório de conhecimento sobre o Estado e de seu funcionamento em interação com a sociedade e suas estruturas sociais, o que torna evidente a missão dos arquivos públicos de ser a memória social do Estado, portanto uma fonte de conhecimento sobre ele, preservada e tratada, não, apenas, para ser evocada, mas também para ser revocada como conhecimento utilitário, capaz de criar “novos ativos de conhecimento” (MORESI, 2006, p. 291) sobre o próprio Estado e a sociedade a qual ele serve. Para explicitar mais clara e obviamente esta analogia pode-se lançar mão do conceito de Stein (1995 apud MORESI, 2006, p.289) de que “memória organizacional é memória coletiva”, e, nesta vertente de pensamento, os autores defendem que memória coletiva é conhecimento construído junto, como resultado de ação cotidiana e funcional, que se fez necessária e, às vezes, obrigatória, mediante uma conjunção de fatores e atividades do dia-a-dia. A memória coletiva refere-se aos processos sociais de articular e comunicar informação relativa às interpretações compartilhadas que são armazenadas como normas sociais e costumes. Desta formulação original surgiu a noção de memória de um sistema social específico, isto é, a memória de uma organização. (STEIN, 1995, apud MORESI, 2006, p.289). 24 Parafraseando Klemke (2000, apud MORESI, 2006, p.290), pode-se afirmar que os arquivos públicos, como a memória da organização Estado, deve reunir todo o conhecimento útil produzido por ele ao longo do tempo, para que, no momento oportuno e necessário, possa responder à demanda do próprio Estado e da sociedade, “facilitando a recuperação de conhecimento relevante sobre atividades cotidianas”. (MORESI, 2006, p.291). No entanto, o que fica patente, pelo menos no Brasil, é que os Poderes Públicos e a sociedade compreendem a memória organizacional como só passado, e como tal, é história e cultura, mas não percebem a interferênciada história na decisão de fatos presentes e futuros. E é esta a visão que hoje se tem da memória organizacional no contexto da gestão de conhecimento. Ou seja, reconhece-se que o documento é mantido porque a informação que ele registra é conhecimento latente sobre algum fato, que pode ser útil no futuro, para apoiar a tomada de decisão; portanto, é um fato passado decidindo o futuro. E, ao ser usada, esta informação demonstra que seu valor se mantém, o que foi reduzida foi a freqüência de uso, conforme vaticinou Paes (2002, p.111). E, ao ser decisiva, para resolver um problema e apoiar uma decisão, a informação demonstra não ser ultrapassada, ela mostra ter um valor estratégico para a vida da organização, e é este caráter estratégico que lhe concede o grau de informação de valor permanente. A despeito desta concepção utilitária do arquivo como fonte de conhecimento, na sociedade em geral, o termo arquivo ainda está associado à idéia de depósito de papéis velhos e sem utilidade prática, tanto que, muitas vezes, os cidadãos conceituam o acervo permanente como arquivo morto, confirmando esta visão de que, no arquivo permanente, as informações são desprovidas de valor e de utilidade, noção combatida por Jardim, conforme afirmação abaixo: [...] no campo arquivístico, a memória exerce uma centralidade que leva, com freqüência, a se identificar os arquivos como lugares de memória. A memória no espaço arquivístico só é atividade, porém se tais lugares de memória forem gerenciados também como lugares de informações, onde 25 esta não é apenas ordenada, mas também transferida. (Jardim, 1995, p.7). É da essência do arquivo público ser a memória da sociedade, porém, na visão contemporânea da gestão do conhecimento, a memória organizacional – e o arquivo público é a memória do Estado – é uma ferramenta de gestão que promove o compartilhamento e a reutilização do conhecimento acumulado Robert (1990, p.137) confirma este fato dizendo: [...] os arquivos constituem a memória de uma organização qualquer que seja a sociedade, uma coletividade, uma empresa ou uma instituição, com vistas a harmonizar seu funcionamento e gerar seu futuro. Eles existem porque há necessidade de uma memória registrada. (ROBERT, 1990, p.137). A teoria da gestão do conhecimento recomenda que, para cumprir seu verdadeiro papel, a memória organizacional deve estar atrelada aos processos e deliberações cotidianos da organização, diferentemente de como age o Estado que mantém o arquivo público, em geral, isolado do fluxo informacional do Estado. É assim que o Estado desvirtua a verdadeira missão do arquivo público e transfere esta imagem estereotipada para a sociedade. Conforme acentua Jardim: Ao não reconhecer sua própria memória, tampouco o Estado oferece-lhe condições de uso social. Também neste sentido, aprofundam-se as distâncias entre Estado e sociedade no Brasil. [...] o estado parece prescindir da memória - ao menos daquela que se expressa nos registros materiais da sua ação ao longo do tempo - como instância legitimadora. Até porque tenha constituído estratégias de legitimação pelo esquecimento, das quais os arquivos públicos seriam uma das expressões mais evidentes. Como tal, os arquivos públicos encontram-se também deslegitimados no aparelho do Estado e na sociedade em geral. (JARDIM, 1995, p.10). Na sociedade contemporânea, as ações produtivas são intensivas em conhecimento, não se pode, portanto, desprezar o rico manancial de informações armazenadas nos arquivos públicos. É preciso romper com esta visão ultrapassada e dar aos arquivos públicos o verdadeiro destino de memória organizacional social do Estado, ou seja, fazer dele um celeiro de conhecimento, que pode ser usado para resolver questões administrativas. Para tanto, faz-se necessário o redesenho desta organização na estrutura do Estado, o 26 redimensionamento de suas funções, o traçado de políticas públicas que alavanquem o Arquivo e o enquadre dentro das funções típicas de Estado, ou seja, como órgão essencial ao seu funcionamento e não como órgão acessório, como é a práxis na atual organização do Estado brasileiro. Por fim, é preciso instrumentalizar os arquivos públicos, implantar uma infra-estrutura física, de equipamentos e de logística, que o leve a poder exercer o papel destinado. Enfim é preciso ver e tratar os arquivos públicos como uma base de conhecimento sobre o Estado, como eles verdadeiramente o são; e gerenciá-los de modo a tirar proveito, na administração do Estado, do conhecimento nele acumulado; este conhecimento pode ser aplicado, na tomada de decisão, na solução de problemas, como base legal e probatória, nos estudos e pesquisas da comunidade científica e na educação da população. Esta visão tem respaldo na linha de pensamento de Walsh e Ungson, que dizem que “Memória organizacional é a informação armazenada relativa à história de uma organização e que pode ser usada no processo decisório presente” (WALSH ; UNGSON, 1991 apud MORESI, 2006, p.289). Mas, para que os arquivos passem a ter esta funcionalidade é preciso mudar a mentalidade dos Poderes Públicos e da sociedade sobre eles e passar a geri-los segundo novos princípios da gestão do conhecimento, conforme Turban et al. conceitua: É o processo que acumula e cria conhecimento de modo eficiente, que gerencia uma base de conhecimentos organizacionais para armazenar o conhecimento e que facilita o compartilhamento desse conhecimento para permitir a sua aplicação eficaz em toda a organização (TURBAN, 2003 apud MORESI, 2006, p.284). É preciso também investir na mudança de mentalidade da população em relação ao papel do arquivo público perante ela; o arquivo público é um órgão que emana de funções que o Estado presta ao povo, ou seja, de ações promotoras de cidadania, portanto, sua ação final também tem de se voltar para o povo; não é correto que sua atividade-fim se torne elitista e se volte apenas para o público intelectualizado. Neste sentido, é preciso sensibilizar a população, apresentando- 27 lhe os serviços que o arquivo público pode e deve prestar para ela. Faz-se necessário que os arquivos públicos projetem e promovam um trabalho educativo permanente, com a população, fazendo-a perceber o que o arquivo pode fazer por ela. Portanto, devem ser promulgadas políticas públicas voltadas para o desenvolvimento de programas sociais consoante com a missão do arquivo. 28 4 POLÍTICAS PÚBLICAS A deficiência das Políticas Públicas do Estado brasileiro no âmbito dos Arquivos Públicos vem contribuindo significativamente para a situação precária em que essas instituições se encontram na sociedade. Atualmente, as políticas de arquivo no Brasil preconizam exclusivamente as atividades de recolhimento e guarda dos documentos. Esta restrição de função desvirtua o valor significativo dessa instituição para a concretização das ações do Estado, mediante o fornecimento de informações estratégicas de extrema importância para a administração e para a tomada de decisão no âmbito da administração pública. As políticas públicas restritivas, também refletem em uma infra-estrutura deficiente e inadequada, tais como, a precariedade dos ambientes, dos materiais e dos suportes tecnológicos; um outro entrave nessa problemática é a falta de investimento na qualificação dos funcionários desse setor na área de Arquivologia. As políticas arquivísticas brasileiras deveriam priorizar o gerenciamento das informações da administração pública, focando as atividades destinadas à execução das tarefas consideradas de interesse público, as quais,geralmente, estão relacionadas com as ações governamentais de caráter decisório, auxiliando de imediato o exercício do governo no cumprimento dos procedimentos públicos definidos por lei. Conforme Jardim: A expectativa em relação à atuação do Arquivo Nacional, como centro articulador das questões arquivísticas do país, via sistema ou não, encontra-se, sobretudo, em relatos que criticam o seu isolamento ou reclamam uma atuação mais agressiva por parte da instituição. (JARDIM, 1995, p. 113). Por outro lado a ausência de políticas públicas na área arquivística parece corresponder à freqüência com que a noção de sistema nacional de arquivo tem norteado projetos nunca viabilizados no plano federal, estadual e municipal. Na citação abaixo, Jardim chama a atenção para este distanciamento das funções informativas dos arquivos públicos brasileiros das funções do Estado: [...] a monumentalização dos documentos e a negligência de seus aspectos informacionais têm norteado, com exceções produzidas a partir dos anos 80, a maioria das nossas instituições arquivísticas públicas. 29 suas relações com o conjunto da administração pública são pouco freqüentes. isto se dá não apenas nas funções de apoio a pesquisa científica, mas também de apoio administrativo ao governo, durante o processo político-decisório. (JARDIM, 1995, p. 58). Mas a literatura arquivística é incisiva na afirmativa de que é atribuição do arquivo prover a administração pública de informações gerenciais correntes e retrospectivas ou permanentes, necessárias ao seu funcionamento efetivo e eficaz. Mas, por outro lado, compete ao Poder Público prover os arquivos públicos com a condição mínima necessária para que esta instituição cumpra eficientemente esta missão. Desconhecer a verdadeira função do arquivo público é levar à promulgação de políticas públicas que não surtem efeito no que tange à missão dos arquivos; e este ato inconseqüente produz um efeito em cascata, pois o aparelho do Estado não se beneficia das informações, portadoras de conhecimento, que os arquivos podem lhe proporcionar e, deste modo, pode vir a gastar mais para obter informações já existentes, ou talvez jamais consiga obter a informação verdadeira e mais apropriada, aquela que lhe asseguraria vantagem competitiva em alguma circunstância. Segundo Moresi (2006, p.291) o uso correto ou incorreto da memória organizacional pode garantir “níveis altos ou baixos de efetividade organizacional”. E este uso não é esporádico, pelo contrário, as funções do arquivo público têm de estar atreladas às políticas e objetivos do Estado de modo que aquele (o arquivo) possa assessorar este (o Estado) nas atribuições que lhe são inerentes tais como: tomada de decisão, direção, controle, reestruturação, comunicação, planejamento, motivação e outras, na medida em que se configurem como atividades do Estado. Há ainda que se considerar a missão constitucional do arquivo público de dar acesso às informações de governo para a população e também prover a população com informações decorrentes da prestação de serviços típicas do Estado, que garantem direitos aos seus cidadãos. Assim sendo, cabe ao Estado respeitar a legislação arquivística, implantar a infra-estrutura necessária para seu cumprimento e contribuir para a promoção da divulgação ostensiva da missão do arquivo público. 30 As políticas públicas brasileiras voltadas aos arquivos públicos, no entanto, não proporcionam esta condição, não são categóricas na tentativa de aproximar o arquivo do Estado nem tão pouco da população. Pelo contrário, criam uma névoa em torno desta relação: arquivos públicos versus Estado versus população. Contrariando o pensamento apregoado por Moresi (2006, p.289) de que “um mecanismo de memória organizacional, que é imediatamente atrelado aos processos e deliberações cotidianos de uma organização, será mais importante e útil para aquela organização”. Pelo exposto até o momento, pode-se inferir que o desconhecimento da natureza do arquivo como memória estratégica de um sistema social, com potencialidade para fornecer informações decisivas leva o Estado a produzir políticas públicas arquivísticas anacrônicas. Fonseca (1996, p.105) pondera que até mesmo a denominação dos arquivos públicos, muitas vezes, como arquivos históricos, denota este alheamento do Poder Público, que se esquece “do arquivo como órgão de decisão, causando assim, prejuízos à eficiência e a eficácia, considerados deveres fundamentais da administração pública” . 31 5 OS ARQUIVOS PÚBLICOS COMO UMA FONTE DE INFORMAÇÃO ESTRATÉGICA PARA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA A história dos arquivos públicos pode ser abordada sob diferentes aspectos no decorrer de sua evolução. Na antiguidade, os arquivos públicos atuavam sempre como instrumento de base da administração pública, servindo ao governo informações de caráter probatório, político, administrativo - financeiro entre outros. Em virtude de sua oficialidade perante o Estado, os arquivos públicos atuavam como fonte de informação segura e completa nos mais diferentes assuntos de seu principal interessado: O soberano. Com a emergência do governo constitucional, dos avanços sociais e tecnológicos, pode-se considerar que esses eventos contribuíram significativamente para as transformações que os arquivos públicos sofreram durante sua evolução, no qual o objetivo de sua criação, durante esse período, resumia-se em apoiar e servir de suporte informacional às classes dominantes, sendo por muito tempo guardado em verdadeiros depósitos de acesso difícil e restrito. Em contrapartida as revoluções sociais forçaram o poder público a redefinir a missão dos arquivos públicos, mudanças que implicaram em conceitos da gestão documental e na criação de políticas arquivísticas de âmbito nacional e estadual. Conforme atesta a citação abaixo: É através da informação que novas conquistas são colocadas ao alcance dos governos, das instituições privadas, dos cientistas, pesquisadores e estudiosos servindo como ponto de partida da evolução da ciência e da cultura. (JARDIM, 1977, p.2). Hoje em dia, com a consciência social da importância que a informação tem para garantir a cidadania e promover o conhecimento e o desenvolvimento econômico, os arquivos públicos deveriam atuar como uma das principais fontes de informação para a tomada de decisão. Os documentos dão sentido a administração e asseguram a memória de um órgão privado ou público. A eles recorrem os administradores para obterem informações que auxiliarão nas tomadas de decisões, como subsídios ou como modelo, uma vez que fornecem informações esclarecedoras e úteis para o usuário. (JARDIM, 1977, p 12). 32 Diante disso, é necessário que os órgãos competentes no âmbito arquivístico revejam a missão para a qual os arquivos públicos foram criados, observando suas reais necessidades e transformando em efetividade sua potencialidade como órgão estratégico para a administração pública, capaz de auxiliar no desenvolvimento da gestão pública; Segundo Jardim: A vocação autoritária do Estado brasileiro tem sustentado a precária sobrevivência das diversas instituições públicas voltadas para o patrimônio documental. Como equipamento governamental, os arquivos públicos brasileiros subsistem como instituições voltadas quase que exclusivamente para a guarda de documentos considerados, na maior parte das vezes sem critérios científicos, como de valor histórico. (JARDIM, 1995, P58). Enfim, é preciso estabelecer políticas arquivísticas no Brasil tomando como base a realidade contemporânea e os novos modelos de gestão, que priorizam a produção,o processamento e a difusão do conhecimento, tendo como pressuposto que o conhecimento é o promotor da inovação de produtos e serviços e, conseqüentemente, do desenvolvimento econômico e social. O arquivo é, por natureza, um órgão gestor de conhecimento e sua missão precípua é auxiliar a administração pública, provendo informações para solucionar os problemas emergentes, mas também para assegurar uma rotina eficiente de prestação de serviços ao Estado e à sociedade. Para Jardim: [...] no Brasil, a precariedade organizacional dos arquivos públicos e o uso social como suas condições políticas, econômicas e sociais. Os arquivos públicos latino-americanos institucionalizaram-se como resultado de um processo de independência e formação dos Estados modernos na região. Sob os projetos emergentes de nação, estas instituições foram consideradas arquivos históricos e, portanto, repositórios de uma memória tida como forjada da identidade nacional. Isto implicou o desenvolvimento de arquivos públicos e serviços arquivísticos “periferizados” na administração pública, incapazes de fornecer informações suficientes para a pesquisa cientifica e tecnológica e à sociedade como um todo. (JARDIM 1993, p. 21). Esta foi sempre uma preocupação da classe e da teoria arquivística, fartamente debatida e questionada, mas que persiste até os dias contemporâneos, apesar de terem ocorrido mudanças culturais, seja por novos motivos filosóficos e conceituais ou pela inovação de processos, técnicas e tecnologias que proporcionaram o desenvolvimento social, econômico e cultural da sociedade, 33 mas que afetaram de modo tênue o modo de gerir os arquivos, pelo menos no Brasil. Pode-se afirmar que tudo tem a ver com o modo como o Estado e, por extensão, a população vê os arquivos públicos: como arquivos históricos; mas se assim o fosse estes arquivos seriam constituídos só de Fundos Fechados, conjunto de documentos que o Dicionário de Terminologia Arquivística (1996, p.8) assim conceitua: Fundo Fechado ,– ao qual não são acrescentados novos documentos, em virtude da supressão da unidade produtora. A idéia de que os arquivos públicos são a memória de um sistema organizacional, que é o Estado, não é inovadora e tem fundamento na própria Lei 8 519, de 1991, que estabelece a Política Nacional de Arquivo e determina que é dever do poder público a gestão documental e a proteção especial a documentos de arquivo, como instrumento de apoio à administração, à cultura e ao desenvolvimento científico e como elemento de prova e informação (Brasil, 1991). Por outro lado, o advento da noção de gestão de documentos na administração da massa documental foi além das mudanças nos processos arquivísticos, representou na verdade uma nova filosofia sobre os arquivos permanentes conforme atestam as afirmações abaixo: A partir do conceito de “gestão de documentos” que estabelece medidas e rotinas visando a racionalização e eficiência na criação, manutenção, uso e avaliação de documentos arquivísticos, modifica-se a tradição dos arquivos voltados exclusivamente para servir à pesquisa histórica, iniciando o processo de aproximação com a administração. A partir daí, Arquivos Públicos não mais se limitam a recolher, preservar e dar acesso aos documentos produzidos e acumulados pelo Estado, mas inserem-se profundamente, na execução de políticas públicas relacionadas com a gestão dos mesmos (OHIRA e MARTINEZ, 2002, p. 2). Mas no contexto atual da sociedade do conhecimento, as boas práticas de gestão da informação se voltam para a natureza da informação como insumo capaz de produzir conhecimento, e procuram valorizar o potencial estratégico inerente ao conteúdo da informação. A prática arquivística tradicional de avaliar o documento, nada mais é do que determinar a potencialidade estratégica da informação, ou seja: procura-se prospectar o futuro, avaliando se, algum dia, 34 movido por alguma circunstância, aquele conteúdo ou conhecimento, será útil para solucionar uma contingência da organização. Para Moresi (2006, p. 292), “As memórias mantidas por uma organização constituem um mapa de seu passado que contém grandes volumes de informação”; O arquivo público é, portanto, o mapa do conhecimento das ações do Estado; e este conhecimento organizacional deve ser canalizado no sentido de auxiliar “os tomadores de decisão a escolher ações adequadas para alcançar os objetivos organizacionais” (MORESI, 2006, p. 292). O Estado brasileiro e o arquivo público devem mudar seu foco de visão, que, no momento, trata o arquivo como um repositório de “informação sugestiva”, que tem característica “evocativa e fraca” e deve passar a tratá-lo como um celeiro de “informações decisivas”, capaz de resolver “controvérsias por meio de evidências inequívocas que suportam a consecução de objetivos dos tomadores de decisão ao longo de determinadas ações” (MORESI, 2006, p. 292-293). A potencialidade do arquivo como um recurso ativo gerencial baseado em conhecimento é latente e natural, o que falta é uma mudança de visão em relação ao seu papel na consecução dos objetivos do Estado. Quando o Poder Público enxergar esta vantagem competitiva que o arquivo pode lhe conferir, uma vez que este, além de armazenar o conhecimento acumulado resultante das ações governamentais, detém o know-how de como tratar, recuperar e disseminar este conhecimento, o Estado, provavelmente, passará a dar prioridade às funções arquivísticas, elevando-as à função típica de Estado. 35 6 ESTUDO DE CASO Conforme explanado na metodologia deste trabalho, com o propósito de colher dados da realidade, a fim de serem confrontados com o conhecimento empírico, ou seja, o senso comum dominante sobre os arquivos públicos, escolheu-se entrevistar autoridades dos dois arquivos públicos de Salvador: O Arquivo Histórico Municipal de Salvador e o Arquivo Público da Bahia. A pequena amostragem resultou na produção, basicamente, de dois estudos de caso, o que em princípio, não permite a generalização dos resultados, mas, é mais um conhecimento testado que pode se somar às muitas pesquisas já existentes e aqui usadas como referencial teórico. 6.1 ARQUIVO HISTÓRICO MUNICIPAL DE SALVADOR O Arquivo Histórico Municipal de Salvador teve origem na documentação do antigo Senado da Câmara, ainda na época do Brasil Colônia, e no acervo da Câmara Municipal, a partir do Séc. XVIII, já nos regimes Imperial e Republicano. Deste modo, seu acervo retrata a história político-administrativa da cidade e sua evolução urbana, social, econômica e cultural. Em 1894, o arquivo era regido pela Lei nº 125, de 12 de dezembro, que o subordinava à Secretaria da Intendência Municipal e só em 10 de abril de 1932, o arquivo é inaugurado como repartição independente e ganha autonomia, por meio do Ato 39º, de 11 de abril do mesmo ano, que também define sua missão e estrutura, bem como lhe dá a designação de Arquivo Municipal da Cidade do Salvador. Sua configuração contemporânea foi estabelecida pelo decreto municipal 9.040, de 1991, que também lhe atribuiu a responsabilidade pela gestão do patrimônio documental do Município do Salvador. 36 O Arquivo Histórico Municipal de Salvador arrola a documentação permanente, intermediária e corrente oriunda do Poder Público Municipal de Salvador e tem como missão, segundo Silva: A guarda, conservação e preservação do acervo e a divulgação da memória do município de Salvador, colocando-a a disposição do Poder Público, para auxiliar as suas ações, aos pesquisadores e aos cidadãos que procuram conhecer a história da cidade, consolidandosua identidade e cidadania (SILVA, 2008, p. 1). Entrevista: Entrevistada: Adriana Sousa Silva, graduada em Arquivologia, coordenadora do Arquivo há dois anos. A. Solicitação de informações pelos órgãos públicos. Segundo a coordenadora do Arquivo Municipal do Salvador, desde a sua chegada à instituição, há dois anos, este acervo nunca foi utilizado pelos órgãos públicos para resolução de assuntos administrativos. A coordenadora confirma que o acervo do arquivo municipal só é requisitado para pesquisa e informações históricas. B. Caracterização de informações solicitadas pelos órgãos públicos. A arquivista diz que a maioria das informações requisitadas pelos consulentes refere-se basicamente à história da cidade do Salvador, nos séculos passados. C. Fato marcante da atualidade para o qual algum órgão público pediu uma informação/ou um documento. Segundo a respondente, houve uma ocasião em que os livros de IPTU foram requisitados pelos órgãos públicos, com o fim de levantar informações sobre nomes de familiares que detinham posse de terra, imóveis, propriedades etc. Embora essas informações tenham sido solicitadas por órgãos públicos, na opinião da arquivista, elas não foram usadas para finalidades de decisão; ela ponderou que informações estratégicas são aquelas cuja finalidade é a solução de conflitos referentes a assuntos decisivos, como, por exemplo, quando uma pessoa 37 física pede informações sobre propriedade de imóveis para comprovação de herança; ou quando funcionários de órgãos públicos pedem informações sobre imóveis tombados na cidade, em um determinado período. D. O que o público pede ao Arquivo: Geralmente os usuários oriundos da população são estudantes de história nos níveis de graduação, mestrado e doutorado, os quais recorrem a esta unidade em busca de fonte de informações para trabalhos de conclusão de curso. Há também uma pequena parcela de pesquisadores da área de jornalismo, que recorre ao acervo, sendo que os documentos mais requisitados são cartas de escravos, contratos, leis dos séculos passados e documentos referentes à escravidão, matérias jornalísticas referentes a entrevistas com personalidades de Salvador do século passado, o crescimento urbano de Salvador, lista de associações de bairros, certidões de nascimento para montagem da árvore genealógica etc. E. O que o público espera encontrar no arquivo: Geralmente o público já conhece a instituição através do sitio eletrônico, no qual obtém informações sobre esse centro de informação, como, por exemplo, localização, tipos de acervos, horário de funcionamento, bem como outros assuntos. Estes consulentes, segundo a coordenadora, adentram nesta unidade sabendo o que irão pesquisar. Segundo a arquivista, o sitio proporciona informações precisas para os usuários, sendo este suporte eletrônico considerado, por ela, como uma espécie de inventário, que ajuda os consulentes na decisão de que tipos de informação existem nesse acervo. Os estudantes de arquivologia também visitam o Arquivo Municipal, interessados em saber sobre os procedimentos nas atividades técnicas, bem como conhecer a estrutura física do acervo. 38 F. Divulgação dos serviços do arquivo público para a administração pública. Segundo a respondente, a administração pública tem a imagem do arquivo como um órgão que guarda documentos históricos, mas também não há nenhuma ação de divulgação no sentido de mostrar ao Poder Público Municipal a verdadeira missão do arquivo. G. Serviços ou programas de divulgação direcionados para o público. Mesmo que timidamente, o Arquivo Público Municipal da Cidade do Salvador realiza, esporadicamente, programas de divulgação em locais públicos, como exposições fotográficas sobre a cidade no século passado. A divulgação dos serviços do arquivo é feita somente nos sítios eletrônicos e nas visitas in loco, e em Shopping Center, em locais públicos como nas estações rodoviárias e praças públicas, por meio de exposições fotográficas e outros acervos, como os livros de IPTU. Na verdade, o programa de exposição de fotos é feito nas estações de transportes de grandes movimentos populacionais, em shopping center da cidade; já os livros de registros de IPTU, ficam expostos geralmente na Secretaria da Fazenda da cidade. Segundo a coordenadora os atuais programas de divulgação são eficientes no que tange à visão histórica da cidade. Avaliação e crítica – As respostas da entrevistada, bem como opiniões por ela emitidas, confirmam que as autoridades municipais, de modo geral, usam, prioritariamente, o Arquivo Municipal da Cidade do Salvador como um aparato histórico e cultural, finalidade que lhe é inerente, mas que não deve ser a missão prioritária, já que, segundo a legislação e a literatura referenciada neste trabalho, a função precípua do arquivo público é servir de fonte de conhecimento para apoiar as atividades administrativas. No entanto, na questão três, em que se usou o artifício do incidente crítico, a arquivista deu exemplo de um fato que comprova que, embora as autoridades não tenham consciência, na prática, o acervo documental do arquivo é usado, pelo 39 menos, esporadicamente, como suporte de informação para decisões administrativas e como prova efetiva, como é o caso de documentos de IPTU para comprovação de propriedade. Este fato também mostra que a informação, embora seja histórica, ganhou um valor estratégico, ao ser usado para resolver um fato do presente, além disso, talvez esta informação seja a única capaz de resolver uma determinada questão; e esta natureza de exclusividade aumenta o seu valor estratégico. Quanto ao público, fica evidente que só a população de nível educacional elevado freqüenta o Arquivo Municipal do Salvador; e, por outro lado, não há um trabalho de divulgação voltado para o cidadão, que o sensibilize sobre o papel do arquivo perante o governo e como órgão responsável pela custódia dos documentos gerados pelo governo na prestação de serviços à comunidade; neste sentido, o Arquivo é também responsável pelo acesso do cidadão a estes documentos, agora já na fase permanente. Ou seja, confirma-se o que diz, ao desconhecer o papel e a potencialidade do arquivo como órgão detentor e provedor de informação para a tomada de decisão, o governo não gera políticas públicas que promovam o arquivo e ainda influencia a opinião da população sobre o arquivo. Mas também não há um esforço deliberado do Arquivo Municipal do Salvador para se mostrar ao governo e à população, provavelmente porque o próprio Arquivo, de tanto ver reduzido seu papel, passou a enxergar apenas sua missão histórico-cultural. 6.2 ARQUIVO PÚBLICO DA BAHIA O Arquivo Público do Estado da Bahia foi criado pelo Poder Executivo em 16 de janeiro de 1890, pelo governador, Manoel Vitorino Pereira. Através da Lei nº 165, de 24 de maio de 1949, essa instituição passar a agregar a Secretaria do Interior e da Justiça com a denominação de Arquivo Público. 40 Em 11 de abril de 1966, o Arquivo Público, através da Lei nº 2.321, passa a integrar a estrutura da Secretaria da Educação e Cultura. Já em 1967, com a Lei nº 2.443, de 06 de abril, o referido Arquivo passa a denominar-se Arquivo Público do Estado da Bahia, como órgão da administração direta, tendo como missão recolher, guardar, preservar e conservar os documentos de valor permanente, oriundos dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário do Estado. Em 1994 houve uma ampliação de suas instalações, com a construção do Prédio Anexo, no qual hoje está instalado o Setor de Restauração. Atravésda Lei nº 6.812 de 18 de janeiro de 1995, o Arquivo Público do Estado da Bahia passa a vincular a estrutura da Secretaria da Cultura e Turismo da Bahia, tendo como finalidade executar as atividades referentes ao recolhimento, guarda, preservação e conservação de documentos que retratem a memória histórica, geográfica, administrativa, técnica, legislativa e judiciária do Estado da Bahia. O Arquivo Público da Bahia possui uma preciosidade histórica e cultural em seu acervo, destacando obras desde o século XVIII e XIX até os dias atuais. Essa riqueza é retratada através de documentos impressos de caráter Legislativo e Executivo, tais como Relatórios de Governadores, falas de Presidentes da Província da Bahia, leis elaboradas pela Assembléia Legislativa e outros documentos oficiais de similar importância. Além disso, guarda uma coleção de obras raras, constituída não só por livros, mas também por mapas, plantas e fotografias. Entrevista: Entrevistada – Mônica Amorim, coordenadora do Arquivo Intermediário. A. Solicitação de informações pelos órgãos públicos. Segundo a entrevistada, os órgãos públicos sempre demandam informações do APB. 41 B. Caracterização de informações solicitadas pelos órgãos públicos. No setor de Arquivo Permanente – Solicitam levantamento sobre imóveis e informações pessoais, por exemplo, para comprovar questões relacionadas a ações de anistia. As pesquisas são realizadas pelos funcionários do setor que respondem a Secretaria solicitante, mediante ofício que fará parte do processo. No setor de Arquivo Intermediário – Os documentos são: pedido de laudos cadavérico, laudos periciais, boletins de ocorrência, inquéritos policiais. Existe também a atividade de apoio técnico as secretarias. C. Fato marcante, da atualidade, para o qual algum órgão público pediu uma informação/ou um documento: No setor de Arquivo Permanente – A Secretaria de Cultura solicitou consulta para exposição sobre o TCA; e o Ministério da Justiça solicitou informações pessoais. D. O que o público pede ao Arquivo: No setor de Arquivo Permanente – Orientação e suporte para pesquisa, utilização de fonte primária para o desenvolvimento de trabalhos acadêmicos e pesquisa na área de genealogia. Os usuários têm nível de escolaridade superior, e são, em geral, das áreas de História, História com Concentração em Patrimônio Documental, Ciências Sociais, Antropologia. No setor de Arquivo Intermediário – são solicitados documentos da Secretaria de Segurança Pública referente a acidentes, exames e inquéritos. Exemplo: Laudo Cadavérico, Laudos Periciais, Boletins de Ocorrência, Inquéritos Policiais. Os usuários são de todos os níveis de escolaridade: fundamental, médio e superior. A documentação deste setor ainda é de interesse do cidadão comum. 42 E. O que o público espera encontrar no arquivo: No setor de Arquivo Permanente - Geralmente as pessoas já trazem a referência da pesquisa a ser feita; ou vêm fazer um levantamento da documentação. No setor de Arquivo Intermediário – As pessoas já trazem a indicação dos órgãos da Secretaria de Segurança Pública (Postos policiais, Instituto Médico Legal Nina Rodrigues, Departamento de Polícia Metropolitana e do Departamento Estadual de Trânsito – DETRAN). F. Divulgação dos serviços do arquivo público para a administração pública. Divulgação através da promoção de seminários, cursos, distribuição de folder, e visitas as Secretarias de Estado. G. Serviços ou programas de divulgação direcionados para o público. Através de atendimento ao pesquisador, de um modo geral, ao cidadão comum, aos órgãos do governo, assim como a outras instituições. Avaliação e crítica: As respostas demonstram que o Arquivo Público da Bahia tem bem definida suas funções, perante o Poder Público estadual e perante a população; por outro lado, fica evidenciado que o Poder Público estadual também sabe qual a missão primária do APB, recorrendo a ele para obter dados factuais e pontuais para resolver problemas imediatos. Quanto aos usuários, destacam-se os estudantes e pesquisadores, que usam o arquivo como fonte de pesquisa e que já sabem o que querem. A população, pelo que ficou evidenciado, vem ao arquivo guiado pelos órgãos estaduais com os quais fizeram contato antes, por conta da necessidade do problema que precisam resolver. No entanto, é evidente que a administração estadual usa o APB de forma pragmática e imediatista, para resolver uma questão pontual, mas não enxerga nele o celeiro de conhecimento social que ele é; portanto não vê a característica estratégica do conteúdo das informações que ele custodia; ou seja, o APB não é reconhecido pelo Poder Público como um repositório de conhecimento capaz de 43 subsidiar a administração do Estado; o que ressalta, na verdade, é o caráter histórico e cultural do arquivo, haja vista a posição do APB na estrutura organizativa do Estado. Neste sentido, não se pode afirmar que o Governo do Estado da Bahia tem uma visão estereotipada do Arquivo Público do Estado, mas pode-se afirmar que ele tem uma visão reduzida e simplificada, que prejudica a administração do estado, que não se utiliza do rico manancial de informações armazenadas no arquivo público, para agilizar as atividades gerenciais e do cotidiano; bem como o APB também sai prejudicado, pois não é beneficiado com políticas e infra- estrutura adequada para implementar suas atividades. Cria-se um circulo vicioso, que agrava principalmente a condição do arquivo, afetando a qualidade dos serviços por ele prestados. Por outro lado, o APB também não desenvolve uma campanha ostensiva de divulgação de sua missão, de suas finalidades e objetivos, sensibilizando os Poderes Públicos e a população sobre seu papel de gestor das informações decorrentes da atividade pública, tornando-se, como conseqüência, a memória do sistema social do Estado. Deste modo, confirma-se o pressuposto expresso neste trabalho de que os arquivos carecem de um programa de divulgação sistemático e profissional, que um plano de marketing poderia ajudar a resolver e que se fundamenta, inclusive, em afirmações de Antunes Silva. 44 7 UM PLANO DE MARKETING DIRECIONADO A MUDAR A IMAGEM DOS ARQUIVOS PÚBLICOS O marketing é uma ferramenta gerencial que tem um forte apelo mercadológico no imaginário da população; no entanto, Kotler e Levy, dois papas deste assunto, procuraram desmitificar este conceito, criando métodos e ferramentas de marketing direcionados especificamente para instituições públicas e que não visam lucro. Kotler e Fox consideram que marketing é uma função essencial às organizações modernas que procuram atender, com eficiência, alguma necessidade do ser humano. E completando dizem: Para sobreviver e tornar-se bem-sucedidas, as instituições devem conhecer seus mercados, atrair recursos suficientes, converter esses recursos em programas, serviços e idéias apropriadas e distribuí-los eficazmente aos vários públicos consumidores. Estas tarefas são conduzidas em uma estrutura de ação voluntária por todas as partes interessadas. A instituição moderna está disposta principalmente em oferecer e trocar valores com diferentes participantes para obter sua cooperação e assim, atingir as metas organizacionais (KOTLER; FOX, 1994, p.23-24) Amaral, ponderando sobre o papel determinante do marketing nas organizações, assevera que: “Da dimensão filosófica da conceituação adotada dependerá o tipo de orientação de uma organização”. (AMARAL, 1998, p.56-57). Entende-se que a aplicação das ferramentas
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