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27 - Anestésicos Gerais

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FARMACOLOGIA 
FERNANDO SALA MARIN 
27. ANESTÉSICOS GERAIS 
 
 Uma anestesia geral (AG) deve proporcionar hipnose com amnésia, analgesia, relaxamento muscular e 
bloqueio dos reflexos autonômicos. Porém, não existe uma droga única que contemple todos estes fatores, por 
isso é comum associações para compô-la. 
 O anestésico geral ideal é aquele que, além de contemplar as características já mencionadas, possui 
indução e recuperação rápidas e suaves, com larga margem de segurança, sustentando a homeostasia 
durante o procedimento cirurgico e que seja rapidamente eliminado. 
 
Propriedades farmacológicas dos AG: são variadas, a escolha deve levar em conta as necessidades do paciente. 
- Efeitos hemodinâmicos: vasodilatação direta, depressão miocárdica, diminuição da resposta reflexa e diminuição ou 
aumento da atividade simpática (depende da droga). 
- Efeitos sobre o sistema respiratório: depressão respiratória, diminuição dos reflexos, irritação (↑ muco → 
predisposição a infecções). 
- Hipotermia: exposição das cavidades, baixa temperatura ambiente, infusão de fluidos frios. 
 
Estágios da anestesia geral: 
- Estágio I: Analgesia (depende do agente, alguns não possuem esta capacidade). Amnésia, euforia. 
- Estágio II: Excitação (+ delirium, comportamento combativo). As drogas que induzem e recuperam mais 
rápido são as que passam mais rápido por este estágio. 
- Estágio III: Anestesia cirúrgica: inconsciência, respiração regular, diminuição do movimento ocular. Sem 
reflexo (importante testar, pois a pessoa pode estar apenas sedada). É neste estágio que a pessoa é considerada 
pronta para a realização do procedimento. 
- Estágio IV: Depressão bulbar (Risco de morte) → Parada respiratória, depressão e parada cardíaca, 
ausência de movimentos oculares. 
*Deve-se aprofundar até o estágio III para realizar o procedimento, geralmente utiliza uma droga para induzir (chegar até este 
estágio rapidamente) e a mesma ou outra para mantê-lo. 
 
Locais de ação dos AG: MEDULA ESPINHAL – causando imobilidade. 
HIPOTÁLAMO – causando amnésia e sedação. 
 
 
� ANESTÉSICOS INALATÓRIOS 
 
Não halogenados: ÓXIDO NITROSO, ÉTER, XENÔNIO 
Halogenados: HALOTANO, ISOFLURANO, ENFLURANO, SEVOFLURANO 
 
Mecanismo de ação: 
 - Alteração da bicamada lipídica (Hipótese de Meyer-Overton) 
 - Potencializar a estimulação de receptores GABAa (via inibitória do SNC) 
 - Hiperpolarização da célula. 
 *Possuem índice de segurança mais estreito. 
 
Potência, indução e recuperação: dependem das propriedades físico-químicas, que determinarão o CAM 
(concentração alveolar mínima que previne a resposta motora a estímulos nociceptivos), é extremamente 
dependente da solubilidade do gás no sangue e nos tecidos (lipídios). 
 
 Solubilidade no sangue: determina o tempo de indução e recuperação. Quanto maior a solubilidade no 
sangue, mais demorada a indução: 
Éter > Halotano > Isoflurano > Sevoflurano > Óxido nitroso 
(Óx. Nitroso → menor coeficiente de partição sangue/gás, induz mais rápido de todas citadas). 
 
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 Solubilidade em lipídios: determina a potência da droga, quanto maior a potência, menor o CAM (ou seja, 
menor concentração para exercer os efeitos). A relação é quanto maior a solubilidade em lipídios, maior a 
potência do anestésico: 
Halotano > Isoflurano > Enflurano > Desflurano > Óx. Nitroso 
(Óx. Nitroso, apesar de induzir e recuperar rapidamente tem a menor solubilidade lipídica, portanto, menor potência e maior CAM). 
 
 
(Fonte: Anestesiologia: Princípios e técnicas, James Manica) 
 
Metabolização: não é importante para a finalização da ação, que é feita pela expiração, porém, pode originar 
metabólitos tóxicos. 
- Óx. Nitroso e éter não são metabolizados; 
- Halotano produz um metabólito hepatotóxico (cloreto de trifluoroacetila); 
- Metoxiflurano produz metabólito nefrotóxico (F- que é o nefrotóxico e ácido dicloroacético). 
 
1) HALOTANO 
→ Utilizado na indução e manutenção da anestesia. 
- Efeitos cardiovasculares: sensibiliza o miocárdio a ação das catecolaminas. Os pacientes ansiosos demais devem 
ser tratados com BZDs para diminuir a ADR. 
- Controle rigoroso da dose. 
- Respiração: menor depressão que os demais, causa broncodilatação (bom para asmáticos). 
- Possui metabolito hepatotoxico. 
- ↑ PIC (pressão intracraniana) devido a vasodilatação (não recomendado para neurocirurgias). 
- Risco de hipertermia maligna (cessar o uso e administrar DANTROLENE); este risco é maior quando associado a 
bloqueadores musculares. 
 
 
2) ISOFLURANO 
→ Utilizado na manutenção da anestesia (não utiliza para induzir, pois irrita muito a árvore respiratória, 
causando intensa tosse enquanto o paciente ainda não estiver com os reflexos abolidos). 
- Efeitos cardiovasculares: mínimos (eleição em cardiopatas) 
- SNC: menor vasodilatação cerebral (eleição em neurocirurgias). 
- Não utilizado na obstetrícia por causa relaxamento uterino. 
 
 
3) SEVOFLURANO 
→ Utilizado na indução e manutenção da anestesia. 
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- Efeitos cardiovasculares mínimos. 
- Respiração: não irrita, causa broncodilatação (bom para asmáticos). 
- SNC: não altera a PIC. 
- Utilizados em idosos, crianças, cardiopatas. 
- Desvantagens: alto custo, oligúria intraoperatória e é muito nefrotóxico. 
 
 
� ANESTÉSICOS INJETÁVEIS (INTRAVENOSOS/PARENTERAIS) 
 
- Barbitúricos: TIOPENTAL 
- PROPOFOL 
- ETOMIDATO 
- QUETAMINA 
 
Mecanismo de ação: 
- Aumento da neurotransmissão inibitória (GABA, GLICINA): Tipental, Propofol, Etomidato 
 - Diminuição da neurotransmissão excitatória (GLUTAMATO) - bloqueia recep. NMDA: Quetamina 
 
Potência, indução e recuperação: dependem das propriedades farmacocinéticas da droga: lipossolubilidade 
(quanto maior, mais rápido chega ao SNC) e da redistribuição. 
 
Tiopental / Propofol / Etomidato: modulação positiva da função inibitória do GABA nos receptores GABAA (abrem 
os canais de Cl-, ocorre o influxo deste íon, hiperpolarização da fibra). 
 
1) TIOPENTAL 
→ Utilizado na indução da anestesia (não utiliza para mantê-la devido ao longo período de eliminação da 
droga, superior a 10h). 
- Possui propriedades analgésicas. 
- Efeitos cardiovasculares: ↓ PA, vasodilatação, ↑ leve da frequência cardíaca. Não utilizado em cardiopatas. 
- Respiração: ↓ FR 
- Outros: É um barbitúrico. Libera histamina (associa com anti-histamínico); provoca dor no local de aplicação e 
causa hemólise quando concentração for <3%. 
- Contra-indicações: obesos (devido a alta afinidade pelo tecido adiposo), cardiopatas. 
 
 
2) PROPOFOL 
→ Utilizado na indução e manutenção da anestesia. 
- Farmacocinética: alta estabilidade; depuração mais rápida (inclusive por metabolismo extra-hepático). 
- Efeitos cardiovasculares: é o mais hipotensor. 
- SNC: causa mais depressão respiratória, é antiemético (escolha para pacientes com náuseas), componentes 
euforizantes. 
- Não tem propriedade anticonvulsivante. 
- Curiosidade: droga responsável pela morte do cantor Michael Jackson. 
 
 
3) ETOMIDATO 
→ Utilizado na indução da anestesia. 
- Efeitos cardiovasculares: mínimos (escolha para cardiopatas) 
- Respiração: menos depressão que os outros parenterais estudados. 
- Outros: aumenta os focos convulsivos, causa náuseas e vômito. 
- Não é utilizado na UTI, pois diminui os níveis de cortisol (que é uma proteção fisiológica contra o estresse), podendo 
levar o paciente a morte. 
 
 
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FERNANDO SALA MARIN 
4) QUETAMINA (= CETAMINA) 
→ Utilizado na indução e manutenção da anestesia. 
- Mecanismo de ação diferente: antagoniza recepetores NMDA de GLUTAMATO, ou seja, bloqueia vias excitatórias. 
- Anestesia dissociativa: substância que causa amnésia e insensibilidade à dor, podendo o paciente permanecer 
consciente. / Reações catalépticas: rigidez muscular, às vezescontração muscular involuntária, catatonia. 
- Propriedade analgésica profunda. 
- Respiração: ↓ FR 
- Associar com relaxantes musculares, devido a rigidez muscular que causa. 
- Efeitos cardiovasculares: diminui receptação de NOR e ADR, o principal mecanismo de inativação destas 
catecolaminas, assim exerce efeitos simpaticomiméticos, estimulando diretamente o coração pelo acúmulo destes 
neurotransmissores (único dentre os estudados que causa isso). 
- Causa delírios durante as 4 primeiras horas após o retorno da anestesia (associar a BZDs). Por esse motivo está 
sendo menos utilizada em adultos. 
- ↑ PIC, portanto não é escolha para neurocirurgias! 
 
 
 “Os anestésicos parenterais são os fármacos mais comumente usados para a indução anestésica em 
adultos. Sua lipofilia, juntamente com a perfusão relativamente alta do cérebro e da medula espinal, resulta em ação 
de início rápido e curta duração após uma dose única em bolo. Entretanto, eles acabam por acumular-se no tecido 
adiposo, prolongando a recuperação quando múltiplas doses são administradas, particularmente quando se 
empregam fármacos com baixas taxas de depuração. Cada anestésico tem o seu próprio conjunto único de 
propriedades e efeitos colaterais. O propofol e o tiopental são os dois agentes parenterais mais comumente usados. 
O propofol é vantajoso para procedimentos onde o rápido retorno ao estado mental pré-operatório é desejável. O 
tiopental tem um histórico de segurança há longo tempo estabelecido. O etomidato é habitualmente reservado para 
pacientes sob risco de hipotensão e/ou isquemia miocárdica. A cetamina é mais adequada para pacientes com asma 
ou para crianças submetidas a procedimentos rápidos e dolorosos.” (As Bases Farmacológicas da Terapêutica de 
Goodman & Gilman, 12ª segunda edição, pág. 539) 
 
 
� ADJUVANTES DA ANESTESIA 
 
“Um anestésico geral é raramente administrado de forma isolada. Os adjuvantes anestésicos são habitualmente 
utilizados para aumentar componentes específicos da anestesia, permitindo doses menores do anestésico geral e 
menos efeitos colaterais. Como esses fármacos são parte integrante dos esquemas anestésicos gerais, o seu uso 
como adjuvantes anestésicos é descrito brevemente aqui.” (As Bases Farmacológicas da Terapêutica de Goodman & Gilman, 12ª segunda 
edição, pág. 548) 
 
1) Benzodiazepínicos: MIDAZOLAM, LOREZAPAM, DIAZEPAM - alívio da ansiedade (ansiolíticos), ação 
sedativa, amnésia anterógrada. 
“Embora possam produzir anestesia similar à dos barbituratos, os BZDs são mais comumente usados para 
sedação e não para anestesia, pois as suas doses anestésicas podem resultar em prolongada amnésia e sedação. 
Como adjuvantes, eles são usados como ansiolíticos, amnésticos e sedativos antes da indução da anestesia ou 
simplesmente para sedação durante os procedimentos que não requerem anestesia geral. O mais usado no período 
perioperatório é o midazolam, seguido bem de longe pelo diazepam e pelo lorazepam.” (As Bases Farmacológicas da Terapêutica 
de Goodman & Gilman, 12ª segunda edição, pág. 548) 
 
 
2) Antihistamínicos: PROMETAZINA – diminui efeitos da histamina que é liberada pelos AG, como o prurido; 
também possuem ação sedativa. 
 
 
3) Bloqueadores Neuromuscular (BNM): na indução da anestesia. São relaxantes musculares: 
Competitivos (não despolarizantes): PANCURÔNIO – antagonista de receptores nicotínicos (N). 
 Despolarizantes: SUCCINILCOLINA – agonista com estímulo contínuo, que dessensibiliza os receptores N. 
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FERNANDO SALA MARIN 
 “Relaxantes musculares despolarizantes (p. ex., suxametônio) e não deposlarizantes (p. ex., vecurônio) são 
com frequência administrados durante a indução anestésica, para relaxar os músculos da mandíbula, do pescoço e 
das vias respiratórias, facilitando deste modo a laringoscopia e a intubação endotraqueal. Os barbituratos precipitarão 
quando misturados aos relaxantes musculares e deve-se esperar que desapareça, do cateter intravenoso antes que 
o relaxante muscular seja infundido. Após a indução, a manutenção do relaxamento muscular é desejável em muitos 
procedimentos, para ajudar a exposição cirúrgica e proporcionar segurança adicional quanto à imobilidade. 
Naturalmente, os relaxantes musculares não são por si só anestésicos e não devem substituir uma anestesia de 
profundidade adequada. A ação dos relaxantes musculares não despolarizantes é habitualmente antagonizada, 
quando a paralisia muscular não é mais desejada, por um inibidor da acetilcolinesterase como a neostigmina ou o 
edrofônio combinados a um antagonista do receptor muscarínico (p. ex., glicopirrolato ou atropina), de modo a 
sobrepujar a ativação muscarínica resultante da inibição da esterase. Afora a liberação de histamina por alguns 
agentes, os relaxantes musculares não despolarizantes usados dessa maneira têm poucos efeitos colaterais. 
Entretando, o suxametônio tem múltiplos efeitos colaterais graves (bradicardia, hiperpotassemia e mialgia grave), 
incluindo a indução de hipertermia maligna em indivíduos suscetíveis.” (As Bases Farmacológicas da Terapêutica de Goodman & Gilman, 
12ª segunda edição, pág. 549) 
 
 
4) Anticolinérgicos: ATROPINA – prevenção de secreções respiratórias (evita engasgamento). 
 
5) Analgésicos: 
- FENTANIL, SUFENTANIL, REMIFENTANIL, MEPERIDINA (Dolantina), MORFINA – rápida indução na 
anestesia e analgesia. Efeitos colaterais: liberam histamina, causam depressão respiratória e dependência. 
“Com exceção da cetamina, nenhum dos anestésicos parenterais ou inalatórios disponíveis atualmente é um 
analgésico eficaz. Assim, analgésicos são tipicamente administrados com os anestésicos gerais para reduzir a 
necessidade do anestésico e minimizar as alterações hemodinâmicas produzidas pelos estímulos dolorosos. Os anti-
inflamatórios não esteroides, os inibidores da ciclo-oxigenase-2 ou o paracetamol resultam às vezes em analgesia 
adequada aos procedimentos cirúrgicos menores. Entretanto, os opioides são os principais analgésicos usados 
durante o período perioperatório devido à analgesia rápida e profunda que produzem. 
A fentanila, sufentanila, alfentanila, remifentanila, meperidina e morfina são os principais opioides parenterais 
usados no período perioperatório. A atividade analgésica primária de cada um desses fármacos é produzida pela sua 
atividade agonista sobre os receptores µ-opioides. A ordem das suas potências (em relação à morfina) é: sufentanila 
(1000x), remifentanila (300x), fentanila (100x), alfentanila (15x), morfina (1x), meperidina (0,1x).” (As Bases Farmacológicas da 
Terapêutica de Goodman & Gilman, 12ª segunda edição, pág. 549) 
 
 
6) Antieméticos: prevenção de náuseas. 
 
7) Agonistas alfa-2: DEXMEDETOMIDINA – sedação e analgesia, utilização para indução da anestesia na 
UTI. 
“A dexmedetomidina é um derivado do imidazol altamente seletivo para o agonismo do receptor α2-adrenérgico 
(Kamibayashi e Maze, 2000). A dexmedetomidina é aprovada pelo FDA para sedação de curto prazo (menos de 24h) 
de adultos criticamente doentes e sedação anterior a e/ou durante procedimentos cirúrgicos ou outros clínicos em 
pacientes não intubados. A ativação do receptor α2A-adrenérgico pela dexmedetomidina produz sedação e analgesia, 
mas não há segurança quanto à obtenção de anestesia geral, mesmo nas doses máximas (Lakhlani e cols., 1997). 
A dexmedetomidina é um sedativo-hipnótico que fornece analgesia com pouca depressão respiratória e, na 
maioria dos pacientes, redução tolerável da pressão arterial e da frequência cardíaca. O fármaco tem propensão a 
ser utilizado cada vez mais para sedação e como anestésico adjuvante. 
Os efeitos colaterais mais comuns incluem hipotensão e bradicardia, atribuídos à redução da liberação de 
catecolaminas determinada pela ativação do receptor α2A-adrenérgico naperiferia e no SNC (Lakhlani e cols., 1997). 
Náuseas e boca seca são também reações adversas comuns.” (As Bases Farmacológicas da Terapêutica de Goodman & Gilman, 12ª 
segunda edição, pág. 548-549)

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