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GRADUAÇÃO 2016.1 REGULAÇÃO E SERVIÇOS PÚBLICOS AUTOR: SÉRGIO GUERRA Sumário Regulação e Serviços Públicos INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................................... 3 UNIDADE I: REFORMA DO ESTADO E REGULAÇÃO ......................................................................................................... 8 Aula 1 ............................................................................................................................................ 8 Aula 2 .......................................................................................................................................... 13 Aulas 3 e 4: .................................................................................................................................. 30 UNIDADE II: CONCESSÃO DE SERVIÇOS PÚBLICOS E PARCERIAS PÚBLICO-PRIVADAS (PPPS). CONSÓRCIOS PÚBLICOS. ............... 40 Aulas 5 e 6: .................................................................................................................................. 40 Aulas 7 e 8 ................................................................................................................................... 52 Aula 9 .......................................................................................................................................... 69 Aula 10 ........................................................................................................................................ 80 Aula 11 ........................................................................................................................................ 89 UNIDADE III: REGIME JURÍDICO DAS ATIVIDADES MONOPOLIZADAS PELO ESTADO ............................................................ 94 Aula 12 ........................................................................................................................................ 94 UNIDADE IV: AGÊNCIAS REGULADORAS ................................................................................................................ 105 Aula 13 ...................................................................................................................................... 105 Aula 14 ...................................................................................................................................... 114 UNIDADE V: CONTROLE DOS ATOS ADMINISTRATIVOS .............................................................................................. 127 Aula 15 ...................................................................................................................................... 127 Aula 16 ...................................................................................................................................... 132 Aula 17 ...................................................................................................................................... 138 UNIDADE VI: PROCESSO ADMINISTRATIVO ............................................................................................................ 145 Aula 18 ...................................................................................................................................... 145 UNIDADE VII: RESPONSABILIDADE CIVIL .............................................................................................................. 153 Aulas 19 ..................................................................................................................................... 153 UNIDADE VIII: AGENTES ESTATAIS ....................................................................................................................... 161 Aulas 20 e 21 ............................................................................................................................. 161 Aula 22 ...................................................................................................................................... 169 Aula 23 ...................................................................................................................................... 175 Aula 24 ...................................................................................................................................... 182 REGUlAçãO E SERvIçOS PúblIcOS FGV DIREITO RIO 3 1 GUERRA, Sérgio. Discricionariedade e reflexividade: uma nova teoria sobre as escolhas administrativas. belo Horizon- te: Fórum, 2008. 2 Sobre a releitura da supremacia do interesse público sobre o privado, des- tacamos, para aqueles que desejam uma introdução sobre o assunto, a obra de MEDAUAR, Odete. O direito admi- nistrativo em evolução, p. 185 et seq., e, em maior profundidade, os diversos artigos que compõem a coletiva intitu- lada: Interesses públicos versus interes- ses privados: desconstruindo o princípio da supremacia do interesse público. Daniel Sarmento (Org.). Rio de Janeiro: lumen Juris, 2005; o artigo de ÁvIlA, Humberto. Repensando o “princípio da supremacia do interesse público sobre o particular”. In: SARlET (Org.). O direito público em tempos de crise: estudos em homenagem a Ruy Ruben Ruschel. Porto Alegre: livraria do Advogado, 1999. p. 99-127; o artigo de OSÓRIO, Fábio Medina. Existe uma supremacia do interesse público sobre o privado no direito administrativo brasileiro? Revista de Direito Administrativo, v. 220, 2000, p. 69-107. 3 cASSESE, . La globalización jurídica. Trad. luis Ortega, Isaac Martín Delgado e Isabel Gallego córceles. Madrid: Mar- cial Pons, 2006, p. 181. 4 Nesse sentido, consulte-se a obra DUGUIT. Les transformations du droit public, (que reproduz a obra publicada em 1913 por Max leclerc e H. bourrelier pela Ed. colin). 5 Expressão utilizada por Sérgio bu- arque de Holanda para se referir aos movimentos “aparentemente reforma- dores” ocorridos no brasil, conduzidos pelos grupos dominantes. Na obra clássica HOlANDA, Sérgio. Raízes do Brasil, p. 160. INTRODUÇÃO O direito administrativo brasileiro foi muito influenciado pelo direito ad- ministrativo francês. No contexto inicial de surgimento do ramo, o direito administrativo era considerado como sendo um mero conjunto de condições necessárias à conformação da estrutura burocrática do governo às regras cria- das pelo Poder Legislativo; isto é, pensava-se o direito administrativo como sendo a disciplina voltada à organização da máquina administrativa do Esta- do, com características de unidade, centralização e uniformidade, em posição privilegiada em relação ao cidadão e direcionada à manutenção do funciona- mento dos serviços públicos.1 A inquestionável superioridade do interesse público sobre o privado2 foi conjugada pela supremacia da Administração, o princípio da legalidade e a função discricionária;3 advindo daí o regime administrativo diferenciado, compreendendo as prerrogativas da Administração Pública: poder de polícia e radical desigualdade, unilateral e singular, tais como espécies diferentes de propriedade, contratos e responsabilidades (diversas, portanto, do direito pri- vado), submetidas as causas desta matéria, inclusive, a um tribunal próprio no caso francês. Um passo importante para a evolução do direito administrativo ocorreu no início do século passado, com León Duguit, ao doutrinar acerca das trans- formações do direito público.4 Nessa obra, destacando a passagem, no direito administrativo, da puissance public para o service public, Duguit advertia que, com o desaparecimento do sistema imperialista, a noção de serviço público substituiu a de soberania e mudou a concepção de lei, do ato administrativo, da justiça administrativa e de responsabilidade estatal. A concepção de direito administrativo no Brasil, seguindo os influxos do direito administrativofrancês, pressupunha uma atuação executiva estatal hierarquizada e suportada por decisões de “cima para baixo”,5 à luz da teoria clássica da separação de poderes. Esse fato era justificado pelo modelo de estado social, com forte intervenção executiva estatal direta nas atividades econômicas. O direito administrativo de que a sociedade atual necessita não se pode caracterizar como a mesma disciplina do século XIX e da primeira metade do século XX. Deve acompanhar as características e os riscos por que passa a sociedade contemporânea globalizada, que, por isso, clama por uma releitura de categorias, fórmulas e institutos desse ramo do direito público, cunhados há mais de um século. A globalização forçou com que a sociedade repensasse a função, a estrutura e o custo dos Estados, especialmente à luz dos princípios da subsidiariedade e da eficiência. [...] Essa transição balança alicerces de 1. GUERRA, Sérgio. Discriciona- riedade e reflexividade: uma nova teoria sobre as escolhas adminis- trativas. belo Horizonte: Fórum, 2008. 2. Sobre a releitura da supremacia do interesse público sobre o privado, destacamos, para aqueles que dese- jam uma introdução sobre o assunto, a obra de MEDAUAR, Odete. O direito administrativo em evolução, p. 185 et seq., e, em maior profundi- dade, os diversos artigos que compõem a coletiva intitulada: Interesses públicos versus interesses pri- vados: desconstruindo o princípio da supremacia do interesse público. Daniel Sarmento (Org.). Rio de Janeiro: lumen Juris, 2005; o artigo de ÁvIlA, Humberto. Repensando o “princípio da supremacia do interesse público sobre o particular”. In: SARlET (Org.). O di- reito público em tempos de crise: estudos em homenagem a Ruy Ruben Ruschel. Porto Alegre: livraria do Advogado, 1999. p. 99-127; o artigo de OSÓRIO, Fábio Medina. Existe uma supremacia do interesse público sobre o privado no direito administrativo bra- sileiro? Revista de Direito Admi- nistrativo, v. 220, 2000, p. 69-107. 3. cASSESE, . La globalización jurídica. Trad. luis Ortega, Isaac Mar- tín Delgado e Isabel Gallego córceles. Madrid: Marcial Pons, 2006, p. 181. 4. Nesse sentido, consulte-se a obra DUGUIT. Les transformations du droit public, (que reproduz a obra publicada em 1913 por Max leclerc e H. bourrelier pela Ed. colin). 5. Expressão utilizada por Sérgio buarque de Holanda para se referir aos movimentos “aparentemente reforma- dores” ocorridos no brasil, conduzidos pelos grupos dominantes. Na obra clássica HOlANDA, Sérgio. Raízes do Brasil, p. 160. REGUlAçãO E SERvIçOS PúblIcOS FGV DIREITO RIO 4 6 SOUTO, Marcos Juruena villela. Direi- to Administrativo Regulatório. Rio de Janeiro: Editora lumen Juris, 2002, pp. 1, 2 e 16. 7 bRASIl (constituição de 1988). Art. 174. como agente normativo e regu- lador da atividade econômica, o Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor pri- vado. 8 Por exemplo: é sabido que nas princi- pais questões submetidas à regulação estatal as normas têm linhas mestras da política econômica e social, fazendo com que seja necessária uma liberdade ao administrador público na hora de executar os comandos gerais da norma, dependendo: (i) dos dados empíricos decorrentes das técnicas disponíveis e testadas; (ii) da circunstância fática em que a norma está sendo aplicada, e; (iii) dos impactos prospectivos multilaterais decorrentes do ato. Estaremos diante, portanto, de questões que transcen- dem a vinculação do administrador público ao princípio da legalidade. há muito solidificados no Direito Administrativo e que, por isso, preci- sam ser revistos para acompanhar a evolução dos fatos nos planos eco- nômico e social, proporcionando um necessário e seguro travejamento jurídico para as novas relações que se produzem no campo em expansão do público não estatal. [...] A globalização da economia tem ampliado as fronteiras comerciais entre os países gerando blocos econômicos e acordos internacionais que colocam a Administração Pública, direta e indireta, cada vez mais em contato com outros países, organismos internacionais — especialmente os de fomento — e cidadãos que ad- quirem liberdade de circulação e de ofício, com igualdade de tratamen- to, forçando, com isso, o aparecimento de novo aspecto no estudo do Direito Administrativo.6 A atividade administrativa vai, aos poucos, tornando-se um mecanismo de composição de interesses públicos e privados, que se manifestam no pro- cedimento, e que os órgãos de decisão devem regular de maneira a tomar a decisão mais adequada e que melhor salvaguarde os direitos subjetivos e os interesses em presença. Nesse diapasão, desponta uma questão de capital importância estudada nas aulas de direito administrativo concernente à configuração da regulação estatal nas relações contemporâneas entre a Administração Pública descentra- lizada e o agente regulado que recebe a delegação dos serviços públicos. Essa forma de intervenção estatal (regulação) deve atender ao interesse público, sem, contudo, deixar de sopesar os efeitos e os impactos dessas decisões no subsistema regulado com os interesses de segmentos específicos da sociedade e, até mesmo, com o interesse individual no caso concreto. De certa forma, esse aspecto é uma novidade no estudo do Direito Administrativo. Nesse campo de questões, as atribuições estatais, no contemporâneo Es- tado Regulador — confirmado, entre nós, com a promulgação da Carta de 19887 — deve atentar para a justiça material no caso real, impossível de ser previsível e positivada, na maioria das vezes, pelo Poder Legislativo. O Di- reito Administrativo se estruturou, no passado, no princípio da legalidade, mas que hoje parece não ser mais suficiente para desvendar todos os desafios postos aos estudiosos do Direito Administrativo.8 Assim, faz parte do objetivo desta disciplina chamar ao debate jurídico esta nova fase por que passa o estudo do direito administrativo, como, por exemplo, a forma de compatibilização dos instrumentos de regulação de ser- viços públicos dentro das premissas decorrentes do Estado Democrático de Direito. 6. SOUTO, Marcos Juruena villela. Direito Administrativo Regu- latório. Rio de Janeiro: Editora lumen Juris, 2002, pp. 1, 2 e 16. 7. bRASIl (constituição de 1988). Art. 174. como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e pla- nejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado. 8. Por exemplo: é sabido que nas principais questões submetidas à re- gulação estatal as normas têm linhas mestras da política econômica e social, fazendo com que seja necessária uma liberdade ao administrador público na hora de executar os comandos gerais da norma, dependendo: (i) dos dados empíricos decorrentes das técnicas dis- poníveis e testadas; (ii) da circunstância fática em que a norma está sendo apli- cada, e; (iii) dos impactos prospectivos multilaterais decorrentes do ato. Esta- remos diante, portanto, de questões que transcendem a vinculação do administrador público ao princípio da legalidade. REGUlAçãO E SERvIçOS PúblIcOS FGV DIREITO RIO 5 REGULAÇÃO E SERVIÇOS PÚBLICOS: a. Objeto geral da disciplina e temas relacionados, sua organização e abordagem teórica; Discutir as funções desempenhadas pelo Estado no âmbito da Ordem Econômica, com ênfase na regulação estatal e na disciplina dos serviços pú- blicos. Os alunos também serão capacitados em temas como processo ad- ministrativo, responsabilidade civil do Estado e regime jurídico dos agentes estatais. b. Finalidades do processo ensino-aprendizado No curso Regulaçãoe Serviços Públicos, a cada encontro serão discutidos um ou mais casos geradores construídos, na maioria das vezes, a partir de si- tuações concretas ou de precedentes que foram objeto de decisão do Superior Tribunal de Justiça ou do Supremo Tribunal Federal, a fim de familiarizar o aluno com questões discutidas no dia a dia forense e despertar o seu senso crítico com relação às posições adotadas pelos Tribunais. A finalidade do processo de ensino-aprendizado deste curso é problemati- zar a complexidade dos temas enfrentados pelos administradores públicos e pelos administrados, com ênfase na pluralidade de correntes sobre os assun- tos abordados e sobre a análise da jurisprudência. c. Método participativo A metodologia do curso é eminentemente participativa, requerendo in- tensa interação dos alunos nos debates em sala e preparo prévio para as aulas, mediante a leitura das indicações bibliográficas obrigatórias e, sempre que possível, das leituras complementares. d. Desafios e dificuldades do curso O Curso exigirá do aluno uma visão reflexiva do direito administrativo e capacidade de relacionar a teoria exposta na bibliografia e na sala de aula com outras disciplinas, especialmente o direito constitucional. O principal desafio consiste em construir uma visão contemporânea e pós-moderna do direito administrativo, centrado nos direitos dos cidadãos, buscando sempre cotejar o conteúdo da disciplina com a realidade do País. REGUlAçãO E SERvIçOS PúblIcOS FGV DIREITO RIO 6 e. Critérios de Avaliação: clareza e objetividade acerca da postura do professor quanto ao exame das aprendizagens dos alunos; A avaliação será composta por duas provas de igual peso. A nota final será composta pela média aritmética entre as duas notas obtidas pelo aluno, notas por conceito e eventuais atividades complementares que venham a ser opor- tunamente solicitadas aos alunos. f. Atividades previstas: tipo da atividade, se em conjunto com outros professores, palestras, projetos, participação em pesquisas, blog etc. O curso possui um blog que pode ser acessado em http://direitoadminis- trativofgvrio.wordpress.com/blog/. Os alunos são estimulados a contribuir para as discussões do blog ao longo do semestre. g. Conteúdo da disciplina A disciplina Regulação e Serviços Públicos discutirá as funções desempe- nhadas pelo Estado no âmbito da Ordem Econômica, com ênfase na regula- ção estatal e na disciplina dos serviços públicos. Como decorrência necessária à compreensão dos limites da atuação da Administração Pública na Ordem Econômica, será apresentado o rol de controles a que se sujeitam os atos da Administração Pública. O programa abrange ainda a responsabilidade civil do Estado por atos e omissões da Administração Pública, bem como o esta- tuto jurídico do servidor público. Em síntese, o curso será composto pelas seguintes unidades: Unidade I: Reforma do Estado e regulação. Unidade II: Concessão de serviços públicos e Parcerias Público-Privadas. Consórcios públicos. Unidade III: Regime jurídico das atividades monopolizadas pelo Estado. Unidade IV: Agências reguladoras. Unidade V: Controle dos atos administrativos. Unidade VI: Processo administrativo. Unidade VII: Responsabilidade civil do Estado. Unidade VIII: Agentes estatais. REGUlAçãO E SERvIçOS PúblIcOS FGV DIREITO RIO 7 PLANO DE ENSINO Apresentamos abaixo quadro que sintetiza o Plano de Ensino da discipli- na, contendo a ementa do curso, sua divisão por unidades e os objetivos de aprendizado almejados com a matéria. REGUlAçãO E SERvIçOS PúblIcOS FGV DIREITO RIO 8 9 cHEvAllIER, Jacques. O Estado pós- -moderno. Tradução de Marçal Justen Filho. belo Horizonte: Editora Fórum, 2009. p. 16. 10 Post-modern condition. Minneapolis: University of Minnesota Press, 1985. 11 Eros Roberto Grau entende que estão inseridos nas atividades econômicas em sentido amplo (gênero) tanto os serviços públicos (espécie) quanto às atividades econômicas em sentido estrito (espécie). GRAU. A ordem eco- nômica..., p. 138 et seq. Em sentido contrário, ao qual aderimos, se ma- nifesta Odete Medauar: “A nosso ver, não parece adequado ao ordenamento brasileiro considerar o serviço público como atividade econômica. De um lado, tem-se o art. 175, que, de modo claro atribui o serviço público ao poder público, podendo ser realizado pelo setor privado mediante concessão ou permissão. vê-se que a constituição Fe- deral fixou um vínculo de presença do poder público na atividade qualificada como serviço público, presença esta que pode ser forte ou fraca, mas que não pode ser abolida. Esta presença se expressa na escolha do modo de reali- zação da atividade, na sua destinação ou atendimento de necessidades da coletividade.” MEDAUAR. Segurança jurídica e confiança legítima. In: ÁvIlA (coord.). Fundamentos do estado de di- reito: estudos em homenagem ao pro- fessor Almiro do couto e Silva, p. 125. UNIDADE I: REFORMA DO ESTADO E REGULAÇÃO AULA 1 I. TEMA Compreendendo a regulação estatal das atividades econômicas II. ASSUNTO Regulação estatal. III. OBJETIVOS ESPECÍFICOS O objetivo desta aula consiste em discutir alguns dos principais temas que comporão o curso Serviços Públicos e Controle da Administração Pública. IV. DESENVOLVIMENTO METODOLÓGICO O presente curso insere-se no contexto da crescente complexidade da so- ciedade contemporânea e fortalecimento da democracia. Segundo Jacques Chevallier, as transformações que os Estados conhecem atualmente não po- dem ser consideradas um fenômeno isolado: elas remetem a uma crise mais genérica das instituições e dos valores da modernidade nas sociedades ociden- tais; e essa crise parece dever conduzir a uma construção de um novo modelo de organização social.9 O termo “pós-modernidade”, popularizado por Jean-François Lyotard,10 indica novas concepções surgidas a partir da segunda grande guerra mundial, incrementadas nas décadas de oitenta e noventa do século XX. Nesta fase, adote-se ou não essa terminologia, vive-se sob um modelo de Estado em que o jusnaturalismo liberal e a intervenção social cedem lugar à interferência estatal nas atividades econômicas privadas (em sentido amplo e restrito)11 e setores sensíveis à sociedade sob configuração de escolha regulatória. Busca-se uma atuação eficiente e com foco no bem estar social mediante ponderação nos conflitos distributivos, à luz de princípios — não apenas regras — que trabalham com categorias econômicas. Um dos principais traços dessa fase por que passa a sociedade está no fato de que a atuação estatal em um determinado aspecto do conjunto social ten- 9. cHEvAllIER, Jacques. O Estado pós-moderno. Tradução de Marçal Justen Filho. belo Horizonte: Editora Fórum, 2009. p. 16. 10. Post-modern condition. Minneapolis: University of Minnesota Press, 1985. 11. Eros Roberto Grau entende que estão inseridos nas atividades econô- micas em sentido amplo (gênero) tanto os serviços públicos (espécie) quanto às atividades econômicas em sentido estrito (espécie). GRAU. A ordem econômica..., p. 138 et seq. Em sentido contrário, ao qual aderimos, se manifesta Odete Medauar: “A nosso ver, não parece adequado ao ordena- mento brasileiro considerar o serviço público como atividade econômica. De um lado, tem-se o art. 175, que, de modo claro atribui o serviço público ao poder público, podendo ser realizado pelo setor privado mediante concessão ou permissão. vê-se que a constituição Federal fixou um vínculo de presença do poder público na atividade quali- ficada como serviço público, presença esta que pode ser forte ou fraca, mas que não pode ser abolida. Esta presen- ça se expressa na escolha do modo de realização da atividade, na sua desti- nação ou atendimento de necessidades da coletividade.” MEDAUAR. Segurançajurídica e confiança legítima. In: ÁvIlA (coord.). Fundamentos do esta- do de direito: estudos em home- nagem ao professor Almiro do couto e Silva, p. 125. REGUlAçãO E SERvIçOS PúblIcOS FGV DIREITO RIO 9 12 JUSTEN FIlHO. Curso de direito ad- ministrativo. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 18. 13 conforme advertência de Sabino cassese, a regulação existe quando a classe política se libera de uma parte de seus poderes a favor de entidades não eleitas pelo povo, que são capazes de bloquear as decisões das eleitas. Para que essa condição ocorra, não basta a separação entre regulador e operador. É preciso, também, a separação entre regulador e governo, cujo fim é evitar a politização das decisões. Ele permite distinguir toda forma de intervenção ou controle desenvolvida sob a direção do governo da regulação em sentido estrito. La globalización jurídica. Trad. luis Ortega, Isaac Martín Delgado e Isabel Gallego córceles. Madrid: Marcial Pons, 2006, p. 151. Nas palavras de Egon bockmann Moreira, o fenômeno da concentração sem centralização faz com que o poder estatal seja fragmen- tado numa rede de autoridades inde- pendentes, detentoras de competên- cias autônomas, com o poder central apenas estabelecendo a política geral de todos os setores e as metas a serem atingidas. MOREIRA, Egon bockmann. Agências reguladoras independentes, déficit democrático e a “elaboração processual de normas”. In: Estudos de direito econômico. belo Horizonte: Ed. Fórum, 2004, p. 172. 14 GOMES, Joaquim b. barbosa. Agên- cias reguladoras: a “metamorfose” do Estado e da democracia (uma reflexão de direito constitucional e comparado). In: Direito da regulação. Revista de Direito da Associação dos Procuradores do Novo Estado do Rio de Janeiro. v. IX. Alexandre Santos de Aragão (org.) Rio de Janeiro: lumen Juris, 2002, p. 90. de a produzir reflexos em outro segmento e afetar o direito individual. Nesse período, o problema básico de qualquer Constituição política contemporâ- nea não pode mais ser captado em toda sua extensão por aquela fórmula clás- sica em que se tinha um problema de delimitação do poder estatal em face do cidadão individualmente considerado. Hoje se demanda um disciplinamento da atividade política e econômica, permitindo a satisfação do interesse cole- tivo que as anima, compatibilizando-o com interesses de natureza individual e pública com base em um princípio de proporcionalidade. O Quadro abaixo apresenta a evolução do Estado Moderno até a denomi- nada pós-modernidade: Com as premissas da pós-modernidade e que acabaram por impor fortes mudanças na condução da Ordem Econômica em diversos países, notada- mente na Europa durante a década de 80, o modelo de Estado Regulador foi confirmado no Brasil com a promulgação da Constituição Federal de 1988. Nesse novo sistema dito neoliberal, o modelo liberal e o intervencionismo social cedem lugar à intervenção estatal na ordem econômica social, impon- do-se que “novas necessidades sejam identificadas e expostas, especialmente para que o Estado neutralize os excessos e se valha de seu poder como instru- mento de controle da atuação privada”.12 Diante desse contexto, e sob o aspecto orgânico, a Administração Pública direta, considerando a premente necessidade de atrair investimentos — so- bretudo estrangeiros — decidiu abrir mão da função de regular diretamente os subsistemas privatizados de telecomunicações, energia elétrica, transportes etc., conferindo essa função a entidades reguladoras independentes. 13 O modelo regulatório decorre do fenômeno de “mutação constitucio- nal”14, desencadeado pelas alterações estruturais por que passou a sociedade e que esse acontecimento teve como consequência, no plano das instituições 12. JUSTEN FIlHO. Curso de di- reito administrativo. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 18. 13. conforme advertência de Sabino cassese, a regulação existe quando a classe política se libera de uma parte de seus poderes a favor de entidades não eleitas pelo povo, que são capazes de bloquear as decisões das eleitas. Para que essa condição ocorra, não basta a separação entre regulador e operador. É preciso, também, a sepa- ração entre regulador e governo, cujo fim é evitar a politização das decisões. Ele permite distinguir toda forma de intervenção ou controle desenvolvida sob a direção do governo da regulação em sentido estrito. La globalizaci- ón jurídica. Trad. luis Ortega, Isaac Martín Delgado e Isabel Gallego cór- celes. Madrid: Marcial Pons, 2006, p. 151. Nas palavras de Egon bockmann Moreira, o fenômeno da concentração sem centralização faz com que o poder estatal seja fragmentado numa rede de autoridades independentes, detento- ras de competências autônomas, com o poder central apenas estabelecendo a política geral de todos os setores e as metas a serem atingidas. MOREIRA, Egon bockmann. Agências reguladoras independentes, déficit democrático e a “elaboração processual de normas”. In: Estudos de direito econômico. belo Horizonte: Ed. Fórum, 2004, p. 172. 14. GOMES, Joaquim b. barbosa. Agências reguladoras: a “metamorfo- se” do Estado e da democracia (uma reflexão de direito constitucional e comparado). In: Direito da regulação. Revista de Direito da Associa- ção dos Procuradores do Novo Estado do Rio de Janeiro. v. IX. Alexandre Santos de Aragão (org.) Rio de Janeiro: lumen Juris, 2002, p. 90. REGUlAçãO E SERvIçOS PúblIcOS FGV DIREITO RIO 10 15 Autoridades reguladoras independen- tes. coimbra: coimbra Editores, 2003, p. 10. 16 conrado Hübner Mendes aduz que: “as empresas que saem do domínio es- tatal e passam a fazer parte do domínio privado não podem estar submetidas, exclusivamente, às livres decisões de seus administradores, motivadas uni- camente pelas contingências econômi- cas. Devem, sim, estar em consonância com interesses que transcendem os meramente capitalistas. Por esse mo- tivo, ao retirar da máquina estatal tais empresas, nasce a necessidade de regu- lá-las intensamente.” MENDES, conrado Hübner. Reforma do Estado e agências reguladoras. In: Direito administrativo econômico. carlos Ari Sundfeld (coord.). São Paulo: Malheiros, 2000, p. 108. 17 cHEvAllIER. O Estado pós-moderno, p. 73. 18 SOUTO, Marcos Juruena villela. De- sestatização: privatização, concessões, terceirizações e regulação. 4. ed. Rio de Janeiro: lumen Juris, 2001, p. 441. 19 ARAGãO, Alexandre Santos de. Agên- cias reguladoras e a evolução do direito administrativo econômico. Rio de Janei- ro: Ed. Forense, 2002, p. 68. 20 MARQUES NETO, Floriano de Azevedo. Pensando o controle da atividade regu- lação estatal. In: SÉRGIO GUERRA (co- ord.). Temas de direito regulatório. Rio de Janeiro: Freitas bastos, 2005, p. 202. políticas, o surgimento do imperativo de mudança nas formas de exercício das funções estatais clássicas. O fenômeno da regulação, tal como concebido nos dias atuais, nada mais representa do que uma espécie de corretivo in- dispensável a dois processos que se entrelaçam. De um lado, trata-se de um corretivo às mazelas e às deformações do regime capitalista e, de outro, um corretivo ao modo de funcionamento do aparelho do Estado engendrado por esse mesmo capitalismo. Diante desses fatos, quais devem ser os objetivos dessa função regulatória descentralizada, adotada em diversos países, inclusive no Brasil? Vital Morei- ra e Fernanda Maças15 advertem serem várias as razões para a adoção do mo- delo de regulação estatal por entidades independentes, ao invés da regulação direta pelo Poder Executivo. Uma dessas razões está atrelada ao novo sentido de regulação administrativa. Com efeito, no modelo intervencionista havia uma confusão entre inter- venção direta estatal na atividade econômica e as tarefas regulatórias e, em váriassituações, a função regulatória competia ao próprio operador público, muitas vezes sob a figura do monopólio. Com o aparecimento de novos ope- radores privados na execução de atividades econômicas e serviços públicos, entendeu-se que deveria haver uma separação das funções de regulação e as funções de participação pública na própria atividade regulada.16 Para Jacques Chevallier, a regulação se distingue dos modos clássicos de in- tervenção do Estado na economia, pois consiste em supervisionar o jogo eco- nômico, estabelecendo certas regras e intervindo de maneira permanente para amortecer as tensões, compor os conflitos e assegurar a manutenção de um equilíbrio do conjunto. Ou seja, por meio da regulação o Estado não se põe mais como ator, mas como árbitro do processo econômico, limitando-se a en- quadrar a atuação dos operadores e se esforçando para harmonizar suas ações.17 Marcos Juruena Villela Souto18 leciona que um processo de regulação implica, tipicamente, em várias fases, em que se destacam a formulação das orientações da regulação, a definição e operacionalização das regras, a implementação e aplicação das regras, o controle da aplicação das regras, a sanção dos transgressores e a decisão nos recursos. Paralela e simulta- neamente aos desafios colocados pela globalização, o Estado atual sofre a crise do financiamento das suas múltiplas funções. Diante dessa crise há inevitabilidade da retração do Estado frente às necessidades sociais, ou, alternativamente, adotam-se novas estratégias de atuação compatíveis com a escassez de recursos.19 Nesse contexto, Floriano Azevedo Marques Neto20 anota: “A atividade re- gulatória é espécie do gênero atividade administrativa. Mas trata-se de uma espécie bastante peculiar. Como já pude afirmar em outra oportunidade, é na moderna atividade regulatória estatal que melhor se manifesta o novo paradig- ma de direito administrativo, de caráter menos autoritário e mais consensual, 15. Autoridades reguladoras independentes. coimbra: coimbra Editores, 2003, p. 10. 16. conrado Hübner Mendes aduz que: “as empresas que saem do do- mínio estatal e passam a fazer parte do domínio privado não podem estar submetidas, exclusivamente, às livres decisões de seus administradores, motivadas unicamente pelas con- tingências econômicas. Devem, sim, estar em consonância com interesses que transcendem os meramente capi- talistas. Por esse motivo, ao retirar da máquina estatal tais empresas, nasce a necessidade de regulá-las intensamen- te.” MENDES, conrado Hübner. Reforma do Estado e agências reguladoras. In: Direito administrativo econô- mico. carlos Ari Sundfeld (coord.). São Paulo: Malheiros, 2000, p. 108. 17. cHEvAllIER. O Estado pós- -moderno, p. 73. 18. SOUTO, Marcos Juruena villela. Desestatização: privatização, concessões, terceirizações e regulação. 4. ed. Rio de Janeiro: lumen Juris, 2001, p. 441. 19. ARAGãO, Alexandre Santos de. Agências reguladoras e a evo- lução do direito administrati- vo econômico. Rio de Janeiro: Ed. Forense, 2002, p. 68. 20. MARQUES NETO, Floriano de Aze- vedo. Pensando o controle da atividade regulação estatal. In: SÉRGIO GUERRA (coord.). Temas de direito regu- latório. Rio de Janeiro: Freitas bastos, 2005, p. 202. REGUlAçãO E SERvIçOS PúblIcOS FGV DIREITO RIO 11 21 Sabino cassese chega a afirmar que as entidades reguladoras independen- tes “não devem ponderar o interesse público a elas confiado com outros interesses públicos secundários, como sucede em outros órgãos públicos que formam parte do Estado, começando, sobretudo, pelo governo.”. La globaliza- ción..., p. 151. 22 MARQUES NETO, Floriano de Azevedo. A nova regulação dos serviços públicos. Revista de direito administrativo, Rio de Janeiro, v. 228, p. 13-29, abr./jun.2002. Denominando esse modelo como Esta- do subsidiário, José Alfredo de Oliveira baracho denota que perseguindo os seus fins, harmoniza a liberdade auto- nômica com a ordem social justa, com a finalidade de manter o desenvolvi- mento de uma sociedade formada de autoridades plurais e diversificadas, re- cusando o individualismo filosófico. Por isso, a idéia de subsidiariedade aparece como a solução intermediária entre o Estado-providência e o Estado liberal. bARAcHO, José Alfredo. O princípio de subsidiariedade: conceito e evolução. Rio de Janeiro: Forense, 2000, p. 88. 23 JUSTEN FIlHO, Marçal. O direito das agências reguladoras independentes. São Paulo: Dialética, 2002, p. 21. aberto à interlocução com a sociedade e permeado pela participação do ad- ministrado”. Entretanto, o principal objetivo perseguido com a instituição de um mo- delo estatal regulatório foi a cessão de capacidade decisória sobre aspectos técnicos para entidades descentralizadas em troca de credibilidade e estabi- lidade, demonstrando-se, com isso, que a regulação estatal deixava de ser assunto de Governo para ser assunto de Estado. Adveio, com a globalização, a obrigação de se gerar salvaguardas institucionais que signifiquem um com- promisso com a manutenção de regras (segurança jurídica) e contratos de longo prazo.21 Por esse novo papel do Estado Regulador se abandona o perfil autoritá- rio em prol de uma maior interlocução do Poder Público com a sociedade. Enquanto na perspectiva do liberalismo compete ao poder público assegurar as regras do jogo para livre afirmação das relações de mercado, e no modelo social inverte-se este papel, de modo que a atividade estatal seja a provedora das necessidades coletivas, ao Estado neoliberal são exigidas funções de equa- lização, mediação e arbitragem das relações econômicas e sociais, ponderados os interesses em presença. 22 Nessa ordem de convicções, Marçal Justen Filho23 conclui que a concep- ção regulatória retrata uma redução nas diversas dimensões da intervenção estatal no âmbito econômico, incorporando uma concepção de subsidiarie- dade. Isso importa reconhecer os princípios gerais da livre iniciativa e da livre empresa, reservando-se ao Estado o instrumento da regulação como meio de orientar a atuação dos particulares à realização de valores fundamentais. V. RECURSOS/MATERIAIS UTILIZADOS Leitura obrigatória GUERRA, Sérgio. Discricionariedade e reflexividade: uma nova teoria sobre as escolhas administrativas. Belo Horizonte: Fórum, 2008, p. 73 a 105. Leitura complementar BINEMBOJN, Gustavo. Uma teoria do direito administrativo. Rio de Janei- ro: Renovar, 2006, capítulo II. MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Juridicidade, pluralidade norma- tiva, democracia e controle social. In: Mutações do direito público. Rio de Janeiro: Renovar, 2006, p. 27 e ss. 21. Sabino cassese chega a afirmar que as entidades reguladoras indepen- dentes “não devem ponderar o interes- se público a elas confiado com outros interesses públicos secundários, como sucede em outros órgãos públicos que formam parte do Estado, começando, sobretudo, pelo governo.”. La globa- lización..., p. 151. 22. MARQUES NETO, Floriano de Azevedo. A nova regulação dos serviços públicos. Revista de direito ad- ministrativo, Rio de Janeiro, v. 228, p. 13-29, abr./jun.2002. Denominando esse modelo como Estado subsidiário, José Alfredo de Oliveira baracho denota que perseguindo os seus fins, harmo- niza a liberdade autonômica com a ordem social justa, com a finalidade de manter o desenvolvimento de uma sociedade formada de autoridades plurais e diversificadas, recusando o individualismo filosófico. Por isso, a idéia de subsidiariedade aparece como a solução intermediária entre o Estado-providência e o Estado liberal. bARAcHO, José Alfredo. O princípio de subsidiariedade: conceito e evolução. Rio de Janeiro: Forense, 2000, p. 88. 23. JUSTEN FIlHO, Marçal. O direito das agências reguladoras in- dependentes. São Paulo: Dialética, 2002,p. 21. REGUlAçãO E SERvIçOS PúblIcOS FGV DIREITO RIO 12 VI. AVALIAÇÃO Caso gerador Não há; trata-se da primeira aula do curso. VII. CONCLUSÃO DA AULA O papel do Estado nas relações econômico-sociais se modificou com o passar do tempo. De um Estado interventor, tem-se hoje um papel regulador do Estado, exercido, precipuamente, por entidades descentralizadas, dotadas de tecnicidade e autonomia face ao Poder Executivo central. REGUlAçãO E SERvIçOS PúblIcOS FGV DIREITO RIO 13 AULA 2 I. TEMA O papel do Estado na Ordem Econômica. II. ASSUNTO Regulação e fomento estatal. III. OBJETIVOS ESPECÍFICOS Esclarecer a conformação atual da participação do Estado na Ordem Eco- nômica e como as modificações introduzidas pela Constituição de 1988 in- fluenciaram mudanças nas funções desempenhadas pela Administração Pú- blica no tocante ao desempenho da atividade econômica. IV. DESENVOLVIMENTO METODOLÓGICO Introdução A Constituição de 1988 e a participação do Estado na economia A Constituição de 1988 constitui o ponto de partida para se compreender as mudanças observadas na forma de participação do Estado na economia nos últimos anos. Neste aspecto, deve-se esclarecer que as formas e o grau de participação do Estado na dinâmica econômica de um País dependem fundamentalmente do tipo de organização expresso na Constituição Econômica, na qual se encon- tra a determinação do regime básico de ordenação dos fatores de produção, bem como seus princípios regedores e objetivos almejados. Segundo Manoel Gonçalves Ferreira Filho, quatro são os requisitos que caracterizam uma ordem econômica com sendo “descentralizada” ou “de mercado”: trata-se de uma economia multipolar, constituída por redes de troca entre centros de produção, de oferta de fatores e de consumo, ligados por uma solidariedade funcional; trata-se de uma economia de empresa, que constitui uma “unidade econômica de produção que assegura a ligação entre os mercados de bens e serviços (demanda de consumo final) e os mercados REGUlAçãO E SERvIçOS PúblIcOS FGV DIREITO RIO 14 24 FERREIRA FIlHO, Manoel Gonçalves. Direito constitucional econômico. São Paulo: Saraiva, 1990, p. 9. ver também GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988. 6a ed. São Pau- lo: Malheiros, 2001. 25 Direito constitucional econômico, ob. cit., p. 9. 26 Agências reguladoras e a evolução do direito administrativo econômico. 2ª edição. Rio de Janeiro: Forense, 2003, p. 132. de fatores de produção (trabalho e capital); trata-se de uma economia de cálculos em moeda, sendo que os preços exprimem as tensões de escassez da vida econômica, traduzem as necessidades e as pretensões entre as quais se instaura um equilíbrio econômico; e trata-se de uma economia em que o Estado exerce somente uma interferência indireta e global, podendo orientar, influenciar a economia através de políticas, mas sem cunho determinante.24 A Constituição de 1988 adota o modelo de organização econômica capi- talista, sendo a livre iniciativa princípio fundamental da República (art 1º, IV) e da Ordem Econômica (art. 170, caput); garantindo-se o direito de propriedade, inclusive dos bens de produção (arts. 5º, XII e 170, II) e; respei- tando-se a liberdade de atividade econômica independentemente de prévia autorização, salvo nos casos previstos em lei (arts. 5º, XIII e 170, parágrafo único).25 O art. 173, caput, da Constituição consagra o princípio da subsidiariedade da participação do Estado na atividade econômica: Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a ex- ploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei. Portanto, a Constituição determina que, como regra geral, o Estado se abstenha de exercer diretamente atividade econômica. Para que possa de- sempenhá-la, faz-se necessário que exista previsão constitucional, ou lei que determine haver relevante interesse coletivo ou necessidade relacionada à se- gurança nacional. Sobre o princípio da subsidiariedade e sua aplicação na Ordem Econômi- ca, expõe Alexandre Santos de Aragão: Inserto no Princípio da Proporcionalidade, mais especificamen- te em seu elemento necessidade, está o Princípio da Subsidiariedade, que, na seara do Direito Econômico, impõe ao Estado que se abstenha de intervir e de regular as atividades que possam ser satisfatoriamente exercidas ou auto-reguladas pelos particulares em regime de liberdade. Ou seja, à medida que os valores constitucionalmente assegurados não sejam prejudicados, o Estado não deve restringir a liberdade dos agen- tes econômicos e, caso seja necessário, deve fazê-lo da maneira menos restritiva possível.26 A participação direta do Estado na atividade econômica, quando admi- tida, concretiza-se geralmente pela constituição de empresas públicas e so- ciedades de economia mista, para as quais a Constituição previu um regime 24. FERREIRA FIlHO, Manoel Gonçal- ves. Direito constitucional eco- nômico. São Paulo: Saraiva, 1990, p. 9. ver também GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Consti- tuição de 1988. 6a ed. São Paulo: Malheiros, 2001. 25. Direito constitucional econômico, ob. cit., p. 9. 26. Agências reguladoras e a evolução do direito adminis- trativo econômico. 2ª edição. Rio de Janeiro: Forense, 2003, p. 132. REGUlAçãO E SERvIçOS PúblIcOS FGV DIREITO RIO 15 27 Faz-se relevante mencionar que a jurisprudência mitiga a equiparação das empresas públicas e sociedades de economia mista às pessoas jurídi- cas de direito privado quando aquelas desempenham atividades considera- das serviços públicos. Nesse sentido, veja-se decisão do Supremo Tribunal Federal relativa à Empresa brasileira de correios e Telégrafos, a qual, muito embora apresente natureza jurídica de empresa pública, goza de algumas prerrogativas inerentes à Fazenda Pública, em consideração à relevância do serviço público por ela prestado. ver, a respeito, Recurso Extraordinário nº 229.696, j. em 16.11.2000, Rel. do acórdão Min. Maurício corrêa, maioria. 28 Dispõe o art. 3º da constituição Fede- ral: “constituem objetivos fundamen- tais da República Federativa do brasil: I — construir uma sociedade livre, justa e solidária; II — garantir o desen- volvimento nacional; III — erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; Iv — promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”. 29 Mesmo antes da promulgação da constituição Federal de 1988, o profes- sor Fábio Konder comparato já ensinava que: “Quando se fala em função social da propriedade não se indicam as res- trições ao uso e gozo dos bens próprios. Essas últimas são limites negativos aos direitos do proprietário. Mas a noção de função, no sentido em que é emprega- do o termo nesta matéria, significa um poder, mais especificamente, o poder de dar ao objeto da propriedade des- tino determinado, de vinculá-lo a certo objetivo. O adjetivo social mostra que esse objetivo corresponde ao interesse coletivo e não ao interesse próprio do dominus; o que não significa que não possa haver harmonização entre um e outro. Mas, de qualquer modo, se se está diante de um interesse coletivo, essa função social da propriedade cor- responde a um poder-dever do proprie- tário, sancionável pela ordem jurídica.” cOMPARATO, Fábio Konder. Função social da propriedade dos bens de pro- dução. In Revista de Direito Mercantil. São Paulo: Malheiros, n. 63, p. 73. jurídico próprio e aproximado daquele aplicável aos agentes privados, cujos princípios encontram-se estatuídos no art. 173, §1º, nos seguintes termos: Art. 173. (...)§1º. A lei estabelecerá o estatuto jurídico da empresa pública, da so- ciedade de economia mista e de suas subsidiárias que explorem ativida- de econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços, dispondo sobre: I — sua função social e formas de fiscalização pelo Estado e pela sociedade; II — a sujeição ao regime jurídico próprio das empresas privadas, inclusive quanto aos direitos e obrigações civis, comerciais, trabalhistas e tributários; III — licitação e contratação de obras, serviços, compras e aliena- ções, observados os princípios da administração pública; IV — a constituição e o funcionamento dos conselhos de adminis- tração e fiscal, com a participação de acionistas minoritários; V — os mandatos, a avaliação de desempenho e a responsabilidade dos administradores.27 Para uma melhor compreensão do papel do Estado face à atividade eco- nômica, não se pode desconsiderar que a Constituição de 1988 possui uma plêiade de objetivos da República de conteúdo marcadamente redistributi- vo (art. 3º da Constituição de 1988)28, os quais vão reclamar uma atuação positiva do Estado na seara econômica para a sua efetivação. Além disso, os artigos 5o, XXIII e 170, III, da Constituição Federal determinam que a pro- priedade cumprirá função social29. Ademais, a livre concorrência como prin- cípio fundador da Ordem Econômica (art. 170, IV) exige uma intervenção do Estado na prevenção e repressão do abuso do poder econômico (art. 174, §3º, CF/88). Em adição aos princípios supracitados, uma das chaves para guiar o esfor- ço de hermenêutica da Ordem Econômica é o artigo 174 da Constituição, o qual se mostra bastante elucidativo no que tange ao papel conferido ao Estado na atividade econômica após a inauguração do novo regime consti- tucional: Art. 174. Como agente normativo e regulador da atividade econô- mica, o Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado. 27. Faz-se relevante mencionar que a jurisprudência mitiga a equiparação das empresas públicas e sociedades de economia mista às pessoas jurídi- cas de direito privado quando aquelas desempenham atividades considera- das serviços públicos. Nesse sentido, veja-se decisão do Supremo Tribunal Federal relativa à Empresa brasileira de correios e Telégrafos, a qual, muito embora apresente natureza jurídica de empresa pública, goza de algumas prerrogativas inerentes à Fazenda Pública, em consideração à relevância do serviço público por ela prestado. ver, a respeito, Recurso Extraordinário nº 229.696, j. em 16.11.2000, Rel. do acórdão Min. Maurício corrêa, maioria. 28. Dispõe o art. 3º da constituição Federal: “constituem objetivos funda- mentais da República Federativa do brasil: I — construir uma sociedade livre, justa e solidária; II — garantir o desenvolvimento nacional; III — er- radicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; Iv — promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”. 29. Mesmo antes da promulgação da constituição Federal de 1988, o profes- sor Fábio Konder comparato já ensinava que: “Quando se fala em função social da propriedade não se indicam as res- trições ao uso e gozo dos bens próprios. Essas últimas são limites negativos aos direitos do proprietário. Mas a noção de função, no sentido em que é emprega- do o termo nesta matéria, significa um poder, mais especificamente, o poder de dar ao objeto da propriedade des- tino determinado, de vinculá-lo a certo objetivo. O adjetivo social mostra que esse objetivo corresponde ao interesse coletivo e não ao interesse próprio do dominus; o que não significa que não possa haver harmonização entre um e outro. Mas, de qualquer modo, se se está diante de um interesse coletivo, essa função social da propriedade cor- responde a um poder-dever do proprie- tário, sancionável pela ordem jurídica.” cOMPARATO, Fábio Konder. Função social da propriedade dos bens de produção. In Revista de Direito Mercantil. São Paulo: Malheiros, n. 63, p. 73. REGUlAçãO E SERvIçOS PúblIcOS FGV DIREITO RIO 16 30 A terminologia é de Eros Roberto Grau. A ordem econômica na Constitui- ção de 1988, ob. cit., p. 169. 31 Sobre essa fase, e o início das privati- zações no brasil, ver item 2.4. Interpretando-se esse artigo, observa-se que ao Estado é consagrado o pa- pel precípuo de agente normativo e regulador da atividade econômica, exer- cendo as funções de incentivo, fiscalização e planejamento, na forma em que dispuser a lei. Ou seja, por um lado, o Poder Constituinte não previu a prestação direta da atividade econômica como função primordial do Estado (art. 173, caput, CRFB/88); por outro lado, conferiu-lhe amplos instrumentos de interven- ção indireta, mediante, por exemplo, das funções de planejamento e regula- ção. Nesse sentido, cumpre esclarecer que, ao transferir algumas atividades de utilidade pública à execução por particulares, por meio do processo de desestatização, o Estado brasileiro não deixou de possuir profunda influência sobre a atividade econômica, mas sua tradicional participação direta (como Estado-empresário) foi substituída por uma intervenção primordialmente de direção ou indução30. Portanto, encontra-se no artigo 174 da Constituição Federal uma previsão genérica de ordenação da economia pelo Estado, baseada no exercício do poder-dever fiscalizatório, normativo e sancionador, no qual pode ser ante- visto o embrião do futuro desmembramento dessas competências nos orde- namentos setoriais regulatórios, hoje personificados na figura das agências reguladoras, que serão estudadas adiante neste Curso. O Programa Nacional de Desestatização O último Governo brasileiro comandado por um militar foi o do General João Baptista de Oliveira Figueiredo (1979-1984). Foi nesse momento que se iniciou o “desmantelamento” do Estado Empresário com o Programa Nacio- nal de Desburocratização, iniciando o processo de privatizações.31 Por meio desse Programa, foram preconizadas as seguintes ações, visando “dinamizar e simplificar o funcionamento da Administração Pública Fede- ral”: a) construir para a melhoria do atendimento dos usuários do serviço público; b) reduzir a interferência do Governo na atividade do cidadão e do empresário e abreviar a solução dos casos em que essa interferência é neces- sária, mediante a descentralização das decisões, a simplificação do trabalho administrativo e a eliminação de formalidades e exigências cujo custo eco- nômico ou social seja superior ao risco; c) agilizar a execução dos programas federais para assegurar o cumprimento dos objetivos prioritários do Go- verno; d) substituir, sempre que praticável, o controle prévio pelo eficiente acompanhamento da execução e pelo reforço da fiscalização dirigida, para a identificação e correção dos eventuais desvios, fraudes e abusos; e) inten- sificar a execução dos trabalhos da Reforma Administrativa de que trata o Decreto-Lei nº 200, de 25 de fevereiro de 1967, especialmente os referidos 30. A terminologia é de Eros Roberto Grau. A ordem econômica na Constituição de 1988, ob. cit., p. 169. 31. Sobre essa fase, e o início das pri- vatizações no brasil, ver item 2.4. REGUlAçãO E SERvIçOS PúblIcOS FGV DIREITO RIO 17 32 No caso do setor elétrico, tinha-se o Departamento Nacional de Energia Elétrica — DNAEE, órgão do Ministério das Minas e Energia. 33 PINHEIRO, Armando castelar. “Re- gulatory Reform in brazilian Infras- tructure: Where do We Stand?” Rio de Janeiro, IPEA, Texto para discussão nº 964, maio de 2003, p. 7. Disponível em http://www.ipea.gov.br, consultada em 13.02.2005. no Título XIII;f ) fortalecer o sistema de livre empresa, favorecendo a em- presa pequena e média, que constituem a matriz do sistema, e consolidando a grande empresa privada nacional, para que ela se capacite, quando for o caso, a receber encargos e atribuições que se encontram hoje sob a respon- sabilidade de empresas do Estado; g) impedir o crescimento desnecessário da máquina administrativa federal, mediante o estímulo à execução indire- ta, utilizando-se, sempre que praticável, o contrato com empresas privadas capacitadas e o convênio com órgãos estaduais e municipais; h) velar pelo cumprimento da política de contenção da criação indiscriminada de empre- sas públicas, promovendo o equacionamento dos casos em que for possível e recomendável a transferência do controle para o setor privado, respeitada a orientação do Governo na matéria. Mas foi com a instituição de uma filosofia regulatória na matriz constitu- cional brasileira, implementou-se no país um amplo processo de desestatiza- ção, considerando-o como sendo a retirada da presença do Estado de ativi- dades reservadas constitucionalmente à iniciativa privada (princípio da livre iniciativa) ou de setores onde ela possa atuar com maior eficiência (princípio da economicidade). Assim, a partir do arcabouço constitucional supracitado, em 1990 foi criado o Programa Nacional de Desestatização (“PND”), por intermédio da Medida Provisória nº 155/1990, posteriormente convertida na Lei nº 8.031, de 12.04.1990. Nos termos desta Lei, a desestatização compreende a alie- nação pela União, de direitos que lhe assegurem, diretamente ou por meio de outras controladas, preponderância nas deliberações sociais e o poder de eleger a maioria dos administradores da sociedade; e a transferência, para a iniciativa privada, da execução de serviços públicos explorados pela União, diretamente ou por meio de entidades controladas, bem como daqueles de sua responsabilidade. Até os anos 90, as atividades relacionadas aos setores de infraestrutura eram executadas basicamente por empresas públicas e sociedades de econo- mia mista, sendo a regulação e gerência dos setores de infraestrutura atri- buída a departamentos ministeriais diretamente subordinados aos ministros de Estado.32 Armando Castelar Pinheiro33 comenta que tais departamentos apresentavam as seguintes características, as quais contribuíram significati- vamente para o cenário de ineficiência acima descrito: (i) não eram inde- pendentes do governo; (ii) mostravam-se capturados pelos agentes do setor (as chamadas “estatais”) e (iii) não possuíam competência no que concerne à determinação das tarifas, as quais eram fixadas pelo ministro da Fazenda como parte da política macroeconômica pretendida. Eram também comuns as práticas de subsídios cruzados entre diferentes segmentos de uma mes- ma atividade, assim como o recurso a empréstimos externos garantidos pelo governo, os quais permitiam manter as tarifas artificialmente baixas, dentre 32. No caso do setor elétrico, tinha-se o Departamento Nacional de Energia Elétrica — DNAEE, órgão do Ministério das Minas e Energia. 33. PINHEIRO, Armando castelar. “Regulatory Reform in brazilian Infras- tructure: Where do We Stand?” Rio de Janeiro, IPEA, Texto para discussão nº 964, maio de 2003, p. 7. Disponível em http://www.ipea.gov.br, consultada em 13.02.2005. REGUlAçãO E SERvIçOS PúblIcOS FGV DIREITO RIO 18 34 Auto-regulação profissional e admi- nistração pública. lisboa: Almedina, 1997, p. 38. 35 bRASIl. Plano Diretor da Reforma do Estado. Disponível em: http://www. planalto.gov.br/publi_04/cOlEcAO/ PlANDI.HTM>. Acesso em: 03 abr. 2010. outros mecanismos que impediam a auto-suficiência dos agentes setoriais e, conseqüentemente, o seu funcionamento em bases de mercado. Na verdade, como leciona Vital Moreira, o processo de privatização pode conduzir ao estabelecimento de esquemas reguladores que a anterior proprie- dade pública permitia dispensar. Muitos dos serviços públicos geridos pelo Es- tado começaram por ser serviços públicos concedidos altamente regulados, de modo que o binômio privatização/regulação significa, de certa maneira, retorno às origens.34 Com o diagnóstico acima descrito, não é surpreendente que, em 1988, o Constituinte brasileiro e, posteriormente, o Poder Constituinte Deri- vado (por emendas constitucionais) tenham pretendido inaugurar uma nova forma de participação estatal na vida econômica, conforme a seguir detalhado. As Emendas Constitucionais de 1995 O Executivo Federal iniciou o processo de desestatização brasileiro com a edição da Lei nº 8.031/1990. Em 1995, notadamente com a promulgação de Emendas Constitucionais, o Estado pode avançar com a desestatização. Convém registrar alguns trechos da apresentação do Plano Diretor da Re- forma do Aparelho do Estado,35 que bem reflete seus objetivos: A crise brasileira da última década foi também uma crise do Esta- do. Em razão do modelo de desenvolvimento que Governos anteriores adotaram, o Estado desviou-se de suas funções básicas para ampliar sua presença no setor produtivo, o que acarretou, além da gradual de- terioração dos serviços públicos, a que recorre, em particular, a parcela menos favorecida da população, o agravamento da crise fiscal e, por consequência, da inflação. Nesse sentido, a reforma do Estado passou a ser instrumento indispensável para consolidar a estabilização e asse- gurar o crescimento sustentado da economia. Somente assim será pos- sível promover a correção das desigualdades sociais e regionais. Com a finalidade de colaborar com esse amplo trabalho que a sociedade e o Governo estão fazendo para mudar o Brasil, determinei a elaboração do “Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado”, que define ob- jetivos e estabelece diretrizes para a reforma da Administração Pública brasileira. O grande desafio histórico que o País se dispõe a enfrentar é o de articular um novo modelo de desenvolvimento que possa tra- zer para o conjunto da sociedade brasileira a perspectiva de um futuro melhor. Um dos aspectos centrais desse esforço é o fortalecimento do Estado para que sejam eficazes sua ação reguladora, no quadro de uma economia de mercado, bem como os serviços básicos que presta e as políticas de cunho social que precisa implementar. 34. Auto-regulação profissional e ad- ministração pública. lisboa: Almedina, 1997, p. 38. 35. bRASIl. Plano Diretor da Reforma do Estado. Disponível em: http://www. planalto.gov.br/publi_04/cOlEcAO/ PlANDI.HTM>. Acesso em: 03 abr. 2010. REGUlAçãO E SERvIçOS PúblIcOS FGV DIREITO RIO 19 36 MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Reforma da ordem econômica e finan- ceira. Cadernos de Direito Constitucional e Ciência Política. São Paulo, v. 3, n. 9, p. 22-25, out/dez. 1994. Sobre a necessidade de reforma constitucional para o atingimento dessa política absenteísta, de fato ocorrida em 1995, é digno de menção o posicio- namento de Diogo de Figueiredo Moreira Neto: “Dois são os temas de reforma: o da ordem econômica e o da or- dem financeira. Com relação à necessidade de rever-se o capítulo da ordem econômica basta lembrar da Constituição de 1967-1969, dita estatizante e autocrática, era menos regulatória da economia e menos monopolista que a Constituição de 1988. Passamos de sete para mais de vinte modalidades de intervenção regulatória e de uma para seis pre- visões de intervenções monopolistas. Houve, portanto, um retrocesso. (...) O Estado, ao imiscuir-se na ordem econômica para competir com a sociedade ou para se substituir a ela com exclusividade, ou seja, nas modalidades de intervenção concorrencial e monopolista, se afasta do exercício regular de seu poder coercitivo, do qual detém o monopólio, para ser mais apenas uma empresa ou mais um concorrente. Com isso, ele perde suas características públicas. OEstado se privatiza, perdendo de vista os interesses gerais, que lhes são próprios, para ter interesses privados. Além de não existirem mais recursos para recapitalizar as em- presas do Estado, escasseiam também os recursos para o desempenho de suas atividades públicas: o Estado privatizado acaba se despublici- zando”.36 E conclui que: “privatizar torna-se necessário para republicizar o Estado: fazê-lo retornar às prestações que só ele pode fazer numa sociedade; dar-lhe segurança jurídica, segurança física, segurança social, nos campos da 36. MOREIRA NETO, Diogo de Figuei- redo. Reforma da ordem econômica e financeira. Cadernos de Direito Constitucional e Ciência Po- lítica. São Paulo, v. 3, n. 9, p. 22-25, out/dez. 1994. REGUlAçãO E SERvIçOS PúblIcOS FGV DIREITO RIO 20 37 Idem. Em sentido oposto a esse ra- ciocínio, Paulo bonavides assevera que “todas essas Emendas constitucionali- zam a dependência do País, um crime que jamais a ditadura militar de 1964 ousou perpetrar, pois os seus generais- -presidentes — faça-se-lhes justiça — eram quase todos nacionalistas. Aceito e aplaudido por algumas elites como o determinismo deste fim de século, o ne- oliberalismo arvora a ideologia de sujei- ção, para coroar, como uma fatalidade, a abdicação, nos mercados globais, da independência econômica do País”. Cur- so de direito constitucional. 12a ed. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 613. 38 bRASIl. Plano Diretor da Reforma do Estado. Disponível em: <http://www. planalto.gov.br/publi_04/cOlEcAO/ PlANDI.HTM>. Acesso em: 03 abr. 2010. saúde e da educação, e, tão negligenciado, dar-lhe segurança monetá- ria, uma moeda estável, inconspurcada pelas emissões inflacionárias, essa modalidade imoral de obter recursos sem tributo, ou o que é pior, sem o respeito às reservas e condicionantes tributários”.37 As Emendas Constitucionais cujas matérias estão voltadas à nova política de retirada do Estado da execução direta das atividades econômicas são as de nº 5, de 15 de agosto de 1995, que transferiu aos Estados a competência para a exploração diretamente, ou mediante concessão, dos serviços públicos de dis- tribuição de gás canalizado; nº 6, de 15 de agosto de 1995, que pôs fim à dis- tinção entre o capital nacional e o estrangeiro; nº 7, de 15 de agosto de 1995, que tratou da abertura para navegação de cabotagem; nº 8, de 15 de agosto de 1995, que flexibilizou o monopólio dos serviços de telecomunicações e de ra- diodifusão sonora e de sons e imagens; e nº 9, de 9 de novembro de 1995, que flexibilizou o monopólio da exploração do petróleo e do gás natural. Após a promulgação das Emendas Constitucionais de nºs 5 a 8, foi apro- vado, em 21 de setembro de 1995, o já mencionado Plano Diretor da Re- forma do Aparelho do Estado, sob a motivação de reconstruir o Estado de forma a resgatar sua autonomia financeira e sua capacidade de implementar políticas públicas:38 Este “Plano Diretor” procura criar condições para a reconstrução da Administração Pública em bases modernas e racionais. No passa- do, constituiu grande avanço a implementação de uma Administração Pública formal, baseada em princípios racional-burocráticos, os quais se contrapunham ao patrimonialismo, ao clientelismo, ao nepotismo, vícios estes que ainda persistem e que precisam ser extirpados. Mas o sistema introduzido, ao limitar-se a padrões hierárquicos rígidos e ao concentrar-se no controle dos processos e não dos resultados, revelou- -se lento e ineficiente para a magnitude e a complexidade dos desafios que o País passou a enfrentar diante da globalização econômica. A si- tuação agravou-se a partir do início desta década, como resultado de reformas administrativas apressadas, as quais desorganizaram centros decisórios importantes, afetaram a “memória administrativa”, a par de desmantelarem sistemas de produção de informações vitais para o pro- cesso decisório governamental. É preciso, agora, dar um salto adiante, no sentido de uma Administração Pública que chamaria de “gerencial”, baseada em conceitos atuais de administração e efi ciência, voltada para o controle dos resultados e descentralizada para o poder chegar ao ci- dadão, que, numa sociedade democrática, é quem dá legitimidade às instituições e que, portanto, se torna “cliente privilegiado” dos serviços prestados pelo Estado. 37. Idem. Em sentido oposto a esse raciocínio, Paulo bonavides asse- vera que “todas essas Emendas constitucionalizam a depen- dência do País, um crime que jamais a ditadura militar de 1964 ousou perpetrar, pois os seus generais-presidentes — faça-se-lhes justiça — eram quase todos nacionalistas. Aceito e aplaudido por algu- mas elites como o determi- nismo deste fim de século, o neoliberalismo arvora a ideo- logia de sujeição, para coroar, como uma fatalidade, a abdi- cação, nos mercados globais, da independência econômi- ca do País”. Curso de direito constitucional. 12a ed. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 613. 38. bRASIl. Plano Diretor da Reforma do Estado. Disponível em: <http:// www. planalto.gov.br/publi_04/cO- lEcAO/ PlANDI.HTM>. Acesso em: 03 abr. 2010. REGUlAçãO E SERvIçOS PúblIcOS FGV DIREITO RIO 21 39 Segundo dados obtidos no bNDES (www.bndes.gov.br/privatizacao - acesso em 31 de julho de 2003), entre 1990 e 1992 foram incluídas sessenta e oito empresas no PND, das quais de- zoito foram desestatizadas, com a arre- cadação de cerca de quatro bilhões de dólares norte-americanos, em grande parte através de títulos representati- vos da dívida pública federal. Nos três primeiros anos do PND a estratégia governamental constituiu-se em con- centrar esforços na venda de estatais produtivas, pertencentes a setores anteriormente estratégicos para o de- senvolvimento do País, tais como com- panhias siderúrgicas, petroquímicas e de fertilizantes. Em 1993 e 1994 inten- sificou-se o processo de transferência de empresas produtivas ao setor pri- vado, concluindo-se a privatização das empresas siderúrgicas. Nesse período foram desestatizadas quinze empresas, com a arrecadação de cerca de quatro e meio bilhões de dólares norte-ame- ricanos, em sua maior parte em mo- eda corrente. Em março de 1994, pelo Decreto nº 1.068 o Executivo Federal incluiu no PND as participações societá- rias minoritárias detidas por fundações, autarquias, empresas públicas, socie- dades de economia mista e quaisquer outras sociedades controladas, direta ou indiretamente, pela União Federal. com a eleição do Presidente Fernando Henrique cardoso em 1995 houve uma intensificação nas privatizações. O PND foi apontado como sendo um dos prin- cipais instrumentos do Programa Dire- tor da Reforma do Aparelho do Estado. Entre 1995 e 1996, após significativas alterações da matriz constitucional mediante a flexibilização dos serviços de telecomunicações e do monopólio da exploração do petróleo e do gás natural, dentre outras, e com a edição de lei específica acerca da concessão e permissão dos serviços públicos (lei nº 8.987/95), iniciou-se uma nova fase do PND, em que os serviços públicos foram sendo concedidos à iniciativa privada, com destaque para o setor elétrico, de transportes e telecomunicações. É re- levante registrar que em 1997 ocorreu um dos grandes marcos do PND, com a venda das ações da companhia vale do Rio Doce - cvRD, num processo de desestatização pautado por intensa batalha de liminares judiciais. com a privatização da companhia vale do Rio Doce encerrou-se praticamente a transferência à iniciativa privada das empresas industriais e o início de uma nova fase, cujo foco principal foi a pri- vatização de empresas ligadas à área de infra-estrutura e as concessões de serviços públicos. Além da privatiza- ção da cvRD, merece destaque, ainda, o término da desestatização da Rede FerroviáriaFederal — RFFSA, com a venda da malha Nordeste e o leilão de sobras de 14,65% das ações ordinárias A desestatização implementada no país foi executada mediante várias mo- dalidades39: alienação de participação societária detida pelo Estado, inclusive de controle acionário; abertura de capital; aumento de capital, com renúncia ou cessão, total ou parcial, de direitos de subscrição; alienação, arrendamen- to, locação, comodato ou cessão de bens e instalações; dissolução de socie- dades ou desativação parcial de seus empreendimentos, com a consequente alienação de seus ativos; e concessão, permissão ou autorização de serviços públicos.40 Conforme visto, o programa de desestatização fez-se acompanhar da instituição de toda uma estrutura reguladora por parte do Estado, sen- do relevante, por conseguinte, estudar o significado da regulação do Estado sobre a atividade econômica, a partir das considerações a seguir tecidas, e o conseqüente impacto sobre o estudo do direito administrativo. Regulação da atividade econômica A terminologia “regulação da atividade econômica” apresenta mais de um sentido, dependendo do contexto em que for utilizada. Com efeito, o termo pode ser interpretado tanto como significando um conjunto de atividades estatais voltadas à regulamentação de um determinado setor específico da economia (como, por exemplo, os setores de telecomunicações, energia, se- guros de saúde, petróleo, dentre outros), mas também como o conjunto das atividades estatais voltadas à fiscalização e regulamentação sobre a generali- dade dos agentes da economia, como é o caso das atividades exercidas pelos órgãos ambientais e de defesa da concorrência.41 De outra perspectiva, mas igualmente espelhando a pluralidade de significados que o termo pode abar- car, observa Vital Moreira: 39. Segundo dados obtidos no bNDES (www.bndes.gov.br/privatiza- 40. bem a propósito, o Programa Nacional de Desestatização foi objeto de amplo questionamento perante os Tribunais Superiores, onde destacamos o acórdão do Tribunal Pleno do Supre- mo Tribunal Federal, na ADIN 1078/RJ, julgada em 11 de maio de 1994, que confirmou a constitucionalidade das privatizações, em textual: Ação Dire- ta De Inconstitucionalidade. Medida cautelar. Medida Provisória n. 506, de 25/5/1994, art. 1º, e Decretos n.s 427, de 16/01/1992; 473, de 10/3/1992, e 572, de 22/6/1992, todos concernentes ao Programa Nacional de Desestati- zação, regulado pela lei nº 8.031, de 12/4/1990. 2. Alegação de ofensa ao art. 21, XII, 171, II e 176, par. 1.. da constituição. 3. Não conhecimento da ação, relativamente aos decretos n.s 427, 473 e 572, todos de 1992, por não serem atos normativos, mas, tão- -só, atos administrativos individuais e concretos. 4. Diante da viabilidade de privatização de entidades da adminis- tração indireta, no sistema da consti- tuição, a lei nº 8.031, de 1990, instituiu o Programa Nacional de Desestatiza- ção, cujas modificações poderão ser feitas por lei, de acordo com a política da administração a ser seguida, respei- tadas as normas da constituição. 5. Os fundamentos da inicial não justificam a concessão da cautelar, não se caracte- rizando, também, o “periculum in mora”. 6. Se porventura houver pro- cesso de privatização de empresa, que se tenha como contrário à lei especial referida ou aos princípios da constitui- ção, há vias judiciais adequadas, para eventualmente atacar o ato adminis- trativo especifico, tal como já sucedeu. 7. Ação conhecida, em parte, e, nessa parte, indeferida a medida cautelar. 41. SUNDFElD, carlos Ari. “Intro- dução às Agências Reguladoras”. In SUNDFElD, carlos Ari (coord.). Direito Administrativo Econômico. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 18. Explica ainda o autor: “A regulação, enquanto espécie de intervenção es- tatal, manifesta-se tanto por poderes e ações com objetivos claramente eco- nômicos (o controle de concentrações empresariais, a repressão de infrações à ordem econômica, o controle de preços e tarifas, a admissão de novos agentes no mercado) como por outros de justificativas diversas, mas de efeitos econômicos inevitáveis (medidas am- bientais, urbanísticas, de normalização, de disciplina das profissões etc.).” Ob. Cit., loc. cit. REGUlAçãO E SERvIçOS PúblIcOS FGV DIREITO RIO 22 da companhia Espírito Santo centrais Elétricas - Escelsa. Nesse ano também foi realizada a primeira privatização no setor financeiro, envolvendo as ações do banco Meridional do brasil S/A. Em 16 de julho de 1997 foi editada a lei nº 9.472, a lei Geral de Telecomunicações, tornando-se possível o processo de privatização do setor de telecomuni- cações, no qual foram licitadas con- cessões de telefonia móvel celular para três áreas do território nacional. Em ju- lho de 1998 o governo federal alienou as ações das doze holdings, criadas a partir da cisão do Sistema Telebrás, re- presentando a transferência à iniciativa privada das Empresas de Telefonia Fixa e de longa Distância, bem como das empresas de Telefonia celular-banda A. O resultado financeiro com a venda das ações dessas doze empresas somou 22.057 milhões de reais, sendo que o ágio médio foi de 53,74% sobre o preço mínimo. Foi transferida para a iniciativa privada a exploração do Terminal de contêineres do Porto de Sepetiba (Te- con 1), da cia. Docas do Rio de Janeiro, do cais de Paul e do cais de capuaba (cia. Docas do Espírito Santo-cODESA), Terminal roll-on roll-off (cDRJ) e Porto de Angra dos Reis (cDRJ). No setor elétrico foi realizada a venda das ações de emissão da companhia centrais Elé- tricas Geradoras do Sul S/A - GERASUl, após a cisão efetivada em 29 de abril de 1998. A arrecadação foi de 800,4 milhões de dólares norte-americanos, pagos totalmente em moeda corren- te. Em 1999 o governo arrecadou 128 milhões de dólares norte-americanos com a outorga das concessões para exploração de quatro áreas de telefonia fixa das empresas espelho que fazem concorrência às atuais companhias de Telecomunicações. Em 23 de junho daquele ano foi realizada a venda da Datamec S.A - Sistemas e Processa- mento de Dados, empresa do setor de Informática, que foi adquirida pela Unisys brasil S.A pelo preço mínimo de 47,29 milhões de dólares norte-ame- ricanos. O Porto de Salvador (cODEbA) foi adquirido em 21 de dezembro pela Wilport Operadores Portuários pelo preço mínimo de 21 milhões de dólares norte-americanos. O resultado obtido com o Programa Nacional de Desestati- zação no ano 2000 atingiu cerca de 7,7 bilhões de dólares norte-americanos, representando, assim, a maior receita anual já auferida pelo Programa desde o seu início. O destaque no ano consis- tiu na venda das ações que excediam o controle acionário detido pela União na Petróleo brasileiro S.A. — Petrobrás, e a desestatização do banco do Estado de São Paulo S.A — banespa. A conclusão da mega operação de venda, no brasil e no exterior, das ações da Petrobrás ocorreu em 09 de agosto daquele ano e o valor total auferido foi de 4 bilhões de dólares norte-americanos. Observe-se Quanto à amplitude do conceito, aparecem-nos três concepções de regulação: (a) em sentido amplo, é toda forma de intervenção do Estado na economia, independentemente de seus instrumentos e fins; (b) num sentido menos abrangente, é a intervenção estatal na economia por outras formas que não a participação direta na atividade econômica, equivalendo, portanto, ao condicionamento, coordenação e disciplina da atividade econômica privada; (c) num sentido restrito, é somente o condicionamento normativo da atividade econômica privada (por via de lei ou outro instrumento normativo).42 Dessa forma, a atividade estatal de regulação, em seu sentido mais técnico e restrito, constitui uma espécie do gênero intervenção estatal
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