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A DEPRESSÃO NO MEIO AMBIENTE DO TRABALHO E SUA CARACTERIZAÇÃO COMO DOENÇA OCUPACIONAL

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A DEPRESSÃO NO MEIO AMBIENTE DO TRABALHO E SUA CARACTERIZAÇÃO COMO DOENÇA OCUPACIONAL
Rocheli Margota Künzel (*)
1.	Introdução
Tristeza, frustração, melancolia, ansiedade e medo são sentimentos inerentes ao ser humano e decorrem justamente da capacidade que o homem tem de sentir, de sofrer, de se emocionar e de interagir com os demais. Por mais que se queira e se busque o contrário, há momentos na vida em que os planos não dão certo, as pessoas se magoam, as coisas não acontecem como se gostaria que fossem. Tudo isso é natural e ninguém está imune, pois ser completamente alheio a sentimentos negativos é uma utopia. No entanto, estes maus sentimentos normalmente são passageiros e dão lugar ao bom humor, a alegria e a motivação em poucos dias, eis que a capacidade de se regenerar e dar a volta por cima também é uma característica do ser humano.
O problema surge quando os sentimentos negativos permanecem e se incorporam à realidade diária do indivíduo, se tornando tão avassaladores que impedem o curso da vida. E fica ainda mais grave quando estes sentimentos retiram da pessoa a vontade de viver, a alegria de estar com os seus, a motivação para continuar em busca da realização de seus planos. O problema, portanto, é quando se trata de depressão.
A depressão é uma doença grave e, segundo a Revista Veja (2012), está sendo apontada pela Organização Mundial da Saúde como a quinta maior questão de saúde pública do mundo. É uma das mais antigas doenças, embora sua identificação como patologia própria tenha se dado somente no século XVIII. Caracteriza-se como um transtorno do humor e seus principais sintomas são: melancolia, tristeza profunda, falta de motivação, fadiga, dificuldade de concentração, perda da libido, e em estágio mais grave, até impulsos suicidas.
É uma doença de diagnóstico complexo, tendo em vista não apenas a sua multiplicidade de sintomas, mas principalmente a dificuldade de identificação de um fator preponderantemente responsável pelo seu surgimento. Há quem sustente que se trata de uma doença psicogênica, que se desenvolve em pessoas predispostas, que nascem com perturbações neurológicas. Há, por outro lado, quem defenda qúe a depressão decorre de problemas de ordem emocional, em razão de fatos ocorridos ao longo da vida.
E para tomar o diagnóstico ainda mais difícil, recentemente o trabalho também passou a ser apontado como uma das causas que contribuem para o desencadeamento da depressão. Assim, além da predisposição genética e da estrutura psicoemocional, também se analisa se o meio ambiente laborai pode ter interferido de alguma forma para a precipitação da doença.
É evidente que a hipótese de o trabalho ter contribuição para o desenvolvimento da patologia tem gerado controvérsias e acirrados debates, não apenas no ramo médico, mas principalmente entre doutrinadores e juristas, tendo em vista os efeitos decorrentes do reconhecimento da depressão como uma doença ocupacional, seja no ramo trabalhista, seja no jjrevidenciário. Justifica-se, portanto, a escolha do temaMiscutido no presente estudo.
Nesse contexto, este artigo tem por objetivo discutir sobre a possibilidade de o trabalho ser considerado como uma das causas da depressão, de forma que se possa caracterizá-la como uma doença ocupacional. O estudo discute como problema: o meio ambiente de trabalho pode ser considerado como um fator desencadeante da depressão?
Como hipótese para tal questionamento, entende- -se que para que o meio ambiente de trabalho possa ser caracterizado como fator determinante para o desenvolvimento de um quadro depressivo pelo trabalhador, deve restar comprovado que o trabalho agiu de forma direta e imediata. Se o trabalho se desenvolveu em condições equilibradas e seguras e ainda assim o empregado desenvolve a patologia, é porque estava predisposto geneticamente para a doença. Portanto, para a formação de um diagnóstico mais preciso, é necessário que o meio ambiente laborai seja analisado em conjunto com os demais fatores que podem influenciar o comportamento do trabalhador, como os genéticos, psicológicos, sociais e emocionais.
A pesquisa, tendo em vista o caráter subjetivo da abordagem, é qualitativa, que tem como característica o aprofundamento no contexto estudado e a perspectiva interpreta ti va desses possíveis dados para a realidade. Para obter a finalidade desejada pelo estudo, é empregado o método dedutivo, cuja operacio-
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nalização se dá por meio de procedimentos técnicos baseados na doutrina, legislação e jurisprudência. É adotado este método porque está diretamente vinculado aos objetivos a serem alcançados com o presente trabalho.
Neste sentido inicialmente é tratado sobre o conceito amplo de meio ambiente de trabalho, demonstrando que condições seguras e saudáveis de trabalho são um direito fundamental do trabalhador, para depois tratar sobre a depressão, suas causas e sintomas e sua relação com o trabalho, e por fim, tratar sobre a depressão no meio ambiente de trabalho e sua possível caracterização como doença ocupacional.
2.	Meio ambiente do trabalho e a proteção à saúde do trabalhador
O meio ambiente do trabalho, segundo Nascimento (1999), caracteriza-se como o conjunto de condições existentes no local onde o trabalhador exerce a sua profissão, nele devendo ser compreendidos todos os fatores que de alguma forma interferem no seu bem- -estar, ou seja, todo o complexo de relações humanas na empresa, a forma de organização do trabalho, os equipamentos de proteção coletiva e individual, a jornada de trabalho, os critérios de remuneração, a satisfação dos trabalhadores, os meios de prevenção à fadiga, as condições de salubridade e, também, as medidas de proteção à saúde dos trabalhadores.
A seguir serão descritas noções sobre o meio ambiente do trabalho como um direito fundamental, apresentando-se seu conceito e natureza jurídica, além da evolução da legislação brasileira em relação aos mecanismos de proteção à saúde dos trabalhadores.
2.1	Conceito e natureza jurídica de meio ambiente de trabalho
A legislação brasileira, através da redação do art. 38, inciso I, da Lei n. 6.938/1981 conceituou a expressão "meio ambiente" como sendo "o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas".
A Constituição Federal de 1988 recepcionou este conceito tratando de forma expressa sobre o tema, ao dispor em seu art. 225 que "Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações".
O meio ambiente, de acordo com o referido conceito, sempre foi compreendido, especialmente na concepção do cidadão comum, por três aspectos: o ambiente físico ou natural, nele se inserindo toda a forma de vida, como a flora, a fauna, o solo, a água, a atmosfera, etc.; o ambiente cultural, nele compreendidos os bens e direitos de valor artístico, arqueológico, estético, histórico, turístico e paisagístico; e o ambien
te artificial, que representa o conjunto de edificações particulares ou públicas, onde se verifica a interação do homem com o meio ambiente. (MORAES, 2002).
Recentemente, porém, além desses três ramos, o meio ambiente do trabalho, caracterizado como o conjunto de condições existentes no local de trabalho relativos à qualidade de vida do trabalhador, também passou a integrar o conceito geral de meio ambiente, por força do art. 200, VIII'”, da CF/1988.
Observa-se, portanto, que atualmente o meio ambiente do trabalho merece a mesma proteção dispensada ao meio ambiente global, que cuida de tudo o ue estiver relacionado à sadia qualidade de vida. imperativo, pois, considerando que é o local onde o trabalhador permanece grande parte da sua vida, que se crie e sustente um meio ambiente do trabalho hígido, equilibrado e seguro.
E, de fato, a proteção ao meioambiente do trabalho vem se mostrando como uma das preocupações, tanto de legisladores como de empresários e, aos poucos, as fórmulas e medidas de proteção adotadas na prática vão sendo acolhidas em textos legais, de forma a ampliar o alcance e a abrangência dos cuidados com a saúde do trabalhador. (MELO, 2001)
O meio ambiente do trabalho está relacionado diretamente com o trabalhador na sua atividade cotidiana, no desenvolvimento do labor diário em proveito de outrem. Refere-se, portanto, às condições do local onde o trabalhador exerce o seu labor.
O meio ambiente do trabalho vem a ser o habitat laborai, isto é, tudo o que envolve e condiciona, direta e indiretamente, o local onde o homem obtém os meios para prover o quanto necessário para sua sobrevivência e desenvolvimento, em equilíbrio com o ecossistema. A contrario sensu, portanto, quando aquele "habitat" se revele inidôneo a assegurar as condições mínimas para uma razoável qualidade de vida do trabalhador, aí se terá uma lesão ao meio ambiente do trabalho. (MANCUSO, 2002, p. 59).
Por ser o local onde o trabalhador passa praticamente a maior parte do seu tempo, o meio ambiente laborai não deve ser compreendido apenas como o espaço físico onde o trabalhador permanece, devendo ser englobadas no conceito de ambiente de trabalho todas as condições e instrumentos dispostos no local de trabalho.
O meio ambiente de trabalho é, exatamente, o complexo máquina-trabalho; as edificações do estabelecimento, equipamentos de proteção individual, iluminação, conforto térmico, instalações elétricas, condições de salubridade ou insalubridade, de peri- culosidade ou não, meios de prevenção à fadiga, outras medidas de proteção ao trabalhador, jornadas de trabalho e horas extras, intervalos, descansos, férias, movimentação, armazenagem e manuseio de materiais que forma o conjunto de condições de trabalho etc. (NASCIMENTO, 1999, p. 584).
(1) Art. 200. Ao sistema úrvico de saúde compete, além de outras atribuições, nos termos da lei:
VIU — colaborar na proteção do meio ambiente, nele compreendido o do trabalho.
íol.
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Portanto, o meio ambiente de trabalho compreen- todos os fatores que de alguma forma interferem bem-estar do trabalhador, isso significa, que "não só o ambiente físico, mas todo o complexo de rela- :s humana na empresa, a forma de organização do ibalho, sua duração, os ritmos, os turnos, os crité- s de remuneração, as possibilidades de progresso, satisfação dos trabalhadores etc." (OLIVEIRA apud ÍELO, 2001, p. 28).
Rocha (2002, p. 127) também afirma que "o meio biente do trabalho representa todos os elementos, ter-relações e condições que influenciam o traba- ador em sua saúde física e mental, comportamento valores reunidos no locus do trabalho".
Conclui-se, diante das definições supracitadas, e o meio ambiente do trabalho compreende todos fatores que interferem na vida do trabalhador em u local de trabalho, que por sua vez, não se restrin- e ao estabelecimento físico da empresa, mas sim, en- loba toda sua infraestrutura organizacional, sendo o u objeto a salvaguarda do trabalhador, assim enten- ido não apenas o empregado registrado, mas todos ue oferecem a sua força de trabalho, contra todas as formas de degradação da sua sadia qualidade de vida.
No tocante a sua natureza jurídica, o meio ambiente do trabalho classifica-se como um direito difuso, que, de acordo com Manus apud Melo (2001, p. 32) é "aquele que transcende o direito individual, sendo indivisível e cujos titulares não podem ser individualizados".
Quanto à definição de direito difuso, o Código 'e Defesa do Consumidor, em seu art. 81,1, assim os efine: "interesses ou direitos difusos, assim entendidos para efeitos deste código, os transindividuais, de tureza indivisível, de que sejam titulares pessoas .determinadas e ligadas por circunstância de fato".
Portanto, o meio ambiente do trabalho seguro e saudável, por ser um direito de todos os trabalhadores indistintamente, é um direito transindividual, reconhecido como uma obrigação social constitucional do Estado, ao mesmo tempo em que se trata de um interesse difuso ou mesmo coletivo quando se tratar de determinado grupo de trabalhadores.
De acordo com Rocha (1997, p. 32):
O equilíbrio do meio ambiente de trabalho e a plenitude da saúde do trabalhador constituem direitos essencialmente difusos, inclusive porque a tutela tem por finalidade a proteção da saúde, que, sendo direito de todos, de toda a coletividade, caracteriza-se com um direito eminentemente metaindividual.
A proteção do meio ambiente de trabalho está vinculada diretamente à saúde do trabalhador como cidadão, sendo, nesse contexto, um direito de todos. Conclui-se, portanto, que o meio ambiente do trabalho equilibrado e seguro é um direito fundamental de todos os trabalhadores, indistintamente. E não se trata de um simples direito trabalhista vinculado à re- iação empregatícia, pois a proteção conferida ao em- regado é distinta da assegurada ao meio ambiente
do trabalho, eis que esta última busca salvaguardar a saúde e a segurança do trabalhador, independente se este mantiver um vínculo de emprego ou não, no local onde presta os seus serviços.
2.2	Meio ambiente iio trabalho equilibrado como direito fundamental do trabalhador
O direito de viver num ambiente sadio e equilibrado é um dos mais importantes entre os direitos fundamentais de terceira geração, por isso tem merecido maior atenção na atualidade, tendo em vista que é dele que depende a qualidade de vida do cidadão, e consequentemente, a sua dignidade humana, relacionando-se diretamente com o direito à vida, o maior de todos os direitos fundamentais.
Segundo Garcia apud Melo (2001, p. 57):
Um direito deve ser considerado fundamental quando a sua inobservância implica na impossibilidade do exercício do direito fundamental à vida. Ou seja, o exercício de determinado direito deve ser essencial para a proteção e manutenção do mais fundamental de todos os direitos que é o direito à vida.
Também nesse sentido é a precisa lição de Harb apud Melo (2001, p. 65):
Em síntese, o respeito ao direito do meio ambiente equilibrado implica, necessariamente, na defesa do direito à vida, que é o mais básico dos direitos fundamentais, nele se inserindo por visar diretamente à qualidade de vida (art. 225, caput, da CF/88) como meio de atingir a finalidade de preservação e proteção à existência, ejji qualquer forma que esta se manifeste, bem como cdhdições dignas de existência a presente e às futuras gerações.
O direito ao meio ambiente saudável, portanto, está indissociável mente ligado ao direito à vida. E se está relacionado ao direito à vida, diz respeito ao homem e o local onde ele vive e desenvolve suas potencialidades. No mesmo contexto, a qualidade de vida do homem está diretamente ligada ao equilíbrio do meio ambiente onde ele se situa, incluindo-se o meio ambiente do trabalho, onde passa boa parte de seu tempo.
A essencialidade da proteção do meio ambiente, como etapa importante para o equilíbrio do meio ambiente geral, justifica-se porque, normalmente, o homem passa a maior parte de sua vida útil no trabalho, exata mente no momento de plenitude de suas condições físicas e mentais, razão pela qual o trabalho, habitualmente, determina o estilo de vida, interfere no humor do trabalhador, bem como no de sua família. (MELO, 2001, p. 70)
E se o homem passa boa parte de sua vida no trabalho e o meio ambiente onde desenvolve suas atividades laborais interfere na sua vida pessoal e no relacionamento com amigos e familiares, é inegável que esse ambiente deve ser equilibrado e saudável, de forma a preservar a sua integridade física e moral e lhe garantir desfrutar de sua vida com qualidade.
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O homem, muito além de ser trabalhador, é um ser humano e como detentor dessa condição, “não pode ser encarado como uma máquina formada por músculos e nervos ou um amontoado de células, mas sim como um ser dotado de inteligência,aptidões, sentimentos e aspirações" (MELO, 2001, p. 71). Logo, deve ser tratado com total respeito e dignidade, devendo lhe ser oferecido um ambiente de trabalho compatível com a sua condição de humano, um ambiente adequado, seguro e saudável, de forma que possa desenvolver as suas aptidões e realizar-se não apenas profissionalmente, mas também como pessoa.
Por conta disso “a proteção e a preservação do meio ambiente são fatores primordiais à realização do trabalho digno, em que o trabalhador não se transforme em mera máquina humana de produção, causando prejuízos à sua integridade física, moral e psicológica". (MORAES, 2002, p. 23).
Tem-se, então, que o direito ao meio ambiente equilibrado, incluindo-se o meio ambiente do trabalho é meio útil e necessário para obtenção do direito à vida, com dignidade e qualidade. E o que se percebe atualmente é que há uma valorização do homem, não apenas como trabalhador, mas como ser humano que é digno de toda a proteção estatal.
Frente a todo o exposto, é inequívoca a conclusão no sentido de que o meio ambiente equilibrado é, de fato, um direito fundamental materialmente considerado, eis que está inexoravelmente ligado ao direito à vida, não se sustentando o argumento de que o meio ambiente saudável não seria um direito fundamental por não estar previsto expressamente no título II da CF/1988 que trata sobre os Direitos e Garantias Fundamentais.
O direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado é um direito à vida e à manutenção das bases que a sustentam. Destaca-se da garantia fundamental à vida exposta nos primórdios da construção dos direitos fundamentais, porque não é simples garantia à vida, mas este direito fundamental é uma conquista prática pela conformação das atividades sociais, que devem garantir a manutenção do meio ambiente ecologicamente equilibrado, abster-se de sua deterioração e construir sua melhoria integral das condições de vida da sociedade. (DERANI apud MELO, 2001, P* 68).
Restando claro que o meio ambiente de trabalho interfere em todos os aspectos da vida do homem, é inequívoco que o equilíbrio laborai é um direito fundamental inerente à qualidade e dignidade de vida do trabalhador. A Constituição Federal de 1988, em seu art. 225, quando fala em meio ambiente equilibrado engloba todos os aspectos do meio ambiente, inclusive o laborai.
O meio ambiente de trabalho está inserido no meio ambiente geral (art. 200, VIII, da Constituição), de modo que é impossível alcançar qualidade de vida sem ter qualidade de trabalho, nem se pode atingir meio ambiente equilibrado e sustentável ignorando o meio ambiente do trabalho. Dentro desse espírito, a Constituição de 1988 estabeleceu expressamente que
a ordem econômica deve observar o princípio da defesa do meio ambiente. (OLIVEIRA, 1998, p. 79).
Conclui-se, diante disso, que a sadia qualidade de vida somente pode ser alcançada quando há uma interação equilibrada entre o meio ambiente e os seres que nele habitam. E este meio ambiente não é apenas o meio ambiente natural, cultural ou artificial, mas também, e principalmente, o meio ambiente labo ral. E o meio ambiente do trabalho equilibrado deve ser respeitado e garantido a todos os trabalhadores, como um direito fundamental.
2.3	Proteção legal à saúde do trabalhador
Como salientado, o ordenamento jurídico brasileiro trata do meio ambiente do trabalho saudável e equilibrado como um direito fundamental. Não é diferente com a saúde, a segurança, a higiene e a medicina do trabalho, que foram alçadas à matéria constitucional, sendo direitos indisponíveis de todos os trabalhadores. Isso significa que todos os trabalhadores têm direito a um ambiente de trabalho seguro e sadio, cabendo ao empregador tomar as medidas necessárias para reduzir os riscos inerentes ao trabalho, através da observância de normas de segurança e medicina do trabalho.
Saúde, trabalho, segurança e previdência social são direitos sociais e estão previstos no art. 69, da CF/1988. Já no art. 196, a Carta Magna dispõe que "a saúde é um direito de todos e um dever do Estado", do que se infere, no âmbito do Direito do Trabalho, que a manutenção de um ambiente de trabalho saudável é direito do trabalhador e dever do empregador.
É deverdc*Estado, portanto, garantir e promover a efetividade desses direitos, através de políticas, ações e serviços públicos de saúde, organizados em um sistema único, que podem ser complementados por outros serviços de assistência à saúde prestados por instituições privadas. Nos termos dos incisos II e VIII, do art. 200, da CF/1988, compete ao sistema único de saúde, entre outras coisas, executar as ações de vigilância sanitária e epidemiológica, bem como as de saúde do trabalhador, além de “colaborar na proteção do meio ambiente, nele compreendido o do trabalho".
Ainda em matéria constitucional, destaca-se, como de extrema importância, o art. I9, III, da CF/1988, que eleva a dignidade da pessoa humana como direito fundamental. Todo o ser humano tem direito a uma vida digna, e dentro desse conceito de dignidade encontra-se o direito ao meio ambiente equilibrado, o qual lhe garantirá a "sadia qualidade de vida" preconizada pelo art. 225 do mesmo diploma.
No tocante à proteção da saúde e segurança dos trabalhadores, a CF/1988 elenca, no art. 7®, XXII, como um dos direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, a "redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança".
A interpretação sistemática dos dispositivos constitucionais acima referidos, não deixa dúvidas de que a saúde do trabalhador e o meio ambiente do
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trabalho foram alçados ao patamar de direitos fundamentais de natureza constitucional, cuja garantia é imposta por lei ao empregador.
Em termo de legislação infraconstitucional, e especificamente em relação ao meio ambiente do trabalho, a CLT dispõe expressamente sobre a saúde e segurança do trabalhador, dedicando um capítulo exclusivo para o assunto. O art. 154 e seguintes contempla normas de proteção da saúde do trabalhador, bem como, trazem as medidas a serem adotadas pelas empresas a fim de evitar acidentes de trabalho ou doenças ocu- pacionais. As normas previstas neste capítulo, diante da delegação normativa, foram minuciosamente detalhadas por intermédio da Portaria do Ministério do Trabalho n. 3.214/78 e suas atualizações, que representam, na prática, a consolidação das normas de segurança, higiene e saúde dos trabalhadores no Brasil, por meio de normas regulamentadoras.
Dentre as normas regulamentadoras da referida Portaria, destaca-se como mais relevantes a NR n. 5, que disciplina acerca da instalação da CIPA (Comissão Interna de Prevenção de Acidentes), cujo objetivo é prevenir os acidentes e doenças do trabalho, compatibilizando o labor com a qualidade de vida; a NR n. 17, que dispõe sobre a adaptação das condições de trabalho às características psicofisiológicas dos trabalhadores, dentro de uma análise ergonômica adequada e precisa; a NR n. 6, que prevê a obrigatoriedade do uso dos equipamentos de proteção individual; e a NR n. 9 que estabelece a obrigatoriedade de elaboração e implementação, por parte de todos os empregadores, do Programa de Prevenção de Riscos e Acidentes Ambientais-PPRA, visando à preservação da saúde e da integridade física dos trabalhadores.
Tratando ainda do aspecto relativo ao meio am- bientedo trabalho, foi promulgada a Lei n. 6.514/1977, promovendo profundas e significativas mudanças no capítulo V do Título II da CLT. Nesse sentido, importante destacar a alteração do caput e a inclusão de vários incisos nos arts. 155 e 200 do texto celetista.
Não obstante a isso, em matéria de ambiente do trabalho, o Brasil é signatário de várias Convenções da OIT, dentre as quais destacam-se, no tocante à proteção da saúde do trabalhador a Convenção n. 155 que dispõe sobre normas relativas à segurança, higiene e meio ambiente do trabalho, e conceitua (art. 3°) como lugar de trabalho "todos os lugares onde os trabalhadores devempermanecer ou onde tiverem que acudir por razão de seu trabalho, e que se acham sob o controle direto ou indireto do empregador", e a Convenção n. 161 que trata sobre os serviços de saúde no trabalho.
Observa-se, diante disso, que o ordenamento jurídico brasileiro é bastante adiantado no tocante à proteção da saúde e qualidade de vida do trabalhador, especialmente a partir da CF/1988. Ou seja, a legislação brasileira oferece total respaldo à proteção da saúde e segurança do trabalhador. Basta, portanto, que as normas legais sejam cumpridas.
Diante disso, a observância, pelos empregadores, das normas que tratam sobre a proteção à saúde e se
gurança é fundamental para a manutenção do meio ambiente do trabalho equilibrado e sadio, livre de riscos ambientais que possam acarretar danos à vida dos trabalhadores, e assim, ser garantido o direito do trabalhador de não ser exposto a riscos de danos à sua saúde ou integridade física.
3.	Depressão
A depressão é uma doença psiquiátrica grave, que vem sendo considerada como "o mal do século XXI", pois é um dos problemas de saúde pública que mais tem afetado a população na atualidade, alastrando-se, inclusive, no meio ambiente laborai. Não há dúvidas de que a sociedade em que hoje se vive é complexa, exigindo das pessoas um ritmo cada vez mais acelerado. Não é diferente no ambiente de trabalho, onde as pessoas são cobradas diariamente, além de, não raramente, serem submetidas a condições inadequadas e inseguras de trabalho.
Nesse cenário, tendo em vista a relevância que o assunto vem ganhando, não apenas no meio psiquiátrico, como também para o Direito do Trabalho, eis que o meio ambiente laborai vem sendo apontado como uma das causas da doença, o presente capítulo tem por objeto aprofundar-se no conceito de depressão, explicando suas causas e seus sintomas, e buscando explicar as teorias que vem se sobressaindo entre os estudiosos que se debruçam a apontar os fatores que podem contribuir para o desencadeamento do quadro depressivo.
3.1	Conceito
^ i
A depressão é uma doença psiquiátrica grave que afeta anualmente milhares de pessoas e, de acordo com a Revista Veja (2012), está sendo apontada pela OMS como a quinta maior questão de saúde pública do mundo. Segundo Abreu (2007, texto digital), "atualmente já atinge mais de 350 milhões de pessoas e em 2020, ocupará o segundo lugar no ranking das doenças que mais matam, perdendo apenas para as doenças cardíacas".
Mas, afinal, o que é a depressão? E por que razão ela se alastra de forma tão significativa entre a população?
A depressão é uma das mais antigas e, com certeza, a mais frequente das doenças psiquiátricas diagnosticadas, em que pese sua identificação como patologia própria ser recente, remontando ao século XVIII. Segundo Abreu (2007, texto digital), "a depressão é tão antiga quanto o homem; tem-no acompanhado através de sua história e a literatura universal registrou-a com a veemência e relevância que uma condição tão antiga requer".
Apesar de ser considerada como uma das mais antigas doenças era tratada como uma patologia sem definição, tendo, inicialmente características míticas e poéticas. E, conforme destacam Jorge Neto, Cavalcante e Miranda (2012, p. 07) "somente na idade moderna, a depressão passou a ser visualizada como
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uma patologia com características próprias". De acordo com a Organização Mundial da Saúde, atualmente encontra-se classificada como transtorno do humor, nas modalidades dos códigos F30-39, do CID-10.
No tocante ao seu conceito, ainda hoje persistem dificuldades de se apresentar uma definição que exprima todo o sentido da palavra. Conforme assevera Mendels apud Abreu (2007, texto digital), "a palavra depressão é usada de muitas maneiras: para descrever um estado de humor, um sintoma, uma síndrome (ou um grupo de sinais e sintomas), assim como um grupo específico de doenças".
O termo depressão pode significar um sintoma, que faz parte de inúmeros distúrbios emocionais e não é exclusivo de nenhum, pode significar uma síndrome, representada por muitos e vários sintomas psíquicos e somáticos ou, ainda, pode significar uma doença, caracterizada por marcantes alterações afetivas. (BALLONE; ORTOLANI; PEREIRA NETO, 2007, p. 147).
No entanto, em que pese à dificuldade de se conceituar precisamente o instituto da depressão, sua definição vem sendo formulada com base nos sintomas que a mesma apresenta. Nesse contexto, a autora destaca que:
É uníssono, entretanto, apesar das eternas discussões que existem sobre a definição de depressão, que o transtorno depressivo é semelhante à tristeza, um dos sentimentos humanos mais dolorosos, distinta da comum por sua intensidade, duração, irracionalidade evidente e por seus efeitos na vida dos indivíduos acometidos por ela. (ABREU, 2007, texto digital).
A Organização Mundial da Saúde definiu a doença diferenciando-a das mudanças de humor mais comuns. A depressão se manifesta por um sentimento de tristeza que dura, ao menos, duas semanas, e que impede a pessoa de levar uma vida normal. É fruto da interação de fatores sociais, psicológicos e biológicos (REVISTA VEJA, 2012).
Portanto, com base nestas breves definições, pode- -se dizer que a depressão é uma doença que se caracteriza por afetar o estado de humor da pessoa, deixando-a com um predomínio anormal de tristeza. E um tipo de distúrbio mental que perturba o humor da vítima. Refere-se a um sentimento psíquico e/ou dor moral desencadeada por uma insatisfação ou um acontecimento desagradável que interfere significativamente na diminuição da qualidade de vida, na produtividade e capacitação social do indivíduo.
O transtorno depressivo é caracterizado por sentimentos de melancolia, de profunda tristeza e falta de motivação, que embora tenham sido desencadeados por um sentimento distressante e real na vida da pessoa, a reação emocional tem uma intensidade e uma duração não proporcional e justificável. (AM- BRÓSIO, 2013, p. 194).
Quando se fala em transtorno depressivo não se pode pensar que seja uma tristeza passageira, desencadeada por um acontecimento pontual, mas sim um
estado constante de pessimismo em relação à vida. Afirma Ambrósio (2013, p. 194), que "durante a depressão profunda, as pessoas sentem-se desesperan- çosas e desanimadas e o tempo custa a passar".
Teles (1992, p. 11) diferencia a tristeza da depressão, afirmando que esta não é uma doença, mas simples emoção de quem é capaz de sentir:
A diferença capital entre a tristeza e a depressão, que é uma doença, está para mim em dois pontos importantíssimos: na tristeza, por maior que seja a dor, não há baixa na autoestima; outra coisa, quando se está triste, o mundo parece vazio e sem sentido; já na depressão, é a gente que se sente vazio e acha que não serve para nada, que não há nenhum sentido em nossa própria existência. A pessoa passa a dizer que não realiza nada de importante, que ninguém precisa dela etc.
No mesmo sentido, Ambrosio (2013, p. 195) afirma que a depressão é um estado em que a pessoa se sente dominada por uma tristeza excessiva; pessoas deprimidas perdem o interesse por coisas que normalmente lhe agradam e demonstram sentimentos de inutilidade e de culpa, que as deixam impossibilitadas de sentir prazer:
Em geral, a pessoa que desenvolve a depressão tem uma autocrítica extremada, sendo extremamente rígida em seus julgamentos para com os outros e para consigo mesma. Consequentemente apresenta sentimentos de baixa autoestima e de inferioridade, quando se compara às outras pessoas ou confronta o seu atual momento da vida com momentos do passado. Uma das características mais marcantes da depressão é a inibiçãjQ, geral da motivação e completo pessimismo em relaçao a situações de futuro ou possibilidades de mudança na sua condição atual.
Diante desse cenário de tristeza profunda e permanente e de desmotivaçâo, a pessoa depressiva não investe a sua energia no mundo e não se atém aos estímulos ambientais, tomando-se um indivíduo desorientado, apático e semvontade para mais nada. Prefere viver sozinho e em ambientes escuros, além de, em casos mais extremos, tentar tirar a própria vida.
Como já referido, a depressão vem afetando um número cada vez maior de pessoas. E, segundo a doutrina psiquiátrica, a doença se alastra na proporção em que a sociedade moderna cresce em complexidade, exigindo cada vez mais esforços das pessoas. Segundo Abreu (2007, texto digital), a depressão "é consequência do ritmo acelerado da vida, do caos tecnológico, da alienação das pessoas, do colapso da estrutura familiar, da solidão, do fracasso dos sistemas de crença (religioso, moral, político, social), qualquer coisa que parecia outrora dar significado e direção à vida".
Não há dúvida de que se vive hoje uma realidade de grandes transformações, caracterizada, sobretudo, pelo avanço da tecnologia e pela globalização da economia. Exige-se das pessoas uma adaptação rápida às novas formas de comunicação e transmissão de informações. Não é diferente no processo produtivo,
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que passa a exigir dos trabalhadores uma constante atualização devido à necessidade de adequação às novas tecnologias e à competitividade acirrada.
E, colocados em situações de pressão psicológica, de cobranças excessivas por um melhor desempenho, de medo de perder o emprego, de não adaptar- -se às novas tecnologias, de não alcançar as metas impostas pelo empregador, é razoável considerar que o trabalhador possa desenvolver transtornos de humor, que com o passar do tempo pode ser caracterizado como transtorno depressivo.
O que se verifica, no entanto, é que em descompasso com a rápida transformação da sociedade, a depressão, em que pese ser tão antiga quanto o homem, afligindo as pessoas desde tempos imemoriais, e ser cientificamente comprovada como uma patologia, ainda é vista com preconceito e desprezo pela sociedade. "O transtorno mental da depressão, ainda hoje, é considerado por muitos como "frescura" ou "fraqueza de caráter ', preconceito que gera nas pessoas vergonha em pedir ajuda para que possam receber o tratamento adequado". (ABREU, 2007, texto digital).
O fato, porém, é que a depressão existe, é uma doença grave e requer tratamento. E a cura da doença não depende apenas da pessoa afetada. As pessoas com quem ela convive devem contribuir para o processo de cura, apoiando-a e compreendendo o seu estado patológico. Além disso, o meio onde a pessoa doente desenvolve suas atividades, inclusive o meio ambiente laborai, deve ser propício ao tratamento, ou seja, deve ser saudável e seguro.
3.2	Sintomas
De acordo com Solomon apud Abreu (2007, texto digital), os primeiros sintomas apresentados por uma pessoa depressiva surgem da seguinte forma:
A primeira coisa que vai embora é a felicidade. A pessoa não consegue ter prazer em nada. Isso é notoriamente o sintoma cardeal da depressão. Mas logo outras emoções caem no esquecimento junto com a felicidade: a tristeza como você a conhecia, a tristeza que parecia tê-lo conduzido até esse ponto; o senso de humor; a crença no amor e na sua própria capacidade de amar. Sua mente é sugada a tal ponto que você parece um total imbecil, até para si próprio. Se seu cabelo sempre foi ralo, parece mais ralo ainda; se você tem uma pele ruim, ela fica pior. Você cheira azedo até para si. Você perde a capacidade de confiar nas pessoas, de ser tocado, de sofrer. Posteriormente, ausenta-se de si mesmo.
Em termos mais objetivos, os sintomas mais comuns apresentados pelos portadores de depressão são: isolamento do convívio familiar, apatia, fadiga, dificuldade de concentração, dores crônicas e sem motivo clínico, irritabilidade, insônia ou excesso de sono, diminuição da autoestima e da autoconfiança, redução da energia e diminuição da atividade, idéias de culpabilidade ou de indignidade, perda do interesse ou prazer, lentidão psicomotora, agitação,
perda da libido, falta de apetite e, em estágio mais grave, impulsos suicidas.
O Ministério da Saúde do Brasil, ao elaborar a obra "Doenças Relacionadas ao Trabalho", caracterizou a depressão pela verificação dos seguintes sintomas:
Os episódios depressivos caracterizam-se por humor triste, perda do interesse e prazer nas atividades cotidianas, sendo comum uma sensação de fadiga aumentada. O paciente pode se queixar de dificuldade de concentração, pode apresentar baixa autoestima e autoconfiança, desesperança, idéias de culpa e inutilidade; visões desoladas e pessimistas do futuro, idéias ou atos suicidas. O sono encontra-se frequentemente perturbado, geralmente por insônia terminal. O paciente se queixa de diminuição do apetite, geralmente com perda de peso sensível. Sintomas de ansiedade são muito frequentes. A angústia tende a ser tipicamente intensa pela manhã. As alterações da psicomotricidade podem variar da lentificação à agitação. Pode haver lentificação do pensamento.
Em um estágio mais avançado, chamado de depressão severa:
As características clínicas incluem uma lentidão psicomotora da fala, marcha e gestos, bem como a expressão fisionômica tipicamente deprimida. A pessoa sente que a vida não vale a pena, nada lhe dá prazer. Pode apresentar uma sensação geral de fadiga associada com inquietação, dificuldade de tomar decisões, ruminações obsessivas (pensamentos repetitivos), constipação, queixas generalizadas, sensação de frio. (TELES, 1992, p. 14)
Nem todos os sintomas listados, contudo, necessariamente se apresentam de forma concomitante. "Pelo contrárid^a «aferição se dá pela verificação da presença simultânea de um significativo número deles, que contextualizado, indiquem tratar-se de depressão". (JORGE NETO; CAVALCANTE; MIRANDA, 2012, p. 9).
Além da presença concomitante de no mínimo cinco dos sintomas acima referidos, é necessário, para determinar o diagnóstico da depressão, que se considere o lapso temporal de pelo menos duas semanas em suas ocorrências. Segundo Jorge Neto, Cavalcante e Miranda (2012, p. 10), "para fins de diagnóstico, a manutenção do quadro deve estender-se por lapso superior a duas semanas, sendo que a experiência é reavivada pelo paciente dia após dia, isto é, os sintomas o acompanham diariamente".
Também é importante frisar que os sintomas variam de uma pessoa para outra. Nem todos os portadores de depressão apresentam os mesmos sintomas, sem que isso descaracterize a patologia que os acomete.
Nem todas as pessoas com a doença sentem-se em baixo-astral, apesar da noção que a palavra depressão sugere. Algumas são ansiosas, outras se dizem emocionalmente insensíveis, enquanto outras ainda não apresentam mudança de humor, mas consultam os médicos com sintomas físicos inexplicáveis ou motivadas por uma mudança comportamental. (ABREU, 2007, texto digital).
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Importante destacar, entretanto, que apesar da aparente facilidade na constatação da depressão, tendo em vista os inúmeros sintomas que a mesma apresenta, nem sempre o seu diagnóstico é tarefa simples. "O único modo de se descobrir se a pessoa está deprimida é através da análise dos seus próprios sentimentos e comportamentos" (ABREU, 2007, texto digital). O dano psíquico normalmente não pode ser verificado por meio de exames complementares, fazendo com que sua avaliação seja eminentemente clínica e dependente da sinceridade e precisão das informações repassadas pelo paciente.
3.3	Causas
Tarefa ainda mais difícil do que o diagnóstico preciso da depressão, em face de sua multiplicidade de sintomas, é a identificação de um fator preponderantemente responsável pelo seu surgimento. De acordo com Jorge Neto, Cavalcante e Miranda (2012, p. 10):
E impossível a identificação de um fato pontual responsável pelo quadro depressivo, sendo sua origem multifatorial, sendo que entre eles podemos citar: (a) predisposição genética; (b) ambiente familiar; (c) educação; (d) estrutura psicoemocional; (e) qualidade dos relacionamentos interpessoais; (0 trabalho.
Ambrosio (2013) também defende que, diante da complexidade da patologia, os teóricospreferem referir que a depressão tem várias causas, razão pela qual é considerada como uma doença multifatorial. Sendo assim, destaca entre os fatores desencadeadores do quadro depressivo, entre outros: eventos estressantes ou perdas (morte de um ente querido ou rompimento de uma relação); problemas pessoais como falta de dinheiro ou traumas de infância; algumas doenças como esderose múltipla ou derrame; alteração nos níveis hormonais (pessoas com problemas de tireoi- de ou mulheres em período de menopausa); uso de medicamentos, drogas ou álcool; e ainda, a predisposição genética.
Segundo Teles (1992), outros fatores que podem contribuir para o desencadear da doença são: o stress, o perfeccionismo, o medo do fracasso ou do sucesso, desequilíbrios hormonais, falta de uma relação plena de confiança e cumplicidade, doenças como hipoglicemia, anemia, hipo ou hipertireoidismo, esgotamento, problemas sexuais, perdas na infância, o desenvolvimento da baixa autoestima na infância (pais repreendem os filhos ao invés de realçar suas qualidades), cobranças excessivas por parte dos pais.
Sendo, portanto, uma doença multifatorial, a sua comprovação exige a análise dessas causas diversas. Há que se considerar a pessoa como um todo, no meio social, familiar e laborai em que se insere, além de ser feita uma análise do seu passado, de modo a se verificar os traumas sofridos, os medos, os relacionamentos sociais etc.
Nesse contexto, precisa é a lição de Teles (1992, p. 13) ao asseverar que "uma coisa é certa: se não se considerar a pessoa como um todo, dificilmente se poderá chegar às raízes do mal que a deprime, pois ela,
como produto de sua cultura, tenderá a manifestar as mesmas distorções presentes no mundo que a cerca."
Abreu (2007, texto digital) também trata o tema desta forma, ao asseverar que:
Na maioria das vezes as causas combinam-se, a depressão é provocada por uma união de fatores genéticos e hereditários com problemas de ordem psicológica. É difícil a constatação de que a depressão apareceu do nada, sem motivo aparente, pois não conseguir identificar um acontecimento específico estressante que tenha precipitado o processo de depressão não significa que ele não exista.
Verifica-se, com base nessas definições, que a depressão pode ser endógena ou reativa. A endógena é "aquela que surge do nada em pessoas com predisposição orgânica, através de uma alteração do mecanismo bioquímico do sistema nervoso, que, de alguma maneira, perdeu a capacidade de produzir suficiente quantidade de neurotransmissores". Já a depressão reativa, conforme a mesma autora, "é aquela que ocorre após situações traumáticas e estressantes". (ABREU, 2007, texto digital).
Apesar da simplicidade da classificação, na prática é extremamente difícil constatar se a patologia é decorrente apenas de fatores genéticos e predisposição orgânica, ou se está relacionada com algum fato estressante específico que tenha desencadeado o surgimento do quadro depressivo.
Geralmente, por trás da depressão está muita frustração, muitos desejos não realizados. A mentira e a ilusão do querer e ser muito, próprios de nossa sociedade e dè rtossos dias, deixam, no fundo da nossa alma, um buraco vazio, onde se agigantam e agitam os fantasmas da ansiedade e da depressão (TELES, 1992, p. 22).
Evidente, pois, se tratando de fatores tão subjetivos, de sentimentos tão íntimos, que a definição de uma causa específica para o desencadeamento da depressão é extremamente delicada. Dizer que a doença é eminentemente genética, seria o mesmo que negar todos os traumas sofridos pela pessoa durante sua vida familiar, social ou laborai. Por outro lado, ao atribuir a doença unicamente a fatores psicológicos e sociais, podería se estar negando que o indivíduo já tenha nascido predisponente para a doença. É, portanto, extremamente difícil concluir com certeza qual o fator que levou ao surgimento do episódio depressivo.
E para tomar o diagnóstico ainda mais complexo, recentemente o trabalho também foi incluído entre as causas que podem contribuir para o desenvolvimento da depressão. Portanto, além da predisposição genética, da estrutura psicoemocional, do ambiente familiar e social em que vive a pessoa depressiva, também deverá ser analisado se o trabalho pode ter interferido de alguma forma para a precipitação do quadro depressivo.
E é justamente essa causalidade multifatorial que explica a dificuldade encontrada pelos profissionais de saúde em relacionar o quadro depressivo com as
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relações de trabalho, isolando-as como fator determinante. Segundo Ambrosio (2013, p. 195):
Provar a existência de uma patologia mental específica do trabalho é tarefa das mais árduas, pois essa investigação pressupõe necessariamente a análise da estrutura do trabalhador, assim como a capacidade de resiliência, as condições específicas de trabalho e as estratégias de enfrentamento de estresse desse sujeito.
Abreu (2007, texto digital) também destaca que:
É extremamente difícil, na prática, para a medicina constatar que a patologia é fruto apenas da predisposição orgânica em detrimento dos problemas de origem psicológica, ou seja, que não houve um acontecimento específico estressante que tenha precipitado o processo de depressão.
Resta, diante disso, analisar quais as teorias que buscam explicar o surgimento da depressão, para tentar encontrar possibilidades de relacioná-la com o trabalho, a fim de caracterizá-la como doença ocupacional.
Se a origem da depressão já é questão tormentosa, relacioná-la diretamente com o trabalho é tarefa ainda mais árdua, tendo em vista a própria gênese da doença, que decorre de fatores genéticos, biológicos e psicossociais.
Em que pese ser considerada como um transtorno do humor, a depressão ainda não tem sua origem confirmada, sendo coerente afirmar, entretanto, que não pode ser considerada como puramente psicogê- nica, ou seja, apenas de caráter emocional. O fato é que a questão é polêmica. Conforme destaca Teles (1992, p. 13):
Os médicos preferem acreditar que os deprimidos são pessoas que já nascem com perturbações nos neu- rotransmissores do cérebro. Já os psicólogos pensam que, por detrás de toda depressão, está uma série de problemas de ordem emocional, dificuldades inconscientes que provocam ansiedade nos indivíduos.
Teles (1992, p. 12) ainda assevera que:
Até pouco tempo atrás, acreditava-se que as diversas formas de depressão eram puramente psicogêni- cas, isto é, não tinham nenhuma base orgânica: eram problemas de ordem emocional. Já hoje, é quase que universal pular-se para o polo oposto, afirmando-se que toda depressão é um problema físico, de ordem médica.
Nesse contexto, é que se sobressaem as teorias que procuram identificar o seu surgimento, divididas basicamente em dois grupos. No primeiro grupo, liderado por Christophe Dejours, estão os que adotam a psicanálise como teoria da base de compreensão dos transtornos de humor. De outro lado, estão os adeptos da psiquiatria social, movimento representado por Louis Le Guillant, que lançou as bases na psico- patologia do trabalho.
Christophe Dejours, psiquiatra, psicanalista e er- gonomista que se dedica a estudar os impactos da organização do trabalho sobre a saúde mental dos trabalhadores afirma que as desordens mentais se explicam pela estrutura da personalidade do trabalhador e que o trabalho não é fonte de doenças mentais. Para o autor do livro a Loucura do Trabalho, "as descompensações psicóticas e neuróticas dependem, em última instância, da estrutura das personalidades, adquirida muito antes do engajamento na produção". (DEJOURS, 1992, p. 122).
O autor segue sustentando que:
Contrariamente ao que se poderia imaginar, a exploração do sofrimento pela organização do trabalho não cria doenças mentais específicas. Não existem psicoses do trabalho, nem neuroses do trabalho. Até os maiores e mais ferrenhos críticos da nosologia psiquiátrica não conseguiram provar a existência de uma patologia mental decorrente do trabalho. (DEJOURS,1992, p. 122)
Para o médico, que defende a teoria psicogênica, a organização do trabalho não pode ser considerada como uma fonte de doenças mentais, e as patologias dessa ordem teriam origem exclusivamente nas estruturas específicas de personalidade que cada indivíduo possui. Em outras palavras, "as doenças somáticas aparecem, sobretudo, em indivíduos que apresentam uma estrutura mental caracterizada pela pobreza ou ineficácia das defesas mentais". (DEJOURS, 1992, p. 126).
A teoria sustenta que o trabalho deve estar de acordo com a economia psicossomática de cada trabalhador, cabendo ele "buscar o trabalho que atenda às suas necessidades e aptidões pessoais, pois somente este labor permitirá a estruturação positiva de sua identidade, com completa descarga psíquica da energia, aumentando as resistências da pessoa ao desequilíbrio psíquico". (AMBRÓSIO, 2013, p. 196).
Sendo assim, conclui que cada trabalhador tem a sua maneira de reagir diante das condições de trabalho às quais é submetido. As reações de cada indivíduo decorrem de sua personalidade, que, por sua vez, é constituída de tendências determinantes que desempenham papel ativo no comportamento da pessoa. Conforme Ambrósio (2013, p. 196), "dois indivíduos não fazem os mesmos ajustamentos ao meio e, portanto, não têm a mesma personalidade".
Nesse caso:
Ainda que as condições de trabalho sejam idênticas para dois trabalhadores, cada um fará uma apreensão diferente da realidade em razão da individualidade de sua personalidade. A realidade exterior elaborada pelo trabalhador é fruto de subjetivismo, na medida em que os indivíduos interpretam os fatos de acordo com suas tendências afetivas. (LÓPEZ apud AMBRÓSIO, 2013, p. 196).
Portanto, de acordo com a teoria psicogênica, a realidade é subjetiva, logo é relativa, eis que é deformada pelos processos psíquicos de cada indivíduo. É a sua bagagem genética, biológica e psicossocial
3.4	Teoria psicogênica e teoria psicossociológica
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que vai determinar como a pessoa reagirá diante de uma situação a que for submetida.
A tese defendida por Dejours sofreu críticas justamente por ser decorrente da psicanálise, teoria construída especificamente para um determinado fim. A psicanálise, segundo os críticos, seria muito simplista para ser aplicada no estudo de um fenômeno que deve ultrapassar os limites individuais e alcançar um meio social, como é o trabalho. De acordo com Am- brósio (2013, p. 196), "para a psicanálise, o paciente é responsável por seu sintoma, o homem é autor da sua própria história, tal definição, no entanto, para muitos teóricos é muito simplista para explicar e justificar os verdadeiros impactos do ambiente de trabalho na mente de indivíduo".
Em contraponto à tese de que organização do trabalho não interfere no comportamento mental do trabalhador, o psiquiatra Louis Le Guillant defende que algumas condições específicas de trabalho podem favorecer a eclosão de quadros neuróticos ou psicóticos. Trata-se da teoria psicossociológica, que não negligencia as características subjetivas que individualizam o trabalhador, mas enfatiza o papel do meio no qual ele se insere no desencadeamento dos distúrbios mentais.
Assim, a apreensão do distúrbio mental deve partir de suas dimensões objetivas e subjetivas, ou seja, "devem ser considerados os fatores sociais na gênese da doença mental, assim como as estruturas prévias da personalidade dos trabalhadores não podem ser desprezadas na compreensão do fenômeno". (AMBRO- SIO, 2013, p. 197).
No entanto, apesar de afirmar que deve ser considerado o meio em que o trabalhador depressivo vive, e mesmo após a realização de importantes estudos sobre o impacto das condições de trabalho sobre o sistema psicológico dos trabalhadores, Le Guillant reconheceu a dificuldade de se caracterizar o nexo causai entre essas condições e o trabalho.
O que se pode concluir pela análise dessas duas teorias é que se for considerada apenas a gênese do trabalhador, estar-se-ia negando que influências externas, como fatores sociais, culturais e ambientais pudessem ter contribuído para o desencadeamento da depressão. Por outro lado, se for considerado apenas o meio onde vive o trabalhador, estar-se-ia negligenciando a carga genética e emocional do paciente. Há, portanto, que se analisar cada caso, considerando o trabalhador no contexto em que ele se insere, além de toda sua bagagem genética, emocional e cultural.
Pois, se é certo que a doença mental depende da personalidade que o indivíduo desenvolve ao longo de sua existência, não é menos verdade que aumentaram as pressões sobre a massa trabalhadora. Trabalhadores de todo o mundo estão tendo que conviver com desemprego, competição acirrada, metas elevadas, jornadas extenuantes, exigências de qualificação, domínio de outros idiomas, ameaças de perda do cargo, pressão de clientes e chefes, falta de reconhecimento no trabalho, ausência de perspectivas de crescimento profissional, gestões autoritárias, etc. (AMBROSIO, 2013).
É inegável, diante desse quadro, que as condições de trabalho podem influenciar diretamente na qualidade de vida dos trabalhadores e, consequentemente, vir a desestabilizá-los emocionalmente. Nesse contexto, não pairam dúvidas de que o meio ambiente pode ser considerado como um dos fatores desencadeantes da depressão, desde que analisado em conjunto com os fatores genéticos, biológicos e psicossociais, que permeiam a vida do trabalhador.
Isso não significa, também, que todos os trabalhadores submetidos às mesmas condições de trabalho irão desenvolver um quadro depressivo. Não fosse assim, todas as pessoas que trabalham no mesmo meio ambiente laborai, em iguais condições de trabalho, subordinadas aos mesmos superiores hierárquicos, submetidas à mesma jornada de trabalho etc., acabariam por se tornar depressivas.
Nesse contexto, Teles (1992, p. 21) destaca que:
Uma coisa é certa: diante de fatores comumen- te considerados como desencadeadores, nem todo mundo reage com a depressão, o que nos leva a pensar que deve haver uma predisposição hereditária, um fator genético predisponente para a doença.
Já Jorge Neto, Cavalcante e Moreira (2012, texto digital) falam que:
No que toca à predisposição genética, um dos efeitos biológicos da psicopatologia é a diminuição nos níveis de serotonina. Assim, uma pessoa que, por alguma razão biológica, tenha uma produção diminuta do neurotransmissor poderá ter uma suscetibilidade individual maior aos quadros psicossomáticos. Portanto, diante de uma mesma circunstância fática e ambientql poderá desenvolver a depressão ao passo que outra pessoa não o manifeste.
Acredita-se, portanto, que ainda que o trabalho possa ser visto como um dos fatores desencadeadores da depressão, ele não pode ser considerado de forma isolada, como única causa da patologia, mas sim, deve ser analisado em conjunto com os demais fatores que podem contribuir para o surgimento da doença, porque não há dúvidas de que quando uma pessoa desenvolve um quadro depressivo é porque há fatores genéticos, psicológicos, sociais e emocionais que interferem diretamente no seu comportamento, inclusive no ambiente de trabalho, e que podem ser determinantes para o desenvolvimento da depressão.
4. A depressão no meio ambiente de trabalho e sua caracterização como doença ocupacional
Doenças ocupacionais são aquelas relacionadas à atividade desempenhada pelo trabalhador ou às condições de trabalho às quais ele está submetido. A caracterização da depressão como uma doença ocupacional em razão da organização do trabalho é uma questão que vem sendo debatida de forma constante no meio juslaboralista, tendo em vista o crescente número de demandas de trabalhadores que buscam esse reconhecimento e, consequentemente, os seus desdobramentos legais. E o que se tem percebido é
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que, quando comprovado, de forma inequívoca, que o meio ambiente laborai é inadequado para a saúde do trabalhador, ele pode ser considerado comoum dos fatores que influenciam no surgimento da doença mental, desde que seja analisado em conjunto com os fatores genéticos e psicológicos.
Por isso, a presente seção tem por objeto o exame da possibilidade de o meio ambiente do trabalho ser caracterizado como um fator contributivo para o surgimento da depressão, partindo-se da análise da relação da depressão com o trabalho, para, em seguida, caracterizar a depressão como uma doença ocupacio- nal, e, ao final, discorrer sobre a forma de caracterização do nexo causai entre a depressão e o trabalho.
4.2	A relação da depressão com o trabalho
A sociedade em que se vive atualmente é complexa e exige das pessoas um ritmo de vida cada vez mais acelerado e intenso. Não é diferente no ambiente laborai, onde os trabalhadores são cada vez mais cobrados por cumprimento de metas, por produtividade e qualidade, além de conviverem diariamente com o temor de perderem seus empregos em razão da alta tecnologia e da competitividade acirrada.
Trabalhadores de todo o mundo estão tendo que conviver com desemprego, competição acirrada, metas elevadas, jornadas extenuantes, exigências de qualificação e maiores habilidades, domínio de outros idiomas, rapidez na tomada de decisões, ameaças de perda do cargo, tarefas repetitivas, ausências de pausa no trabalho, exposição a situações prolongadas de tensão, pressão de cliente e chefes, falta de reconhecimento no trabalho, hostilidades nas relações, perda de direitos trabalhistas, ausência de perspectivas de crescimento profissional, recriminação de condutas, gestões autoritárias, disponibilidade ampla à empresa, enfraquecimento das relações sindicais etc. (AM- BROSIO, 2013, p. 197).
Ademais, é preciso considerar que o trabalhador passa boa parte de sua vida no local de trabalho. É neste local que desenvolve suas aptidões profissionais e relações interpessoais, além de ser o trabalho uma forma de identificação do indivíduo na sociedade na qual se insere. De acordo com Teixeira (2007, p. 37), "o ato de trabalhar ganhou valor como elemento de inclusão social e de definição da própria identidade como pessoa".
O trabalho na sociedade contemporânea, ocupa grande espaço na vida do ser humano, não só do ponto de vista temporal, considerando que o trabalhador, via de regra, passa mais de 1/3 do seu dia ligado à atividade profissional, mas também por meio do trabalho é que se dá boa parte de suas relações sociais, bem como ser a profissão desempenhada um dos elementos de identificação social. (JORGE NETO; CAVALCANTE; MIRANDA, 2012, p. 14)
Diante desse quadro, não se pode ignorar que o trabalho pode, de alguma forma, influenciar no humor da pessoa, ainda que de forma sutil, tendo em vista que não há como simplesmente dissociar o tra
balhador de seu trabalho, ou seja, pretender que os fatos ocorridos no ambiente laborai sejam completamente esquecidos ou rejeitados.
Como bem destaca Abreu (2007), a relação da depressão com a atividade laborai sempre foi muito sutil. Entretanto, atualmente, o trabalho vem sendo reconhecido como importante fator no desencadea- mento de distúrbios psíquicos. E, citando Sebastião Geraldo de Oliveira, a autora complementa que:
Num curto espaço de tempo, mudaram as características do trabalho e das relações trabalhistas [...]. Esse quadro de mudanças quase permanente reflete em cheio na saúde mental do trabalhador, acarretando ansiedade, irritação, angústia, frustração, depressão e outras anomalias que podem evoluir para um quadro vasto de doenças psicossomáticas. (ABREU, 2007, texto digital).
Importante destacar que o Ministério da Saúde do Brasil, em sua obra "Doenças Relacionadas ao Trabalho", também tem se manifestado no sentido de que a depressão diagnosticada em um trabalhador pode estar relacionada com a sua atividade laborai. Segundo o órgão governamental:
As decepções sucessivas em situações de trabalho frustrantes, as perdas acumuladas ao longo dos anos de trabalho, as exigências excessivas de desempenho cada vez maior no trabalho, geradas pelo excesso de competição, implicando ameaça permanente de perda do lugar que o trabalhador ocupa na hierarquia da empresa, perda efetiva, perda do posto de trabalho e demissão podem determinar depressões mais ou menos graves^ri^protraídas. (BRASIL, texto digital).
Não há dúvidas, portanto, que as condições laborais e as relações entre os trabalhadores e destes com seus superiores interfere diretamente na vida pessoal do indivíduo, podendo desestabilizá-lo emocionalmente, colaborando, inclusive, para o desenvolvimento de um quadro depressivo.
No entanto, como já destacado, na prática é extremamente difícil para a medicina diagnosticar que a depressão foi desencadeada em razão apenas de situações estressantes no trabalho. Por isso, conforme assevera Abreu (2007) é coerente sempre atribuir o desencadeamento da patologia a uma combinação de fatores genéticos e hereditários com problemas de origem psicológica, como, por exemplo, o trabalho.
E como forma de se descobrir se o trabalho tem ou não influência nos episódios depressivos apresentados pelo trabalhador, há dois aspectos que devem ser analisados: as condições de trabalho a que o empregado se submete e a organização do trabalho, destacando-se, nesta análise, a questão do estresse profissional e do assédio moral.
Abreu (2007, texto digital) destaca que primeiramente, em relação às condições de trabalho, "devem ser verificadas as condições físicas, químicas e biológicas, vinculadas à execução do trabalho, que interferem na saúde mental do trabalhador". Neste aspecto, "o maior enfoque é dado à depressão relacionada ao trabalho ocasionada devido à exposição do empregado a alguma substâncias químicas". (ABREU, 2007, texto digital)
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Nesse caso, importante destacar que a depressão, cuja causa determinante é o contato do trabalhador com substâncias químicas encontradas no meio ambiente de trabalho, já é reconhecida como uma doença ocupacional, constando na relação de doenças ocupacionais do Decreto 3.048/99, que em seu anexo II, grupo V, CID-10 considera os episódios depressivos como doença do trabalho nos casos em que as atividades dos trabalhadores os expõem a tais substâncias químicas.
Em relação ao segundo aspecto a ser analisado, a mesma autora explica que:
Quanto à organização do trabalho esta tem o efeito mais preponderante na determinação dos agravos psíquicos relacionados com o trabalho e, nesta esfera, engloba-se a estruturação hierárquica, a divisão de tarefas, a estruturação temporal do trabalho, as política de pessoal e as formas de gerenciamento adotadas pela empresa. Fica claro, neste aspecto que quanto menor é a participação do trabalhador na organização de sua própria atividade e controle da mesma, maiores as probabilidades de que esta atividade seja desfavorável à saúde mental. (ABREU, 2007, texto digital).
É justamente a depressão que decorre deste segundo aspecto, ou seja, da organização do trabalho, que é mais difícil de ser relacionada com o trabalho, eis que são analisados fatores subjetivos, como a relação do trabalhador com superiores e colegas, além dos fatores individuais e psicossociais que influenciam na forma como o trabalhador irá reagir diante das situações que lhe são impostas.
E nestes casos, considerando que se trata de fatores subjetivos, a análise para constatação da relação da depressão com o trabalho deve ser feita de forma combinada, considerando o trabalhador como um todo. Deve-se avaliar os fatores genéticos e hereditários em conjunto com problemas de origem psicológica, incluindo-se nesse aspecto, o trabalho, especialmente as condições em que o mesmo se desenvolve e a sua organização.
Somente assim, a partir da análise de todos estes fatores em conjunto, é que se pode concluir, ou ao menos presumir, se a atividade laborai desenvolvida pelo trabalhador causou ou contribuiu para o desen- cadeamento de sua depressão. Uma vez constatado que a patologia foi causada pelo trabalho, a depressão passa a ser consideradacomo doença relacionada ao trabalho, equiparando-se, para fins legais, ao acidente de trabalho.
4.2	A caracterização da depressão como doença ocnpa- cional
Doenças ocupacionais são as que estão diretamente relacionadas à atividade desempenhada pelo trabalhador ou às condições de trabalho às quais ele está submetido. O termo é utilizado para caracterizar as doenças relacionadas ao trabalho. E, portanto, gênero, o qual se divide em duas espécies: doenças profissionais e doenças do trabalho.
Conforme Jorge Neto, Cavalcante e Miranda (2012, p. 11) "doença ocupacional é aquela cujo fator de origem está relacionado com as condições de trabalho, correspondendo ao gênero cujas espécies são doença profissional e doença do trabalho".
As doenças profissionais são típicas de uma determinada profissão e são causadas por fatores inerentes à atividade laborai. Neste caso, basta que se comprove a prestação de serviços nesta atividade e o acometimento da doença profissional.
A doença profissional é aquela peculiar a determinada atividade ou profissão, também chamada de doença profissional típica, tecnopatia ou ergopatia. O exercício de determinada profissão pode produzir ou desencadear certas patologias, sendo que, nessa hipótese, o nexo causai da doença com a atividade é presumido. (OLIVEIRA, 2008, p. 46).
As doenças do trabalho, por sua vez, são aquelas desencadeadas em razão de condições especiais em que o trabalho se desenvolve e com ele se relacionam. Não decorrem diretamente da atividade laborativa, mas são adquiridas em função das condições em que o trabalho se realiza.
Segundo Oliveira (2008, p. 46):
A doença do trabalho, também chamada mesopa- tia ou doença profissional atípica, apesar de igualmente ter origem na atividade do trabalhador, não está vinculada necessariamente a esta ou aquela profissão. Seu aparecimento decorre da forma em que o trabalho é prestado ou das condições específicas do ambiente de trabalho.
Ademais, ao contrário do que ocorre com as doenças profissionais, as doenças do trabalho não têm nexo causTli presumido, sendo necessária a comprovação de que a patologia desenvolveu-se em razão das condições especiais em que o trabalho foi realizado. Conforme Monteiro apud Brandão (2009, p. 163) "o traço inerente a essas enfermidades reside no fato de não terem o nexo etiológico presumido com o trabalho, segundo a lei, sendo aquele determinável conforme prova pericial, testemunhai e até mesmo indiciária em alguns casos".
Há que ser salientado ainda que na maioria dos casos, ao contrário do acidente de trabalho típico que decorre de um evento repentino, a doença do trabalho ocorre paulatinamente, ensejando a perda da capacidade laborativa. Nesse sentido, Catharino apud Brandão (2009, p. 117) afirma que ao contrário do acidente de trabalho, "a doença, seja lá qual for, implica a existência de um processo mais ou menos demorado e insidioso, de natureza patológica, havendo mediatismo entre sua causa e seu efeito, surgindo de um processo que se desenvolve no tempo, tendo, assim, a sua história".
A Lei n. 8.213/91 equipara a doença ocupacional ao acidente de trabalho(2), quando em razão das ati
(2) De acordo com o art. 19, da Lei n. 8.213/91, "acidente de trabalho é o que ocorre pelo exercício do trabalho a serviço da empresa ou pelo exercício do trabalho dos segurados referidos no inciso VII do art. 11 desta Lei, provocando lesão corporal ou perturbação
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vidades desempenhadas ou pelas condições de trabalho ocorre o desenvolvimento de alguma moléstia. E, nos termos do art. 20 da referida lei, consideram-se acidente de trabalho as seguintes doenças: a) profissional, assim entendida a produzida ou desencadeada pelo exercício do trabalho peculiar a determinada atividade e constante da respectiva relação elaborada pelo Ministério do Trabalho e da Previdência Social. São denominadas de idiopatias, tecnopatias ou er- gopatias; b) do trabalho, assim compreendida a adquirida ou desencadeada em função de condições especiais em que o trabalho é realizado e com ele se relacione diretamente. São chamadas de mesopatias.
Além disso, nos termos do § 2® do referido artigo, em caso excepcional, constatando-se que a doença não incluída na relação prevista nos incisos I e II deste artigo resultou das condições especiais em que o trabalho é executado e com ele se relaciona diretamente, a Previdência Social deve considerá-la acidente do trabalho.
A depressão, cuja causa determinante é o contato do trabalhador com substâncias químicas encontradas no meio ambiente de trabalho, se tornou tão recorrente que já é reconhecida como uma doença ocupacional, constando na relação de doenças ocupa- cionais do Decreto n. 3.048/99, que em seu anexo II, grupo V, CID-10 considera os episódios depressivos como doença do trabalho nos casos em que as atividades dos trabalhadores os expõem a substâncias como brometo de metila, chumbo e seus compostos tóxicos, manganês e seus compostos tóxicos, mercúrio e seus compostos tóxicos, sulfeto de carbono, entre outras.
Nessas condições, não há dúvidas quanto ao enquadramento da depressão como doença ocupacional, situação que, inclusive, já foi consolidada pela legislação previdenciária. "Nesta seara, em trabalhadores expostos a estas substâncias químicas neu- rotóxicas, entre outras, o diagnóstico de episódios depressivos, excluídas outras causas não ocupacio- nais, permite enquadrar esta doença tendo o trabalho ou a ocupação como causa necessária". (ABREU, 2007, texto digital).
Ocorre, no entanto, que atualmente tem surgido uma nova espécie de depressão supostamente relacionada ao trabalho. Trata-se da depressão desenvolvida em razão da organização do trabalho, a qual o trabalhador se submete. Não se trata de verificar o contato do indivíduo a substâncias químicas, mas sim da exposição do trabalhador a um ambiente de trabalho hostil, inseguro e desequilibrado, que lhe causa sofrimento de ordem psicológica em razão da pressão diária a que se sujeita, o rigor com que é tratado pelos chefes, a ameaça do desemprego, a cobrança excessiva de metas etc.
Nessas situações, quando o empregado alega ser portador de transtornos depressivos deve comprovar, além de sua patologia, a relação de causa e efeito que tem a doença com as atividades laborais desen
funcion.il que cause a morte ou a perda ou redução, permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho.
volvidas, de forma que se possa enquadrar o caso no § 29, do art. 20, da Lei n. 8.213/91. Dessa forma, a doença será equiparada ao acidente de trabalho, e o empregado depressivo terá assegurados direitos pre- videnciários que englobam as prestações devidas ao acidentado ou seus dependentes, como o auxílio-do- ença, auxílio-acidente, aposentadoria por invalidez e pensão por morte.
Nesse sentido, importante é o posicionamento de Abreu (2007, texto digital):
A depressão pode vir a ser considerada como doença do trabalho enquadrando-se na previsão do art. 20, II, da Lei n. 8.213/91 toda vez que o empregado estiver sob a exposição das substâncias tóxicas elencadas no Anexo II, Grupo V da CID 10; ou ainda, quando houver uma ligação profunda entre ela e as doenças supracitadas de forma que não possam ser dissociadas; nesta hipótese as circunstâncias relativas às condições de trabalho, organização etc., deverão ser sempre averiguadas. Em caso excepcional, se a síndrome depressiva não puder se enquadrar em nenhuma das hipóteses acima elencadas, pode ser considerada como doença do trabalho a partir do reconhecimento do nexo causai entre a doença e o trabalho, com base no previsto no art. 20, § 2® da Lei n. 8.213/91.
Portanto, para que se possa caracterizar como doença ocupacional a depressão originada tão somente da exposição da pessoa às condições de intenso de sofrimento no trabalho, a lei previdenciária exige a demonstração de que a patologia resultou das condições especiais em que o trabalho é executado, bem como, que com ele se relacione diretamente, nos termos do § 2®, do art.20, da Lei n. 8.213/91.
O que deve ficar claro é que apesar da depressão não possuir previsão expressa enquanto doença do trabalho quando adquirida ou desencadeada em função de problemas relacionados com o emprego e com o desemprego, condições difíceis de trabalho, ritmo de trabalho penoso, reação após acidente grave, reação após assalto no trabalho, desacordo com o patrão e colega de trabalho, circunstâncias relativas às condições do trabalho, má adaptação à organização do horário de trabalho etc., ela pode ser assim considerada pela sua ligação íntima com os outros dispositivos existentes no mesmo grupo do Anexo II. (ABREU, 2007, texto digital).
Assim sendo, devem ser investigados os fatores que propiciaram o surgimento ou evolução do quadro depressivo, verificando como se dá a organização do trabalho e em que medida o trabalho é fator determinante na eclosão ou agravo do quadro depressivo. É imprescindível, portanto, a configuração do nexo causai entre o dano sofrido e o ambiente laborai.
Configurado o nexo causai, o trabalhador também tem o direito de pleitear, junto ao INSS, o benefício previdenciário cabível, e junto ao empregador, a reparação do dano sofrido, com fundamento no art. 186, do Código Civil. Tal reparação inclui tanto danos materiais, como os danos morais sofridos em decorrência da doença.
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4.3	O reconhecimento do nexo de causalidade entre a depressão e o trabalho
Entende-se por nexo causai o vínculo existente entre a conduta do agente e o resultado por ela produzido. Segundo Cavalieri Filho (2003, p. 67) "é a relação de causa e efeito entre a conduta e o resultado, sendo certo que por meio dele, é possível concluir quem foi o causador do dano".
De acordo com Brandão (2009, p. 154):
O nexo de causalidade é o vínculo necessariamente estabelecido entre a ocorrência do infortúnio e a lesão sofrida pelo empregado. É a relação de causa e efeito entre dano e a desgraça que o atinge, seja esta proveniente do acidente típico ou por extensão, da doença do trabalho ou do trajeto casa-trabalho e vice-versa.
Na teoria clássica da responsabilidade civil, instituída no ordenamento jurídico brasileiro por força dos arts. 186 e 927 do Código Civil e, especificamente no Direito do Trabalho, pelo art. 7e, inciso XXVIII, da Constituição Federal de 1988, para que o lesado tenha direito à reparação são imprescindíveis alguns requisitos: o dano efetivamente sofrido, a culpa do causador deste dano e o nexo de causalidade entre a conduta do ofensor e o dano por ele causado.
Dessa forma, considerando que a regra no direito brasileiro é a teoria da responsabilidade subjetiva, o ofensor somente deverá responder pelos danos que, comprovadamente, decorrerem diretamente de sua conduta. "A necessidade de estabelecer o liame causai como requisito da indenização funda-se na conclusão lógica de que ninguém deve responder por dano a que não deu causa ". (OLIVEIRA, 2008, p. 128). Logo, ainda que haja dano, se sua causa não se relaciona com o comportamento do lesante, inexiste nexo causai e, consequentemente, obrigação de indenizar.
O autor destaca ainda que quando se trata de indenizações decorrentes de acidentes de trabalho, o nexo de causalidade é o mais importante dos requisitos da responsabilidade civil. "Este pressuposto é o primeiro que deve ser investigado, porquanto se o acidente não estiver relacionado ao trabalho é desnecessário, por óbvio, analisar a extensão dos danos ou a culpa patronal". (OLIVEIRA, 2008, p. 129).
Pode haver responsabilidade sem culpa, como no caso da responsabilidade objetiva, mas não pode haver responsabilidade sem nexo causai. Não basta que o agente tenha praticado uma conduta ilícita e que a vítima tenha sofrido um dano, é preciso que esse dano tenha sido causado pela conduta ilícita do agente. (AMBRÓSIO, 2013, p. 198).
Assim, se o liame causai for identificado, caracteri- za-se o acidente de trabalho, e a partir disso, se passa a analisar a culpa do empregador pelos danos sofridos pelo empregado por conta do infortúnio. Se não for verificado o nexo causai, toma-se inviável discutir qualquer indenização. Trata-se de aplicar a teoria da causalidade direta e imediata, segundo a qual o dever de indenizar surge quando o evento danoso é efeito necessário de determinada causa, sendo que o
ofensor somente responde pelos danos que decorrerem diretamente de seus atos.
Em se tratando da depressão, especialmente nos casos que não se enquadram no anexo II, grupo V, CID-10, do Decreto n. 3.048/1999, como já salientado, deve ser considerado que é uma doença multi- fatorial, ou seja, que não há como definir um único fator para o seu surgimento. Em função disso, segundo asseveram Jorge Neto, Cavalcante e Miranda (2012, p. 14), "tem-se uma dificuldade natural da fixação do nexo causai da depressão com as condições do trabalho".
A polêmica travada em torno do nexo causai saú- de/doença mental e trabalho decorre principalmente das diferentes concepções a respeito da gênese da doença mental: alguns estudiosos acham que ela advêm, sobretudo, de fatores orgânicos; outros entendem que a doença mental tem origem exclusivamente psicogênita; e existem aqueles que compreendem o transtorno mental com um fenômeno multidimensio- nal, resultante de um somatório de fatores biopsicos- sociais. (TEIXEIRA, 2007, p. 38).
Verifica-se, portanto, que a caracterização da depressão como doença do trabalho é extrema mente complicada. Em primeiro lugar, em razão das próprias características da doença, considerada como multifatorial; em segundo lugar, porque os peritos da Justiça do Trabalho nem sempre estão qualificados para fazer este diagnóstico, tendo em vista que normal mente são médicos do trabalho, sem titulação em psicologia ou psiquiatria, ciências que estudam de forma mais detalhada o comportamento humano.
Nesse contexto, destaca o Procurador do Trabalho do MPX,da 28 Região, Gustavo Filipe Barbosa Garcia que "existé um nítido descompasso entre o acentuado avanço médico-científico nessa área, quando comparado com o ainda insuficiente desenvolvimento jurídico legislativo no tratamento do tema". (TEIXEIRA, 2007, p. 39).
Além disso, há uma forte resistência da doutrina que vem tratando sobre o assunto em aceitar que a depressão que acomete o trabalhador seja desencadeada pelo trabalho. Ainda é predominante o entendimento de que a doença se origina de vários fatores: genéticos, biológicos e psicossociais. Ou seja, prevalece a ideia de que um transtorno depressivo desenvolve-se com a somatória de fatores, somente incluindo-se o trabalho quando comprovado que o trabalhador se submetia a condições desequilibradas de labor.
Por conta disso, quando o trabalhador apresentar um quadro depressivo, é necessário que o perito que o avaliar faça uma análise minuciosa de todos estes fatores, de modo a diagnosticar, com a maior precisão possível, se as condições de trabalho as quais se submetia podem ter contribuído para o desenvolvimento da doença.
Nesse aspecto, a Resolução n. 1.488/1998 do Conselho Federal de Medicina é bastante exigente no que tange ao estabelecimento do nexo causai pelos médicos. Prevê o art. 25 que:
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Para estabelecimento do nexo causai entre os transtornos de saúde e as atividades do trabalhador, além do exame clínico (físico e mental) e os exames complementares, quando necessários, deve o médico considerar:
I — A história clínica e ocupacional, virtualmente decisiva em qualquer diagnóstico e/ou investigação de nexo causai; II — o estudo do posto de trabalho; III — o estudo da organização do trabalho; IV — os dados epidemiológicos; V — a literatura atualizada; VI — a ocorrência de quadro clínico ou sub-clínico em trabalhador exposto a condições agressivas; VII — a identificação de riscos físicos, químicos, biológicos, mecânicos, estressantes e outros; VIII — os depoimentos e a experiência dos trabalhadores; IX — os conhecimentos e as práticas de outras disciplinas e de seus profissionais,

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