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CiÊNCIA POLÍTICA O PENSAMENTO GREGO

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OS GREGOS E OS FUNDAMENTOS DA POLÍTICA
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	“A política, dentre todas as vocações, é amais nobre. A política, dentre todas as profissões, é a mais vil”.
	 					(Rubem Alves)
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“Política” vem de polis, “cidade”. A cidade era, para os gregos, um espaço seguro, ordenado e manso, onde os homens podiam se dedicar à busca da felicidade. 
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	O político seria aquele que cuidaria desse espaço. A vocação política, assim, estaria a serviço da felicidade dos moradores da cidade. 
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	É preciso que o melhor governo seja aquele que possua uma constituição tal que todo o cidadão possa ser virtuoso e viver feliz. 						(Aristóteles)
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Para compreendermos a evolução política da Grécia antiga, é necessário retrocedemos aos tempos pré-homéricos, quando os povos indo-europeus ali se fixaram. 
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SOBRE A ORDEM GENTÍLICA
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	Já nessa época, esses grupos humanos encontravam-se divididos em genos, famílias coletivas constituídas por um grande número de pessoas sob a liderança de um patriarca. 
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	Assim, podemos afirmar que o período pré-homérico foi o período das comunidades gentílicas. Cada geno constituía uma unidade econômica, social, política e religiosa da sociedade grega. 
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	Os meios de produção (terra, sementes), assim como os bens produzidos (alimentos, objetos), pertenciam a todos os indivíduos, ou seja, a propriedade não tinha caráter particular. 
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	As comunidades gentílicas existiram durante quase todo o período homérico. Por volta do século VIII a.C., iniciou-se o processo de desintegração dos genos.
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	Diversos fatores contribuíram para a dissolução dos genos no final dos tempos homéricos, entre eles o crescimento populacional e o aumento do consumo. 
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	Entretanto, a produção continuava limitada, pois havia poucas terras férteis e as técnicas de produção eram bastante rudimentares. 
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	A luta pela sobrevivência, que dependia basicamente da terra, desencadeou uma série de guerras entre genos. Para enfrentar um inimigo comum, muitos deles se uniram, formando uma fratria. 
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	Reunidas, as fratrias constituíam uma tribo, a qual se submetia à autoridade do filobasileu, o supremo comandante do exército. 
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	A união de várias tribos deu origem ao demos (“povo”, “povoado”), que reconhecia seu líder supremo o baliseu.
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	A crise da sociedade gentílica alterou profundamente a estrutura interna dos genos. Aos poucos, a terra deixou de constituir propriedade coletiva, sendo dividida, de modo desigual, entre os membros dos genos. 
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	As melhores parcelas de terra foram tomadas pelos parentes próximos do pater, e por esse motivo, passaram a serem chamados de eupátridas (“bem-nascidos”). O restante das terras foi dividido entre os georgóis (agricultores), parentes mais distantes do patriarca. 
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	Nesse processo de divisão, os mais prejudicados foram os thetas (marginais), para os quais nada restou. 
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	Com a crise das comunidades gentílicas, a Grécia continental se transformou em palco de inúmeros conflitos e tensões sociais, que resultaram em uma nova dispersão do povo grego – a segunda diáspora. 
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	Os principais fatores que provocaram esse novo deslocamento foram o crescimento demográfico e a escassez de terras cultiváveis, 
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	em grande parte pela concentração da propriedade nas mãos de uma pequena parcela da população.
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	Desse modo, boa parte da população excedente, constituída, principalmente pelos menos beneficiados na partilha das terras, emigrou para regiões do Mediterrâneo ocidental, 
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	ali fundando diversas colônias. Assim surgiram cidades como Tarento e Siracusa, no sul da Itália, região que desenvolveu muito, graças ao cultivo de cereais e que ficou conhecida como Magna Grécia. 
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	Nesse período de instabilidade, por questões de segurança, várias tribos se uniram formando comunidades independentes, 
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	que deram origem às pólis ou cidades-estados. Elas tinham como ponto central a acrópole, parte mais alta da povoação, governada pelo conselho de aristocratas, os eupátridas.
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	As cidades gregas tinham governo próprio e independente, constituindo verdadeiros Estados. 
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	Algumas se tornaram muito famosas: Atenas, Esparta, Tebas, etc. Em cada uma delas desenvolveu-se um tipo particular de civilização:
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	Esparta cultivava o militarismo; Atenas dedicou-se, sobretudo, ao pensamento, às artes e à cultura. Mas havia entre elas muita coisa em comum no que se refere à vida urbana.
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	Provavelmente, as primeiras cidades (polis) surgiram na Jônia, e nos séculos VIII e VII a. C.
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	Portanto, com a desintegração lenta da ordem gentílica, aumentam as diferenças sociais: a desigual divisão de terras privilegia alguns, gerando uma aristocracia baseada na riqueza decorrente da propriedade da terra. 
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	Em contrapartida, os que perdem seus lotes passam a trabalhar para os ricos, e aos poucos, se desenvolve o sistema escravista.
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	A intensificação do sistema escravista acentua a divisão do trabalho, desenvolve o artesanato e estimula o comércio, a partir da necessidade de dar vazão aos produtos excedentes. 
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	Com a invenção da moeda, a economia deixa de ser natural, baseada na troca em espécie, e passa a ser monetária, 
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	enriquecendo os comerciantes e proprietários de oficinas, os quais, ainda sem representação política, tendem a aspirar ao poder. 
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	A luta contra a aristocracia exige a institucionalização da lei escrita, a fim de evitar abusos do poder, o que favorecerá a nova classe.
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	Sabemos que Atenas possuía cerca de meio milhão de habitantes, dos quais trezentos mil eram escravos e cinqüenta mil metecos (estrangeiros); 
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	excluídas ainda as mulheres e as crianças, apenas 10% do corpo social tinha o direito de decidir por todos, e era considerado cidadão. 
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	Atentando para o número de escravos, percebemos que nesse período a escravidão grega atinge o seu apogeu: em todas as atividades artesanais encontramos o braço escravo, “libertando” o cidadão livre para as funções teóricas, políticas e de lazer, consideradas mais nobres.
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O PENSAMENTO POLÍTICO DE PLATÃO
	
	Platão é de origem aristocrática, e seu posicionamento teórico de valorização da reflexão filosófica o leva a conceber uma sofocracia (etimologicamente, “poder da sabedoria”). 
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	Platão ilustra o seu pensamento com o famoso mito da caverna. Segundo ele, o filósofo, representado por aquele que se liberta das correntes
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	ao contemplar a verdadeira realidade, passa da opinião à ciência e deve retornar ao meio dos homens para orientá-los
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Platão imagina uma cidade utópica, a Callipolis (Cidade Bela). Etimologicamente, utopia significa “em nenhum lugar” (em grego, ou-tópos). Platão imagina uma cidade que não existe, mas que deve ser o modelo da cidade ideal. 
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	Partindo do principio de que as pessoas são diferentes e por isso devem ocupar lugares e funções diversas na sociedade, Platão imagina que o Estado, e não a família, deveria se incumbir da educação das crianças. 
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Para isso, propõe uma forma de comunismo onde são eliminadas a propriedade e a família, a fim de evitar a cobiça e os interesses decorrentes dos laços afetivos.
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	O Estado orientaria as formas de eugenia para evitar casamentos entre desiguais, oferecendo melhores condições de reprodução e, ao mesmo tempo, criando creches para a educação coletiva das crianças. 
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	A educação promovida pelo Estado deveria, segundo Platão, ser igual para todos até os 20 anos, quando dar-se-ia o primeiro corte identificando as pessoas que, por possuírem “alma de bronze”, 
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	têm a sensibilidade grosseira e, por isso, devem se dedicar à agricultura, ao artesanato e ao comércio. Estes cuidariam da subsistência da cidade. Os outros continuariam os estudos por mais dez anos, 
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	até o segundo corte. Aqueles
que tivessem a “alma de prata” e a virtude da coragem essencial aos guerreiros constituiriam a guarda do Estado, os soldados que cuidariam da defesa da cidade. 
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	Os mais notáveis, que sobrariam desses cortes, por terem a “alma de ouro”, seriam instruídos na arte de pensar a dois, ou seja, na arte de dialogar. Estudariam filosofia, que eleva a alma até o conhecimento mais puro e é a fonte de toda verdade. 
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	Aos cinqüenta anos, aqueles que passassem com sucesso pela série de provas estariam aptos a ser admitidos no corpo supremo dos magistrados. Caberia a eles o governo da cidade, o exercício do poder, pois apenas eles teriam a ciência da política. 
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	Sua função seria manter a cidade coesa. Por serem os mais sábios, também seriam os mais justos, uma vez que justo é aquele que conhece a justiça. A justiça constitui a principal virtude.
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	Se, para Platão, a política é “a arte de governar os homens com o seu consentimento” e o político é precisamente aquele que reconhece essa difícil arte, só poderá ser chefe quem conhece a ciência política. 
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	Por isso, a democracia é inadequada, pois desconhece que a igualdade deve se dar apenas na repartição dos bens, mas nunca no igual direito ao poder. 
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	Para que o Estado seja bem governado, é preciso que “os filósofos se tornem reis, ou que os reis se tornem filósofos”.
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	Para que o Estado seja bem governado, é preciso que “os filósofos se tornem reis, ou que os reis se tornem filósofos”.
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	Platão propõe um modelo aristocrático de poder. No entanto, como já vimos, não se trata de uma aristocracia da riqueza, mas da inteligência, em que o poder é confiado aos melhores, ou seja, é uma sofocracia.
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	O rigor do Estado concebido por Platão ultrapassa de muito a proposta de educação. Se a virtude suprema é a obediência à lei, o legislador tem de conseguir o seu cumprimento pela persuasão em primeiro lugar, 
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	aguardando a atuação consentida dos cidadãos livres e racionais. Caso não o consiga, deve usar a força: a prisão, o exílio ou a morte. Da mesma forma, a censura é justificável quando visa manter a integridade do Estado.
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	Para Platão, a democracia não corresponde aos ideais platônicos porque, por definição, o povo é incapaz de possuir a ciência política. 
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	Quando o poder pertence ao povo, é fácil prevalecer a demagogia, característica do político que manipula e engana o povo (etimologicamente, “o que conduz o povo”). 
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	Platão critica a noção de igualdade na democracia, pois para ele a verdadeira igualdade é de ordem geométrica, porque se baseia no valor pessoal que é sempre desigual (já que uns são melhores do que outros), não considerando todos igualmente cidadãos.
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	Por fim, a democracia levaria fatalmente à tirania, a pior forma de governo, exercida pela força por um só homem e sem ter por objetivo o bem comum. O tirano é a antítese do magistrado-filosófico. 
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PENSAMENTO POLÍTICO DE ARISTÓTELES
	Aristóteles, discípulo de Platão, logo se torna crítico do mestre e elabora uma filosofia original. Aristóteles critica o autoritarismo de Platão, considerando sua utopia impraticável e inumana. 
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	Recusa a sofocracia platônica que atribui poder ilimitado a apenas uma parte do corpo social, os mais sábios, o que torna a sociedade muito hierarquizada. 
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	Não aceita a proposta de dissolução da família nem considera que a justiça, virtude por excelência do cidadão, possa vir separada da amizade. É o que veremos a seguir.
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A CIDADE FELIZ
	A reflexão aristotélica sobre a política não se separa da ética, pois a vida individual está imbricada na vida comunitária. 
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	Se Aristóteles conclui que a finalidade da ação moral é a felicidade do indivíduo, também a política tem por fim organizar a cidade feliz. Por isso, diante da noção fria de justiça proposta por Platão, Aristóteles considera que a justiça não pode vir separada da Philia. 
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	A palavra grega Philia, embora possa ser traduzida por “amizade”, é um conceito mais amplo quando se refere à cidade. Significa a concordância entre as pessoas que tem idéias semelhantes e interesses comuns, 
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	donde resulta a camaradagem, o companheirismo. Daí a importância da educação na formação ética dos indivíduos, preparando-os para a vida em comunidade.
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	A amizade não se separa da justiça. Essas duas virtudes se relacionam e se complementam, fundamentando a unidade que deve existir na cidade. Se a cidade é a associação dos homens iguais, a justiça é o que garante o princípio da igualdade. 
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	Justo é o que se apodera de parte que lhe cabe, é o que distribui o que é devido a cada um.
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	Mas é preciso lembrar que Aristóteles não se refere à igualdade simples ou aritmética, mas à justiça distributiva, segundo a qual a distribuição justa é a que leva em conta o mérito das pessoas. 
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	Isso significa que não se pode dar o igual para desiguais, já que as pessoas são diferentes. A justiça está intimamente ligada ao império da lei, pela qual se faz prevalecer a razão sobre as paixões cegas. 
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	Retomando a tradição grega, a lei é para Aristóteles o princípio que rege a ação dos cidadãos, é a expressão política da ordem natural. 
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	Mesmo considerando a importância das leis escritas, Aristóteles valoriza o direito consuetudinário (ou seja, das leis não-escritas, trazidas pelo costume):
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	“Com efeito, de nada serve possuir as melhores leis, mesmo que ratificadas por todo o corpo de cidadãos, se estes últimos não estiverem submetidos a hábitos e a uma educação presente no espírito da Constituição”.
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QUEM É O CIDADÃO?
	O fato de se morar na mesma cidade não torna seus habitantes igualmente cidadãos. São excluídos os escravos, os estrangeiros, as mulheres. O que também não significa que todo homem livre, nascido na pólis, possa participar da administração da justiça ou ser membro da assembléia governante. 
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	Para Aristóteles, é necessário ter qualidades que variam conforme as exigências da constituição aceita pela cidade. De forma geral, Aristóteles concorda que o bom governante deve ter a virtude da prudência prática (phronesis), pela qual será capaz de agir visando o bem comum. Trata-se de virtude difícil, que não se acha disponível a muitos.
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	Por isso, exclui da cidadania a classe dos artesões, comerciantes e trabalhadores braçais em geral, em primeiro lugar, porque a ocupação não lhes permite o tempo de ócio necessário para participar do governo e, 
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	em segundo lugar, porque, reforçando o desprezo que os antigos tinham pelo trabalho manual, Aristóteles pondera que esse tipo de atividade embrutece a alma e torna o indivíduo incapaz da prática de uma virtude esclarecida.
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	Vale lembrar ainda a polêmica justificativa de Aristóteles à escravidão. Para ele, os homens livres e concidadãos aprisionados em guerras não deveriam ser escravizados, 
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	mas o mesmo não acontece com os “bárbaros”, nome genérico atribuído aos não-gregos, por serem estes considerados inferiores e, portanto, possuírem uma disposição natural para a escravidão. 
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	Por isso seria legítimo o controle que o senhor exerce sobre o escravo, e Aristóteles recomenda apenas que o tratamento não seja cruel, devendo mesmo ser estabelecidos laços afetivos, como nas antigas famílias dos tempos homéricos, quando os escravos pertenciam ao lar. 
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	É bem verdade que no estágio de desenvolvimento urbano do século IV a.C. a escravidão não se restringia apenas às atividades domésticas, mas se estendia ao comércio e à manufatura, em condições bastante adversas de trabalho.
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FORMAS DE GOVERNO
Além de escrever as diversas constituições, Aristóteles estabelece uma tipologia das formas de governo que se tornou clássica. Usa o critério do número, da quantidade, para distinguir a monarquia (ou governo de um só), a aristocracia (ou governo de um
pequeno grupo) e a politéia (ou governo da maioria). 
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	Em seguida, usando o critério axiológico (de valor), Aristóteles considera que as três formas podem ser consideradas boas, quando visam o interesse comum, e más, corrompidas, degeneradas, quando têm como objetivo o interesse particular. 
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	Portanto, a cada uma das três formas boas descritas correspondem respectivamente três formas degeneradas: a tirania se refere ao governo de um só quando visa o interesse próprio; 
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	a oligarquia prevalece quando vence o interesse dos mais ricos ou nobres; e a democracia quando a maioria pobre governa em detrimento da minoria rica. 
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	Embora considere a monarquia, a aristocracia ou a politéia formas corretas e adequadas ao exercício do poder, Aristóteles prefere a última. 
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	Talvez isso se deva à constatação feita de que a tensão política sempre deriva da luta entre ricos e pobres; se um regime conseguir conciliar esses antagonismos, torna-se mais propício para assegurar a paz social.
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	Aqui Aristóteles retoma o critério já usado na ética: o de que a virtude sempre está no meio termo. descobre na classe média – constituída pelos indivíduos que não são nem muito ricos,nem muito pobres – 
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	as condições de virtude para criar uma política estável. “Onde a classe média é numerosa, raramente ocorrem conspirações e revoltas entre os cidadãos”.
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CONCLUSÃO
	A teoria política grega está voltada para a busca dos parâmetros do bom governo. Platão e Aristóteles envolvem-se nas questões políticas de seu tempo e criticam os maus governos. 
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	Platão tentou implantar um governo justo na Sicília; esboçou a idealizada Callípolis como modelo a ser alcançado. Aristóteles, mesmo recusando a utopia de seu mestre, aspira também a uma cidade justa e feliz. 
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	Isso significa que esses filósofos elaboraram uma política de natureza descritiva, já que a reflexão parte da análise de uma política de fato, mas é também de natureza normativa e prescritiva porque pretende indicar quais são as boas formas de governo. 
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	A ligação entre ética e política é evidente, na medida em que a questão do bom governo, do regime justo, da cidade boa, depende da virtude do bom governante. Esta tendência persiste na Idade Média, até ser criticada no Século XVI, a partir de Maquiavel.

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