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1 NEUROLOGIA GABRIELA CARVALHO ABREU EXAME FÍSICO NEUROLÓGICO: 1. Pescoço e coluna cervical: Deve-se incluir os exames seguintes: Carótidas: palpação e ausculta de ambas as carótidas separadamente, comparando-se a amplitude e verificando se existe frêmito e/ou sopro. O objetivo é observar se existe ou não estenose ou oclusão da artéria, que são condições que determinam distúrbios vasculares encefálicos. Região supraclavicular: A ausculta é importante porque é nesse ponto que a artéria vertebral tem origem na subclávia. Limitação dos movimentos: Paciente deve executar os movimentos de extensão, flexão, rotação e lateralização da cabeça. Caso haja dificuldade ou limitação para a realização desses movimentos, isso deve ser assinalado com a respectiva graduação. Eventual dificuldade ou limitação talvez esteja relacionado com doenças osteoarticulares, musculares, meningites, radiculopatias e hemorragia subaracnóidea. Rigidez da nuca: Com o paciente em decúbito dorsal, o examinador coloca uma das mãos na região occipital e, suavemente, tenta fletir a cabeça do paciente. Se o movimento for fácil e amplo, não há rigidez nucal. Caso contrário, fala-se em resistência, defesa ou simplesmente rigidez da nuca. Esta última situação é frequentemente encontrada na meningite e na hemorragia subaracnóidea. o Prova de Brudzinski: Com o paciente em decúbito dorsal e membros estendidos, o examinador coloca uma das mãos sobre o tórax do paciente e, com a outra colocada na região occipital, executa uma flexão forçada da cabeça. É positiva quando o paciente flete o membros inferiores, mas há casos nos quais se observam flexão dos joelhos e expressão fisionômica de sensação dolorosa. Transição craniovertebral: Observe especialmente se existe o chamado "pescoço curto": o qual pode denunciar deformidades ósseas, como redução numérica das vértebras cervicais, platibasia e impressão basilar, nitidamente visíveis ao exame radiológico. 2 NEUROLOGIA GABRIELA CARVALHO ABREU Coluna lombossacra: limitação dos movimentos: solicita-se ao paciente executar movimentos de flexão, extensão, rotação e lateralização da coluna e observa-se a eventual existência de limitação na amplitude dos movimentos e em que grau. o Provas de estiramento da raiz nervosa: Prova de Lasègue: com o paciente em decúbito dorsal e os membros inferiores estendidos, o examinador levanta um dos membros inferiores estendido. A prova é positiva quando o paciente reclama de dor na face posterior do membro examinado, logo no início da prova (cerca de 30° de elevação). Prova de Kernig: consiste na extensão da perna, estando a coxa fletida em ângulo reto sobre a bacia e a perna sobre a coxa. Considera-se a prova positiva quando o paciente sente dor ao longo do trajeto do nervo ciático e tenta impedir o movimento. Essas provas são utilizadas para o diagnóstico de meningite, hemorragia subaracnóidea e radiculopatia ciática. Manobra de Patrik: pode trazer informações importantes sobre o estado da articulação coxofemoral. O tornozelo é colocado ao lado medial do joelho contralateral, e o joelho ipsilateral é levemente deslocado em direção à mesa de exame. Isso força a articulação do quadril e, geralmente, não exacerba a compressão verdadeira das raízes nervosas. Em geral, o resultado é positivo na presença de doença da articulação do quadril. 3 NEUROLOGIA GABRIELA CARVALHO ABREU Nervos raquidianos: Pelo menos quatro nervos devem ser examinados em seus trajetos periféricos pelo método palpatório: o Nervo cubital, no nível do cotovelo, na epitróclea. o Nervo radial, na goteira de torção no terço inferior da face externa do braço. o Nervo fibular, na parte posterior e inferior da cabeça da fíbula. o Nervo auricular, na face lateral da região cervical. Algumas doenças (hanseníase, neurite intersticial hipertrófica) acometem seletivamente os nervos periféricos, espessando-os. Marcha ou equilíbrio dinâmico: Cada pessoa tem um modo próprio de andar, extremamente variável, individualizado pelas suas características físicas e mentais. A todo e qualquer distúrbio da marcha, dá-se o nome de disbasia. A disbasia pode ser uni ou bilateral, e os tipos mais representativos são determinados a seguir: o Marcha helicópode, ceifante ou hemiplégica: Ao andar, o paciente mantém o membro superior fletido em 90°C no cotovelo e em adução, e a mão fechada em leve pronação. O membro inferior do mesmo lado é espástico, e o joelho não flexiona. Assim, a perna tem de se arrastar pelo chão, descrevendo um semicírculo quando o paciente troca o passo. Esse modo de caminhar lembra o movimento de uma foice em ação. Aparece nos pacientes que apresentam hemiplegia, cuja causa mais comum é acidente vascular cerebral. o Marcha anserina ou do pato: O paciente para caminhar acentua a lordose lombar e vai inclinando o tronco ora para a direita, ora para a esquerda, alternadamente, lembrando o andar de um pato. É encontrada em doenças musculares e traduz diminuição da força dos músculos pélvicos e das coxas. o Marcha parkinsoniana: O doente anda como um bloco enrijecido, sem o movimento automático dos braços. A cabeça permanece inclinada para a frente, e os passos são miúdos e rápidos, dando a impressão de que o 4 NEUROLOGIA GABRIELA CARVALHO ABREU paciente "corre atrás do seu centro de gravidade" e vai cair para a frente. Ocorre nos portadores da doença de Parkinson. o Marcha cerebelar ou marcha do ébrio: Ao caminhar, o doente ziguezagueia como um bêbado. Esse tipo de marcha traduz incoordenação de movimentos em decorrência de lesões do cerebelo. o Marcha tabética: Para se locomover, o paciente mantém o olhar fixo no chão; os membros inferiores são levantados abrupta e explosivamente, e, ao serem recolocados no chão, os calcanhares tocam o solo de modo bem pesado. Com os olhos fechados, a marcha apresenta acentuada piora, ou se torna impossível. Indica perda da sensibilidade proprioceptiva por lesão do cordão posterior da medula. Aparece na tabes dorsalis (neurolues), na mielose funicular (mielopatia por deficiência de vitamina B12, ácido fólico ou vitamina B6), mielopatia vacuolar (ligada ao vírus HIV), mielopatia por deficiência de cobre após cirurgias bariátricas, nas compressões posteriores da medula (mielopatia cervical). o Marcha de pequenos passos: É caracterizada pelo fato de o paciente dar passos muito curtos e, ao caminhar, arrastar os pés como se estivesse dançando marchinha. Aparece na paralisia pseudobulbar e na atrofia cortical da senilidade. o Marcha vestibular: O paciente com lesão vestibular (labirinto) apresenta lateropulsão quando anda; é como se fosse empurrado para o lado ao tentar mover-se em linha reta. Se o paciente for colocado em um ambiente amplo e lhe for solicitado ir de frente e voltar de costas, com os olhos fechados, ele descreverá uma figura semelhante a uma estrela, daí ser denominada também marcha em estrela. o Marcha escarvante: Quando o doente tem paralisia do movimento de flexão dorsal do pé, ao tentar caminhar, toca com a ponta do pé o solo e 5 NEUROLOGIA GABRIELA CARVALHO ABREU tropeça. Para evitar isso, levanta acentuadamente o membro inferior, o que lembra o "passo de ganso" dos soldados prussianos. o Marcha claudicante: Ao caminhar, o paciente manca para um dos lados. Ocorre na insuficiência arterial periférica e em lesões do aparelho locomotor. o Marcha em tesoura ou espástica: Os dois membros inferiores enrijecidose espásticos permanecem semifletidos, os pés se arrastam e as pernas se cruzam uma na frente da outra quando o paciente tenta caminhar. O movimento das pernas lembra uma tesoura em funcionamento. Esse tipo de marcha é comum nas manifestações espásticas da paralisia cerebral. Equilíbrio estático: Solicita-se ao paciente continuar na posição vertical, com os pés juntos, olhando para frente. Nessa postura, ele deve permanecer por alguns segundos. Em seguida, ordena-se a ele que feche as pálpebras = prova de Romberg. No indivíduo normal, nada se observa, ou apenas ligeiras oscilações do corpo são notadas (prova de Romberg negativa). Na vigência de determinadas alterações neurológicas, ao fechar os olhos, o paciente apresenta oscilações do corpo, com desequilíbrio e forte tendência à queda (prova de Romberg positiva). A tendência para a queda pode ser: o Para qualquer lado e imediatamente após interromper a visão, indicando lesão das vias de sensibilidade proprioceptiva consciente; sempre para o mesmo lado, após transcorrer pequeno período de latência, traduzindo lesão do aparelho vestibular. A prova de Romberg é positiva nas labirintopatias, na tabes dorsalis, na degeneração combinada subaguda e na polineuropatia periférica. Em algumas ocasiões, sobretudo nas lesões cerebelares, o paciente não consegue permanecer de pé (astasia) ou o faz com dificuldade (distasia), alargando, então, sua base de sustentação pelo afastamento dos pés para compensar a falta de equilíbrio. Tais manifestações não se modificam quando se interrompe o controle visual (prova de Romberg negativa). 6 NEUROLOGIA GABRIELA CARVALHO ABREU Motricidade voluntária: Os atos motores podem ser de três tipos: voluntário, involuntário e reflexo. O primeiro atua sobre os demais no sentido de inibição, controle e moderação. O sistema motor voluntário que comanda os movimentos dos vários segmentos do corpo é representado pelos neurônios centrais ou superiores, situados no córtex frontal, precisamente na circunvolução pré- central, cujos axônios formam o fascículo corticoespinal, também chamado piramidal, indo terminar em sinapse nos vários níveis medulares com os segundos neurônios motores. Esses são chamados periféricos ou inferiores e se localizam nas colunas ventrais da medula. Seus axônios alcançam a periferia e terminam nos músculos. A motricidade voluntária é estudada por meio de duas técnicas, uma para a análise da motricidade espontânea e outra para a avaliação da força muscular. o Motricidade espontânea: Solicita-se ao paciente executar uma série de movimentos, especialmente dos membros, tais como: abrir e fechar a mão, estender e fletir o antebraço, abduzir e elevar o braço, fletir a coxa, fletir e estender a perna e o pé. Durante a execução desses movimentos, é importante observar se eles são realizados em toda a sua amplitude. Não o sendo, cumpre avaliar o grau e a sede da limitação. Um dado importante que pode ajudar nessa fase de avaliação da motricidade é a realização de movimentos repetitivos dos dedos, como, por exemplo, aproximar e afastar o indicador e o polegar. Nas síndromes piramidais, existe diminuição da velocidade dos movimentos. Nas extrapiramidais, como a parkinsoniana, há também diminuição da velocidade dos movimentos; porém, observa-se progressiva diminuição da amplitude dos movimentos com a realização deles. O mesmo pode ser observado nos movimentos de flexão e extensão da coxa sobre o tronco, com o paciente sentado. Afastadas as condições locais extraneurológicas (abscesso, anquilose, retração tendinosa), as causas de redução ou abolição do movimento voluntário são representadas por lesão dos neurônios motores e/ou de suas vias. Força muscular: O paciente procura fazer os mesmos movimentos mencionados no exame da motricidade espontânea, só que, desta vez, com oposição aplicada pelo examinador. Não havendo indícios de doença que justifique exame 7 NEUROLOGIA GABRIELA CARVALHO ABREU particularizado de determinados segmentos, esse exame é realizado rotineiramente de modo global. Nos casos de discreta ou duvidosa deficiência motora dos membros, realizam-se as denominadas provas deficitárias, representadas pelas provas de Barré, Mingazzini e dos braços estendidos. O resultado do exame da força pode ser registrado de duas maneiras: Anotando- se a graduação e a sede, assim: o Força normal nos quatro membros. o Força discretamente diminuída na extensão do antebraço direito. o Força moderadamente diminuída na flexão da perna esquerda. o Força muito reduzida na extensão do pé direito. o Força abolida na flexão da coxa esquerda. Percentualmente, anotando-se também a graduação e a sede, ou seja: o 100%: força normal. o 75%: movimento completo contra a força da gravidade e contra certa resistência aplicada pelo examinador. o 50%: movimento contra a força da gravidade. o 25%: movimento completo sem a força da gravidade. o 10%: discreta contração muscular. o 0%: nenhum movimento. Outra maneira de nomear os déficits de movimento é com o grau de força: o Grau V: força normal. o Grau IV: movimento completo contra a força da gravidade e contra certa resistência aplicada pelo examinador. o Grau III: movimento contra a força da gravidade. o Grau II: movimento completo sem a força da gravidade. o Grau I: discreta contração muscular. o Grau 0: nenhum movimento. 8 NEUROLOGIA GABRIELA CARVALHO ABREU Tônus muscular: O tônus pode ser considerado como o estado de tensão constante a que estão submetidos os músculos, tanto em repouso (tônus de postura), como em movimento (tônus de ação). O exame do tônus é realizado com o paciente deitado e em completo relaxamento muscular, da seguinte maneira: o Inspeção: Verifica-se a existência ou não de achatamento das massas musculares de encontro ao plano do leito. É mais evidente nas coxas e só tem valor significativo na acentuada diminuição do tônus. o Palpação das massas musculares: Averigua-se o grau de consistência muscular, a qual se mostra aumentada nas lesões motoras centrais e diminuída nas periféricas. o Movimentos passivos: São feitos movimentos naturais de flexão e extensão nos membros e observam-se: A passividade, ou seja, se há resistência (tônus aumentado) ou se a passividade está aquém do normal (tônus diminuído). A extensibilidade, isto é, se existe ou não exagero no grau de extensibilidade da fibra muscular. Assim, na flexão da perna sobre a coxa, fala-se em diminuição do tônus quando o calcanhar toca a região glútea de modo fácil. Balanço passivo: O examinador, com as suas duas mãos, segura e balança o antebraço do paciente, observando se a mão movimenta-se de forma normal, exagerada (na hipotonia) ou diminuída (na hipertonia). O mesmo pode ser observado, aplicando-se a manobra nos membros inferiores, segurando a perna e observando o balanço dos pés. A diminuição do tônus (hipotonia) ou o seu aumento (hipertonia) devem ser registrados com as respectivas graduação e sede. Coordenação: para executar os movimentos é necessário um jogo de mecanismos reguladores de sua direção, velocidade e medida adequadas, que os tornam econômicos, precisos e harmônicos. Coordenação adequada traduz o bom funcionamento de, pelo menos, 2 setores do sistema nervoso: o cerebelo (centro coordenador) e a sensibilidade proprioceptiva. À sensibilidade proprioceptiva cabe informar continuamente ao centro coordenador as modificações de posição dos vários segmentos corporais. A perda de coordenaçãoé denominada ataxia, a qual pode ser de três tipos: cerebelar, sensorial e mista. Cumpre mencionar que, nas lesões da sensibilidade proprioceptiva, o paciente utiliza a visão para fiscalizar os movimentos incoordenados. Cerradas as pálpebras, acentua -se a ataxia. Tal fato não ocorre nas lesões cerebelares. o Exame de coordenação: Prova dedo-nariz: Com o membro superior estendido lateralmente, o paciente é solicitado a tocar a ponta do nariz com o indicador. Repete-se a prova algumas vezes: primeiro, com os 9 NEUROLOGIA GABRIELA CARVALHO ABREU olhos abertos e, depois, fechados. O paciente deve estar de preferência de pé ou sentado. Prova calcanhar-joelho: Na posição de decúbito dorsal, o paciente é solicitado a tocar o joelho oposto com o calcanhar do membro a ser examinado. A prova deve ser realizada várias vezes, de início com os olhos abertos; depois, fechados. Nos casos de discutível alteração, "sensibiliza-se" a prova mediante o deslizamento do calcanhar pela crista tibial, após tocar o joelho. Diz-se que há dismetria (distúrbio na medida do movimento) quando o paciente não consegue alcançar com precisão o alvo. Prova dos movimentos alternados: Determina-se ao paciente que realize movimentos rápidos e alternados, tais como: abrir e fechar a mão, movimento de supinação e pronação, extensão e flexão dos pés. Tais movimentos denominam-se diadococinesia, e a capacidade de realizá-los é chamada eudiadococinesia. Sua dificuldade é designada disdiadococinesia e a incapacidade de realizá-los recebe o nome de adiadococinesia. 10 NEUROLOGIA GABRIELA CARVALHO ABREU 2. Reflexos: Reflexo é uma resposta do organismo a um estímulo de qualquer natureza. A reação pode ser motora ou secretora, dependendo da modalidade do estímulo e do órgão estimulado. Constituintes do arco reflexo: Via aferente: receptor e fibras sensoriais do nervo. Centro reflexógeno: substância cinzenta do sistema nervoso. Via eferente: fibras motoras do nervo. Órgão efetor: músculo. Reflexos exteroceptivos ou superficiais: o estímulo é feito na pele ou na mucosa externa, por meio de um estilete rombo. Os reflexos cutâneos habitualmente examinados: Reflexo cutâneo-plantar: Estando o paciente em decúbito dorsal, com os membros inferiores estendidos, o examinador estimula superficialmente a região plantar, próximo à borda lateral e no sentido póstero anterior, fazendo um leve semicírculo na parte mais anterior. A resposta normal é representada pela flexão dos dedos. A abolição desse reflexo ocorre quando há interrupção do arco reflexo e, algumas vezes, na fase inicial da lesão da via piramidal. A inversão da resposta normal, ou seja, a extensão do hálux (os demais podem ou não apresentar abertura em forma de leque), constitui o sinal de Babinski, um dos mais importantes elementos semiológicos do sistema nervoso que indica lesão da via piramidal ou corticoespinal. NÃO EXISTE BABINSKI POSITIVO E NEGATIVO. Reflexos cutâneo-abdominais: Ainda com o paciente em decúbito dorsal, com a parede abdominal em completo relaxamento, o examinador estimula o abdome do paciente no sentido da linha mediana em três níveis: superior, médio e inferior. A resposta normal é a contração dos músculos abdominais que determina um leve deslocamento da cicatriz umbilical para o lado estimulado. Podem estar abolidos quando houver interrupção do arco reflexo, na lesão da via piramidal e, às vezes, mesmo na ausência de alterações do sistema nervoso (obesidade, pessoas idosas, multíparas). 11 NEUROLOGIA GABRIELA CARVALHO ABREU Reflexos proprioceptivos, profundos, musculares ou miotáticos: Reconhecem- se os tipos fásicos ou clônicos, e os tônicos ou posturais. Na pesquisa dos reflexos miotáticos fásicos ou clônicos, o estímulo é feito pela percussão com o martelo de reflexos do tendão do músculo a ser examinado. De rotina, são investigados os reflexos aquileu, patelar, flexor dos dedos, supinador, pronador, bicipital e tricipital. Os reflexos miotáticos fásicos podem estar: normais, abolidos, diminuídos, vivos ou exaltados. Suas alterações podem ser simétricas ou não. O registro dos resultados deve ser feito literalmente ou por meio de sinais convencionais, desta forma: o Arreflexia ou reflexo abolido: 0 o Hiporreflexia ou reflexo diminuído: - o Normorreflexia ou reflexo normal: + o Reflexo vivo: ++ o Hiper-reflexia ou reflexo exaltado:+++. A arreflexia ou hiporreflexia são encontradas comumente nas lesões que interrompem o arco reflexo (poliomielite, polineuropatia periférica, miopatia), e a hiper-reflexia nas lesões da via piramidal (acidente vascular cerebral, neoplasia, doença desmielinizante, traumatismo). É possível, todavia, obter resposta diminuída ou aumentada, mesmo na ausência de doença. Nos pacientes com lesão do cerebelo, é comum a resposta em pêndulo do reflexo patelar (reflexo patelar pendular), consequência da hipotonia. Reflexo de automatismo ou de defesa: O reflexo de automatismo ou de defesa representa reação normal de retirada do membro a um estímulo nociceptivo, habitualmente aplicado no pé. Com o paciente em decúbito dorsal e os membros inferiores estendidos, faz -se um beliscamento na região dorsal do pé, ou uma flexão forçada nos dedos do pé, ou ainda a percussão rápida e repetida na região plantar com o martelo de reflexo. Em condições normais, o membro estimulado permanece na mesma posição ou apresenta discreta retirada, caso o estímulo seja muito forte. A resposta anormal é uma tríplice flexão, representada pela flexão do pé sobre a perna, desta sobre a coxa e da coxa sobre a bacia. Corresponde, na verdade, a um exagero da resposta normal. Ocorre na lesão piramidal, em nível medular, principalmente. 12 NEUROLOGIA GABRIELA CARVALHO ABREU 3. Sensibilidade: O estudo semiológico da sensibilidade diz respeito aos receptores, às vias condutoras e aos centros localizados no encéfalo. Essas vias sensoriais estão em estreita e contínua ligação com as vias motoras, configurando, em seu conjunto, o arco reflexo que representa a unidade anátomo funcional do sistema nervoso. Sensibilidade subjetiva: compreende as queixas sensoriais que o paciente relata durante a anamnese, ou seja, a dor e as parestesias (dormência, formigamento). Sensibilidade objetiva: a rigor, não deixa de ser subjetiva, já que depende da resposta do paciente aos estímulos percebidos. É dita objetiva apenas porque, nesse caso, está presente um estímulo aplicado pelo examinador. Sensibilidade especial corresponde aos sensórios e será estudada na parte relativa aos nervos cranianos. Sensibilidade superficial: o Sensibilidade tátil: utiliza-se um pedaço de algodão ou um pequeno pincel macio, os quais são passados levemente em várias partes do corpo. A diminuição da sensibilidade tátil recebe o nome de hipoestesia; sua abolição, anestesia; e seu aumento, hiperestesia. Tais alterações estão na dependência da lesão das vias das várias modalidades sensoriais. o Sensibilidade térmica: requer dois tubos de ensaio, um com água gelada e outro com água quente, com que se tocam pontos diversos do corpo, alternando-se os tubos. 13 NEUROLOGIA GABRIELA CARVALHO ABREU o Sensibilidade dolorosa: é pesquisada com o estilete rombo, capaz de provocar dor sem ferir o paciente. A agulha hipodérmica é inadequada, sobretudo em mãos inábeis. o O resultado do exame, se for normal, deve ser registrado literalmente, discriminando-se cada tipo de sensibilidade.Se houver alterações, o registro será feito em esquemas que mostrem a distribuição sensorial corporal ou, então, discriminativamente, como exemplificado a seguir: diminuição da sensibilidade tátil; abolição da sensibilidade vibratória; aumento da sensibilidade superficial dolorosa. É fundamental acrescentar a esses exemplos o grau e a localização das alterações. Sensibilidade profunda: A sensibilidade vibratória (palestesia) é pesquisada com o diapasão de 128 vibrações por segundo, colocado em saliências ósseas. A sensibilidade à pressão (barestesia) é verificada mediante compressão digital ou manual em qualquer parte do corpo, especialmente de massas musculares. A cinético-postural ou artrocinética (batiestesia) é explorada deslocando-se suavemente qualquer segmento do corpo em várias direções (flexão, extensão). Em dado momento, fixa-se o segmento em uma determinada posição, que deverá ser reconhecida pelo paciente. Para facilitar o exame, elegem-se algumas partes do corpo, como o hálux, o polegar, o pé ou a mão. A sensibilidade dolorosa profunda é avaliada mediante compressão moderada de massas musculares e tendões, o que, normalmente, não desperta dor. Se o paciente acusar dor, é sinal de que há neurites e miosites. De modo contrário, os pacientes com tabes dorsalis não sentem dor quando se faz compressão, mesmo forte, de órgãos habitualmente muito dolorosos, como é o caso dos testículos. Estereognosia: Em seguida ao exame da sensibilidade, avalia-se o fenômeno estereognóstico, que significa a capacidade de reconhecer um objeto com a mão sem o auxílio da visão. É função tátil discriminativa ou epicrítica com componente proprioceptivo. Coloca-se um pequeno objeto comum (chave, botão, grampo de cabelo) na mão do paciente, o qual, com os olhos fechados, deve reconhecer o objeto apenas pela palpação. Quando se perde essa função, diz-se astereognosia ou agnosia tátil, indicativa de lesão do lobo parietal contralateral. 4. Nervos cranianos: I Nervo olfatório: As impressões olfatórias são recolhidas pelos receptores da mucosa nasal e conduzidas aos centros corticais da olfação, situados nos hipocampos, após atravessarem os dois lobos frontais. No exame da olfação, empregam-se substâncias com odores conhecidos: café, canela, cravo, tabaco, álcool etc. De olhos fechados o paciente deve reconhecer o aroma que o examinador colocar diante de cada narina. Existem alterações da olfação por lesões corticais que compreendem os seguintes tipos: parosmia (perversão do olfato), alucinações olfatórias e cacosmia (sensação olfatória desagradável na ausência de qualquer substância capaz de originar odor). Essas manifestações 14 NEUROLOGIA GABRIELA CARVALHO ABREU têm de ser levadas em consideração, pois podem representar verdadeiras crises epilépticas, por lesão do úncus hipocampal. São chamadas crises epilépticas uncinadas. II Nervo óptico: é examinado da seguinte maneira: o Acuidade visual: Pede-se ao paciente que diga o que vê na sala de exame ou leia alguma coisa. Examina-se cada olho em separado. Havendo diminuição da acuidade, fala-se em ambliopia; quando abolida, constitui-se em amaurose. Ambas podem ser uni ou bilaterais e costumam ser causadas por neurite retrobulbar, neoplasias e hipertensão intracraniana. o Campo visual: Sentado, o paciente fixa um ponto na face do examinador, postado à sua frente. O examinador desloca um objeto nos sentidos horizontal e vertical, e o paciente dirá até que ponto está "percebendo" o objeto nas várias posições. Cada olho é examinado separadamente. As alterações campimétricas causadas por neoplasias, infecções e desmielinização são anotadas em relação ao campo visual, e não à retina. Assim, hemianopsia homônima direita significa perda da metade direita do campo visual. o Fundoscopia: Com o oftalmoscópio, o fundo de olho toma-se perfeitamente visível. O neurologista não pode prescindir desse exame, que constitui verdadeira biopsia incruenta. Podem ser reconhecidos o tecido nervoso (retina e papila óptica) e os vasos (artérias, veias e capilares), que evidenciam fielmente o que se passa com as estruturas análogas na cavidade craniana. Entre as alterações que podem ser encontradas, destacam-se: a palidez da papila, a qual significa atrofia do nervo óptico; a estase bilateral da papila, que traduz hipertensão intracraniana, e as modificações das arteríolas, que aparecem na hipertensão arterial. III Nervo oculomotor, IV nervo troclear e VI nervo abducente: Esses três nervos são examinados em conjunto, pois inervam os vários músculos que têm por função a motilidade dos globos oculares. Tais músculos compreendem o reto medial, o reto superior, o reto inferior, o oblíquo inferior (inervados pelo oculomotor), o oblíquo superior (inervado pelo troclear) e o reto lateral (inervado pelo abducente). O III nervo inerva também a musculatura elevadora da pálpebra. o Motilidade extrínseca: A posição do globo ocular é dada pelo funcionamento harmônico dos vários músculos. Caso haja predomínio de um deles (por paresia ou paralisia de seu antagonista), ocorre o que se chama estrabismo (desvio do olho de seu eixo normal), que pode ser horizontal (convergente ou divergente) ou vertical (superior ou inferior), e isso vai depender se o desvio é em uma ou em outra direção. Na presença de estrabismo, pelo menos na fase inicial, o paciente reclama de visão dupla ou diplopia. O exame é feito em cada olho separadamente e, depois, simultaneamente, da seguinte maneira: estando o paciente 15 NEUROLOGIA GABRIELA CARVALHO ABREU com a cabeça imóvel, o examinador solicita a ele que desloque os olhos nos sentidos horizontal e vertical. No exame simultâneo, acrescenta-se a prova da convergência ocular, que é feita aproximando gradativamente um objeto dos olhos do paciente. As causas mais frequentes de lesões dos nervos oculomotores são traumatismos, diabetes melito, aneurisma intracraniano, hipertensão intracraniana e neoplasias da região selar. o Motilidade intrínseca: O exame da pupila é feito em seguida ao estudo da motilidade extrínseca dos globos oculares. A íris é formada por fibras musculares lisas e apresenta uma camada externa, radiada, inervada pelo simpático cervical, e uma camada interna, circular, que recebe a inervação parassimpática. Esta tem origem no mesencéfalo, no núcleo de Edinger-Westphal, e suas raízes alcançam o olho por intermédio do III nervo, que constitui a sua via eferente. A via aferente corresponde às fibras pupilomotoras, as quais têm origem na retina e transitam pelo nervo óptico. A pupila é normalmente circular, bem centrada e tem um diâmetro de 2 a 4 mm. Ressalte-se que o diâmetro pupilar é o resultado do funcionamento equilibrado entre os dois sistemas autônomos - simpático e parassimpático. A irregularidade do contorno pupilar é chamada discoria; quando o diâmetro se acha aumentado, fala-se em midríase; o contrário, miose; a igualdade de diâmetros denomina-se isocoria; e a desigualdade, anisocoria. Dinamicamente, a pupila é examinada por meio de um feixe luminoso (lanterna de bolso) e pela convergência ocular. Em ambiente de pouca luminosidade, o paciente deve olhar para um ponto mais distante. O examinador incide o feixe de luz em uma pupila e observa a resposta nos dois lados. Chama-se reflexo fotomotor direto a contração da pupila na qual se fez o estímulo, e de reflexo fotomotor consensual a contração da pupila oposta. Em seguida, aproxima-se dos olhos um objeto, e as pupilas se contrairão normalmente - é o reflexo da acomodação. Os reflexos podem estarnormais, diminuídos ou abolidos. A abolição pode abranger todos os reflexos ou ser dissociada. Assim, na lesão unilateral do oculomotor, a pupila entra em midríase homolateral (predomínio do simpático) e não responde a estímulo algum - midríase paralítica. A pupila oposta permanece normal. Na lesão bilateral da via aferente (fibras pupilomotoras que estão juntas com o nervo óptico), os reflexos fotomotor direto ou consensual estão abolidos, enquanto o reflexo de acomodação está preservado. Outro exemplo é representado pela lesão da via aferente do lado direito: se o estímulo for aplicado à direta, os reflexos direto e consensual estarão abolidos; se for a esquerda, ambos os reflexos estarão normais, mostrando que o reflexo de acomodação está preservado. 16 NEUROLOGIA GABRIELA CARVALHO ABREU o Sinal de Argyll-Robertson consiste basicamente em miose bilateral, abolição do reflexo fotomotor e presença do reflexo de acomodação. Foi tido por muito tempo como patognomônico da sífilis nervosa. Na verdade, sabe-se hoje que ele pode depender de várias outras causas. A lesão responsável pelo sinal de Argyll-Robertson situa-se na região periaquedutal, no mesencéfalo. o Síndrome de Claude Bernard-Homer é caracterizada por miose, enoftalmia e diminuição da fenda palpebral. Decorre de lesão do simpático cervical (traumatismo, neoplasia do ápice pulmonar, pós- cirurgia cervical). V Nervo trigêmeo: este é um nervo misto com várias raízes: o Raiz motora: representada pelo nervo mastigador, que inerva os músculos destinados à mastigação (temporal, masseter e pterigóideos). Avalia-se a lesão unilateral da raiz motora pela observação dos seguintes elementos: Atrofia das regiões temporais e masseterinas. A abertura da boca promove desvio da mandíbula para o lado da lesão. Ao trincar os dentes, nota-se debilidade do lado paralisado. Há dificuldade do movimento de lateralização da mandíbula. o Raízes sensoriais: que compreendem os nervos oftálmico, maxilar e mandibular. Estas raízes responsabilizam-se pela sensibilidade geral da metade anterior do segmento cefálico. O exame dessas raízes é semelhante ao da sensibilidade superficial, cabendo apenas acrescentar a pesquisa da sensibilidade corneana, feita com uma mecha de algodão que toca suavemente entre a esclerótica e a córnea. O paciente deve estar com os olhos virados para o lado oposto, a fim de perceber o menos possível a prova. A resposta normal é a contração do orbicular das pálpebras, daí a denominação de reflexo córneo-palpebral. o As alterações do trigêmeo podem ser consequência de herpes-zóster, traumatismo e neoplasias. Comprometida a raiz sensorial, o paciente vai 17 NEUROLOGIA GABRIELA CARVALHO ABREU referir dor, limitada à área correspondente à sua distribuição. Em tais casos, usa -se a designação de neuralgia do trigêmeo ou de trigeminalgia. VII Nervo facial: a parte motora do nervo facial se divide em dois ramos temporofacial e cervicofacial, os quais se distribuem para a musculatura da mímica facial. Para fazer o exame do nervo facial, solicita-se ao paciente enrugar a testa, franzir os supercílios, fechar as pálpebras, mostrar os dentes, abrir a boca, assobiar, inflar a boca e contrair o platisma ou músculo cutilar do pescoço. Na paralisia unilateral, observam-se lagoftalmia (o olho permanece sempre aberto); ausência do ato de piscar; epífora (lacrimejamento); desvio da boca para o lado normal, sobretudo quando se pede ao paciente que mostre os dentes ou abra amplamente a boca, e incapacidade para contrair o platisma, assobiar e manter a boca inflada. A paralisia da face se chama prosopoplegia e, quando bilateral, fala-se em diplegia facial. Cerca de 80% dessas paralisias são chamadas a frigore e têm caráter benigno. Admite-se, atualmente, que essas paralisias sejam provocadas por infecções virais, acompanhadas de reação edematosa do nervo. Outras causas incluem o diabetes melito, as neoplasias, a otite média, os traumatismos, o herpes-zóster e a hanseníase. Tem importância prática a distinção entre a paralisia por lesão do nervo facial (paralisia infranuclear ou periférica) e aquela por lesão da via corticonuclear ou feixe geniculado (paralisia central ou supranuclear). No tipo periférico, toda a hemiface homolateral é comprometida, enquanto, na central, somente a metade inferior da face contralateral se mostra alterada. Este último tipo ocorre com frequência nos acidentes vasculares e nas neoplasias cerebrais. Às vezes, pacientes com paralisia facial periférica relatam alguma anormalidade da gustação. VIII Nervo vestibulococlear: É constituído por duas raízes: a coclear, incumbida da audição, e a vestibular, responsável pelo equilíbrio. A raiz coclear é avaliada pelos seguintes dados e manobras: o Diminuição gradativa da intensidade da voz natural. o Voz cochichada. o Atrito suave das polpas digitais próximo ao ouvido. o Prova de Rinne, que consiste em aplicar o diapasão na região mastoide. Quando o paciente deixar de ouvir a vibração, coloca-se o aparelho próximo ao conduto auditivo. Em condições normais, o paciente acusa a percepção do som (Rinne positivo). Transmissão óssea mais prolongada que a aérea (Rinne negativo) significa deficiência auditiva de condução. 18 NEUROLOGIA GABRIELA CARVALHO ABREU As alterações auditivas são representadas por sintomas deficitários (hipoacusia) ou de estimulação (zumbido, hiperacusia e alucinações). Afastadas as causas de diminuição ou a abolição da acuidade por transmissão aérea (tamponamento por cerume, otosclerose), as causas mais comuns de lesão da raiz coclear são a rubéola, o neurinoma, a fratura do rochedo, a intoxicação medicamentosa e a síndrome de Méniere. Já os sintomas irritativos (zumbidos) podem estar ou não associados a déficit de audição, ou depender de focos corticais (alucinações), ou, ainda, acompanhar a paralisia facial periférica (hiperacusia). O acometimento da raiz vestibular é reconhecível pela anamnese, quando as queixas do paciente incluem estado vertiginoso, náuseas, vômitos e desequilíbrio. A vertigem corresponde a uma incômoda e ilusória sensação de deslocamento do corpo ou dos objetos, sem alteração de consciência. A investigação da raiz vestibular compreende a pesquisa de nistagmo, desvio lateral durante a marcha, desvio postural, sinal de Romberg e provas calórica e rotatória. O nistagmo consiste em movimentos oculares ritmados, com dois componentes: um rápido e outro lento. O nistagmo pode ser espontâneo ou provocado e compreende os tipos horizontal, vertical, rotatório e misto. Quando há desvio postural durante a marcha, observa-se lateropulsão para o lado da lesão. Se o paciente estiver de pé ou sentado com os olhos fechados e os membros superiores estendidos para frente e elevados em ângulo reto com o corpo, os braços irão desviar-se para o lado do labirinto lesado, e o corpo tenderá a cair para este mesmo lado. Sinal de Romberg positivo, com desequilíbrio do corpo para o lado lesado. IX Nervo glossofaríngeo e X nervo vago: Pelas estreitas ligações quanto à origem, ao trajeto e à distribuição, esses nervos são examinados em conjunto. Algumas funções estão imbricadas entre si; outras, porém, correspondem a um ou a outro nervo especificamente. O exame do X nervo inclui o ramo interno do XI, que é motor, tem origem bulbar e se une em curto trajeto ao nervo vago. A lesão unilateral do glossofaríngeo pode exteriorizar-se por distúrbios da gustação do terço posterior da língua (hipogeusia e ageusia); no entanto, esse19 NEUROLOGIA GABRIELA CARVALHO ABREU exame não é habitualmente realizado. Pode aparecer disfagia. Mais raramente ocorre dor. Na lesão unilateral do IX e do X nervos, observam-se: desvio do véu palatino para o lado normal, quando o paciente pronuncia as vogais a ou e; desvio da parede posterior da faringe para o lado normal (sinal da cortina) pela cuidadosa estimulação; disfagia com regurgitação de líquidos pelo nariz, e diminuição ou abolição do reflexo véu palatino. A lesão isolada do X nervo, a qual envolve apenas o ramo laríngeo, determina considerável disfonia. As causas mais frequentes de lesão dos nervos IX e X, ou de seus ramos, são: neuropatia diftérica, neoplasia do mediastino, esclerose lateral amiotrófica, siringobulbia e traumatismo. XI Nervo acessório: Essencialmente motor. Inerva os músculos esternocleidomastóideo e a porção superior do trapézio. A lesão do acessório por traumatismo, esclerose lateral amiotrófica ou siringomielia tem como consequência atrofia desses músculos, deficiência na elevação do ombro (trapézio) e na rotação da cabeça para o lado oposto (esternocleidomastóideo) do músculo comprometido. XII Nervo hipoglosso: Trata-se de um nervo exclusivamente motor, o qual se origina no bulbo e se dirige para os músculos da língua. Investiga-se o hipoglosso pela inspeção da língua - no interior da boca ou exteriorizada, movimentando- a para todos os lados, forçando-a de modo que vá de encontro à bochecha e, por fim, palpando-a, para avaliação de sua consistência. Nas lesões unilaterais do hipoglosso, observam-se atrofia e fasciculação na metade comprometida. Ao ser exteriorizada, a ponta da língua se desvia para o lado da lesão. Ás vezes, ocorre disartria para as consoantes linguais. Nas lesões bilaterais, as manifestações compreendem atrofia, fasciculação, paralisia, acentuada disartria e dificuldade para mastigar e deglutir (a língua auxilia esses atos). AVALIAÇÃO DO ESTADO MENTAL: Abrange apenas orientação temporoespacial, memória e linguagem. É uma avaliação quantitativa, o que possibilita uma avaliação evolutiva mais precisa do paciente. Orientação: Pergunta-se ao paciente o ano, o mês, o dia do mês e da semana e a hora aproximada do exame. A resposta certa de cada item vale 1 ponto, perfazendo um máximo de 5 pontos. A seguir, pergunta-se o nome do país, do estado, da cidade, do bairro e do local da consulta, perfazendo, também, se todas as respostas forem corretas, um total de 5 pontos. Memória: Para avaliar a memória, são realizados 3 testes: o Diga ao paciente 3 palavras, para que ele repita logo após, valendo um ponto cada uma, no total de 3 pontos. o Solicite ao paciente diminuir 7 de 100, por 5 vezes subsequentes (100-7 = 93, 93-7 = 86, e assim por diante). Cada resposta vale 1 ponto, totalizando 5. o Peça ao paciente que repita as 3 palavras do primeiro teste, valendo 1 ponto cada uma, podendo perfazer 3 pontos no máximo. 20 NEUROLOGIA GABRIELA CARVALHO ABREU Linguagem: A linguagem é analisada em 6 etapas: o Peça ao paciente que fale os nomes de 2 objetos apresentados a ele (caneta e relógio, por exemplo), valendo 1 ponto cada resposta correta. o Solicite ao paciente que repita uma frase ou um conjunto de palavras (p. ex., aqui, ali e lá), valendo 1 ponto se repetir corretamente. o Prova dos 3 comandos: solicite ao paciente que pegue uma folha de papel, dobre-a em 3 partes e a coloque em determinado lugar, valendo 1 ponto cada etapa. o Apresente ao paciente um papel no qual esteja escrito: Feche os olhos. Ele terá de ler só para si e executar o que está escrito, valendo 1 ponto. o Peça ao paciente que escreva uma frase própria, valendo 2 pontos. o Solicite ao paciente que copie um desenho simples (geralmente 2 pentágonos), valendo 1 ponto. Somando-se todos os itens, pode-se chegar a um total de 30 pontos. Consideram-se normais valores de 27 a 30 pontos; 24 a 27 pontos é um valor tolerado como normal; abaixo de 23 caracteriza o comprometimento do estado mental. Quanto mais baixo o valor obtido, maior o comprometimento do estado mental. Deve-se levar em conta o nível de escolaridade da pessoa examinada. 21 NEUROLOGIA GABRIELA CARVALHO ABREU SÍNDROME DO NEURÔNIO MOTOR SUPERIOR OU I NEURÔNIO Decorre de lesão cortical ou das vias centrais relacionadas com a motricidade: trato córtico-espinhal e trato retículo-espinhal inibidor (ou bulbar) sendo seu reconhecimento feito a partir de sinais e sintomas bem definidos. Uma lesão piramidal costuma acometer grupamentos musculares mais extensos, pois um feixe nervoso central influência vários grupos de neurônios periféricos. Dessa forma, uma lesão central costuma levar a fraqueza proporcionalmente mais difusa do que uma lesão periférica. Na fase aguda de uma lesão piramidal temos uma fraqueza tanto proximal quanto distal, que com o tempo vai recuperando na região axial e proximal dos membros, porém sem grande melhora nos segmentos mais distais, pelo fato de haver maior representação cortical dos segmentos distais e por haver outros tratos que também são responsáveis pela inervação proximal, como o trato retículo-espinhal e vestíbulo-espinhal, além de essa ser bilateral. Na síndrome piramidal observamos dois tipos de sinais, os de liberação, que aparecem numa fase subaguda da lesão, e os deficitários, que surgem na fase aguda. Liberação: hiper-reflexia profunda, isto é, reflexos policinéticos mais amplos e bruscos, aumento da área reflexógena, clônus, hipertonia espástica, sincinesias e o sinal de Babinski. Entre os deficitários, temos a paresia/plegia e a abolição dos reflexos superficiais como o cutâneo plantar e o cutâneo-abdominal. Hiper-reflexia: sinal marcante de liberação, é explicado pelo fato de o trato retículo– espinhal bulbar exercer um efeito inibitório sobre o arco reflexo, assim, com sua lesão, existe hiperatividade dos motoneurônios, o que torna os reflexos aumentados (mais bruscos e amplos) em relação ao padrão normal da pessoa (essa observação é importante pelo fato de existir grande variação individual na intensidade dos reflexos profundos). Reflexos policinéticos: caracterizam-se pelo fato de apenas uma percussão desencadear contrações repetidas do mesmo grupo muscular e devem-se a hiperexcitabilidade dos motoneuronios. Já o aumento da área reflexógena, como o próprio nome diz, indica que um mesmo reflexo pode ser conseguido percutindo uma área maior, assim, por exemplo, o tendão do músculo quadríceps femoral, logo abaixo da patela com lesão piramidal pode ser obtido percutindo-se a tíbia do paciente ou mesmo o ventre do músculo quadríceps. Outro sinal observado em lesões piramidais é o clônus, causado pelo estiramento passivo muscular, o que estira os fusos musculares, os quais mandam um estimulo excitatório à medula, havendo aí uma integração do reflexo e o envio da mensagem de volta a musculatura por motoneurônios (alfa) para que esta se contraia, o que diminui o estiramento do fuso e, com isso, o estímulo excitatório sobre o motoneurônio. O músculo relaxa, porém, pelo examinador manter o estiramento, inicia-se novamente o ciclo e ocorrem contrações repetidas do músculo. Este fenômeno é mais facilmente obtido com o estiramento do aquileu e da patela. 22 NEUROLOGIA GABRIELA CARVALHO ABREU O tônus muscular, definido como o estado de relativa tensão do músculo durante o repouso, encontra-se aumentado na síndrome piramidal, caracterizando a chamada hipertonia espástica, cuja fisiopatologia parece dever-se ao aumento de excitabilidade dos motoneurônios alfa e gama. Assim, com essa hiper-reatividade,os fusos musculares ficam mais sensíveis ao estiramento do músculo, o que causa uma contração reflexa mais intensa que o normal. Essa hipertonia é mais evidente com o movimento passivo, sendo mais pronunciada quando os músculos são solicitados com maior velocidade e de menor intensidade quando os músculos são solicitados mais lentamente. Vemos então que a hipertonia da síndrome piramidal é “velocidade-dependente”. Além disso, essa hipertonia espástica é mais acentuada no início do movimento, cessando repentinamente, o que caracteriza clinicamente o clássico sinal do canivete. A hipertonia da síndrome piramidal apresenta um acometimento desigual nos membros superiores e inferiores: naqueles predomina o tônus dos músculos flexores, enquanto nestes há um predomínio do tônus extensor, dando a marcha ceifante. Pelo predomínio flexor, o membro superior fica semifletido e o polegar posiciona-se na palma da mão - postura de Wernicke- Mann. Um sinal clássico da síndrome piramidal é o de Babinski ou reflexo cutâneo-plantar em extensão, sendo este um reflexo patológico de extensão do hálux quando estimulamos o pé do paciente com uma espátula. É necessário que a lesão esteja acima de L1 (inervação de membros inferiores; onde começam a sair às fibras do plexo lombossacral). O trato córtico-espinhal inibe o reflexo primitivo cutâneo-plantar em extensão. Só pode ser considerado patológico em crianças maiores que do que 1 ano e meio a 2 anos, pela mielinização que se dá ao redor de 1 ano. Outro reflexo superficial alterado é o reflexo cutâneo-abdominal (integrado na medula torácica de T6 a T12), que também depende da integridade do trato córtico-espinhal. Normalmente, estimulando-se a parede abdominal em um dos lados observa-se a contração muscular e o desvio da cicatriz umbilical para o lado estimulado, mas esse padrão pode estar ausente ou diminuído na lesão piramidal. Há uma discreta e tardia hipotrofia muscular, decorrente principalmente da subsolicitação do grupamento muscular após lesão nervosa. Quando temos um quadro parético/plégico que acomete igualmente (com a mesma intensidade) o braço e a perna do mesmo lado, temos uma plegia/paresia proporcional; se houver predomínio crural ou braquial temos uma hemiparesia desproporcionada. Quando um quadro hemiparético acomete a face e os membros, temos uma hemiparesia incompleta. Se o acometimento de nervo craniano for contralateral ao restante do corpo afetado, temos a chamada hemiparesia alterna (sugestiva de lesão no tronco cerebral). 23 NEUROLOGIA GABRIELA CARVALHO ABREU SÍNDROME DO NEURÔNIO MOTOR INFERIOR OU II NEURÔNIO O sintoma principal da síndrome do neurônio motor inferior (NMI) é a fraqueza, que pode ser acompanhada de fadiga e dor muscular (mialgia). O quadro clínico decorre de distúrbios dos motoneurônios inferiores, que inervam as fibras musculares. Quadro clínico: Paralisia flácida Atrofia Perda dos reflexos Fasciculações A diferenciação clínica da síndrome motora periférica da central requer a observação e comparação de alguns aspectos clínicos peculiares e ambas, sendo os principais o padrão de reflexos, o tônus e o trofismo muscular, a presença ou não de fasciculação, o tipo e o local da fraqueza, além de outros sinais associados. Observa-se diminuição ou abolição dos reflexos miotáticos, pois não existe mais a alça eferente do arco reflexo e resposta motora perceptível. Os reflexos superficiais cutâneo-abdominal e cutâneo–plantar flexor, que dependem da integridade do trato córtico-espinhal, geralmente estão preservados, podendo estar diminuídos e às vezes, abolidos, mas não patológicos (sinal de Babinski). Na maioria dos distúrbios da junção neuromuscular, os reflexos costumam estar preservados, como na miastenia gravis. O tônus muscular encontra-se na maioria das vezes diminuído, em parte pela diminuição do reflexo de estiramento do músculo. Essa paralisia com perda do tônus dá origem ao termo paralisia flácida. A hipotonia não é exclusiva de lesão dos motoneurônios, podendo ser encontrada na fase aguda de lesão do NMS e em alguns tipos de síndromes cerebelares. Percebe-se uma atrofia muscular precoce, variando de leve a grave. A explicação para esse achado é a de que existe um fluxo axoplasmático anterógrado de substâncias tróficas, a partir do corpo celular do neurônio responsável pela manutenção da massa muscular, o qual é interrompido pela lesão neuronal. O diagnóstico de hipotrofia ou hipertrofia depende da experiência do examinador, devido a grande variedade individual. Em crianças e pessoas obesas o problema se intensifica, e deve-se sempre valorizar as assimetrias. São observadas fasciculações, que são contrações involuntárias de uma unidade motora, perceptíveis ao exame físico. Quando observamos um quadro de fraqueza localizada (focal) ou restrito ao território de inervação de um nervo periférico, esse quadro é indicativo de síndrome motora periférica. Quando existe lesão de um motoneurônio, apenas a musculatura dependente de sua inervação é que é acometida, podendo-se inclusive individualizar os músculos afetados. 24 NEUROLOGIA GABRIELA CARVALHO ABREU Em pacientes com lesão motora periférica existe uma marcha parética típica, a marcha escarvante, encontrada em alguns tipos de neuropatias e lesões de nervo periférico do membro inferior. Um exemplo típico são as fraturas da cabeça da fíbula, em que o nervo fibular, responsável pela inervação dos músculos flexores do é estirado, causando uma condição chamada pé caído. Uma vez firmado o diagnóstico de síndrome do NMI, podemos progredir no diagnóstico topográfico tentando identificar o segmento da unidade motora acometido pela doença, observando-se os aspectos clínicos peculiares da lesão de cada região. Deve-se considerar o tempo de evolução dos sintomas, tônus muscular, reflexos, atrofia e alterações da sensibilidade. Corno anterior da medula: o exemplo clássico desse tipo de lesão é a poliomielite, causada por um vírus neurotrópico que ataca as colunas de motoneurônios do corno anterior, acomentado desigualmente os diversos grupamentos musculares. Por essa razão, a fraqueza nesse tipo de lesão tem distribuição predominantemente focal e assimétrica. Em infecções mais leves, há o acometimento de músculos com funções semelhantes e sinérgicas, já em infecções mais graves todo o membro (ou mais de um membro) pode estar acometido. Existe uma somatotopia bem definida dos motoneurônios no corno anterior. Na sua parte anterior, estão os neurônios relacionados com a inervação dos músculos extensores, enquanto na posterior estão relacionados à musculatura flexora, em sua parte lateral, estão os motoneurônios responsáveis pela motricidade da musculatura distal (ou apendicular), e na sua parte medial, os relacionados à musculatura proximal (ou axial). Não existe alteração da sensibilidade e os reflexos miotáticos estão diminuídos ou ausentes, já que não existe mais a alça eferente do arco reflexo. Da mesma forma, também encontra-se uma hipotonia flácida dos músculos da região acometida. Com o passar do tempo, a atrofia muscular é proeminente. Raiz anterior da medula: ao saírem da medula, os motoneurônios fazem em grupo formando feixes denominados radículas nervosas, as quais se juntam, formando as chamadas raízes ventrais (ou anteriores). Lesões desse segmento da unidade motora causam um quadro muito semelhante ao encontro das lesões do corno anterior. Encontra-se uma fraqueza focal, com hipo ou arreflexia e hipotonia, na maioria das vezes sem alterações da sensibilidade. A atrofia também está presente, no entanto, nãose encontra fasciculação. A etiologia mais característica de lesão da raiz anterior são as hérnias de disco, que podem ser de dois tipos: central e lateral. As hérnias laterais têm o material protuso dos discos intervertebrais passando lateralmente pela medula e comprimindo a raiz anterior, o que causa dor radicular como um sintoma precoce, diferentemente das hérnias medias, em que, em geral, esse sintoma aparece mais tardiamente. Os dois tipos de hérnia causam, inicialmente, dor local por compressão do ligamento vertebral. Outra síndrome que também acomete as raízes nervosas, porém menos comum, é a polirradiculoneurite, uma doença sistêmica auto-imune, em que existem auto-anticorpos contra a bainha de mielina e que causa, por consequência, um quadro de fraqueza global, juntamente com arreflexia e ausência ou discreto déficit 25 NEUROLOGIA GABRIELA CARVALHO ABREU sensitivo. Apesar de a raiz ventral possuir predominantemente fibras motoras, alguns pacientes podem também se queixar de alterações sensitivas vagas, principalmente parestesias. Frequentemente o quadro inicia-se nos membros inferiores para depois acomenter segmentos mais rostrais. Plexo ou nervo: os nervos periféricos surgem da união de várias raízes que, por sua vez, surgem da raiz dorsal medular (sensitiva) com a raiz ventral (motora), sendo, portanto, funcionalmente mistos. Existem raízes para cada nível medular, dessa forma cada uma delas é responsável pela inervação de uma faixa de pele (dermátomo) do tronco, membros ou parte do segmento cefálico. O restante do segmento cefálico é suprido pelos nervos cranianos. Em nível cervical (C5-T1) e lombossacro, várias raízes se unem formando os plexos, respectivamente o plexo braquial responsável pela inervação do membro superior e plexo lombossacral, responsável pelo suprimento nervoso do membro inferior. Neuropatia periférica é o termo genérico que engloba os distúrbios dos nervos periféricos, existindo uma gama muito grande de doenças que causam esse quadro, sendo essencial, assim, que se investigue sua etiologia. Essas lesões, geralmente, cursam com um quadro de fraqueza restrito aos músculos suprido pelo nervo lesado, além de hipotonia ou arreflexia e, com a evolução do quadro, atrofia proeminente. Geralmente, não se observa fasciculação. O dado mais importante no diagnóstico de uma neuropatia é a alteração de sensibilidade. Assim, em termos práticos a presença de uma neuropatia periférica é surgida por uma fraqueza localizada ao território de um nervo periférico, associada a déficit sensitivo do mesmo segmento. Quando apenas um nervo é lesado, temos uma mononeuropatia (traumatismo direto e compressão são causa comuns); quando uma doença acomete os nervos periféricos de modo multifocal e aleatório, temos a chamada mononeuropatia múltipla, condição causada por um número relativamente limitada de afecções. Existem ainda as polineuropatias, definidas como processo patológico gradativo, simétrico e de predomínio distal dos nervos periféricos, dando o clássico padrão anestésico em ”bota e luva”, característico da neuropatia diabética e das carências vitaminicas, como a do alcoolismo. SÍNDROME CEREBELAR: A síndrome cerebelar é constituída de alterações da coordenação e do tônus muscular. Podem-se identificar os sintomas próprios da lesão do vermis e dos hemisférios cerebelares. As alterações dependentes das lesões hemisféricas se refletem nos membros e são sempre do mesmo lado. As decorrentes da lesão do vermis localizam-se de modo predominante no tronco. Os sinais e sintomas que constituem essa síndrome são: alterações dos movimentos ativos (ataxia) e alterações do tônus (hipotonia). 26 NEUROLOGIA GABRIELA CARVALHO ABREU Alterações dos movimentos ativos (ataxia): Dismetria: constitui um distúrbio na medida do movimento, verificável pelas provas dedo-nariz, calcanhar-joelho e das linhas horizontais. Dis ou adiadococinesia: é a dificuldade ou a incapacidade de realizar movimentos rápidos e alternados, como fazer alternadamente supinação e pronação da mão. Tremor: chamado tremor intencional, cinético ou cerebelar. Ocorre quando o paciente executa um movimento e reflete sua descontinuidade. Dis ou assinergia: é a dificuldade ou a incapacidade para efetuar um conjunto de movimentos que representam determinado ato. Assim, na mudança da posição deitada para a sentada, o paciente eleva demasiadamente os membros inferiores, fazendo com que esse ato seja difícil ou impossível. Disartria: é caracterizada pela fala lenta, monótona e explosiva. Disgrafia: as letras tornam-se maiores (macrografia) e muito irregulares. Distúrbios dos movimentos oculares: representados pela lentidão e descontinuidade dos movimentos, além da instabilidade na fixação dos olhos. Disbasia: marcha do tipo embrioso ou em zigue-zague, com ampliação da base de sustentação. Alterações do tônus (hipotonia): Exagero do balanço das extremidades distais dos membros. Aumento da passividade. Aumento da extensibilidade. Reflexos patelar e tricipital pendulares. É conveniente ressaltar que, apesar da dificuldade para manter o equilíbrio, o sinal de Romberg é negativo, porque o desequilíbrio não se modifica significativamente quando se fecham os olhos. As principais causas da síndrome cerebelar são: neoplasias, infecções, distúrbios vasculares (isquemia, hemorragia), intoxicações exógenas (álcool), uso de medicamentos (hidantoinato, piperazina), doença desmielinizante (esclerose múltipla), doenças heredodegenerativas e traumatismos. SÍNDROME DA HIPERTENSÃO INTRACRANIANA A pressão intracraniana é avaliada pela medida direta por sensor colocado dentro do crânio, por meio de trepanação, ou pela punção lombar com o paciente em decúbito lateral, em que a pressão normal é de 10 a 20cm de H20, normalmente 15cm de H20. Este equilíbrio pode ser rompido, transitória ou definitivamente, de acordo com vários fatores, como: aumento da massa cerebral, bloqueio do fluxo venoso, bloqueio da circulação ou da reabsorção do liquor, presença de sangue no interior do parênquima nervoso, no espaço subaracnóideo ou nos demais espaços. A síndrome de hipertensão intracraniana, resultante de aumento da pressão intracraniana, pode exteriorizar-se de modo agudo ou lento, dependendo da etiologia. Quando a evolução é gradual, caracteriza-se pelos sintomas: 27 NEUROLOGIA GABRIELA CARVALHO ABREU Cefaleia: ocasional, moderada e localizada na fase inicial, mais frequente pela manhã, passando a constante, intensa e global com a evolução do quadro clínico. Piora com a tosse ou esforço físico. É um sintoma praticamente constante e decorre da compressão ou tração das estruturas intracranianas sensíveis, como as leptomeninges, as artérias, as veias calibrosas e os seios venosos. Vômitos: bastante frequentes, ocorrem habitualmente depois de algum tempo de doença. Predominam pela manhã, quando o paciente passa da posição deitada para a sentada ou de pé; não têm relação com alimentação. São chamados de "vômitos cerebrais" ou, impropriamente, "vômitos em jato". Distinguem-se dos vômitos de origem digestiva por não apresentarem o período nauseoso que os antecedem. Os vômitos cerebrais ocorrem conforme a irritação dos centros eméticos bulbares. Vertigens: não muito frequentes, surgem habitualmente pela movimentação abrupta da cabeça. São mais comuns nas neoplasias da fossa posterior. Convulsão: Pouco frequente, ocorre mais em crianças e quando a hipertensão intracraniana evolui de modo rápido. Quase sempre é generalizada; quando focal,pode significar que o agente causal situa-se em área cerebral correspondente. Paralisia de nervos cranianos: Na maioria dos casos, o nervo abducente é o comprometido. Pode ser uni ou bilateral, e as manifestações que denunciam seu comprometimento são o estrabismo convergente e a diplopia. Transtornos psíquicos: mais comuns nas fases avançadas, caracterizam-se por irritabilidade, raciocínio lento, indiferença, confusão, desatenção, falta de iniciativa (embotamento global das funções mentais). Distúrbios autônomos: na fase avançada da hipertensão intracraniana, observam-se com frequência bradicardia e hipertensão arterial. A respiração pode mostrar-se alterada, tanto na frequência (taquipneia) quanto no ritmo (respiração de CheyneStokes ou de Biot), ou com períodos irregulares de apneia. Edema de papila: frequente, mas não obrigatório, em especial nas fases iniciais. Excepcionalmente, é unilateral e pode ser assimétrico. Eventualmente, alcança grande intensidade, sem prejuízo para a acuidade visual, no seu início. Contudo, sua evolução determina o aparecimento de atrofia do nervo óptico, levando à amaurose definitiva. Macrocrania: ocorre apenas em crianças pequenas, antes da consolidação definitiva das suturas cranianas. Um dado clínico simples, mas de grande significado, é a presença de abaulamento da fontanela anterior, quando aberta. A hipertensão intracraniana determina, também, uma série de eventos reconhecidos à fundoscopia, ou seja, desaparecimento do pulso venoso, turgência venosa, focos hemorrágicos e atrofia papilar pós-edema. Causas mais comuns de hipertensão intracraniana são: tumores, abscessos, meningite, hidrocefalia, hemorragia cerebral ou subaracnóidea, traumatismo com ou sem hematoma, tromboflebite cerebral, uso de medicamentos em crianças (tetraciclinas, 28 NEUROLOGIA GABRIELA CARVALHO ABREU vitamina A, ácido nalidíxico), estenose congênita do aqueduto silviano, neurocisticercose. SÍNDROME PARKISONIANA O parkinsonismo representa a mais frequente manifestação de disfunção do sistema extrapiramidal. A tríade característica da síndrome se compõe de rigidez, acinesia e tremor, aos quais se devem acrescentar os distúrbios posturais. A rigidez muscular no parkinsonismo é descrita como plástica, cérea, para diferenciá-la da espasticidade que ocorre nas lesões piramidais. Nesta, há predomínio de acometimento nos músculos antigravitacionais (flexores nos membros superiores e extensores nos membros inferiores), de modo que o paciente apresenta uma postura característica no lado afetado – postura de Wernicke-Mann, postura hemiplégica, com o membro inferior estendido, com pé equinovaro e membro superior com flexão no cotovelo e punho e pronação do antebraço e mão. Essa hipertonia, à manobra de manipulação passiva das articulações, é evidenciada pelo sinal do canivete, que consta de uma resistência aumentada no início do movimento e uma redução da resistência ao final, pela facilidade advinda da estimulação dos órgãos neurotendíneos. Em contrapartida, na rigidez parkinsoniana, os músculos de um segmento são afetados como um todo (flexores, extensores, pronadores, supinadores, adutores e abdutores); de tal modo que, na manobra de manipulação passiva das articulações, a resistência à deslocação é uniforme, sem "sinal do canivete", mas frequentemente aparece o sinal da roda dentada. Esse sinal é produto da fragmentação do movimento, que, em vez de se fazer de uma maneira contínua, ocorre de maneira entrecortada, como se a articulação fosse dotada de uma cremalheira na qual os dentes não estivessem exatamente se encaixando ou faltasse lubrificação adequada. A acinesia, hipocinesia ou bradicinesia é responsável por uma variedade de sintomas parkinsonianos, como a pobreza geral da motricidade, denunciada pela diminuição da expressão facial denominada amimia ou hipomimia, e gestual, pela perda de movimentos associados, como o do balanço dos membros superiores na marcha, diminuição ou falta do piscamento, baixo volume de voz, que se torna monótona, e a hesitação no início da marcha. Cumpre ressaltar que parte desses sintomas deve estar associada à rigidez, visto que podem apresentar melhora após cirurgia com a produção de lesões em núcleos do tálamo (talamotomias), quando a rigidez ameniza marcadamente. Uma parte dos sintomas acinéticos, no entanto, não melhora com tais lesões cirúrgicas. Embora estejam preservados os mecanismos perceptivos, que entram em jogo na decisão de realizar um movimento, o padrão e a sequência temporal na ação dos músculos envolvidos, os parkinsonianos têm um acréscimo no tempo para se movimentar. O suporte funcional para a manutenção do tempo dos movimentos em níveis normais parece ser dado pelo putame e globo pálido. O tremor da síndrome parkinsoniana, também definido como tremor de repouso, apresenta certas características que o identificam facilmente, na maior parte das vezes. Pelo menos nas manifestações iniciais, o tremor ocorre quando os membros estão em repouso, ao contrário do tremor essencial e de outros tremores, que ocorrem 29 NEUROLOGIA GABRIELA CARVALHO ABREU predominantemente durante a ação muscular. Caracteristicamente, um paciente com tremor parkinsoniano pode diminuí-lo ou aboli-lo, ao realizar um ato motor voluntário com o membro afetado. O tipo mais comum de tremor é o que realiza movimentos de "contar dinheiro" ou "rolar pílulas” em que os dedos da mão em flexão ritmada deslizam sobre a superfície palmar do polegar, em um gesto característico. Entretanto, a simples pronossupinação ou a flexoextensão do antebraço e mão também são comuns. Pode ter início em um dos membros superiores e posteriormente acometer o lado oposto, assim como ocorrer nos membros inferiores e cabeça. A instabilidade postural que frequentemente ocorre nos parkinsonianos se deve à perda de reflexos posturais; os quais possibilitam que se mantenha a postura ereta na posição sentada ou em pé, sem que seja necessário esforço voluntário. A propriocepção muscular, as aferências labirínticas e o sistema visual são algumas das fontes de alimentação do sistema extrapiramidal no controle do tônus postural. Os parkinsonianos assumem uma postura característica com a cabeça e o tronco fletidos anteriormente, e têm muita dificuldade de ajustar a sua postura quando se inclinam ou quando há súbitos deslocamentos do corpo, o que lhes facilita ter quedas ao solo. Outros sintomas acessórios ocorrem comumente nos parkinsonianos, muitos dos quais secundários aos 4 fenômenos básicos. A marcha se faz com o paciente enrijecido, sem os movimentos associados, a pequenos passos, tal qual um bloco semirrígido se deslocando. Os passos vão se acelerando, e o paciente parece estar correndo atrás de seu próprio eixo de gravidade. A escrita apresenta uma alteração progressiva, tornando-se quase incompreensível; inicia-se melhor, e as letras vão diminuindo de tamanho até desaparecerem (micrografia). Há incapacidade de se virar na cama durante o sono. Outra série de sintomas que revelam anormalidade na regulação autonômica costuma estar presente. Seborreia intensa, que leva à produção de um aspecto de blefarite e dermatite seborreica, e aumento da produção de saliva, concorrendo para perda dessa secreção pelas bordas labiais, são muito encontrados. A hipersalivação se associa a uma deficiência do reflexo de deglutição, explicando a perda salivar pelos cantos da boca. Ultimamente, tem sido dado muita ênfase a 2 aspectos que podem acompanhar as alterações motoras: a depressão psíquica e a decadência mental (demência), que uma considerável parte dos pacientesapresenta, a longo prazo. O parkinsonismo pode estar relacionado com uma enorme variedade de agentes etiológicos. No passado, o papel das infecções virais do sistema nervoso central foi muito valorizado; os casos em que se identificam inequivocadamente antecedentes de tais infecções são agrupados sob a denominação de parkinsonismo pós-encefálico. Algumas intoxicações podem causar a síndrome, tanto agudas, como as por monóxido de carbono, como crônicas, na contaminação pelo manganês. Casos desse tipo são denominados parkinsonismo por intoxicação. Vários medicamentos, incluindo as fenotiazinas (tranquilizantes antipsicóticos, como a clorpromazina, a levomepromazina, flufenazina e outros), os derivados da butirofenona (haloperidol), os bloqueadores de canal de cálcio (cinarizina e flunarizina), a alfametildopa, a metoclopramida e a reserpina, podem condicionar o aparecimento de uma síndrome parkinsoniana, denominada parkinsonismo induzido por medicamentos. Os casos em que uma eventual 30 NEUROLOGIA GABRIELA CARVALHO ABREU correlação entre arteriosclerose e parkinsonismo possa ser lembrada ficam restritos a um pequeno grupo em que infartos cerebrais se instalam nas regiões extrapiramidais relacionadas com a síndrome, ocasionadas por lesões arteriais determinadas pelo processo patológico mencionado. As hipóteses etiológicas atuais para DP incluem uma complexa interação entre fatores ambientais, tóxicos, predisposição genética e idade, e sua patogênese parece se relacionar com a disfunção do sistema ubiquitina-proteassoma e mitocondrial, iniciando a partir daí uma cascata de eventos que resulta na perda dopaminérgica característica da doença. De longe, o maior contingente de pacientes apresenta a variedade degenerativa, o assim chamado parkinsonismo idiopático, sem uma etiologia claramente definida. Assim como a decadência mental não pode ser explicada com base nas alterações do funcionamento do sistema extrapiramidal, a depressão psíquica também depende de anormalidades em outros setores. Como a depressão costuma ser um dos sintomas presentes nas manifestações iniciais dos processos demenciais e também pelo fato de que muitas deficiências cognitivas encontradas nas demências podem também aparecer nos deprimidos (p. ex., déficit de memória), torna-se um problema a diferenciação entre os 2 quadros, em muitos pacientes. Há um imbricamento entre tais processos, nem sempre diferenciáveis entre si. As teorias bioquimicas dos transtornos depressivos admitem que esse estado se deva a uma diminuição de concentração de alguns neurotransmissores, principalmente a norepinefrina, a dopamina e a serotonina, em áreas do córtex cerebral, especialmente nos lobos frontais e temporais, além das áreas corticais límbicas. O parkinsonismo, de modo particular na maneira idiopática (doença de Parkinson), ao lado da deficiência dopaminérgica estriatal, trazida pela morte dos neurônios da substância negra, apresenta também deficiência de outros neurotransmissores, como a norepinefrina e a serotonina, como resultado de morte de neurônios em outras áreas, como o locus coeruleus (norepinefrina) e núcleos da rafe mediana mesencefálica (serotonina). Por outro lado, muita ênfase se tem dado à rarefação do contingente de células oriundas da área tegmentada ventral, na parte reticular da substância negra, que formam o circuito mesocorticolímbico, também dopaminérgico, principal aferente das áreas límbicas, estas relacionadas com os mecanismos de expressão e percepção afetivas. O mesmo processo patológico atua sobre essas diferentes regiões no parkinsonismo, originando as manifestações psíquicas não relacionadas com os movimentos. O diagnóstico das múltiplas manifestações de parkinsonismo, como da própria síndrome em si, é feito exclusivamente do ponto de vista clínico, a partir da história clínica e do exame neurológico. Não se conhece ainda um marcador biológico que pudesse ser utilizado para o diagnóstico. Em casos raros de síndrome parkinsoniana associada a outras doenças, como a calcificação dos gânglios da base (com hipoparatireoidismo), parkinsonismos atípicos, como, por exemplo, atrofia de múltiplos sistemas, a paralisia supranuclear e a degeneração corticobasal, as degenerações olivopontocerebelares e a atrofia multissistêmica, investigações hematológicas, tomografia computadorizada e ressonância magnética cerebral são importantes na diferenciação com o parkinsonismo idiopático, no qual essas investigações não costumam revelar anormalidades. 31 NEUROLOGIA GABRIELA CARVALHO ABREU SÍNDROME DA TRANSECCÃO MEDULAR E SÍNDROME HEMISECCÃO MEDULAR Anatomicamente, a medula espinhal pode ser dividida em quarto regiões: Cervical (7 vértebras e 8 Segmentos medulares), Torácica (12v e 12sm), lombar (5v e 5sm) e sacral (5v fundidas e 5 sm). Os principais tratos relevantes clinicamente da medula são: Colunas dorsais (ascendentes) que transmitem a discriminação tátil, as sensibilidades vibratórias e posicional articular (chamada propriocepção); Tratos espinotalâmicos (ascendentes), que transmitem dor, temperatura e o toque grosseiro; Tratos corticoespinhais (descendentes) que conduzem as fibras relacionadas com o controle motor. O quadro clínico de síndromes medulares clássicas pode ser caracterizado por anormalidades sensitivas, motoras, esfincterianas e sexuais. Síndrome Causas Quadro Clínico Hemissecção transversa lateral da Medula (Brown-Séquard) Trauma (principalmente por arma de fogo), neoplasias, infecções, hemorragias. Ipsilateral à lesão: Paralisia (SNMS), abolição da sensibilidade vibratória e cinético postural. Contralateral: Perda de sensibilidades térmica e dolorosa. Transecção Medular (Completa da medula) Trauma, compressão Acometimento de todas as vias medulares ascendentes e descendentes. - Perda das funções sensitivas, motoras e autonômicas abaixo do nível da lesão bilateralmente.
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