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A MULHER , A HISTÓRIA , A GUERRA-FRIA E A RESERVA DE VAGAS Noely Manfredini Almeida * Não é verdade que a mulher antigamente se equiparava ao burro de carga, muito ao contrário. Tanto que na antiga Ásia Menor, o homem adotava o sobrenome materno e as filhas é que herdavam os bens. Predominavam no mundo as divindades femininas : Diana ou Ártemis, por exemplo. Conta a lenda que esta filha de Júpiter, rainha dos bosques e deusa da caça, foi surpreendida no banho por Acteon. Não teve dúvida: transformou-o em veado e fez com que os cães o devorassem. Não sei onde começou a guerra-fria entre homens e mulheres, porém. É certo que na Índia, segundo as leis de Manú, a mulher era equiparada a uma escrava e o noivo entregava ao sogro 100 vacas como espécie de contrato nupcial. Em compensação a mãe da noiva logo deu um jeito nesse costume: passou a exigir o direito de escolher o futuro marido da filha. A egípcia podia ser repudiada pelo marido se este alcançasse altos cargos públicos, mas em compensação, se ele falecesse, tomava seu lugar na direção dos negócios, com todos os efeitos jurídicos decorrentes. A mulher da civilização mesopotâmica, porém, logo tratou de consertar o problema: se fosse repudiada, era facultado recorrer aos tribunais a fim de obter a reparação de danos. Entre os gregos, foi célebre o ódio de Eurípedes contra a mulher. Foi um dos três maiores poetas trágicos da antiga Grécia, é verdade, mas conta a História que ele acabou sendo devorado por cães, na Macedônia. Se alguma mulher deu o sinal de partida aos cães, ninguém falou disso, pelo menos não, abertamente... E que não se esqueça da herança dos hebreus, antes de Moisés, quando o poder dos pais era absoluto sobre os filhos. Mas o libertador de Israel não foi jogado nas águas do Nilo com todos os outros filhos varões? E quem o colocou numa cesta para que não morresse afogado? A mãe. E quem o recolheu também era mulher. Quanto à viúva hebraica que não tivesse procriado filhos, podia exigir, inclusive judicialmente, que um cunhado a desposasse... e isso , a meu ver, só podia ser vingança. Teodora, filha de prostituta, chegou a imperatriz do Império Romano no século VI e ali reinou por 22 anos. Dizem, dizem, não sei, que Justiniano, seu marido, procedeu à codificação das leis romanas debaixo de sua inspiração. É dela a frase : "a audácia é nossa única esperança." Em troca, é de Catão, o Velho, (escritor romano A.C.), a frase : " as nações em geral dominam suas mulheres, ao passo que os romanos são dominados pelas suas... "- ficando aí, visível, a sua queixa. O certo é que a emancipação feminina, com certeza, começou a firmar no Império Romano, cujo povo era essencialmente prático. A mulher tinha direito absoluto sobre os seus bens e ao marido cabia apenas a administração. Então começaram os divórcios, por não se conformar o marido com essa submissão e talvez ali tivesse começado o troca-troca de vinganças, pelo uso dos direitos com tanta liberdade , porque os homens instituíram, a seguir, leis contra as adúlteras; se condenada, cumpria à mulher devolver as chaves da casa. Pura guerra-fria, hão de concordar comigo,senhores. Que tal lembrar dos celtas, ( gauleses da região central da Europa) ? O divórcio era de uso corrente e qualquer das partes podia promovê-lo. A divorciada recebia de volta o dote nupcial e podia contrair novo casamento . Os homens então inventaram uma lei dizendo que seu primeiro esposo tinha o direito de retomá-la (à mulher e não ao dote) antes da consumação do segundo casamento. As muçulmanas, antigamente, não eram impedidas de visitar seus homens, de andar em longas distâncias pelas ruas ou orar nas mesquitas. Mais tarde é que os maridos decidiram estabelecer o véu e confiná-las em haréns - diga-se em favor deles que consideravam estes haréns equivalentes a santuários. A mulher, por sua vez, sabiamente não reclamava desse costume, porque entendia ser, a segregação, sinal de deferência à sua pessoa. Em tempos mais recentes, o que dizer da Estátua da Liberdade, inaugurada em 1886, na baía de Nova York, orgulho de milhões de americanos? Não passa da representação de 95 metros e 5 toneladas de uma mulher. Aliás, também cantada em versos pelo Padre Antonio, o Príncipe dos Poetas Cearenses, em 1863, que prodigalizava a beleza das formas femininas. Costume que perdura, é verdade. Apesar de, lá, na Idade Média, Crisóstomo ter dito que a mulher era "um mal necessário, uma calamidade desejável e o próprio mal que se mostra sob disfarce..." e apesar de, a tradução do nome Crisóstomo significar "aquele que tem boca dourada "... ;e, apesar de se saber que, concordando com ele, Tomás de Aquino tenha, depois, escrito, que a sujeição da mulher estava de acordo com a lei da natureza e, assim, haja recomendado aos filhos, em geral, que amassem mais aos pais que às mães. Pura deslealdade, hão de convir, senhores. No século XIII a mulher ocupava posição claramente inferior ao homem; sua palavra não era aceita nos tribunais; era-lhe vedado exercer a medicina; trabalhando nas fábricas, recebia menor salário, pelo mesmo serviço executado pelo homem; se insultada por um ofensor, a multa era de, apenas, a metade do que seria pago a um homem ofendido. Mesmo assim, a mulher medieval era inspiradora de artistas, príncipes, poetas e heróis outros. Brilhou nas letras e encantava reuniões sociais, ao lado do marido, geralmente um analfabeto (diz a História, não eu) . Como deixar de lembrar nomes famosos pela energia ou habilidade com que regeram seus domínios : Branca, viúva de Luís VII, que desfez mil conchavos em oposição à Coroa; Ana D'Áustria, mulher regente durante a menoridade de seu filho Luís XIV; Madame Du Barry e Madame Pompadour, que dizem, dizem, reinaram no lugar do rei Luís XV ? E Maria Antonieta, guilhotinada sem provas concretas, como se fosse a culpada de todos os males da Revolução Francesa? Frtjof Capra, em seu livro "O ponto de Mutação", explica que, a evolução de uma sociedade está intimamente ligada a mudanças no sistema de valores que serve de base a todas as suas manifestações e que os valores inspiradores da vida de uma sociedade determinarão sua visão do mundo. Uma vez expresso e codificado o conjunto de valores e metas, ele constituirá a estrutura das percepções, intuições e opções da sociedade, para que haja inovação e adaptação social. À medida que um sistema de valores culturais muda, surgem, de fato, novos padrões de evolução cultural. Desculpem-me, porém, os senhores homens: quando a ciência econômica passou a figurar como disciplina separada da filosofia e da política e se consubstanciou no enfoque básico da necessidade da riqueza material, os valores masculinos e de orientação yang deram ênfase à aquisição de bens materiais, à obsessão pela competição, o desenfreado amor pela tecnologia. Ao lado disto e ao atribuir excessiva ênfase a tais valores, a sociedade encorajou a busca de metas não-éticas e à prática do orgulho, egoísmo, ganância. O comércio, por exemplo, tinha, antigamente, escassa motivação econômica de lucro e compensações individuais, embora houvesse, claro e sempre haverá, pessoas de ambos os lados agindo motivadas pela necessidade de poder e dominação. Havia, também, e ainda há, uma vaga idéia baseada na ética do trabalho protestante, onde o trabalho árduo, diligente e abnegado dos homens são equiparados e qualificados como virtude. A ascensão do capitalismo, por volta do final da Idade Média, conduziu, é fato, à mudança de valores, entendendo-se que, os valores e atividades de orientação yang, de comportamento agressivo, competitivo, a acumulação de reservas de ouro e prata, maquinários e peões, eram melhores que a orientação yin, de valorese atividades integrativas, de contato calorosamente humano, de apaziguamento de conflitos. Entendo que por esta época, o mundo ficou, senhores, vazio. Estéril. Sem lastro. Propício a ações individualistas, jamais pela comunidade. Uma nova invertida vem ocorrendo, agora, ao final do século XX. Porque são necessárias respostas para os grandes desafios de salvar a Humanidade do caos - e elas não estão vindo dos homens. No Paraná, a cada 7 minutos pratica-se um delito e a cada 36 ocorre um crime violento. Em 1995, as estatísticas policiais apontaram 2.226 crimes contra os costumes, sendo 148 por estupro, 95 por atentado ao pudor, 63 casos de sedução. O resto ficou por contra dos crimes contra a administração pública, a fé pública e a paz pública, nenhum destes encaixando a mulher como protagonista e ré. Em Minas, os crimes contra a mulher somaram, de 1995 ao primeiro semestre de 1996, cerca de 17.625 casos, representando 15% dos 115 mil processos criminais em andamento no Estado. Em S.Paulo 90% dos estupradores são pais, amigos, vizinhos, parentes ou namorados das mulheres, ou seja, são pessoas conhecidas das vítimas, estas, entre 8-20 anos. No Brasil o eleitorado feminino somava, em 1995, cerca de 52% e a frase mais ouvida em Brasília, dizem, dizem, era de que, 46% do eleitorado é incompetente - mas, certamente não se estava falando das mulheres, em si, embora, digam por lá, se dá graças aos céus por ser de, apenas, 6% o percentual de mulheres que ocupam cargos parlamentares, entre os 513 deputados e 81 senadores eleitos e 27 suplentes que assumiram a vaga de titulares, no início do período legislativo. No cômputo geral, convenham comigo, senhores: a taxa de avaliação de desempenho dos congressistas, desde a posse em janeiro até o natal/95, caiu, de 34% para 19%. Sem contar os processos criminais contra ex-prefeitos, gerando a restrição da habilitação para futuros cargos públicos, por bom período. Sem contar, também, a queda estarrecedora de comportamentos éticos na vida pública, a que temos assistido, por todo esse Brasil imenso. A classe política tem dado motivos sobejos para que se lhe irroguem falta de solidez ética e de escrúpulos, esquecendo-se que os eleitores, sobretudo os jovens, precisam de bons paradigmas que os orientem. Vereadores em pé de guerra, denunciando corrupções de prefeitos, como recentemente em Guaratuba, balneário do Paraná. Vereador condenado a 3 anos de reclusão em S.Jerônimo da Serra-PR, por ter causado, a murros, deformidade permanente no nariz de um colega, em 1995, além de outro, condenado por estelionato no mesmo ano. A participação de ex-vereador em roubo de sacas de café, em Diamante do Norte-PR, em 1995 ou de ex- vereador, preso por promover quebra-quebra nas dependências da Cohab, em Curitiba, dez/95. Fraudação de votos e boletins de urnas no Rio, nas eleições de 94, envolvendo 100 nomes masculinos com aquela grega, a Maria Stavrinou. Vestígios de cocaína nas vísceras do prefeito, recentemente falecido, de Casa Branca, município de S.Paulo. Prefeito de Jardim Olinda-PR, respondendo a 4 inquéritos por crimes de corrupção, estelionato, suborno e apropriação indébita, em dez/95. Procurador de Justiça denunciando ex-prefeito de Pato Branco-PR, pela prática de 3 infrações penais relacionadas a processos de licitações irregulares. Subtenente da PM da Paraíba, denunciando, como mandante de um assassinato com 30 tiros de metralhadora, um deputado federal e ex-governador daquele Estado, em janeiro de 96. Agressões entre senadores, como a troca de socos em plenário, envolvendo personalidade eleita pelo PFL e outra, pelo PMDB. Ou, ainda, a ameaça de bate-bocas, entre um ex-governador paranaense e atual senador pelo PMDB e outro, senador pelo PTB. Representação de senadores do Acre contra o atual governador, pedindo investigações sobre o envolvimento dele com empresa colombiana, para exploração, dita irregular, de 1/3 das florestas acreanas e não só isto, mas outros 17 casos em investigação na Procuradoria Geral da República. O grande número de processos contra políticos gaúchos, cerca de 250 e que vão desde crimes contra a administração pública até a casos de homicídios, inclusive, levando o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, a criar uma câmara criminal somente para analisá- los. A violência nas campanhas eleitorais de 1992, onde, em comícios, facadas e tiros mataram cabos eleitorais e eleitores, na Bahia. O tráfico de influências e a ajuda de amigos com dinheiro do Tesouro Nacional, no caso PC Farias-Collor, em 1992. O assassinato do senador Olavo Pires, candidato a governador por Rondônia, em 1990. Ou o caso do ex-deputado estadual e ex- prefeito ,Tomazelli, pai do atual prefeito e morto com 4 tiros, em Campo Grande-MS, em fevereiro deste ano. Sem contar os socos e chutes entre o Vice-Presidente e o Presidente de Gana .Os presidentes americanos mulherengos. Presidentes envolvidos em operação de fundos ilegais, como o da Coréia do Sul. Processos e ordem de prisão contra o Vice, do Equador, por enriquecimento ilegal. Sem falar de um passado torturante de assassinatos políticos, como a chacina da família imperial russa; a morte do arquiduque da Áustria que detonaria a I Guerra Mundial; Abraham Lincoln; dois Kennedys; Martir Luther King; Mahtma Gandhi. E bem recentemente, as mortes violentas de Anuar Sadat e Yitzhak Rabin. Ou das 15 pessoas degoladas, enquanto dormiam em uma cidade a 150 kms. de Argel, assassinadas por extremistas muçulmanos. Ou a morte com 3 tiros do candidato Benhadid, ao anunciar que disputaria as eleições presidenciais na Argélia. Ou o caso dos deputados de Taiwan, Formosa, trocando socos e bofetões em volta da Mesa da presidência do Parlamento. É difícil, ouvir falar em moral e ética masculinas, sem reprimir uma espécie de sorrisinho de mofa. Quero falar, pois, das 100 mulheres que fizeram o mundo avançar, neste século. Que lutam contra a exploração sexual de crianças na Ásia ou denunciam a loucura assassina em Ruanda; que chegaram ao Everest, como Junko Tabei, organizadora de "lixeiros" pelas montanhas do mundo. Das que reclamam contra a poluição e atividades nucleares. Daquelas que gritam sobre a russificação da Sibéria, contra a cultura e o meio ambiente em que vivem, como Galina Yegorova ou que rechaçam, com veemência, contra guerras e a entrada de crianças no front, como Graça Machel, de Moçambique.. Mulheres contra esquadrões da morte e outras violências, como Marilene de Souza, no Rio, ou Anna Syomina, que envia pequenos ucranianos órfãos para férias em regiões saudáveis . Mulheres a favor das focas, do uso de preservativos, do habitat dos esquimós, dos filhos de domésticas haitinianas, do reconforto das crianças de rua - brasileiras ou vietnamitas. Que salvam a Terra, como terra em si, a exemplo, Wangari Maathai que mobilizou outras tantas a plantarem 10 milhões de árvores no Quênia. Que lutam pela igualdade, como Marinella, advogada que batalha para abrandar as condições severíssimas de detenção, nas quais se encontram as prisioneiras venezuelanas. Ou criadoras de serviços de atendimento a soropositivos, como a médica marroquina Hakima. Ou a psiquiatra suíça Annie, que atende especificamente a mães toxicômanas. Como não falar de Monique Daviaud, de 72 anos, denunciadora das condições indignas das prisões francesas? Ou da cingalesa Manorani , líder de um movimento de mães de 25 mil desaparecidos de Sri Lanka? Ou da deputada Leyla Zana, condenada à prisão por 15 anos ao ter denunciado os crimes do Estado turco contra a minoria curda? Ou de Rosa, a líder das Mães de Mayo argentina ? Ou Denise Frossard, a juíza carioca que ousou atacar, enquanto viva, a máfia de bicheiros ? Relembrar a deputada Marta Suplicy afirmando que a mulher tem direito ao prazer e que, além disso, precisa participar mais intensamente da política como parlamentar. Dá para esquecer a deputada colombiana Eulalia Gonzales, que milita pela preservação da cultura do seu povo, os índios embera? Ou das minhas 25 mães de presos paranaenses aidéticos, que publicaram, até, um livreto de receitas com remédios caseiros, ainda hoje impedido de entrar, abertamente, nos presídios? Ou das mães da Cinelândia, no Rio, em busca dos filhos desaparecidos? Vou continuar falando de mulheres nota 1.000 porque, como deixar de citar nomes das que, pouco a pouco, fizeram o mundo avançar, celebradas na Quarta Conferência Mundial em Pequim? A isto me propus, ao relembrar o declínio dos parlamentos ( já desenhado desde 1970 por pesquisadores outros) e porque levo em conta a comprovação de que mulher continua discriminando mulher, nas eleições, em absurda desmemória cultural . Como esquecer de Domenica, ex-prostituta alemã que, aos 48 anos, resolveu dedicar-se aos filhos de prostitutas de Hamburgo e às mulheres sem moradias fixas? Da socióloga americana Kathy Barry, criadora da coalizão contra o tráfico de mulheres e o abuso sexual contra as asiáticas? A Irmã Sarah, egípcia que ajuda 40 mil pobres do Cairo ou Mère Sofia, da Suíça, uma freira sem direito a usar o hábito e que percorre Lausanne, atrás de sem-tetos e viciados. Não lembrar de Osmarina Silva, senadora do Acre e batalhadora do desenvolvimento da Amazônia? Ou não citar Marjan Sax, criadora do "Mama Cash", associação holandesa que empresta dinheiro para mulheres realizarem seus projetos? E simplesmente é impossível esquecer Radhika, denunciando à ONU as 100 milhões de mulheres anualmente mutiladas, sexualmente, na África. Mas lembro agora, de outra, a primeira mulher eleita na América do Sul, ALZIRA SORIANO; prefeita de Lajes, em 1929, município do Rio Grade do Norte e quando ainda nem estava nacionalmente instituído o voto feminino, implantado só em 1932. Com idades que vão entre 17 e 83 anos, elas são juízas, médicas, políticas, estudantes, mães de família, militantes e líderes em defesa dos direitos humanos e do planeta. São mil, dez mil ou mais, nos cinco continentes e não param de crescer, por dentro e por fora. Não se preocupam, é verdade, com a reserva de vagas a candidaturas. Porque a verdade é que não param de crescer ética e espiritualmente, em ritmo vertiginoso - desde os tempos em que se dizia ser a mulher equiparada a um burro de carga, ou, quando podia ser vendida ao noivo pelo valor de 100 vacas, como na Índia antiga. Os senhores homens me desculpem, porém, 8 de março foi consagrado como Dia Internacional da Mulher- não pelos seus belos olhos, mas, porque outras 129, desconhecidas operárias a exigir melhores condições de trabalho, em 1857, foram trancadas e queimadas vivas, em uma fábrica de Nova York . Que me desculpem, os senhores, se não acredito mais nas espertezas politiqueiras, símbolos, pecados e pecadilhos. Na dança de partidos em busca de mais poder nas Comissões ou corredores de Brasília. Nas legendas de pasquim ou nos currículos portentosos dos cibercandidatos da Internet, que se aproveitam de uma brecha na legislação. Na divulgação, meio que cheia de orgulho, das famosas depressões do Collor , do coração bêbado do Ieltsin ou da história do Tampax do príncipe Charles. Sou mais Teodora, a imperatriz romana, que ousou dizer, durante seus 22 anos de reinado: "a audácia é nossa única esperança...". Há 22 milhões de anos surgiu o homem na face da terra, mas, de ambos os lados, o preconceito continua a ter mais raízes que os princípios, como disse, um dia, Maquiavel. As mulheres, é preciso concordar com as que lutam pela reserva de vagas, têm tido pouco espaço nos partidos políticos que justamente se dizem adeptos da igualdade de direitos e oportunidades. Guerra-fria das mais inconvenientes, penso eu: afinal, podemos estar a elogiar mulheres esquecendo-nos das sangüinárias, muito conhecidas ao longo dos tempos. Nem todas estamos libertas dos males antigos, é verdade. Nem todas estamos aptas ou desejosas de corresponder ao sistema de cotas garantido pelo Presidente da República, recentemente. Porque, no fundo, estamos é buscando, com urgência, resgatar a reflexão sobre os valores e atividades sob a orientação yin. Temos tanto, a aprender... Concordo com a participação do Fundo das Nações Unidas, que pretende patrocinar cursos de capacitação para mulheres candidatas, de qualquer Partido. Não concordo é com a reserva de vagas. Entendo que a preferência dos eleitores é que deverá estabelecer o melhor percentual para prefeitas e vereadoras a serem eleitas, sem uso de nenhum argumento adicional. Nos países escandinavos a cota chega a 40%, mas, como em outros 15 países, o sistema é o de Listas Fechadas de Candidatos e então, sim, cada Partido pode garantir a proporcionalidade classifi-classificatória, para candidatos dos dois sexos. Não é este o sistema brasileiro. O que deve ser levado em conta é a disputa leal entre candidatos, durante as convenções; buscar aqueles de maior tirocínio, larga experiência, lastro distrital ou até nacional, segundo as áreas de influência efetivas. Candidatos vinculados à bandeira do seu partido. Deve-se coibir, isto sim e dentro dos Diretórios, posições individualistas e o impacto do poder econômico. A distorção, posterior, da disputa desleal e desigual, economicamente, por votos, entre candidatos de um mesmo partido - porque, isto sim, diminui a consistência ideológica das agremiações políticas e afasta, da reta, futuros líderes. Há, de fato, entre as mulheres, uma resistência para o ingresso na política, até por outro motivo: não há nada de novo, a fazer, por ali, neste momento. E a busca de novos talentos não pode passar pela reserva de vagas, com a desculpa de que se está ignorando a voz da minoria. Até nem somos mais minoria, segundo o IBGE e porque existem outras, como a dos gays, deficientes físicos ou negros. Haverá, para eles, também, um futuro sistema de cotas? Mais importante que uma cota específica, precisamos é ter consciência política e opinar, publicamente, sobre questões nacionais e da nossa comunidade. Para influir na tomada de decisões, independente de cargos eletivos. Esquecer a barreira da timidez, como fizeram as 100 homenageadas na Conferência de Pequim. Esquecer a presença maciça masculina nas Vereanças, Assembléias, Governos e Senados. Balela, essa história de que homem sozinho não vai a lugar nenhum. Desculpem-me as senhoras mulheres: fazer, agir, trabalhar, unir, crescer por dentro e por fora - devem ser as metas. O resto é conseqüência. * Coordenadora de Comunicações do TRE/PR e autora dos livros “Jurisprudência Eleitoral: 1985 – 1990 e “Crimes Eleitorais e Outras Infringências”, em co-autores.
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