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Extensivo Semanal Trabalhista – Direito Administrativo – Fernanda Marinela – 08.03.2010 – Aula n. 03 EXTENSIVO SEMANAL TRABALHISTA Disciplina: Direito Administrativo Prof.: Fernanda Marinela Data: 08.03.2010 Aula nº 03 MATERIAL DE APOIO – MONITORIA Índice 1. Artigos Correlatos 1.1 Princípio da eficiência. Ainda a inspiração do gerente público? 1.2 O princípio da isonomia e os privilégios processuais. 1.3 Uma visão crítica do princípio da proporcionalidade. 1.4 Comentário sobre a decisão proferida no julgamento da Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 45/DF. 2. Assista!!! 2.1 O que se entende por dimensão substancial do princípio do contraditório? 3. Simulados 1. ARTIGOS CORRELATOS 1.1 PRINCÍPIO DA EFICIÊNCIA. AINDA A INSPIRAÇÃO DO GERENTE PÚBLICO? Claudio Rozza Auditor Fiscal no Paraná Elaborado em 03.2009 1 INTRODUÇÃO Este trabalho objetiva rediscutir o princípio da eficiência ao lado dos demais princípios constitucionais (art. 37, caput, da Constituição Federal/88) no gerenciamento da coisa pública, em meio a reflexos de crise financeira internacional, marolas e tsunâmis. Sem verticalização de aprofundamento teórico, e receando inevitáveis imprecisões ao tratar de temas tão fluidos, são reutilizados termos como Estado-rede, Estado enxuto, Agências Executivas, Agências Reguladoras, Organizações Sociais, Contratos de Gestão, Consórcios e Convênios. Como a inclusão do princípio da eficiência deve-se a poder constituinte derivado, também se debate sobre a coincidência com os demais princípios e com os objetivos perseguidos pelo ordenamento jurídico inaugurado pela Constituição de 1988. A inspiração neoliberal do princípio da eficiência, num mundo denominado globalizado, pode ter como raiz a antiga discussão sobre a predominância de um dos fatores de produção (capital) sobre o outro (trabalho). O rumo tomado pela legislação infraconstitucional decorrente da Emenda 19 parece ser no sentido de equilibrar as contas públicas, com provável aumento de desemprego, agora causado também por dispensas no setor público, mediante programas de desligamento voluntário e avaliação de desempenho. Por vezes, ars gratia artis, o controle pelo controle, legalista, formal, esquecido o seu caráter instrumental. Por vezes, denigre-se a imagem do serviço público, o olhar fixo na privatização de fatias importantes na área da saúde suplementar, aposentadoria suplementar, segurança particular, concessões, benesses, carências e juros subsidiados. Sem renovação dos quadros de servidores necessários à promoção de serviço público, sem qualificação dos existentes, obrigados a trabalhar pelas vagas não preenchidas, por parcos e congelados vencimentos, agravam-se as deficiências em Extensivo Semanal Trabalhista – Direito Administrativo – Fernanda Marinela – 08.03.2010 – Aula n. 03 meio e com a desculpa da crise financeira mundial, da lei de responsabilidade fiscal, dos cortes orçamentários, necessários ao cumprimento do superávit primário, aumentando, círculo vicioso, a carência de médicos, professores, policiais... Que compatibilidade teria o princípio da eficiência em face dos objetivos destacados pela Constituição Federal (art. 3º, CF/88) se os efeitos decorrentes de sua aplicação gerassem equilíbrio nas contas públicas em detrimento do bem-estar social? Sua aplicação pela administração pública deve ser idêntica em países já estabilizados economicamente e em países "em desenvolvimento"? Em que sentido o princípio da eficiência será útil à nação ao se desdobrar em regramentos e orientar a Administração Pública? -------------------------------------------------------------------------------- 2 PRINCÍPIO Sob inspiração neoliberal, a Emenda Constitucional 19 introduziu, entre os princípios regedores da Administração Pública, o da eficiência. Art. 37, caput: A Administração Pública direta e indireta de qualquer dos poderes da União, dos Estados, do Distrito Federa e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência (...). O modelo de Estado voltado para as preocupações sociais assumiu tantas responsabilidades que, inchado em sua estrutura, não consegue nem recursos para continuar oferecendo os serviços públicos à comunidade, nem exercer o controle sobre o seu próprio organismo. Sem conseguir satisfazer plenamente a uma crescente exigência da sociedade, os governos vendem a imagem não do Estado do bem-estar social, que se não consegue manter, mas de um Estado enxuto. A visão é um tanto diferente da do Estado puramente liberal da era da industrialização. A orientação é para que se possibilite o atendimento ao cidadão usuário de serviço público. Nesta perspectiva, o Estado deixa de participar intensivamente da atividade econômica. Os interesses coletivos têm sua relevância alterada com o passar do tempo. O que constitui interesse público necessariamente será o reflexo do dinamismo expresso historicamente, fruto da cultura e da ideologia dominante. O Estado se relaciona ao mesmo tempo com vários níveis de vínculos, ora nacionais, com seus entes federados, ora com o concerto internacional de nações. O novo Estado, quase a abdicar de sua soberania, vincula-se a outras entidades políticas e todas elas são permeáveis ao intercâmbio econômico, cuja tendência maior é a ação livre de amarras legislativas. Na onda da globalização, na era da informática que revoluciona a comunicação, o exercício da cidadania, exige um Estado-rede capaz de autuar em conjunto com a sociedade e para isso observam-se princípios da subsidiariedade (o Estado substituído pela sociedade ou empresa em tudo o que não seja mais necessária a sua atuação), da flexibilidade na organização e atuação da administração, da coordenação, da participação cidadã, da transparência administrativa, da modernização tecnológica, entre outros [01]. No plano interno, o Estado brasileiro, até a década de 80, teve um participação cada vez maior na economia, quando a iniciativa privada, devido à maturação exigida pela implantação de alguns projetos, não dispunha de recursos ou por que a segurança nacional podia se ver ameaçada. Mas a década de 80 manifestou que o Estado não era mais capaz de arcar com a atividade pública empresarial assumida e, a partir de 1990, implantou-se uma política de privatização. Na perseguição do que se convencionou chamar de Administração Pública Gerencial, a implantação progressiva e crescente do processo de privatização inaugura um sistema peculiar Extensivo Semanal Trabalhista – Direito Administrativo – Fernanda Marinela – 08.03.2010 – Aula n. 03 de fiscalização e controle estatal sobre a eficiência dos serviços privatizados e a eficiência do próprio serviço público. [02] A primeira fase de descentralização se deu através de criação de autarquias, empresas públicas, sociedade de economia mista. Numa segunda etapa ocorreu mais intensamente o enxugamento das atividades estatais, hoje arrefecida, tem termos. a visão privatizante. O papel do Estado com relação à atividade econômica tende a limitar-se à fiscalização, incentivo e planejamento, consoante o artigo 174-CF: Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado tende a limitar-se à fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado. A diminuição do tamanho do Estado é devida a vários fatores, como: a)de ordem financeira, para diminuir os gastos públicos; b)de ordem jurídica, ao retornar ao particular a prestação do serviço público sem os controles que são exercidos sobre a Administração Pública; c)de ordem política, pela inspiração neoliberal. [03] Por meio das concessões, particulares prestam o serviçopúblico em seu próprio nome sob o controle da Administração Pública. O princípio da eficiência aponta para um novo modelo para a gerência da coisa pública mediante a utilização de conceitos trabalhados na administração da empresa privada. A eficiência diz respeito à produtividade, isto é, diz respeito a desempenho que se deve ter para atingir o resultado esperado. A ineficiência do atendimento às necessidades coletivas decorre de um Estado que cresceu muito e deixou de atender ao cidadão-usuário. Muitos se manifestaram entendendo, com relação ao princípio de eficiência que seu objetivo é claro: a obtenção de resultados positivos no exercício dos serviços públicos, satisfazendo as necessidades básicas dos administrados [04]. -------------------------------------------------------------------------------- 3 AGÊNCIAS E ORGANIZAÇÕES SOCIAIS As entidades que anteriormente foram criadas como autarquias, empresas públicas, recebem agora a imposição do princípio da eficiência. Como a atividade é exercida ou pelo próprio Estado, ou pelo particular, ambas as atividades sofrem controle para auferir-lhes o desempenho. A Administração Gerencial do Estado, cujo modelo foi introduzido pela Emenda Constitucional 19, passa pela utilização das Agências Executivas, Agências Reguladoras e das Organizações Sociais com controle exercido mediante cláusulas de Contrato de Gestão. Assim, são criadas para o desempenho da atividade controladora duas espécies de autarquias. As Agências Executivas para ação delimitada ao interior da própria administração da atividade pública, devendo obedecer a metas previamente estabelecidas. A Lei 9.649/98, de 27.5.98, ao dispor sobre a organização da Presidência da República e dos Ministérios, tratou nos artigos 51 e 52 das Agências Executivas, (a Lei 9.648, alterando o artigo 24, da Lei 8.666/93, amplia o limite de isenção do dever de licitar para as Agências Executivas). Extensivo Semanal Trabalhista – Direito Administrativo – Fernanda Marinela – 08.03.2010 – Aula n. 03 Exemplo: INMETRO – Instituto Nacional de Metrologia, Normatização e Qualidade Industrial. As Agências Reguladoras destinam-se ao controle das atividades exercidas pela iniciativa privada. Exemplos: ANEEL – Agência Nacional de Energia Elétrica (Lei 9.427/96, de 26.12.96), ANATEL – Agência Nacional de Telecomunicações (Lei 9.472/97, de 16.7.97), ANP – Agência Nacional de Petróleo (Lei 9.478/97, de 8.8.97). A Lei 9.637/98 apresenta algumas características que devem ter as Organizações Sociais: - pessoas jurídicas de direito privado; -sem fim lucrativo (associações, fundações); -atividade de ensino, pesquisa científica, desenvolvimento tecnológico, preservação do meio ambiente, cultura e saúde. Quando atuando em áreas próprias do setor público, cumpridos requisitos estabelecidos pela Lei 9.790/99, podem receber do poder público a denominação de OSCIPs – Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público. Poderão ser beneficiadas com recursos públicos e também por empréstimo da força de trabalho de servidores públicos. O particular, mediante Contrato de Gestão, atuará em seu próprio nome, sob regime privado, mas com apoio estatal. Tem sido denominada a atividade exercida pelas Organizações Sociais como de terceiro setor, nem puramente público, nem exatamente particular. Para não confundir com o setor terciário da economia, o da prestação de serviços (ao lado do primário e do secundário), também é denominado de setor quaternário. Exemplo de Organização Social: Associação Educativa Roquette Pinto. -------------------------------------------------------------------------------- 4 CONTRATO DE GESTÃO, CONVÊNIOS E CONSÓRCIOS As parcerias estabelecidas com Organizações Sociais para execução de atividades, que podem ser tanto públicas quanto privadas, como no caso de prestação de serviços na área de saúde ou da educação, usarão como instrumento de acordo os Contratos de Gestão, do qual também poderão se utilizar Agências Executivas e Reguladoras, conforme artigo 37, § 8º, da e se unirão num mesmo interesse público. A autonomia gerencial, orçamentária e financeira dos órgãos e entidades da Administração direta e indireta poderá ser ampliada mediante contrato, a ser firmado entre seus administradores e o poder público, que tenha por objeto a fixação de metas de desempenho para o órgão ou entidade, cabendo à lei dispor sobre: I-o prazo de duração do contrato; II-os controles e critérios de avaliação de desempenho, direitos, obrigações e responsabilidades dos dirigentes; III-a remuneração do pessoal. Na verdade, trata-se mais propriamente de um convênio, ou conjugação de esforços, e não de contrato. Contrato quer dizer acordo de vontades. Na Administração Pública direta, os entes que podem manifestar vontade são a União, Estados, Distrito Federal ou Municípios. Na visão orgânica da Extensivo Semanal Trabalhista – Direito Administrativo – Fernanda Marinela – 08.03.2010 – Aula n. 03 Administração, a entidade não pode contratar com o seu próprio órgão, porque o órgão não manifesta a vontade, o órgão pertence ao ente que manifesta a vontade. A denominação de contrato poderia caber quando referindo-se a acordo estabelecido com as Organizações Sociais, no entanto, o conceito se aproxima mais de um convênio pois não serão acordadas obrigações recíprocas. Tanto a Administração como as Organizações é que se unirão num mesmo interesse público. A modalidade do assim denominado "contrato de gestão" (ou como melhor expressão "acordo de programa") recebeu, com a Lei 9.637, de 13.3.98, que criou o Programa Nacional de Publicização, uma específica alternativa institucional padronizadora dos requisitos formais e materiais para a celebração e execução dos acordos a serem ajustados sob o regime público administrativo nela previsto, com vistas à publicização, por via de transferências administrativas, de atividades desenvolvidas por pessoas jurídicas de direito privado qualificadas como organizações sociais. [05] A nova ótica que se tenta imprimir à Administração Pública que sempre foi determinada por atos unilaterais ou de contratos administrativos caracterizados pelas cláusulas exorbitantes, admite agora maior flexibilidade na congregação de esforços entre particulares e governo para consecução de objetivos de interesse geral. Não são opostos, na verdade, os interesses públicos e os privados. O interesse privado está embutido no interesse público geral, do qual o particular participa. O indivíduo se congrega aos outros indivíduos, e, no Estado Democrático de Direito, comunga de interesses coletivos comuns. Daí que não é da Administração a preocupação na busca dos bens comuns. O interesse é de todos porque é de cada um que compõe este todo. Em conseqüência, a responsabilidade não é apenas do governo, a responsabilidade é de todos. Ao lado da ação estatal de visão hierarquizada, verticalizadora, de caráter subordinativo, pretende-se uma transição para uma visão cooperativista, horizontalizadora, de caráter coordenativo. Neste sentido, a nova redação do artigo 241, dada pela Emenda Constitucional 19: A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios disciplinarão por meio de lei os consórcios e os convênios de cooperação entre os entes federados, autorizando a gestão associada de serviços públicos, bem como a transferência total ou parcial de encargos, serviços, pessoal e bens essenciais à continuidade dos serviços transferidos. Pelo consórcio são estabelecidas metas comuns e cooperação no desempenho entre entidades públicas. Pelo convênio, as metas comuns e a cooperação de desempenho se estabelecem entre entidades quer sejam públicas ou privadas. O conjunto das disposições da Emenda Constitucional 19 traz parao governo a incumbência de agir de acordo com orientações administrativas praticadas pelos particulares ao gerir recursos com maior eficiência. Esta ideologia marcante em todos os quadrantes do mundo inspira mudanças legislativas em diversos países. -------------------------------------------------------------------------------- 5 OBJETIVO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL Para onde as reformas constitucionais estão levando o país? Se o país é ineficiente e inchado em sua estrutura, será tentando diminuir-lhe a gordura que atenderá melhor à população carente de sua atenção? Quem atenderá à população não será, necessariamente, um profissional de carreira, servidor público. Necessariamente, não será um funcionário público, consciente de seu múnus, a prestar o melhor serviço possível, e aperfeiçoar-se neste mister. Extensivo Semanal Trabalhista – Direito Administrativo – Fernanda Marinela – 08.03.2010 – Aula n. 03 O antigo servidor público é substituído por profissional ligado à área privada da economia. O interesse privado prevalece na atividade econômica (Art. 170-CF: A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social...) pois a sua exploração pelo Estado se limita aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei, segundo reza o artigo 173, da Constituição Federal. É do interesse privado a limitação do custo, do prejuízo, para obtenção de um lucro maior para o acionista. É nesta dimensão que se busca a satisfação do cliente. Cliente satisfeito é meio para obtenção do lucro. Sempre que se quer aumentar o lucro, diminui-se o custo. Não haverá motivo para atender alguém se este atendimento, esta prestação de serviço, não corresponder a ingresso de receita. Espera-se que a eficiência proporcione serviço público, atendimento a necessidades coletivas, atingindo o bem comum. O artigo 3º-CF manifesta a razão de ser do Estado brasileiro: Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I-construir uma sociedade livre, justa e solidária; II-garantir o desenvolvimento nacional; III-erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV-promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade, e quaisquer outras formas de discriminação. Este objetivo primeiro inspira toda a Constituição brasileira. É com esta perspectiva que a nação se organizou politicamente, e sob a inspiração desta Constituição se plasmou o ordenamento jurídico. Mas se não se coadunar com este interesse, o princípio da eficiência não estará condizente com o modelo de país que se quis traçar pela Constituição. A estes objetivos elencados no artigo 3º, da Constituição Federal, se vinculam os interesses públicos primários. Em busca dos interesses públicos secundários da Administração pretende-se alcançar, como qualquer outra entidade, uma melhor gerência de seus recursos, diminuindo seu custo com servidores, por exemplo. O princípio da eficiência, introduzido no conjunto de reformas administrativas pela Emenda Constitucional 19, deverá se traduzir em efeitos positivos para o conjunto da população e não se reduzir a índices estatísticos de demonstração de produtividade, apenas minorando custos para obtenção de equilíbrio nas contas públicas. Pelo princípio da moralidade, o agir deve ser em busca do bem, além da legalidade (compreende a lealdade e a boa-fé). Malversando recursos, pelo princípio da indisponibilidade dos bens públicos, não se buscaria a finalidade intrínseca do bem agir, buscando o objetivo maior do interesse público. Ora, projetos de normatização infraconstitucional têm o sentido de que seja atingido o equilíbrio na situação das contas do país. Quando se alcançar o equilíbrio, atingir-se-á a eficiência pelo gerenciamento adequado dos recursos disponíveis. Extensivo Semanal Trabalhista – Direito Administrativo – Fernanda Marinela – 08.03.2010 – Aula n. 03 A legislação complementar decorrente da Emenda Constitucional 19 visa a atingir o bem da população em geral, que amarga miséria e desemprego crescente, para minorar a sua situação, inclusive com saneamento básico, atendimento à saúde, educação? Ou apenas o saneamento das contas públicas? A responsabilidade fiscal é serviente da responsabilidade social. Um país com contas públicas acertadas é mais confiável para o capital estrangeiro que aqui poderá fazer a sua aplicação financeira na certeza de que o capital será corretamente amortizado e engordado de juros. O projeto de Lei Complementar 248 (disciplina a perda de cargo público por insuficiência de desempenho do servidor público estável), após votada na Câmara, recebeu emendas no Senado, retornou à Câmara, e tem sido retirada de pauta a sua discussão, passada a efervescência dos primeiros momentos da, em certo ponto, exagerada preponderância dos conceitos de gerência e de enxugamento da máquina pública. Discute-se a razoabilidade destas iniciativas nas circunstâncias conjunturais do país em que os índices de desemprego sempre se mantêm elevados. Tendências neoliberais visualizam a Administração Pública com maior produtividade num Estado "enxuto", e, para isto, preparam o arcabouço jurídico infraconstitucional. No mesmo sentido de tornar enxuto o Estado, a avalanche de discussões sobre o papel do Judiciário, seu controle externo e, por vezes, o preconizado fim da justiça especial do trabalho. Tornaram-se comuns expressões como flexibilização no sentido de adaptação de normas jurídicas diante do dinamismo das alterações provocadas pelo novo contexto econômico inspirado pela globalização, em meio a uma sempiterna crise financeira, em movimentos de sístole e diástole, marolas e tsunâmis. No Direito do Trabalho, por exemplo, tratam-se de temas como duração da jornada do trabalho, contratação, salários, visando a diminuir os encargos sociais, até em detrimento de direitos arduamente conquistados pelos trabalhadores. O termo "desregulamentação" tem sido utilizado tendo em vista uma redução de normas ditadas pelo Estado, deixando um maior espaço para a iniciativa privada [06]. Tudo parece ser em favor do fator de produção "capital" em detrimento do fator de produção "trabalho", numa tensão que se estende ao longo da História. Já houve época em que acordos entre a Administração Pública e os empresários permitiu que uma cesta básica sofresse pouca pressão inflacionária para possibilitar aos assalariados de menor renda melhor acesso ao alimento. No entanto, também grassa ou desgraça o desemprego. -------------------------------------------------------------------------------- 6 EFICIÊNCIA, PRODUTIVIDADE E EFICÁCIA A eficiência é avaliada comparando-se os resultados alcançados com os recursos utilizados. A produtividade é uma relação entre os recursos empregados e resultados obtidos: é medida contando-se quantas unidades de produção ou serviços são realizadas por uma unidade de recurso numa unidade de tempo. Um sistema eficiente é o que utiliza racionalmente seus recursos. Isto significa que, quanto maior a qualidade e a quantidade de recursos obtidos com o emprego dos recursos disponíveis, mais produtiva ou eficiente será a organização. [07] -------------------------------------------------------------------------------- 7 UTILIDADE DA EFICIÊNCIA De conformidade com a atualização realizada na obra de Hely Lopes Meirelles, por Eurico de Andrade Azevedo, Délcio Balestero Aleixo e José Emmanuel Burle Filho, na edição de 1999, em Extensivo Semanal Trabalhista – Direito Administrativo – Fernanda Marinela – 08.03.2010 – Aula n. 03 função da EmendaConstitucional 19, destacou-se que o princípio da eficiência exige que a atividade administrativa seja exercida com presteza, perfeição e rendimento funcional. É o mais moderno princípio da função administrativa, que já não se contenta em ser desempenhada apenas com legalidade, exigindo resultados positivos para o serviço público e satisfatório atendimento das necessidades da comunidade e de seus membros [08]. Há que se ver os aspectos positivos da utilização de técnicas administrativas gerenciais. No entanto, quando se visa mais ao resultado do que o meio, o receio é que os fins venham a justificar os meios. Assim, o princípio da moralidade deve sempre estar presente, para que não haja desvirtuamento do espírito geral e fundamental da Constituição de 1988, diante da Emenda 19, emanada por um poder constituinte derivado. No fundo, contudo, o agente ou sujeito da reforma é o poder constituinte originário, que, por esse método, atua em segundo grau, de modo indireto, pela outorga de competência a um órgão constituído para, em seu lugar, proceder às modificações que a realidade exige. [09] Por isso é importante salientar, e observar a tendência, as intenções, as entrelinhas, para que se preserve e se concretize a Constituição. Vale dizer que a eficiência é princípio que se soma aos demais princípios impostos à Administração, não podendo sobrepor-se a nenhum deles, especialmente ao da legalidade, sob pena de sérios riscos à segurança jurídica e ao próprio Estado de Direito. [10] O princípio da eficiência está já incluso no princípio da legalidade cujo desvirtuamento traduzirá pelo servidor público abuso de poder, ou desvio de finalidade, que será sempre voltada para o interesse público, e serve de moldura inclusive para atos denominados discricionários da Administração Pública. Os conflitos entre legalidade e eficiência terão no campo da temática espaço cativo e deverão ser enfrentados sem desprezo ao direito e à prevalência do verdadeiro interesse público. [11] O princípio da eficiência deve ser analisado na dependência do conjunto dos princípios que regem a administração pública. Quanto ao princípio da eficiência, não há nada a dizer sobre ele. Trata-se evidentemente, de algo mais do que desejável. Contudo, é juridicamente tão fluido e de tão difícil controle ao lume do Direito, que mais parece um simples adorno agregado ao art. 37 ou o extravasamento de uma aspiração dos que buliram no texto. [12] -------------------------------------------------------------------------------- 8 EXCESSO x RAZOABILIDADE Não é possível utilizar o mesmo princípio e com a mesma finalidade em países já resolvidos socialmente, já estruturados politicamente, como na economia estabilizada européia e em países da América Latina ou África que abrigam largo contingente de miseráveis. Uma vez reconhecido que nos Estados apenas formalmente democráticos o jogo espontâneo das forças sociais e econômicas não produziu, nem produz por si mesmo – ou ao menos não o faz em prazo aceitável – as transformações indispensáveis a uma real vivência democrática, resulta claro que, para eles, os ventos neoliberais, soprados de países cujos estádios de desenvolvimento são muito superiores, não oferecem as soluções acaso prestantes nestes últimos. Valem, certamente, como advertência contra excessos de intervencionismo estatal ou contra a tentativa infrutífera de fazer do Estado um eficiente protagonista estelar do universo econômico. Sem embargo, nos países que ainda não alcançaram o estágio político cultural requerido para uma prática real da democracia, o Estado tem de ser muito mais que um árbitro de conflitos de interesses individuais. [13] Extensivo Semanal Trabalhista – Direito Administrativo – Fernanda Marinela – 08.03.2010 – Aula n. 03 Há uma tendência hoje ao "darwinismo social". Só os fortes, os melhores, os eficientes da espécie sobrevivem. Os ineptos à concorrência, considerados indivíduos inferiores. O princípio da eficiência não deve submeter o fator de produção "trabalho" ao "capital". O fantasma do desemprego torna insegura a sociedade. As ameaças de exoneração de servidores, dispensa de empregados, PDVs (Planos de Demissão Voluntária) vêm como corolário do equilíbrio fiscal e das metas traçadas junto ao FMI (Fundo Monetário Internacional) e demais organismos financeiros internacionais. [14] Paulo Bonavides afirma que sua tese concluída no ano de 1958 permanece tema de igual importância na reflexão sobre a atualidade tendo em vista o ataque da ideologia neoliberal que o consagrado autor considera um verdadeiro retrocesso diante da evolução do direito. Com efeito, o Estado social contemporâneo compreende direito da primeira, da segunda, da terceira e da quarta gerações numa linha ascendente de desdobramento conjugado e contínuo, que principia com os direitos individuais, chega aos direitos sociais, prossegue com os direitos da fraternidade e alcança, finalmente, o último direito da condição política do homem: o direito à democracia. [15] Comenta, ainda, que escorado na globalidade, ele (referindo-se ao neo-liberalismo) é também o mesmo liberalismo de outrora, em cujo ventre o gênero humano viu gerar-se o desemprego, a fome, a penúria, a miséria, a enfermidade, o analfabetismo; flagelos de aguda intensidade neste fim de século, fazendo o mundo contemporâneo mais injusto e violento que o universo social da Revolução Industrial dos séculos XVIII e XIX [16]. -------------------------------------------------------------------------------- 9 CONCLUSÃO A eficiência atingiu o status de princípio constitucional por força de emenda, ou seja, por poder constituinte derivado. Precipuamente, será instrumento de utilidade para atingir o interesse público secundário, como decorre dos projetos de legislação infraconstitucional que inspirou. Todavia, o objetivo maior da nação brasileira expressa-se no artigo 3º da Constituição Federal e, nesta dimensão, deve ser analisada a eficiência. Quando e na medida em que o instrumental técnico da ciência da administração for colocado a serviço do interesse público primário e, somente neste diapasão, o novo princípio não estará afetando o espírito constitucional originário. Os demais princípios insculpidos na Constituição Federal, explícita ou implicitamente, inspiram a Administração Pública e o princípio da eficiência se condiciona a eles. A Administração Pública, antes que superávit, equilíbrio financeiro, mede sua eficiência na medida em que cumpre o desiderato como serviente prol da dignidade da pessoa. Dados os princípios primeiros que regem a Administração Pública, como serviente à supremacia do interesse público sobre o particular e a indisponibilidade do interesse público, o princípio da eficiência, na verdade, queda diante deles como uma variável dependente. -------------------------------------------------------------------------------- REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BITTENCOURT, Marcus Vinicius Corrêa. 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Parcerias na administração pública – concessão, permissão, franquia, terceirização e outras formas. São Paulo: Atlas, 1996. ROZA, Claudio. Processo administrativo disciplinar & comissões sob encomenda. Curitiba: Juruá, 2006. SCHIER, Adriana. A participação popular na administração pública: o direito de reclamação. Rio de Janeiro: Renovar, 2002. SCHIER, Paulo Ricardo. Ensaio sobre a supremacia do interesse público sobre o privado e o regime jurídico dos direitos fundamentais. In: PANSIERI, Flávio (Org.). Revista da Academia Brasileira de Direito Constitucional. SILVA, Cláudio Eduardo Regis de Figueiredo e. Administração gerencial & reforma administrativa no Brasil. Curitiba: Juruá, 2003. _________. Direito administrativo. 10 ed. São Paulo: Atlas, 1999. SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 13 ed. São Paulo: Malheiros, 1997. TÁCITO, Caio. Transformações de direito administrativo. Boletim de direito administrativo. n. 2. São Paulo: NDJ, fev. 1999. -------------------------------------------------------------------------------- Notas 1.CASTELLS, Manuel. O Estado-rede e a reforma na Administração Pública. Revista Gerencial. M.A.R.E., jul 1988, p. 27. 1.TÁCITO, Caio. Transformações de Direito Administrativo. Boletim de direito administrativo. N.2. São Paulo: NDJ, fev 1999, p. 85. 1.PIETRO, Maria Sylvia Zanella Di. Parcerias na administração pública – concessão, permissão, franquia, terceirização e outras formas. São Paulo: Atlas, 1996, p. 21. 1.BULOS, Uadi Lammêgo. Reforma administrativa (primeiras impressões). Revista de direito administrativo. N. 214. Rio de Janeiro: Renovar, out./dez. 1998, p. 77. 1.MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Coordenação gerencial na administração pública. Revista do direito administrativo. N. 214. Rio de Janeiro: Renovar, out./dez. 1998, p. 49. 1.CATHARINO, José Martins. Neoliberalismo e sequela. São Paulo: Ltr, 1997, p. 43. 1.MAXIMIANO, Antônio Cesar Amaru. Introdução à administração. 4 ed. São Paulo: Atlas, 1995, 52. 1.MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 24 ed. São Paulo: Malheiros, 1999, p. 89. 1.SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 13 ed. São Paulo: Malheiros, 1997, p. 67. 1.PIETRO, Maria Sylvia Zanela Di. Direito administrativo. 10 ed. São Paulo: Atlas, 1999, p. 74. 1.PIRES, Maria Coeli Simões. Terceiro setor e as organizações sociais. Boletim de direito administrativo. n. 4. São Paulo: NDJ, abr. 1999, p. 254. 1.MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 11 ed. São Paulo: Malheiros, 1999, p. 75. 1.MELLO, Celso Antônio Bandeira de. A democracia e suas dificuldades contemporâneas. Revista de direito administrativo. n. 212. Rio de Janeiro: Renovar, abr./jun. 1998, p. 61. Extensivo Semanal Trabalhista – Direito Administrativo – Fernanda Marinela – 08.03.2010 – Aula n. 03 1.OLIVA, Antônio Lucena de. Ética, utopia e globalização. LEOPOLDIANVM – Revista de Estudo e Comunicações. Vol. XXII, 62. Santos: UNISANTOS/Loyola, 1996, p. 61. 1.BONAVIDES, Paulo. Do Estado liberal ao Estado social. 6 ed. São Paulo: Malheiros, 1996, p. 16. 1.BONAVIDES, Paulo. Do Estado liberal ao. .., p. 20. Fonte: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=12638 1.2 O PRINCÍPIO DA ISONOMIA E OS PRIVILÉGIOS PROCESSUAIS Agapito Machado Juiz federal no Ceará, professor de Direito na Universidade de Fortaleza (Unifor) 01. Para discorrer sobre o princípio da isonomia e os privilégios processuais é indispensável façamos, inicialmente, a distinção da Fazenda Pública agindo no interesse público/coletivo, vale dizer, no seu jus imperii e na posição de parte em uma relação processual. 02.Não é novidade dizer que a Constituição Federal de 1988, em seu art. 5º, caput, determinou que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza. 03.Como quem estaria desconfiando de que os conservadores não a aceitariam, o Constituinte só no art. 5º, caput e inciso I, menciona, por duas (2) vezes a palavra iguais e uma (1) vez, a palavra igualdade. 04.A igualdade constitucional/processual não deve ser interpretada de modo a sempre nivelar o particular ao Poder Público, já que este age em nome de uma coletividade na qual se insere o próprio particular. Assim, um particular jamais poderá exercer o chamado poder de polícia, criar um tributo, decretar uma desapropriação, um estado de sítio etc., próprios do Poder Público. 05.Portanto, no campo desse interesse público/coletivo, é necessário não se igualar o Poder Público ao particular, sob pena mesmo de se tornar inútil todo o ramo do Direito Administrativo construído que foi ao longo de décadas. 06.Abstraída, destarte, a atuação do Poder Público no seu jus imperii, bem diferente é a sua posição como parte dentro de um devido processo legal. 07.Como parte, seja no pólo ativo ou passivo, no devido processo legal, não vemos como se possa, diante do caput do art. 5º da CF/88, continuar admitindo a desigualdade em benefício de uma pessoa jurídica de direito público, tais como: contra ela não ocorrerem os efeitos da revelia, ter direito ao prazo em quádruplo para contestar e em dobro para recorrer, duplo grau, entre tantos outros privilégios. 08.Não é possível se interpretar uma lei ordinária senão a partir da Constituição vigente (fenômeno da recepção). Envergonha-nos possa um magistrado se insurgir contra a Constituição de seu País e julgar para agradar a opinião pública ou a quem quer que seja, trazendo, assim, uma enorme insegurança aos jurisdicionados. É muito fácil fazer média com a opinião pública ficando no campo da retórica. 09.É incrível como possa alguém permanecer fiel às interpretações banidas por uma nova Constituição, se esta, todos sabem, rompe com o ordenamento jurídico anterior. Como foi difícil entenderem alguns Tribunais que os procedimentos imorais de ascensão e progressão funcionais agrediam à Constituição de 1988. Foi preciso esperar quase quatro (4) anos para que o STF, em sua atividade judicial, liquidasse o assunto, atestando a inconstitucionalidade de tais provimentos. 10.Temos entendido, e não encontramos razões para mudar que, em face do caput do art. 5º da CF/88, foram eliminados todos os privilégios processuais da Fazenda Pública. Todavia, dado ao aspecto conservador dos Tribunais, esses pontos de vista não têm sido aceitos em grau de recurso. Compete ao juiz de 1º grau, estudioso, dedicado e sem preocupações outras senão julgar com igualdade e cumprindo a Constituição, trazer interpretações compatíveis com a nova Constituição e, portanto, entendimentos novos ao seu Tribunal. Quem sabe não ocorra o exemplo citado por ELIEZER ROSA in A Voz da Toga, "E aqui um conselho da experiência: não tenha o juiz a lei de cor.Se à força de manejar Extensivo Semanal Trabalhista – Direito Administrativo – Fernanda Marinela – 08.03.2010 – Aula n. 03 seu código chegar a decorar seus textos, busque esquecer. Sempre que tiver de aplicar uma lei, abra o código e leia o texto que entende aplicável. Leia-o em momentos diversos, em horas diferentes. Dessa leitura pode surgir inesperadamente uma nova interpretação benéfica. Durante mais de meio século, os tribunais franceses leram o art. 1.382 do Código de Napoleão e o aplicavam tal como lhes soava sua letra. Um grave acidente que vitimou um grande número de operários que ficaram ao desamparo de uma necessária indenização, segundo a doutrina tirada do dito texto, levou um juiz estudioso a uma leitura do revelho artigo. E sem mudar uma só palavra no anoso texto, levou ao seu tribunal uma leitura nova, uma inteligência nova daquele versículo legal. Nesse dia, nasceu para o mundo ocidental a teoria da responsabilidade sem culpa". 11.Tão logo promulgada a CF/88, já entendíamos que os privilégios processuais (não confundir com jus imperii) da Fazenda Pública haviam desaparecido, especialmente agora com o advento da Lei Complementar, bipartindo o Ministério Público com a Advocacia Geral da União (CF/88, art. 131 e parágrafo único) e em breve o surgimento também da Lei Complementar (art. 134 da Cf/88) da Defensoria Pública. Assim também entenderam Rogério Lauria Tucci e José Rogério Cruz e Tucci in "Constituição de 1988 e Processo", Saraiva, pág. 41, e o Juiz José Augusto Delgado, agindo na qualidade de jurista, para quem "não há mais lugar para a existência de privilégios e proibições processuais. Desapareceram todos: prazo em quádruplo para contestar e em dobro para recorrer; o privilégio disposto no art. 20, § do CPC; não há mais obrigação de se sujeitar ao duplo grau decisões judiciais contra a Fazenda Pública; tratamento diferenciado ao Ministério Público, quando ele age como parte; é descabida a exigência de pessoas privadas de cauções processuais do tipo previsto no art. 835 do CPC; não se pode mais exigir o depósito para a ação rescisória dos particulares; inexistem, no processo de execução, os dispositivos que desigualam as partes, a exemplificar os artigos 599, 600 e 601 do CPC; a mulher casada pode apresentar queixa-crime sem o consentimento do marido, estando revogado o art. 35 do CPP" (in A SUPREMACIA DOS PRINCÍPIOS NAS GARANTIAS PROCESSUAIS DO CIDADÃO). 12.O que é necessário ser entendido, de uma vez por todas, é o fato de que o jurisdicionado particular não tem culpa alguma de somente mais de 4 (quatro) anos após promulgada a CF/88, venha a ser editada Lei Complementar bipartindo o Ministério Público e a Advocacia Geral da República e assim eliminando a complexidade e a concentração dos serviços antes apenas nas mãos de um órgão. Que se criem cargos para atender ao acúmulo de serviços na área da Justiça, da Fazenda Pública, do Ministério Público e Defensoria Pública. O Constituinte deu essa solução, mas o legislador ordinário permaneceu inerte por mais de quatro (4) anos, aspecto este meramente extra-jurídico. Assim, com a devida vênia, não temos a felicidade de concordar com o ilustre jurista Nelson Nery Júnior (in Princípios do Processo Civil na Constituição Federal, RT, 1992, págs. 42/43), eis que anterior à CF/88, de que "a concessão de benefício de prazo no processo à Fazenda Pública e ao Ministério Público é da tradição do direito brasileiro, sendo medida de eqüidade, dada a imensa carga de serviços desses órgãos", até porque o Ministério Público se caracteriza pela unidade e indivisibilidade (CF/88, art. 127), mormente em matéria de direito que se repete na Justiça, sendo objeto de contestações padronizadas via computador, isso sem se cogitar da utilização da ação cível pública que substitui milhares de processos individuais e facilita sobremaneira a missão do Ministério Público. Assim, não vemos como se continuar invocando "tradição de nosso direito à concessão de tais privilégios processuais", até porque é essa malsinada "tradição" que não tem permitido os Tribunais evoluírem, curvando-se ao conservadorismo em prejuízo do jurisdicionado. 13.Demais disso, se os Procuradores das pessoas jurídicas de direito público, mesmo diante da bipartição das funções do Ministério Público e Advocacia Geral da União e em breve da Defensoria Pública, bem como da utilização da ação cível pública, ainda tiverem dificuldades em obter os elementos para defesa em Juízo, por parte de seus órgãos, que então responsabilizem os responsáveis por tais órgãos. O que não se justifica é transferir uma culpa da administração ao jurisdicionado já tão penalizado por ela. Temos dito, ainda, que o Judiciário está assoberbado de processos porque o Poder Público não cumpre bem sua função e em casos considerados simples fica preferindo ser acionado e onerando o próprio povo com a sucumbência a ser paga, o que é um absurdo. A prova disso está em que o Governo, recentemente, preferiu contratar diretamente profissionais da área jurídica para fazerem sua defesa em juízo, sem se sujeitar à licitação, já que esta, ao contrário, estava selecionando profissionais incompetentes que somente lhe deram maior prejuízo. 14.Mas não é só. O que se dizer, por exemplo, de um Procurador de uma pessoa jurídica de direito público precisar de sessenta (60) dias para contestar uma ação que envolve matéria Extensivo Semanal Trabalhista – Direito Administrativo – Fernanda Marinela – 08.03.2010 – Aula n. 03 unicamente de direito, se sequer necessitará de pedir aos órgãos a ele subordinados qualquer dado fático? E, após proferida a decisão, necessitar de 30 (trinta) dias para recorrer? 15.O princípio da isonomia necessita ser efetivado para não ficar no mero campo da retórica. A propósito da importância desse princípio, trazemos à baila o entendimento do mestre em Direito Tributário José Souto Maior Borges, "verbis": "1.1 O princípio da isonomia não corresponde a uma norma igual em eminência a outra qualquer, ou mesmo aos outros princípios, no contexto constitucional. A análise do seu conteúdo revelará a sua insigne posição, que lhe realça decisivamente o significado normativo, em comparação com os outros princípios e normas constitucionais. Com surpreendente perspicácia, Francisco Campos já advertira o intérprete e aplicador da Constituição para a eminência da isonomia no confronto até mesmo com os outros princípios constitucionais: ''A cláusula relativa à igualdade diante da lei vem em primeiro lugar na lista dos direitos e garantias que a Constituição assegura aos brasileiros e estrangeiros residentes no país. Não foi por acaso ou arbitrariamente que o legislador constituinte iniciou com o direito à igualdade a enumeração dos direitos individuais. Dando-lhe o primeiro lugar na enumeração, quis significar expressamente, embora de maneira tácita, que o princípio da igualdade rege todos os direitos em seguida a ele enumerados'' (Direito Constitucional, vol. 2º, Rio, Livraria Freitas Bastos, 1956, p. 12). 1.2 Essa transcrição, de magistério ainda hoje atualíssimo, fornece a pedra de toque para a exegese do texto concernente aos direitos e garantias fundamentais discriminados na Constituição Federal de 1988. Deveras: na ordem de sua hierarquia substancial, isto é, de importância da matéria constitucionalmente regulada (e que nada tem a ver com a hierarquia formal, sintática, entre normas supra e infraordenadas), os princípios constitucionais, tais como a federação, a república (art. 1º caput) e a tripartição do poder (art. 2º), acentuam a sua proeminência no contraste com as restantes normas, p. ex., o art. 87, parágrafo único, III, que dá ao Ministro de Estado competência para elaborar relatório anual da gestão de seu ministério. Esse privilegiamento constitucional é acentuado pela própria insuscetibilidade à reformade alguns desses princípios, sobretudo a forma federativa de Estado, a separação de poderes e os direitos e garantias individuais (art. 60, § 4º). 1.3 Pois bem: na região dos princípios constitucionais observa-se essa hierarquia de importância mesmo entre essas normas-princípio. Porque não é aleatoriamente que o art. 5º, caput, da CF de 1988 enuncia a isonomia antes mesmo e à frente da discriminação dos direitos e garantias fundamentais que institui. Dessa posição ''topograficamente'' eminente da isonomia resulta uma proeminência substancial desse princípio: ele penetra, como uma linfa, os demais direitos e garantias constitucionais, perpassando-lhes o conteúdo normativo: ''rege todos os direitos em seguida a ele enunciados'', na lição de Francisco Campos". "1.6 Igualdade diante da lei não é expressão equivalente a igualdade em direitos e obrigações, porque a igualdade diante da lei poderia ser ardilosamente entendida como uma igualdade apenas formal. No sentido de que nada adiantaria quanto ao conteúdo da lei. Não a igualdade substancial. Pois é para espancar esses ardis hermenêuticos que a Constituição Federal, em mera aparência de redundância, enuncia, já no item I do art. 5º, a igualdade de homens e mulheres em direitos e obrigações. Já aí se manifesta o caráter substancial desse direito. Não se trata de mera igualdade formal diante da lei, mas de igualdade substancial no interior da própria legalidade. Esta é a morada da isonomia. Incumbe-lhe a custódia do princípio-dos-princípios constitucionais, a isonomia". "2.1 Há duas formas distintas - nitidamente distintas, posto em geral inapercebidas - de positivação de igualdade jurídica. A primeira delas é a igualdade diante da lei. Esta pode existir até mesmo quando a igualdade não corresponda ao conteúdo da lei. A igualdade perante a lei nada mais significa senão a simples conformidade, em todas as situações que lhe forem subsumidas, da conduta humana à norma de conduta: ''Com efeito, a chamada ''igualdade'' perante a lei não significa qualquer outra coisa que não seja a aplicação legal, isto é, correta, da lei, qualquer que seja o conteúdo que esta lei possa ter, mesmo que ela não prescreva um tratamento igualitário, mas um tratamento desigual'' (Kelsen, A Justiça e o Direito Natural, Coimbra, Arménio Amado, 1963, p. 79). Extensivo Semanal Trabalhista – Direito Administrativo – Fernanda Marinela – 08.03.2010 – Aula n. 03 A rigor, a igualdade diante da lei somente postula que a aplicação da lei corresponda sempre à sua incidência. Daí o seu caráter formal: nada prescreve sobre a igualdade como o conteúdo da própria lei aplicada. A tônica é aí na inexceptualidade da aplicação concreta da norma, sempre que ocorrentes os seus pressupostos fáticos. 2.2 Não é essa contudo a única igualdade a que se refere o art. 5º da Constituição Federal. Porque esse dispositivo trata da igualdade não só ante a lei, mas também como um conteúdo da legislação que lhe é integrativa. Vincula-a, numa relação sintática de supra e subordinação, no tocante à predeterminação do seu conteúdo, isto é, o próprio âmbito material de validade da norma (igualdade na lei, igualdade contenutística - diria, Pontes de Miranda). De tal sorte que, se desconsiderado o preceito constitucional, o ato legislativo ou administrativo de sua aplicação incorrerá em inconstitucionalidade. A igualdade na lei é igualdade material; somente existe quando a lei prescreve, ela própria, um tratamento igualitário. Será a igualdade, em tais condições, ''matéria'' do ato legislativo. A Constituição Federal, em seu art. 5º, não enuncia apenas e igualdade formal de todos diante da aplicação da lei. Não se circunscreve a anunciar o direito à reta aplicação da lei tributária, entendida essa retitude como a adequação entre norma de conduta e conduta normada; adequação a ser procedida no ato-de-aplicação pelos juízes e tribunais. Tal limitação, um amesquinhamento do princípio, somente poderia prevalecer se o art. 5º estancasse a formulação do direito à isonomia na parte inicial do enunciado: ''Todos são iguais perante a lei'' (e não na lei). 2.3 Um dos mais delicados se não o mais delicado problema da exegese da isonomia consiste na prefixação dos seus limites, isto é, a caracterização das discriminações que são constitucionalmente toleradas e as que não o são. Sejam quais forem esses limites (que aqui não cabe determinar) pode-se concluir pela extrema amplitude do significado normativo do direito à isonomia como conteúdo da lei porque o próprio art. 5º é logo a seguir expresso: a igualdade não é só diante da lei. Ela se completa pela expressa interdição constitucional: ''Sem distinção de qualquer natureza''. Já aí a Constituição Federal vincula o conteúdo da legislação integrativa, esclarecendo em que consiste o igual tratamento. Trata-se da consistência material da própria igualdade. Quando se considere que a igualdade é princípio dirigido primariamente à legislação integrativa da Constituição Federal, há de concluir-se que a lei deve incluir a igualdade, a indistinção ''de qualquer natureza'' como um conteúdo seu, um componente material e pessoal do seu âmbito de validade normativa" (in PRINCÍPIO DA ISONOMIA E SUA SIGNIFICAÇÃO NA CONSTITUIÇÃO DE 1988, RDP-93, págs. 35/37). 16.A interpretação da legislação ordinária há de ser feita, sempre, em face da Constituição e a Brasileira, promulgada em 1988, ao dispor no art. 5º, caput e inciso I que "todos são iguais perante a lei sem distinção de qualquer natureza, eliminou todos os privilégios processuais das pessoas jurídicas de direito público, sobejando apenas a posição de superioridade do Poder Público quando este agir no chamado jus imperii. O magistrado não tem outra alternativa senão cumprir a Constituição. É seu dever. E mais: não deve julgar fazendo média ou apenas para agradar e se notabilizar como "bonzinho". 17."Na verdade, embora com atividades restritas, os juízes possuem opiniões pessoais sobre assuntos políticos. O bom julgador, no entanto, é aquele que consegue deixar sua formação política em segundo plano, no momento do julgamento e colocar acima dela a preservação da ordem jurídica" (SANCHES, Sidney, Ministro-Presidente do STF, in O Judiciário deve cumprir e fazer cumprir a Constituição SM 25/6/92). 18.O Juiz não julga a lei; julga com a lei; aplica-a, se ela não é inconstitucional, mesmo discordando de sua possível injustiça. Salvo em mandado de injunção, o juiz brasileiro só tem função legislativa negativa (STF - Rp. 1451-7-DF, DJU 24.6.88, pág. 16113). Somente se repelida, estreme de dúvida, a presunção juris tantum de constitucionalidade da lei, é que o juiz afasta a sua incidência mantendo a Constituição. Todavia, se a Constituição é iníqua, injusta e anacrônica, aqueles que a elaboraram/promulgaram (Deputados e Senadores) que a revoguem. Mas ninguém tenha a ousadia de pedir ao juiz que descumpra a Constituição de seu País". Fonte: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=6242 Extensivo Semanal Trabalhista – Direito Administrativo – Fernanda Marinela – 08.03.2010 – Aula n. 03 1.3 O PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE E O DIREITO José Carlos de Oliveira Robaldo Procurador de Justiça aposentado. Professor Universitário. Mestre em Direito Penal pela Universidade Estadual Paulista - UNESP. Pós-graduando (especialização) em Direito Constitucional na Unisul/Idp/Lfg/Esud-MS. Diretor da ESUD-MS. Há determinadas terminologias que exigem certos conhecimentos específicos para sua identificação; outras, ao contrário, são identificadas com facilidade pela grande maioria de pessoas. O próprio nome induz à sua compreensão. A palavra proporcionalidade, por exemplo, é um desses termos que, na maioria das vezes, por intuição, se identifica seu significado, ainda que em termos genéricos. Acessível, portanto, aohomem comum. É possível que a pessoa não saiba conceituá-la tecnicamente, isso não significa, contudo, que a mesma não tenha noção sobre seu sentido. Proporcionalidade e Justiça são termos muito próximos e que todos, no fundo, têm uma noção do que significam. A frase "dai a cada um o que é seu" já contém um sentido não só de proporcionalidade, como também de Justiça. No Direito, sobretudo no Direito brasileiro, o ponto de partida para a compreensão do significado do princípio de proporcionalidade é a Constituição de 1988, mais especificamente a partir de um dos seus fundamentos, que é o princípio da dignidade da pessoa humana. O princípio da dignidade humana, para melhor compreensão, significa, em um linguajar comum, o "guarda chuva" que ampara ou fundamenta os demais princípios subjacentes, dentre eles o da proporcionalidade. No Estado de Direito Democrático, o ponto de partida para a compreensão do princípio da dignidade humana, proporcionalidade etc, é o homem. O homem como centro do universo. A partir da perspectiva da concepção iluminista, o homem deixa de ser encarado como meio para galgar a condição de fim. O Estado perde a sua condição de fim e passa a ser encarado como meio propulsor para que o homem, como ser humano, tanto no enfoque individual, como coletivo, desenvolva suas potencialidades, seu bem estar com dignidade etc. Isso já nos conduz à idéia de que o Estado, mesmo quando lança mão da norma como forma de proteger determinados valores, deve utilizar o caminho menos gravoso para atingir o fim desejado. A preocupação deve estar voltada para que o direito ou interesse que se pretende proteger seja de conteúdo valorativo superior ao restringido. Daí compreender-se porque se admite a prisão do autor de um homicídio, por exemplo, posto que o direito à vida é superior ao direito à liberdade; porque que o sistema jurídico-penal brasileiro, a exemplo de outros países, optou pela pena ou medida alternativa em relação às infrações penais de médio e pequeno potencial ofensivo, ao invés da pena de prisão. Isso tudo é uma questão de "custo-benefício". Não se discute que o Estado, em função da defesa do interesse público e até mesmo do particular, está autorizado a restringir direitos individuais, porém, na medida da necessidade e da adequação dos meios utilizados. O que não se admite é o excesso, o arbítrio. Proporcionalmente tudo é correto, desde que realizado dentro das "regras do jogo". O Estado é que, por meio do seu ordenamento jurídico constitucional e infraconstitucional, estabelece os parâmetros, as "regras do jogo". A norma, sobretudo a constitucional, explícita ou implicitamente, estabelece os valores merecedores de proteção e os meios para a sua realização. Cabe ao legislador inicialmente e posteriormente ao aplicador e executor do direito manter o equilíbrio entre o custo-benefício. Proporcionalidade significa, em síntese, o uso do "remédio" adequado para combater a "enfermidade" identificada e a dosagem condizente com a necessidade. Extensivo Semanal Trabalhista – Direito Administrativo – Fernanda Marinela – 08.03.2010 – Aula n. 03 Não exagerar nas comemorações natalinas e de passagem do ano é também uma questão de proporcionalidade. Cuidado com o excesso! Fonte: http://www.uj.com.br/publicacoes/doutrinas/3645/O_PRINCIPIO_DA_PROPORCIONALIDADE_E_O_DIREIT O 1.4 COMENTÁRIO SOBRE A DECISÃO PROFERIDA NO JULGAMENTO DA ARGÜIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL Nº 45/DF Fabiano Holz Beserra Procurador Federal; Mestrando em Direito – PUCRS 1) Íntegra da decisão ADPF – Políticas Públicas – Intervenção Judicial – “Reserva do Possível” (Transcrições) ADPF 45 MC/DF* RELATOR: MIN. CELSO DE MELLO EMENTA: ARGÜIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL. A QUESTÃO DA LEGITIMIDADE CONSTITUCIONAL DO CONTROLE E DA INTERVENÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO EM TEMA DE IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS, QUANDO CONFIGURADA HIPÓTESE DE ABUSIVIDADE GOVERNAMENTAL. DIMENSÃO POLÍTICA DA JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL ATRIBUÍDA AO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. INOPONIBILIDADE DO ARBÍTRIO ESTATAL À EFETIVAÇÃO DOS DIREITOS SOCIAIS, ECONÔMICOS E CULTURAIS. CARÁTER RELATIVO DA LIBERDADE DE CONFORMAÇÃO DO LEGISLADOR. CONSIDERAÇÕES EM TORNO DA CLÁUSULA DA “RESERVA DO POSSÍVEL”. NECESSIDADE DE PRESERVAÇÃO, EM FAVOR DOS INDIVÍDUOS, DA INTEGRIDADE E DA INTANGIBILIDADE DO NÚCLEO CONSUBSTANCIADOR DO “MÍNIMO EXISTENCIAL”. VIABILIDADE INSTRUMENTAL DA ARGÜIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO NO PROCESSO DE CONCRETIZAÇÃO DAS LIBERDADES POSITIVAS (DIREITOS CONSTITUCIONAIS DE SEGUNDA GERAÇÃO). DECISÃO: Trata-se de argüição de descumprimento de preceito fundamental promovida contra veto, que, emanado do Senhor Presidente da República, incidiu sobre o § 2º do art. 55 (posteriormente renumerado para art. 59), de proposição legislativa que se converteu na Lei nº 10.707/2003 (LDO), destinada a fixar as diretrizes pertinentes à elaboração da lei orçamentária anual de 2004. O dispositivo vetado possui o seguinte conteúdo material: “§ 2º Para efeito do inciso II do caput deste artigo, consideram-se ações e serviços públicos de saúde a totalidade das dotações do Ministério da Saúde, deduzidos os encargos previdenciários da União, os serviços da dívida e a parcela das despesas do Ministério financiada com recursos do Fundo de Combate à Erradicação da Pobreza.” O autor da presente ação constitucional sustenta que o veto presidencial importou em desrespeito a preceito fundamental decorrente da EC 29/2000, que foi promulgada para garantir recursos financeiros mínimos a serem aplicados nas ações e serviços públicos de saúde. Requisitei, ao Senhor Presidente da República, informações que por ele foram prestadas a fls. 93/144. Vale referir que o Senhor Presidente da República, logo após o veto parcial ora questionado nesta sede processual, veio a remeter, ao Congresso Nacional, projeto de lei, que, transformado na Lei nº 10.777/2003, restaurou, em sua integralidade, o § 2º do art. 59 da Lei nº 10.707/2003 (LDO), dele fazendo constar a mesma norma sobre a qual incidira o veto executivo. Extensivo Semanal Trabalhista – Direito Administrativo – Fernanda Marinela – 08.03.2010 – Aula n. 03 Em virtude da mencionada iniciativa presidencial, que deu causa à instauração do concernente processo legislativo, sobreveio a edição da já referida Lei nº 10.777, de 24/11/2003, cujo art. 1º - modificando a própria Lei de Diretrizes Orçamentárias (Lei nº 10.707/2003) – supriu a omissão motivadora do ajuizamento da presente ação constitucional. Com o advento da mencionada Lei nº 10.777/2003, a Lei de Diretrizes Orçamentárias, editada para reger a elaboração da lei orçamentária de 2004, passou a ter, no ponto concernente à questionada omissão normativa, o seguinte conteúdo material: “Art. 1º O art. 59 da lei nº 10.707, de 30 de julho de 2003, passa a vigorar acrescido dos seguintes parágrafos: ‘Art.59............................................ § 3º Para os efeitos do inciso II do caput deste artigo, consideram-se ações e serviços públicos de saúde a totalidade das dotações do Ministério da Saúde, deduzidos os encargos previdenciários da União, os serviços da dívida e a parcela das despesas do Ministério financiada com recursos do Fundo de Combate à Erradicação da Pobreza. § 4º A demonstração da observância do limite mínimo previsto no § 3º deste artigo dar-se-á no encerramento do exercício financeiro de 2004.’ (NR).” (grifei) Cabe registrar, por necessário, que a regra legal resultante da edição da Lei nº 10.777/2003, ora em pleno vigor, reproduz, essencialmente, em seu conteúdo, o preceito, que, constante do § 2º do art. 59 da Lei nº 10.707/2003 (LDO), veio a ser vetado pelo Senhor Presidente da República (fls. 23v.). Impende assinalar quea regra legal em questão – que culminou por colmatar a própria omissão normativa alegadamente descumpridora de preceito fundamental – entrou em vigor em 2003, para orientar, ainda em tempo oportuno, a elaboração da lei orçamentária anual pertinente ao exercício financeiro de 2004. Conclui-se, desse modo, que o objetivo perseguido na presente sede processual foi inteiramente alcançado com a edição da Lei nº 10.777, de 24/11/2003, promulgada com a finalidade específica de conferir efetividade à EC 29/2000, concebida para garantir, em bases adequadas – e sempre em benefício da população deste País – recursos financeiros mínimos a serem necessariamente aplicados nas ações e serviços públicos de saúde. Não obstante a superveniência desse fato juridicamente relevante, capaz de fazer instaurar situação de prejudicialidade da presente argüição de descumprimento de preceito fundamental, não posso deixar de reconhecer que a ação constitucional em referência, considerado o contexto em exame, qualifica-se como instrumento idôneo e apto a viabilizar a concretização de políticas públicas, quando, previstas no texto da Carta Política, tal como sucede no caso (EC 29/2000), venham a ser descumpridas, total ou parcialmente, pelas instâncias governamentais destinatárias do comando inscrito na própria Constituição da República. Essa eminente atribuição conferida ao Supremo Tribunal Federal põe em evidência, de modo particularmente expressivo, a dimensão política da jurisdição constitucional conferida a esta Corte, que não pode demitir-se do gravíssimo encargo de tornar efetivos os direitos econômicos, sociais e culturais – que se identificam, enquanto direitos de segunda geração, com as liberdades positivas, reais ou concretas (RTJ 164/158-161, Rel. Min. CELSO DE MELLO) -, sob pena de o Poder Público, por violação positiva ou negativa da Constituição, comprometer, de modo inaceitável, a integridade da própria ordem constitucional: DESRESPEITO À CONSTITUIÇÃO - MODALIDADES DE COMPORTAMENTOS INCONSTITUCIONAIS DO PODER PÚBLICO. - O desrespeito à Constituição tanto pode ocorrer mediante ação estatal quanto mediante inércia governamental. A situação de inconstitucionalidade pode derivar de um comportamento ativo do Poder Público, que age ou edita normas em desacordo com o que dispõe a Constituição, Extensivo Semanal Trabalhista – Direito Administrativo – Fernanda Marinela – 08.03.2010 – Aula n. 03 ofendendo-lhe, assim, os preceitos e os princípios que nela se acham consignados. Essa conduta estatal, que importa em um facere (atuação positiva), gera a inconstitucionalidade por ação. - Se o Estado deixar de adotar as medidas necessárias à realização concreta dos preceitos da Constituição, em ordem a torná-los efetivos, operantes e exeqüíveis, abstendo-se, em conseqüência, de cumprir o dever de prestação que a Constituição lhe impôs, incidirá em violação negativa do texto constitucional. Desse non facere ou non praestare, resultará a inconstitucionalidade por omissão, que pode ser total, quando é nenhuma a providência adotada, ou parcial, quando é insuficiente a medida efetivada pelo Poder Público. - A omissão do Estado - que deixa de cumprir, em maior ou em menor extensão, a imposição ditada pelo texto constitucional - qualifica-se como comportamento revestido da maior gravidade político-jurídica, eis que, mediante inércia, o Poder Público também desrespeita a Constituição, também ofende direitos que nela se fundam e também impede, por ausência de medidas concretizadoras, a própria aplicabilidade dos postulados e princípios da Lei Fundamental.” (RTJ 185/794-796, Rel. Min. CELSO DE MELLO, Pleno) É certo que não se inclui, ordinariamente, no âmbito das funções institucionais do Poder Judiciário - e nas desta Suprema Corte, em especial - a atribuição de formular e de implementar políticas públicas (JOSÉ CARLOS VIEIRA DE ANDRADE, “Os Direitos Fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976”, p. 207, item n. 05, 1987, Almedina, Coimbra), pois, nesse domínio, o encargo reside, primariamente, nos Poderes Legislativo e Executivo. Tal incumbência, no entanto, embora em bases excepcionais, poderá atribuir-se ao Poder Judiciário, se e quando os órgãos estatais competentes, por descumprirem os encargos político-jurídicos que sobre eles incidem, vierem a comprometer, com tal comportamento, a eficácia e a integridade de direitos individuais e/ou coletivos impregnados de estatura constitucional, ainda que derivados de cláusulas revestidas de conteúdo programático. Cabe assinalar, presente esse contexto – consoante já proclamou esta Suprema Corte – que o caráter programático das regras inscritas no texto da Carta Política “não pode converter-se em promessa constitucional inconseqüente, sob pena de o Poder Público, fraudando justas expectativas nele depositadas pela coletividade, substituir, de maneira ilegítima, o cumprimento de seu impostergável dever, por um gesto irresponsável de infidelidade governamental ao que determina a própria Lei Fundamental do Estado” (RTJ 175/1212-1213, Rel. Min. CELSO DE MELLO). Não deixo de conferir, no entanto, assentadas tais premissas, significativo relevo ao tema pertinente à “reserva do possível” (STEPHEN HOLMES/CASS R. SUNSTEIN, “The Cost of Rights”, 1999, Norton, New York), notadamente em sede de efetivação e implementação (sempre onerosas) dos direitos de segunda geração (direitos econômicos, sociais e culturais), cujo adimplemento, pelo Poder Público, impõe e exige, deste, prestações estatais positivas concretizadoras de tais prerrogativas individuais e/ou coletivas. É que a realização dos direitos econômicos, sociais e culturais – além de caracterizar-se pela gradualidade de seu processo de concretização – depende, em grande medida, de um inescapável vínculo financeiro subordinado às possibilidades orçamentárias do Estado, de tal modo que, comprovada, objetivamente, a incapacidade econômico-financeira da pessoa estatal, desta não se poderá razoavelmente exigir, considerada a limitação material referida, a imediata efetivação do comando fundado no texto da Carta Política. Não se mostrará lícito, no entanto, ao Poder Público, em tal hipótese – mediante indevida manipulação de sua atividade financeira e/ou político-administrativa – criar obstáculo artificial que revele o ilegítimo, arbitrário e censurável propósito de fraudar, de frustrar e de inviabilizar o estabelecimento e a preservação, em favor da pessoa e dos cidadãos, de condições materiais mínimas de existência. Cumpre advertir, desse modo, que a cláusula da “reserva do possível” – ressalvada a ocorrência de justo motivo objetivamente aferível – não pode ser invocada, pelo Estado, com a finalidade de exonerar-se do cumprimento de suas obrigações constitucionais, notadamente quando, dessa Extensivo Semanal Trabalhista – Direito Administrativo – Fernanda Marinela – 08.03.2010 – Aula n. 03 conduta governamental negativa, puder resultar nulificação ou, até mesmo, aniquilação de direitos constitucionais impregnados de um sentido de essencial fundamentalidade. Daí a correta ponderação de ANA PAULA DE BARCELLOS (“A Eficácia Jurídica dos Princípios Constitucionais”, p. 245-246, 2002, Renovar): “Em resumo: a limitação de recursos existe e é uma contingência que não se pode ignorar. O intérprete deverá levá-la em conta ao afirmar que algum bem pode ser exigido judicialmente, assim como o magistrado, ao determinar seu fornecimento pelo Estado. Por outro lado, não se pode esquecer que a finalidade do Estado ao obter recursos, para, em seguida, gastá-los sob a forma de obras, prestação de serviços, ou qualquer outra política pública, é exatamente realizar os objetivos fundamentais da Constituição. A meta central das Constituições modernas, e da Carta de 1988 em particular, pode ser resumida,como já exposto, na promoção do bem-estar do homem, cujo ponto de partida está em assegurar as condições de sua própria dignidade, que inclui, além da proteção dos direitos individuais, condições materiais mínimas de existência. Ao apurar os elementos fundamentais dessa dignidade (o mínimo existencial), estar-se-ão estabelecendo exatamente os alvos prioritários dos gastos públicos. Apenas depois de atingi- los é que se poderá discutir, relativamente aos recursos remanescentes, em que outros projetos se deverá investir. O mínimo existencial, como se vê, associado ao estabelecimento de prioridades orçamentárias, é capaz de conviver produtivamente com a reserva do possível.” (grifei) Vê-se, pois, que os condicionamentos impostos, pela cláusula da “reserva do possível”, ao processo de concretização dos direitos de segunda geração - de implantação sempre onerosa -, traduzem-se em um binômio que compreende, de um lado, (1) a razoabilidade da pretensão individual/social deduzida em face do Poder Público e, de outro, (2) a existência de disponibilidade financeira do Estado para tornar efetivas as prestações positivas dele reclamadas. Desnecessário acentuar-se, considerado o encargo governamental de tornar efetiva a aplicação dos direitos econômicos, sociais e culturais, que os elementos componentes do mencionado binômio (razoabilidade da pretensão + disponibilidade financeira do Estado) devem configurar-se de modo afirmativo e em situação de cumulativa ocorrência, pois, ausente qualquer desses elementos, descaracterizar-se-á a possibilidade estatal de realização prática de tais direitos. Não obstante a formulação e a execução de políticas públicas dependam de opções políticas a cargo daqueles que, por delegação popular, receberam investidura em mandato eletivo, cumpre reconhecer que não se revela absoluta, nesse domínio, a liberdade de conformação do legislador, nem a de atuação do Poder Executivo. É que, se tais Poderes do Estado agirem de modo irrazoável ou procederem com a clara intenção de neutralizar, comprometendo-a, a eficácia dos direitos sociais, econômicos e culturais, afetando, como decorrência causal de uma injustificável inércia estatal ou de um abusivo comportamento governamental, aquele núcleo intangível consubstanciador de um conjunto irredutível de condições mínimas necessárias a uma existência digna e essenciais à própria sobrevivência do indivíduo, aí, então, justificar-se-á, como precedentemente já enfatizado - e até mesmo por razões fundadas em um imperativo ético-jurídico -, a possibilidade de intervenção do Poder Judiciário, em ordem a viabilizar, a todos, o acesso aos bens cuja fruição lhes haja sido injustamente recusada pelo Estado. Extremamente pertinentes, a tal propósito, as observações de ANDREAS JOACHIM KRELL (“Direitos Sociais e Controle Judicial no Brasil e na Alemanha”, p. 22-23, 2002, Fabris): “A constituição confere ao legislador uma margem substancial de autonomia na definição da forma e medida em que o direito social deve ser assegurado, o chamado ‘livre espaço de conformação’ (...). Num sistema político pluralista, as normas constitucionais sobre direitos sociais devem ser abertas para receber diversas concretizações consoante as alternativas periodicamente escolhidas pelo eleitorado. A apreciação dos fatores econômicos para uma tomada de decisão quanto às possibilidades e aos meios de efetivação desses direitos cabe, principalmente, aos governos e parlamentos. Extensivo Semanal Trabalhista – Direito Administrativo – Fernanda Marinela – 08.03.2010 – Aula n. 03 Em princípio, o Poder Judiciário não deve intervir em esfera reservada a outro Poder para substituí-lo em juízos de conveniência e oportunidade, querendo controlar as opções legislativas de organização e prestação, a não ser, excepcionalmente, quando haja uma violação evidente e arbitrária, pelo legislador, da incumbência constitucional. No entanto, parece-nos cada vez mais necessária a revisão do vetusto dogma da Separação dos Poderes em relação ao controle dos gastos públicos e da prestação dos serviços básicos no Estado Social, visto que os Poderes Legislativo e Executivo no Brasil se mostraram incapazes de garantir um cumprimento racional dos respectivos preceitos constitucionais. A eficácia dos Direitos Fundamentais Sociais a prestações materiais depende, naturalmente, dos recursos públicos disponíveis; normalmente, há uma delegação constitucional para o legislador concretizar o conteúdo desses direitos. Muitos autores entendem que seria ilegítima a conformação desse conteúdo pelo Poder Judiciário, por atentar contra o princípio da Separação dos Poderes (...). Muitos autores e juízes não aceitam, até hoje, uma obrigação do Estado de prover diretamente uma prestação a cada pessoa necessitada de alguma atividade de atendimento médico, ensino, de moradia ou alimentação. Nem a doutrina nem a jurisprudência têm percebido o alcance das normas constitucionais programáticas sobre direitos sociais, nem lhes dado aplicação adequada como princípios-condição da justiça social. A negação de qualquer tipo de obrigação a ser cumprida na base dos Direitos Fundamentais Sociais tem como conseqüência a renúncia de reconhecê-los como verdadeiros direitos. (...) Em geral, está crescendo o grupo daqueles que consideram os princípios constitucionais e as normas sobre direitos sociais como fonte de direitos e obrigações e admitem a intervenção do Judiciário em caso de omissões inconstitucionais.” (grifei) Todas as considerações que venho de fazer justificam-se, plenamente, quanto à sua pertinência, em face da própria natureza constitucional da controvérsia jurídica ora suscitada nesta sede processual, consistente na impugnação a ato emanado do Senhor Presidente da República, de que poderia resultar grave comprometimento, na área da saúde pública, da execução de política governamental decorrente de decisão vinculante do Congresso Nacional, consubstanciada na Emenda Constitucional nº 29/2000. Ocorre, no entanto, como precedentemente já enfatizado no início desta decisão, que se registrou, na espécie, situação configuradora de prejudicialidade da presente argüição de descumprimento de preceito fundamental. A inviabilidade da presente argüição de descumprimento, em decorrência da razão ora mencionada, impõe uma observação final: no desempenho dos poderes processuais de que dispõe, assiste, ao Ministro- Relator, competência plena para exercer, monocraticamente, o controle das ações, pedidos ou recursos dirigidos ao Supremo Tribunal Federal, legitimando-se, em conseqüência, os atos decisórios que, nessa condição, venha a praticar. Cumpre acentuar, por oportuno, que o Pleno do Supremo Tribunal Federal reconheceu a inteira validade constitucional da norma legal que inclui, na esfera de atribuições do Relator, a competência para negar trânsito, em decisão monocrática, a recursos, pedidos ou ações, quando incabíveis, estranhos à competência desta Corte, intempestivos, sem objeto ou que veiculem pretensão incompatível com a jurisprudência predominante do Tribunal (RTJ 139/53 - RTJ 168/174-175). Nem se alegue que esse preceito legal implicaria transgressão ao princípio da colegialidade, eis que o postulado em questão sempre restará preservado ante a possibilidade de submissão da decisão singular ao controle recursal dos órgãos colegiados no âmbito do Supremo Tribunal Federal, consoante esta Corte tem reiteradamente proclamado (RTJ 181/1133-1134, Rel. Min. CARLOS VELLOSO - AI 159.892-AgR/SP, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.). Cabe enfatizar, por necessário, que esse entendimento jurisprudencial é também aplicável aos processos de controle normativo abstrato de constitucionalidade, qualquer que seja a sua modalidade (ADI 563/DF, Rel. Min. PAULO BROSSARD – ADI 593/GO, Rel. Min. MARCO AURÉLIO - ADI
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