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Efésios (Barclay)

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EFÉSIOS
 ÍNDICE 
 
EPHESIANS 
 
WILLIAM BARCLAY 
Título original em inglês: 
The Letter to the Ephesians
 
 Tradução: Carlos Biagini 
 
 
 
 
 O NOVO TESTAMENTO Comentado por William Barclay 
 
 … Introduz e interpreta a totalidade dos livros do NOVO 
 TESTAMENTO. Desde Mateus até o Apocalipse William Barclay 
 explica, relaciona, dá exemplos, ilustra e aplica cada passagem, sendo 
 sempre fiel e claro, singelo e profundo. Temos nesta série, por fim, um 
 instrumento ideal para todos aqueles que desejem conhecer melhor as 
 Escrituras. O respeito do autor para a Revelação Bíblica, sua sólida 
 fundamentação, na doutrina tradicional e sempre nova da igreja, sua 
 incrível capacidade para aplicar ao dia de hoje a mensagem, fazem que 
 esta coleção ofereça a todos como uma magnífica promessa. 
 
 PARA QUE CONHEÇAMOS MELHOR A CRISTO 
 O AMEMOS COM AMOR MAIS VERDADEIRO 
 E O SIGAMOS COM MAIOR EMPENHO 
 
Efésios (William Barclay) 2 
ÍNDICE 
 
Prefácio
Introdução Geral
Introdução Geral às Cartas Paulinas
Introdução à Carta aos Efésios
Capítulo 1 Capítulo 3 Capítulo 5 
Capítulo 2 Capítulo 4 Capítulo 6 
 
 
PREFÁCIO A GÁLATAS E EFÉSIOS 
 
Os comentários a estas duas cartas de Paulo apareceram 
originalmente por separado com um intervalo de dois anos, para logo ser 
publicados juntos num só tomo. 
O autor menciona em seu Prefácio a Gálatas, o fato de haver-se 
publicado numerosas obras sobre esta epístola, dada a influência que ela 
teve na Igreja. Lembra que uma das obras mais importantes do Lutero foi 
seu comentário sobre o Gálatas, e menciona como um "monumento de 
erudição e um tesouro de materiais" o de E. D. Burton no International 
Critical Commentary. Dos comentários existentes sobre o texto inglês 
menciona o de A. W. F. Blunt na Clarendon Bible; mas, diz, "o melhor 
comentário em inglês continua sendo o de G. S. Duncan no Moffatt 
Commentary". 
Termina com a afirmação de que Gálatas "leva-nos mais perto do 
coração do evangelho de Paulo" que qualquer outra de suas cartas. 
Com referência a Efésios, assinala que é uma das cartas de Paulo 
mais freqüentemente estudadas, como que põe diante de nós o ideal da 
Igreja. Menciona como três grandes comentários sobre o texto grego os 
de J. Armitage Robinson, B. F. Westcott e T. K. Abbott. Entre os 
comentários sobre o texto inglês, menciona os de E. F. Scott no Moffatt 
Efésios (William Barclay) 3 
Commentary, J. Armitage Robinson, e H. G. Moule, e recomenda como 
excelente a exposição de Efésios pelo Dr. John A. Mackay. 
 
 Os Editores 
 
INTRODUÇÃO GERAL 
 
Pode dizer-se sem faltar à verdade literal, que esta série de 
Comentários bíblicos começou quase acidentalmente. Uma série de 
estudos bíblicos que estava usando a Igreja de Escócia (Presbiteriana) 
esgotou-se, e se necessitava outra para substituí-la, de maneira imediata. 
Fui solicitado a escrever um volume sobre Atos e, naquele momento, 
minha intenção não era comentar o resto do Novo Testamento. Mas os 
volumes foram surgindo, até que o encargo original se converteu na idéia 
de completar o Comentário de todo o Novo Testamento. 
Resulta-me impossível deixar passar outra edição destes livros sem 
expressar minha mais profunda e sincera gratidão à Comissão de 
Publicações da Igreja de Escócia por me haver outorgado o privilégio de 
começar esta série e depois continuar até completá-la. E em particular 
desejo expressar minha enorme dívida de gratidão ao presidente da 
comissão, o Rev. R. G. Macdonald, O.B.E., M.A., D.D., e ao secretário e 
administrador desse organismo editar, o Rev. Andrew McCosh, M.A., 
S.T.M., por seu constante estímulo e sua sempre presente simpatia e 
ajuda. 
Quando já se publicaram vários destes volumes, nos ocorreu a idéia 
de completar a série. O propósito é fazer que os resultados do estudo 
erudito das Escrituras possam estar ao alcance do leitor não 
especializado, em uma forma tal que não se requeiram estudos teológicos 
para compreendê-los; e também se deseja fazer que os ensinos dos livros 
do Novo Testamento sejam pertinentes à vida e ao trabalho do homem 
contemporâneo. O propósito de toda esta série poderia resumir-se nas 
palavras da famosa oração de Richard Chichester: procuram fazer que 
Efésios (William Barclay) 4 
Jesus Cristo seja conhecido de maneira mais clara por todos os homens e 
mulheres, que Ele seja amado mais entranhadamente e que seja seguido 
mais de perto. Minha própria oração é que de alguma maneira meu 
trabalho possa contribuir para que tudo isto seja possível. 
 
INTRODUÇÃO GERAL ÀS CARTAS DE PAULO 
 
As cartas de Paulo 
 
No Novo Testamento não há outra série de documentos mais 
interessante que as cartas de Paulo. Isto se deve a que de todas as formas 
literárias, a carta é a mais pessoal. Demétrio, um dos críticos literários 
gregos mais antigos, escreveu uma vez: "Todos revelamos nossa alma 
nas cartas. É possível discernir o caráter do escritor em qualquer outro 
tipo de escrito, mas em nenhum tão claramente como nas epístolas" 
(Demétrio, On Style, 227). 
Justamente pelo fato de Paulo nos deixar tantas cartas, sentimos que 
o conhecemos tão bem. Nelas abriu sua mente e seu coração àqueles que 
tanto amava; e nelas, até o dia de hoje, podemos ver essa grande 
inteligência abordando os problemas da Igreja primitiva, e podemos 
sentir esse grande coração pulsando com o amor pelos homens, mesmo 
que estivessem desorientados e equivocados. 
 
A dificuldade das cartas 
 
E entretanto, é certo que não há nada tão difícil como compreender 
uma carta. Demétrio (em On Style, 223) cita um dito do Artimón, que 
compilou as cartas do Aristóteles. Dizia Artimón que uma carta deveria 
ser escrita na mesma forma que um diálogo, devido a que considerava 
que uma carta era um dos lados de um diálogo. Dizendo o de maneira 
mais moderna, ler uma carta é como escutar a uma só das pessoas que 
tomam parte em uma conversação telefônica. De modo que quando 
Efésios (William Barclay) 5 
lemos as cartas de Paulo freqüentemente nos encontramos com uma 
dificuldade: não possuímos a carta que ele estava respondendo; não 
conhecemos totalmente as circunstâncias que estava enfrentando; só da 
carta podemos deduzir a situação que lhe deu origem. Sempre, ao ler 
estas cartas, nos apresenta um problema dobro: devemos compreender a 
carta, e está o problema anterior de que não a entenderemos se não 
captarmos a situação que a motivou. Devemos tratar continuamente de 
reconstruir a situação que nos esclareça carta. 
 
As cartas antigas 
 
É uma grande lástima que se chamasse epístolas às cartas de Paulo. 
São cartas no sentido mais literal da palavra. Uma das maiores chaves na 
interpretação do Novo Testamento foi o descobrimento e a publicação 
dos papiros. No mundo antigo o papiro era utilizado para escrever a 
maioria dos documentos. Estava composto de tiras da medula de um 
junco que crescia nas ribeiras do Nilo. Estas tiras ficavam uma sobre a 
outra para formar uma substância muito parecida com nosso papel de 
envolver. As areias do deserto do Egito eram ideais para a preservação 
do papiro, porque apesar de ser muito frágil, podia durar eternamente se 
não fosse atingido pela umidade. De modo que das montanhas de 
escombros egípcios os arqueólogos resgataram literalmente centenas de 
documentos, contratos de casamento, acordos legais, inquéritos 
governamentais, e, o que é mais interessante, centenas de cartas 
particulares. Quando as lemos vemos que todas elas respondiam a um 
modelo determinado;e vemos que as cartas de Paulo reproduzem exata e 
precisamente tal modelo. Aqui apresentamos uma dessas cartas antigas. 
Pertence a um soldado, chamado Apion, que a dirige a seu pai Epímaco. 
Escrevia de Miseno para dizer a seu pai que chegou a salvo depois de 
uma viagem tormentosa. 
 
Efésios (William Barclay) 6 
"Apion envia suas saudações mais quentes a seu pai e senhor 
Epímaco. Rogo acima de tudo que esteja bem e são; e que. tudo parta bem 
para ti, minha irmã e sua filha, e meu irmão. Agradeço a meu Senhor Serapi 
[seu Deus] que me tenha salvado a vida quando estava em perigo no mar. 
logo que cheguei ao Miseno obtive meu pagamento pela viagem —três 
moedas de ouro. Vai muito bem. portanto te rogo, querido pai, que me 
escreva, em primeiro lugar para me fazer saber que tal está, me dar notícias 
de meus irmãos e em terceiro lugar, me permita te beijar a mão, porque me 
criaste muito bem, e porque, espero, se Deus quiser, me promova logo. 
Envio minhas quentes saudações a Capito, a meus irmãos, a Serenila e a 
meus amigos. Envio a você um quadro de minha pessoa pintado pelo 
Euctemo. Meu nome militar é Antônio Máximo. Rogo por sua saúde. Sereno, 
o filho do Agato Daimón, e Turvo, o filho do Galiano, enviam saudações. (G. 
Milligan, Seleções de um papiro grego, 36). 
 
Apion jamais pensou que estaríamos lendo sua carta a seu pai mil e 
oitocentos anos depois de havê-la escrito. Ela mostra o pouco que muda 
a natureza humana. O jovem espera que ser logo ascendido. Certamente 
Serenila era a noiva que tinha deixado em sua cidade. Envia á sua 
família o que na antiguidade equivalia a uma fotografia. Esta carta se 
divide em várias seções. 
(1) Há uma saudação. 
(2) Roga-se pela saúde dos destinatários. 
(3) Agradece-se aos deuses. 
(4) Há o conteúdo especial. 
(5) Finalmente, as saudações especiais e os pessoais. 
Virtualmente cada uma das cartas de Paulo se divide exatamente 
nas mesmas seções. as consideremos com respeito às cartas do apóstolo. 
(1) A saudação: Romanos 1:1; 1 Coríntios 1:1; 2 Coríntios 1:1; 
Gálatas 1:1; Efésios 1:1; Filipenses 1:1; Comesse guloseimas 1:1-2; 1 
Tessalonicenses 1:1; 2 Tessalonicenses 1:1. 
(2) A oração: em todos os casos Paulo ora pedindo a graça de Deus 
para com a gente a que escreve: Romanos 1:7; 1 Coríntios 1:3; 2 
Efésios (William Barclay) 7 
Coríntios 1:2; Gálatas 1:3; Efésios 1:2; Filipenses 1:3; Colossenses 1:2; 
1 Tessalonicenses 1:3; 2 Tessalonicenses 1:3. 
(3) O agradecimento: Romanos 1:8; 1 Coríntios 1:4; 2 Coríntios 1:3 
Efésios 1:3; Filipenses 1:3; 1 Tessalonicenses 1:3; 2 Tessalonicenses 1:2. 
(4) O conteúdo especial: o corpo principal da carta constitui o 
conteúdo especial. 
(5) Saudações especiais e pessoais: Romanos 16; 1 Coríntios 16:19; 
2 Coríntios 13:13; Filipenses 4:21-22; Colossenses 4:12-15; 1 
Tessalonicenses 5:26. 
É evidente que quando Paulo escrevia suas cartas o fazia segundo a 
forma em que todos faziam. Deissmann, o grande erudito, disse a 
respeito destas cartas: "Diferem das mensagens achadas nos papiros do 
Egito não como cartas, mas somente em que foram escritas por Paulo." 
Quando as lemos encontramos que não estamos diante de exercícios 
acadêmicos e tratados teológicos, mas diante de documentos humanos 
escritos por um amigo a seus amigos. 
 
A situação imediata 
 
Com bem poucas exceções Paulo escreveu suas cartas para 
enfrentar uma situação imediata. Não são tratados em que Paulo se 
sentou a escrever na paz e no silêncio de seu estudo. Havia uma situação 
ameaçadora em Corinto, Galácia, Filipos ou Tessalônica. E escreveu 
para enfrentá-la. Ao escrever, não pensava em nós absolutamente; só 
tinha posta sua mente nas pessoas a quem se dirigia. Deissmann escreve: 
"Paulo não pensava em acrescentar nada às já extensas epístolas dos 
judeus; e menos em enriquecer a literatura sagrada de sua nação... Não 
pressentia o importante lugar que suas palavras ocupariam na história 
universal; nem sequer que existiriam na geração seguinte, e muito menos 
que algum dia as pessoas as considerariam como Sagradas Escrituras." 
Sempre devemos lembrar que não porque algo se refira a uma 
situação imediata tem que ser de valor transitivo. Todos os grandes 
Efésios (William Barclay) 8 
cantos de amor foram escritos para uma só pessoa, mas todo mundo 
adora. Justamente pelo fato de as cartas de Paulo serem escritas para 
enfrentar uma situação ameaçadora ou uma necessidade clamorosa ainda 
têm vida. E porque a necessidade e a situação humanas não mudam, 
Deus nos fala hoje através delas. 
 
A palavra falada 
 
Devemos notar mais uma coisa nestas cartas. Paulo fez o que a 
maioria das pessoas faziam em seus dias. Normalmente ele não escrevia 
suas cartas; ditava-as e logo colocava sua assinatura autenticando-as. 
Hoje sabemos o nome das pessoas que escreveram as cartas. Em 
Romanos 16:22, Tércio, o secretário, inclui suas saudações antes de 
finalizar a carta. Em 1 Coríntios 16:21 Paulo diz: “A saudação, escrevo-a 
eu, Paulo, de próprio punho.” Ou seja: Esta é minha própria assinatura, 
meu autógrafo, para que possam estar seguros de que a carta provém de 
mim. (Ver Colossenses 4:18; 2 Tessalonicenses 3:17.) 
Isto explica muitas coisas. Às vezes é muito difícil entender a 
Paulo, porque suas orações começam e não terminam nunca; sua 
gramática falha e suas frases se confundem. Não devemos pensar que 
Paulo se sentou tranqüilo diante de um escritório, e burilou cada uma das 
frases que escreveu. Devemos imaginá-lo caminhando de um lado para 
outro numa pequena habitação, pronunciando uma corrente de palavras, 
enquanto seu secretário se apressava a escrevê-las. Quando Paulo 
compunha suas cartas, tinha em mente a imagem das pessoas às quais 
escrevia, e entornava seu coração em palavras que fluíam uma após outra 
em seu desejo de ajudar. As cartas de Paulo não são produtos 
acadêmicos e cuidadosos, escritos no isolamento do estudo de um 
erudito; são correntes de palavras vitais, que vivem e fluem diretamente 
de seu coração ao dos amigos aos quais escrevia. 
 
 
Efésios (William Barclay) 9 
INTRODUÇÃO À CARTA AOS EFÉSIOS 
 
A carta suprema 
 
Por consenso geral a Carta aos Efésios se localiza no plano mais 
elevado dentro da literatura devocional e teológica da Igreja primitiva. 
foi chamada "A rainha das epístolas", e com razão. Muitos sustentariam 
que nela alcança sua mais alta expressão do pensamento 
neotestamentário. Quando morria John Knox, já próximo a seu desenlace 
o livro que com mais freqüência lhe liam era os Sermões sobre a Carta 
aos Efésios de João Calvino. O grande poeta e filósofo Coleridge disse 
de Efésios que era "a mais divina composição humana". E adicionava: 
"Abrange em primeiro termo aquelas doutrinas peculiares ao 
cristianismo e, logo, os preceitos comuns à religião natural". Efésios é 
sem dúvida uma carta que tem um lugar próprio na correspondência 
paulina. 
Mas apesar disto há problemas muito reais vinculados a Efésios que 
não podem considerar-se produtos especulativos de investigadores 
supercríticos; são problemas que todos podem ver facilmente. Também é 
verdade que quando esses problemas são resolvidos, Efésios se 
engrandece como nunca e até brilha com luz mais radiante, revestindo-se 
de uma importância ainda maior. 
 
Circunstâncias em que se escreveu Efésios 
 
Antes de tratar qualquer tema discutível, assinalemos primeiro o 
que é certo. Em primeiro termo Efésios evidentemente foi escrita estando 
Paulo preso. Ele se chama a si mesmo "prisioneiro de Cristo Jesus" (3:1); 
"detento no Senhor" que lhes roga (4:1); em sua famosa frase é um 
"embaixador em cadeias" (6:20). Paulo estava preso e muito perto de seu 
fim quando escreveu Efésios. Em segundo lugar, Efésios tem claramente 
uma relação muito estreita e íntima com Colossenses. Pareceria que 
Efésios (WilliamBarclay) 10 
Tíquico foi o portador de ambas as cartas, pois em Colossenses Paulo diz 
que aquele lhes informará sobre sua situação (Colossenses 4:7); em 
Efésios diz que Tíquico lhes dará notícias sobre seus assuntos e sobre 
como ele está (Efésios 6:2). Tíquico está relacionado intimamente com 
estas duas cartas. Mas além disso há semelhança no conteúdo das 
mesmas. É tanta a similitude que se contam mais de 55 versículos 
idênticos. Ou, como sustenta Coleridge, Colossenses é o que poderia 
chamar-se "a superabundância" de Efésios ou Efésios constitui uma 
versão mais extensa de Colossenses. No final veremos que esta 
semelhança é a que nos dá a chave do lugar único de Efésios entre as 
cartas de Paulo. 
 
O problema 
 
Assim, pois, é certo que Efésios foi escrito quando Paulo estava no 
cárcere por razão de sua fé e que de algum modo tem a mais estreita 
relação possível com Colossenses. Onde está pois o problema? O 
problema surge quando se começa a indagar na pergunta a quem foi 
escrita a carta. Na antigüidade as cartas eram escritas em rolos de 
papiro. Ao serem concluídas eram ligadas com uma corda; em caso de 
ser particularmente privadas ou importantes o nó da corda era selado. 
Mas raramente ocorria que se chegasse a escrever o endereço do 
destinatário pela simples razão de que no mundo antigo o homem 
comum não dispunha de um sistema postal. O governo possuía seu 
correio, mas só destinado à correspondência oficial e imperial, não ao 
uso privado nem de cartas deste tipo. Naquela época as cartas eram 
entregues em mãos; alguém se encarregava de levá-las pessoalmente; 
pelo qual a direção não era necessária. Por isso os títulos das cartas do 
Novo Testamento não são absolutamente parte das cartas originais. Os 
títulos se inseriram depois que as cartas foram colecionadas e publicadas 
com o fim de que fossem lidas em toda a Igreja. 
Efésios (William Barclay) 11 
Agora, quando estudamos mais de perto e com inteligência a Carta 
aos Efésios advertimos que, efetivamente é muito improvável se dirigiu à 
Igreja de Éfeso. Há razões internas que levam a esta conclusão. 
(a) Salta à vista que a Carta foi dirigida a gentios. Os destinatários 
da Carta eram “gentios na carne, chamados incircuncisão por aqueles 
que se intitulam circuncisos, na carne... sem Cristo, separados da 
comunidade de Israel e estranhos às alianças da promessa” (2:11, 12). 
Paulo lhes suplica: “não mais andeis como também andam os gentios” 
(4:17). O fato de que se tratasse de gentios não significa, certamente, que 
a Carta não fosse enviada a Éfeso; mas dá, antes, a certeza de quais eram 
os destinatários. 
(b) É inegável que Efésios é a carta mais impessoal que Paulo 
escreveu. Do começo até o fim não há nenhuma nota pessoal. Carece 
inteiramente das saudações pessoais e mensagens íntimas de que estão 
cheias as outras cartas. Isto é duplamente surpreendente se lembrarmos 
que Paulo permaneceu em Éfeso mais tempo que em qualquer outra 
cidade; esteve ali não menos de três anos (Atos 18:9-10). Além disso, em 
Atos 20:17-35 podemos ler a despedida de Paulo dos anciãos de Éfeso 
em sua última viagem, antes de abandonar Mileto. Em todo o Novo 
Testamento não há uma passagem de maior intimidade e afeto, e frente a 
tudo isto é muito difícil crer que Paulo enviasse a Éfeso uma carta 
completamente impessoal e desprovida de toda nota íntima. 
(c) Ainda mais. A Carta indica que Paulo e os destinatários não se 
conheciam pessoalmente; só se conheciam por rumores e referências à 
margem de todo contato real. Em 1:15 Paulo escreve: “Tendo ouvido da 
fé que há entre vós”. Conhecia a fidelidade das pessoas às quais se 
dirigia por informação e não por experiência. Em 3:2 lhes escreve: “Se é 
que tendes ouvido a respeito da dispensação da graça de Deus a mim 
confiada para vós outros”; isto equivale a dizer: "Se tiverem ouvido que 
Deus me encomendou a tarefa especial e a acusação de ser o apóstolo 
dos gentios como vós". O conhecimento que a Igreja tinha de Paulo — 
neste caso como apóstolo dos gentios — provinha de informações, não 
Efésios (William Barclay) 12 
do contato pessoal. Assim, pois, a Carta em si tem sinais de que não se 
adapta às íntimas relações pessoais que Paulo tinha com a Igreja de 
Éfeso. 
Estes atos poderiam ser levados em conta ou desprezados, mas há 
um fator externo que emaranha a questão. Em 1:1 nenhum dos grandes 
manuscritos primitivos do Novo Testamento grego contém as palavras 
em Éfeso. Todos estes manuscritos dizem: "Paulo... aos santos e fiéis em 
Cristo Jesus". E sabemos, pelo modo como o comentavam, que essa era 
efetivamente a forma em que os grandes Pais gregos da antigüidade 
conheciam o primeiro versículo de Efésios. 
 
Foi Paulo o autor? 
 
Há alguns investigadores que assinalam outra dificuldade em 
Efésios. Põem em dúvida que Paulo seja efetivamente o autor da Carta. 
Quais são os fundamentos em que se baseiam estas dúvidas? Dizem que 
o vocabulário é diferente do de Paulo; e é verdade que em Efésios há 
umas setenta palavras que não se encontram nas outras cartas. Mas isto 
não precisa nos preocupar já que em Efésios Paulo diz coisas que jamais 
havia dito antes; seu pensamento percorre um caminho que não tinha 
percorrido com antecedência; e é muito natural que necessitasse novas 
palavras para expressar novos pensamentos. Seria ridículo pedir que um 
homem com uma mente como a de Paulo não enriquecesse jamais seu 
vocabulário e se expressasse sempre da mesma maneira. Diz-se que o 
estilo não é o de Paulo. Isto é verdade; até nas traduções, não digamos no 
grego, pode-se apreciar que o estilo de Efésios é diferente do das outras 
cartas. Todas as outras cartas foram escritas com referência a uma 
situação determinada, a uma emergência definida ou a problemas 
concretos. Mas, como diz A. H. M'-Neile, Efésios é "um tratado 
teológico ou, antes, uma meditação religiosa". Até o uso da linguagem é 
diferente. Moffatt o expressa desta maneira: geralmente a linguagem de 
Paulo irrompe como uma cascata ou uma corrente com uma perfeita 
Efésios (William Barclay) 13 
catarata de palavras apaixonadas; mas em Efésios temos "uma corrente 
suave e limpa que flui constantemente e transborda suas elevadas 
margens". Em Efésios a longitude das frases é chamativa. No texto grego 
de Efésios 1:3-14,15-23; 2:1-9; 3:1-7 achamos sentenças longas e 
tortuosas. M'-Neile chama efésios, acertadamente e com justiça "um 
poema em prosa". Tudo isto é muito diferente do estilo normal de Paulo. 
Então, o que dizer a isto? Em primeiro termo é um fato geral que 
nenhum escritor de importância escreve sempre no mesmo estilo. Um 
Shakespeare pode adotar os muito diferentes estilos de Hamlet, O sonho 
de uma noite do verão, A ferinha domada e os Sonetos. Todo grande 
estilista — e Paulo o era — escreve num estilo que se adapta a seu 
propósito e às circunstâncias do momento em que escreve. É crítica de 
má lei dizer que Paulo não escreveu Efésios simplesmente porque esta 
Carta contém um novo vocabulário e um novo estilo. Mas há mais ainda. 
Lembremos como escreveu Paulo a maior parte de suas cartas: em meio 
de um trabalho apostólico muito ativo em que geralmente estava de 
viagem. Escreveu para responder os problemas urgentes que deviam ser 
tratados nesse mesmo momento. Isto significa que a maior parte de suas 
cartas foram escritas em circunstâncias muito difíceis e quase sempre, 
correndo contra o tempo. 
Lembremos agora como escreveu Efésios. Dedicou-se a esta tarefa 
enquanto estava preso. Portanto dispunha de todo o tempo possível: não 
tinha por que apressar-se porque tinha pela frente meses da prisão, sem 
outra coisa a fazer senão pensar e escrever. É de estranhar que o estilo de 
Efésios não seja o estilo das cartas mais antigas? Ainda mais, a diferença 
de estilo — o caráter poético e meditativo — é mais visível nos três 
primeiros capítulosque são uma longa prece que culmina na grande 
doxologia do final do capítulo três. Por certo que não há nada semelhante 
a isto nas cartas de Paulo. É a linguagem da prece poesia lírica, não o do 
argumento, da controvérsia ou da recriminação. 
É evidente que Efésios foi escrita com um vocabulário e num estilo 
que diferem do das outras cartas paulinas; mas foi escrita para expressar 
Efésios (William Barclay) 14 
novas idéias em circunstâncias inteiramente diferentes e — como o 
veremos — com um propósito muito diferente do de qualquer das outras. 
Diferencia-as estão longe de provar que Efésios não pertença a Paulo. 
 
O pensamento da Epístola 
 
Alguns investigadores afirmam que o pensamento de Efésios 
excede ao de qualquer outra carta paulina. Vejamos qual é esse 
pensamento. Vimos que Efésios se vincula estreitamente com 
Colossenses. O grande pensamento central de Colossenses é a 
suficiência total de Jesus Cristo. Em Jesus Cristo reside todo 
conhecimento e toda sabedoria (Colossenses 2:3); aprouve ao Pai que 
nEle habitasse toda plenitude (Colossenses 1:19); numa grande frase, 
Cristo é "corporalmente toda a plenitude da Divindade" (Colossenses 
2:9); só ele é necessário e suficiente para a salvação do homem 
(Colossenses 1:14). Todo o conteúdo de Colossenses se baseia na 
suficiência plena de Jesus Cristo. O pensamento de Efésios desenvolve 
esta concepção; uma síntese completa do mesmo encontra-se em dois 
versículos do primeiro capítulo onde Paulo apresenta a Deus: “E nos 
revelou o mistério da sua vontade, de acordo com o seu bom propósito 
que ele estabeleceu em Cristo, isto é, de fazer convergir em Cristo todas 
as coisas, celestiais ou terrenas, na dispensação da plenitude dos 
tempos” (Efésios 1:9-10, NVI). 
A idéia chave de Efésios é a reunião de todas as coisas em Jesus 
Cristo. Cristo é o centro em quem se unem todas as coisas e o laço que 
todo o liga. Na natureza sem Cristo não há mas sim desunião e 
desarmonia. A natureza é um campo de batalha "vermelho, com dentes e 
garras". O domínio do homem rompeu a união social que devia existir 
entre homens e animais. O homem está dividido do homem, a classe da 
classe, a nação da nação, a ideologia da ideologia, o gentio do judeu. O 
mundo sem Cristo é um mundo dividido, desunido, fragmentado. O que 
é verdade do mundo natural exterior também o é da própria natureza 
Efésios (William Barclay) 15 
humana. Em cada homem há uma tensão; cada homem é uma guerra 
civil em marcha; livra-se uma batalha constante entre a parte superior e a 
inferior do homem; o homem está sempre esmigalhado entre o desejo do 
bem e do mal; aborrece seus pecados e ao mesmo tempo os ama. 
Para o pensamento grego como para o judeu da época de Paulo essa 
batalha, essa desarmonia e essa desunião se estendiam até as mesmas 
alturas celestiais. Está-se desenvolvendo uma luta cósmica entre os 
poderes do mal e os poderes do bem; entre os bons e os maus espíritos e 
os poderes angélicos; entre Deus e os demônios. Mas o pior de tudo é a 
desarmonia, a desunião e a separação entre Deus e o homem. O homem 
que tinha sido destinado a estar em comunhão com Deus se sentiu 
estranho a Ele. De modo que aonde quer que olhemos no mundo sem 
Cristo não há outra coisa senão desunião. Esta desunião não está no 
desígnio de Deus; Deus propôs a harmonia do universo e não a 
desarmonia. E o único caminho para que esta desunião se torne em união 
e esta desarmonia se torne em harmonia é que todas as coisas, todos os 
homens, todos os poderes nos céus e na Terra se unam em Cristo. 
Como disse E. F. Scott: "Os inumeráveis fios quebrados deviam 
reunir-se de novo em Cristo, ligados de novo em um como foi no 
princípio". O pensamento central de Efésios é a compreensão da 
desunião na natureza, no homem, no tempo, na eternidade, desunião 
entre Deus e o homem, e a convicção de que toda esta desunião pode 
converter-se em unidade quando todos os homens e todos os poderes se 
unam em Cristo. 
 
A origem do pensamento de Paulo 
 
Como chegou Paulo a esta grande concepção da união de todas as 
coisas em Jesus Cristo? Muito provavelmente por dois caminhos. Foi 
sem dúvida o resultado inevitável de sua convicção, tão vividamente 
exposta em Colossenses, de que Cristo é plenamente suficiente. Se em 
Cristo há uma suficiência plena, então todos os homens, todas as coisas e 
Efésios (William Barclay) 16 
todos os poderes só podem chegar à unidade quando aceitam a Cristo e 
vivem nEle. Mas também pode ser que houvesse outra coisa que moveu 
o pensamento de Paulo nesta direção. Paulo era cidadão romano e estava 
orgulhoso disso. Em suas viagens tinha estado em constante contato com 
o império romano e agora encontrava-se em Roma a cidade imperial. 
Agora, com o império romano se estabeleceu uma nova unidade no 
mundo. A pax romana era um fato muito real. Reinos, cidades e nações, 
que tinham lutado, combatido, competido e guerreado entre si, 
congregavam-se agora numa nova unidade dentro do império romano. 
As barreiras tinham sido derrubadas, as divisões superadas; as 
hostilidades tinham concluído, as tensões se relaxaram; tudo chegou a 
adquirir unidade em Roma. Bem pode ser que desde sua prisão Paulo 
tenha visto sob uma nova luz toda esta unidade centralizada em Roma; 
pôde ter captado em tudo isto um símbolo ou uma parábola de como 
todas as coisas devem centralizar-se em Cristo, e reunir-se nEle, se é que 
de algum modo a natureza, o mundo e a humanidade têm que chegar 
alguma vez à unidade. Por certo, longe de ser uma concepção que 
excedesse o pensamento de Paulo, todo seu pensamento e sua 
experiência o teriam levado precisamente a este resultado. 
 
A função da Igreja 
 
Nos três primeiros capítulos da Carta Paulo oferece sua concepção 
sobre a unidade em Cristo. Nos seguintes três diz muito sobre o lugar da 
Igreja no plano de Deus para levar a cabo esta unidade. Para que existe a 
Igreja? Qual é sua verdadeira função no plano de Deus? Onde intervém a 
Igreja neste propósito de trazer uma nova unificação a um mundo 
desunido? É aqui onde Paulo acerta no alvo com uma de suas frases mais 
importantes. A Igreja é o corpo de Cristo. A Igreja tem que ser as mãos 
para a obra de Cristo, pés para correr atrás dos que se desviam, uma boca 
que fala por Ele, um instrumento e um corpo pelos quais pode operar. 
Assim, pois, achamos em Efésios uma dupla tese. Primeiro, Cristo é o 
Efésios (William Barclay) 17 
instrumento de Deus para a reconciliação; segundo, a Igreja é o 
instrumento de Cristo para essa reconciliação. A Igreja deve levar Cristo 
ao mundo e dentro dela devem cair por terra todos os muros divisórios e 
as separações. Mediante a Igreja deve realizar-se e levar-se a cabo a 
unidade de todos os elementos discordantes. A Igreja deve pregar ao 
Cristo em quem somente é possível a unidade, e dentro da Igreja deve 
obter-se e realizar-se essa unidade. 
Como diz E. F. Scott: "A Igreja tem como finalidade a 
reconciliação do mundo para a qual veio Cristo: e em todas suas relações 
entre si, os cristãos devem buscar realizar esta idéia formativa da Igreja". 
 
Quem se não Paulo? 
 
Este é, pois, o pensamento de Efésios. Como vimos, alguns, 
pensando no vocabulário, no estilo e no pensamento da Carta, não 
podem crer que Paulo a tenha escrito. 
E. J. Goodspeed, o investigador norte-americano, adiantou uma 
teoria interessante, mas não convincente. Diz que com toda 
probabilidade foi em Éfeso onde cerca de 90 de nossa era, teriam sido 
recolhidas, publicadas e enviadas a toda a Igreja as cartas de Paulo. 
Segundo a teoria de Goodspeed o responsável pela recopilação — algum 
discípulo entusiasta de Paulo — escreveu Efésios como um prefácio ou 
uma introdução a toda a coleção. Basta um fato importante para deitar 
por terra com esta teoria. Toda imitação é inferior ao original. Toda obra 
secundáriase revela ela mesma como tal. Mas Efésios, longe de ser 
inferior, pode ser considerada a maior das cartas de Paulo, e se o próprio 
Paulo não a escreveu devemos postular como autor a alguém ao menos 
da talha do apóstolo, ou superior. 
E. F. Scott faz uma pergunta muito oportuna "Podemos pensar que 
na Igreja do tempo de Paulo tenha existido um mestre desconhecido de 
tão suprema excelência? O natural é supor que uma carta tão afim ao 
melhor da obra de Paulo não pôde ter sido escrita por outro que pelo 
Efésios (William Barclay) 18 
próprio Paulo". Ninguém teve jamais uma visão tão grande de Cristo 
como a que o concebe centro único no qual todas as desuniões da vida se 
transformam em unidade. Ninguém jamais teve uma visão maior da 
Igreja que a que vê nela o instrumento de Deus para a reconciliação 
universal. Bem podemos crer que ninguém a não ser de Paulo pôde ter 
chegado a tal visão. 
 
O destino de Efésios 
 
Voltemos para problema que antes ficou sem resolver. Se Efésios 
não foi escrita para Éfeso — e vimos que dificilmente pôde ter sido 
assim — a que Igreja esteve destinada? 
A posição mais antiga é que foi escrita a Laodicéia. Em 
Colossenses 4:16 Paulo escreve: “E, uma vez lida esta epístola perante 
vós, providenciai por que seja também lida na igreja dos laodicenses; e a 
dos de Laodicéia, lede-a igualmente perante vós”. Desta frase resulta 
certo que Paulo escreveu uma carta à Igreja do Laodicéia. Entre as cartas 
que temos de Paulo não há nenhuma aos laodicenses. Marcion foi um 
dos primeiros em compilar as cartas paulinas; fez uma lista das mesmas 
justamente em meados do segundo século. E, efetivamente, chama 
Efésios de "Carta aos Laodicenses". Assim, pois, de uma época muito 
antiga se pensou na Igreja que Efésios tinha sido enviada em primeira 
instância a Laodicéia. 
Se aceitarmos esta interessante e atrativa sugestão, resta-nos 
explicar como a Carta perdeu o endereço específico de Laodicéia e 
chegou a conectar-se com Éfeso. Podem dar-se duas explicações. 
Pode ser que ao morrer Paulo, tendo a Igreja de Éfeso 
conhecimento que Laodicéia possuía uma carta extraordinária do 
Apóstolo, os cristãos de Éfeso escrevessem a Laodicéia pedindo uma 
cópia. Teria sido feita a cópia para remetê-la com a única omissão das 
palavras "em Laodicéia" do primeiro versículo e deixando um branco, tal 
como ocorre nos manuscritos mais antigos. Quase trinta anos mais tarde 
Efésios (William Barclay) 19 
se recolheram as cartas de Paulo para sua publicação. Agora, Laodicéia 
estava numa zona conhecida por seus terremotos e bem pode ter 
acontecido que todos os arquivos laodicenses fossem destruídos, e que 
portanto quando se levou a cabo a compilação, a única cópia da carta aos 
laodicenses fosse a que existia em Éfeso. Esta carta pôde ter sido 
incluída então na coleção paulina e, como tinha sido achada em Éfeso, 
poderia ter chegado a conhecer-se como carta aos Efésios, pois em Éfeso 
sobrevivia a única cópia existente. Isto é completamente possível e sem 
lugar a dúvida muito provável. 
A segunda explicação sugerida foi proposta pelo Harnack, o grande 
investigador alemão, e diz assim. Em seus últimos dias, infelizmente a 
Igreja de Laodicéia tinha caído da graça. No Apocalipse há uma carta ao 
Laodicéia que faz um triste relato (Apocalipse 3:14-22). Aqui a Igreja de 
Laodicéia é condenada triste e categoricamente por Cristo ressuscitado 
ao ponto de que pronuncia a vívida sentença: "Vomitar-te-ei da minha 
boca" (Apocalipse 3:16). Agora, no mundo antigo existia um costume 
denominado damnatio memorias, a condenação da lembrança de alguém. 
No caso de uma pessoa que tinha rendido notáveis serviços ao Estado 
seu nome poderia aparecer em livros, anais oficiais, inscrições e 
memoriais. Mas se tal homem terminava sua carreira com uma baixa 
traição, uma vergonhosa falta de honestidade ou o colapso total de toda 
venerabilidade, procedia-se a condenar sua memória. Seu nome era 
apagado dos livros, riscado de todas as inscrições, apagado de todos os 
monumentos. Suportava assim uma damnatio memoriae. Harnack pensa 
como possível que a Igreja do Laodicéia tenha sucumbido a uma 
damnatio memoriae, de tal maneira que seu nome fosse apagado dos 
registros cristãos. Se isto foi assim as cópias das cartas a Laodicéia não 
tinham nenhum endereço. Quando se fez a coleção em Éfeso se 
introduziu o nome desta última cidade porque a Carta tinha sobrevivido 
aqui e carecia de outro destinatário. 
 
 
Efésios (William Barclay) 20 
A carta circular 
 
Ambas as sugestões são possíveis, mas há outra muito mais 
provável que consideramos correta. Cremos que os manuscritos 
primitivos de Efésios não tinham o nome de nenhuma Igreja porque de 
fato a carta não tinha sido escrita a nenhuma Igreja, mas, antes, era 
uma circular de Paulo a todas as Igrejas da Ásia. Nunca foi possessão 
de uma Igreja, mas sim possessão de todas as Igrejas. Leiamos de novo o 
que Paulo diz em Colossenses 4:16: “E, uma vez lida esta epístola 
perante vós, providenciai por que seja também lida na igreja dos 
laodicenses; e a dos de Laodicéia, lede-a igualmente perante vós”. 
Agora, Paulo não diz que os colossenses devam ler a epístola a Laodicéia 
mas sim a dos de Laodicéia. É como se houvesse dito: "Há uma carta 
que está circulando, no presente chegou a Laodicéia. Quando chegar —
quando lhes for enviada desde Laodicéia — têm que lê-la". Isto soa 
como se entre as Igrejas da Ásia circulasse uma carta. Pensamos que esta 
era justamente Efésios. 
 
A quintessência do pensamento de Paulo 
 
Se tudo isto é assim, e cremos que efetivamente o é, então Efésios é 
a carta suprema de Paulo. Vimos que Efésios e Colossenses estão ligadas 
estreitamente entre si. Cremos que o que ocorreu foi que Paulo escreveu 
Colossenses para tratar uma situação concreta e um broto definido de 
heresia. Ao escrever nessas circunstâncias dá com sua célebre expressão 
sobre a suficiência plena de Cristo. Disse de si para si: "Isto é algo que 
devo levar a conhecimento de todos." Assim tomou o material que tinha 
usado em Colossenses, tirou-lhe tudo o que tinha sabor local e 
temporário e todo aspecto controverso e escreveu uma nova carta para 
falar com todos os homens sobre a suficiência plena de Cristo. Efésios é 
como vimos, uma carta que Paulo enviou a todas as Igrejas do Oriente 
para lhes anunciar que a unidade destinada a todos os homens e a todas 
Efésios (William Barclay) 21 
as coisas não poderá ser obtida jamais a não ser em Cristo, e que a tarefa 
suprema da Igreja é ser o instrumento e o corpo de Cristo na obra da 
reconciliação mundial dos homens e do homem com Deus. Por esta 
razão Efésios é a rainha das epístolas. 
 
Efésios 
 
Na Carta aos Efésios o argumento de Paulo tem uma trama muito 
intrincada. Com freqüência procede mediante longas sentenças, 
complicadas e muito difíceis de decifrar. Se queremos captar seu 
significado o melhor é proceder a ler algumas seções, primeiro de 
deslocado, toda a seção, para logo fracioná-las em passagens mais breves 
para um estudo detalhado. 
 
Efésios 1 
Saudações ao povo de Deus - 1:1-2 
Os escolhidos de Deus - 1:3-4 
O plano de Deus - 1:5-6 
Os dons de Deus - 1:7-8 
A meta da história - 1:9-10 
Judeus e gentios - 1:11-14 
As marcas da igreja - 1:15-23 
A oração de Paulo pela igreja - 1:15-23 (cont.) 
O corpo de Cristo - 1:15-23 (cont.)
 
SAUDAÇÕES AO POVO DE DEUS 
 
Efésios 1:1-2 
Paulo começa sua Carta mencionando os únicos dois títulos de fama 
que possui. 
(1) Era um apóstolo de Cristo. Nesta afirmação tinha em mente três 
coisas. 
Efésios (William Barclay) 22 
(a) Significava que pertencia a Cristo. Sua vida não era sua própria 
para dispor dela a seu gosto: era possessão de Jesus Cristo e devia vivê-
la de acordo com o que Cristo exigia. 
(b) Significava que tinha sidocomissionado e enviado por Jesus 
Cristo. A palavra apostolos vem do verbo apostellein que significa 
despachar ou enviar. Podia usar-se, por exemplo, para um esquadro 
naval enviado a uma expedição ou para um embaixador enviado por seu 
país nativo. Descreve ao que é enviado para desempenhar uma tarefa 
especial. O cristão se considera a si mesmo, durante toda sua vida, como 
membro de uma força de trabalho de Cristo. Tem uma missão: a de 
servir a Cristo no mundo. 
(c) Finalmente dá a entender que todo o poder que possuía era um 
poder delegado. O sinédrio era a corte suprema dos judeus. Em matéria 
de religião mantinha sua autoridade sobre cada judeu em todo mundo. 
Quando o sinédrio tinha chegado a uma decisão entregava-a a um 
apostolos para que por sua vez este a transmitisse às pessoas interessadas 
e verificasse seu cumprimento. Quando esse apostolos partia não o fazia 
simplesmente por autoridade e poder próprios: estava respaldado e 
acreditado pela autoridade do sinédrio a quem representava. O cristão é 
representante de Cristo no mundo. Mas não leva a cabo esta tarefa por 
virtude e poder próprios; com ele estão a virtude e o poder de Jesus 
Cristo. 
(2) Paulo continua dizendo que era apóstolo por vontade de Deus. 
Ao dizer isto não há nenhum acento de vanglória, mas sim de pura 
admiração. Paulo vivia no final de seus dias o assombro de que Deus 
tivesse eleito um homem como ele para esta tarefa. 
O cristão nunca deve inflar-se de vanglória pela tarefa que Deus o 
encomenda; antes, tem que sentir-se maravilhado porque Deus o tenha 
considerado digno de desempenhá-la. 
Assim, pois, Paulo continua dirigindo sua Carta aos que vivem em 
Éfeso e são fiéis a Jesus Cristo. O cristão vive sempre uma dupla vida. 
Os amigos de Paulo viviam em Éfeso e em Cristo. Todo cristão tem um 
Efésios (William Barclay) 23 
domicílio humano e outro divino. Vive em certo lugar do mundo, mas ao 
mesmo tempo vive em Cristo. E este é precisamente o segredo da vida 
cristã. Alister MacLean fala de uma dama que viveu nos Países 
"highlands" de Escócia uma vida dura, mas de contínua tranqüilidade. 
Ao ser interrogado pelo desta vida respondeu: "Meu segredo está em 
navegar pelos mares e manter sempre o coração no porto." O segredo da 
serenidade do cristão está em que, onde quer que ele esteja, está também 
em Cristo. 
Paulo começa com a saudação com que sempre começa. Diz: 
"Graça e paz a vós." Aqui há duas palavras de enorme significado na fé 
cristã. A palavra graça contém sempre duas idéias principais. A graça é 
sempre algo amável. O termo grego caris pode traduzir-se por encanto. 
Na vida cristã deve haver certa bondade e certo encanto. Um 
cristianismo que não tem atrativos não é verdadeiro cristianismo. Graça 
descreve sempre um dom e um dom que o homem não pode obter por si 
mesmo, e que nunca ganhou nem mereceu em forma alguma. O 
tratamento que Deus nos dá, e seus dons, são coisas que recebemos por 
pura generosidade do coração de Deus. Cada vez que mencionamos a 
palavra graça pensamos no puro encanto da vida cristã e na pura e 
imerecida generosidade do coração de Deus. Devemos tomar cuidado ao 
relacionar à vida cristã a palavra paz. Em grego o termo é eirene, mas 
traduz o hebreu shalom. Na Bíblia a palavra paz nunca é puramente 
negativa: nunca descreve simplesmente a ausência de tribulações, 
dificuldades e aflições. Shalom significa tudo o que se relaciona com o 
bem supremo do homem; todo aquilo que contribui a fazê-lo homem no 
mais alto sentido da palavra; tudo o que faz com que a vida seja 
verdadeiramente digna de ser vivida. A paz cristã é algo absolutamente 
independente das circunstâncias externas. 
A pessoa pode viver no meio do luxo e as comodidades no melhor 
da Terra; pode possuir a melhor das casas e a maior conta bancária e 
entretanto carecer de paz; por outro lado, a pessoa pode desfalecer na 
prisão, morrer no pelourinho ou viver uma vida carente de toda 
Efésios (William Barclay) 24 
comodidade e, entretanto, desfrutar de uma paz perfeita. Qual a 
explicação para isto? A explicação é que há uma só fonte de paz em todo 
mundo: o cumprimento da vontade de Deus. Sabemos perfeitamente que 
quando fazemos algo que sabemos que não deveríamos fazer ou quando 
omitimos algo que sabemos que teríamos que fazer, fica sempre em 
nossa consciência um fundo de intranqüilidade e inquietação 
persistentes, e também sabemos muito bem que se estamos fazendo algo 
muito difícil, ainda que estejamos fazendo algo que não é de nosso 
agrado se soubermos que é o que corresponde fazer, há em nossos 
corações certo contentamento. "Em sua vontade está nossa paz." A única 
paz na Terra está na vontade de Deus. 
 
OS ESCOLHIDOS DE DEUS 
 
Efésios 1:3-4 
Em grego a longa passagem que vai do versículo 3 ao 14 é uma só 
oração. É tão longa e tão complicada porque representa nem tanto o 
enunciado de um raciocínio como um lírico canto de louvor. A mente de 
Paulo avança, não porque esteja pensando logicamente, mas sim porque 
os dons e as maravilhas de Deus desfilam perante seus olhos e penetram 
em sua mente. Para entender o pensamento de Paulo devemos esmiuçar 
sua frase em sentenças curtas. 
Nesta passagem Paulo pensa nos cristãos como o povo escolhido de 
Deus, e sua mente se encaminha em três direções. 
(1) Pensa no ato da eleição de Deus. Jamais creu, ele próprio, ter 
escolhido o serviço e a obra de Deus; sempre pensou que Deus o tinha 
escolhido. Jesus havia dito a seus discípulos: “Não fostes vós que me 
escolhestes a mim; pelo contrário, eu vos escolhi a vós” (João 15:16). 
Para Paulo todo vem de Deus Aqui está precisamente o maravilhoso. 
Não seria nada extraordinário que o homem escolhesse a Deus; o 
maravilhoso é que Deus tenha escolhido ao homem. 
Efésios (William Barclay) 25 
(2) Paulo pensa na generosidade da eleição divina. Deus nos 
escolheu para nos abençoar com bênçãos que só se encontram nos céus. 
Há certas coisas que o homem pode encontrar ou descobrir por si 
mesmo; mas há outras que superam suas possibilidades. O homem pode 
chegar por si mesmo a certa habilidade num oficio ou numa ciência; 
pode obter certa posição no mundo; pode amassar uma determinada 
quantidade de bens deste mundo. Mas jamais poderá por si mesmo obter 
a bondade ou a paz espiritual. Deus nos escolhe para nos dar aquelas 
coisas que só Ele pode dar. 
(3) Paulo pensa no propósito da eleição de Deus. Deus nos escolhe 
para que sejamos santos e sem mancha. Estas duas afirmações são de 
importância. O termo grego por santo é hagios que contém sempre a 
idéia de diferença e separação. Algo que é hagios é diferente das coisas 
ordinárias. Um templo é santo porque é diferente dos outros edifícios: 
um sacerdote é santo porque é diferente do homem comum; uma vítima 
é santa porque é diferente de outros animais; Deus é santo por excelência 
porque é diferente do homem; o dia de repouso é santo porque é 
diferente de outros dias. Assim, pois, Deus escolhe o cristão para que 
seja diferente de outros homens. Isto é o fato e o desafio que a Igreja 
enfrentou com tanta lentidão. Na Igreja primitiva o cristão jamais 
duvidava de que devia ser diferente do mundo; de fato, sabia que tinha 
que ser tão diferente que existia a probabilidade de que o mundo o 
matasse e com toda segurança o aborreceria. Mas a Igreja moderna tende 
a diminuir a diferença entre Igreja e mundo. Com muita freqüência 
temos dito às pessoas: "Enquanto vivam uma vida decente e respeitável, 
está perfeitamente certo que sejam membros da Igreja e sejam chamados 
cristãos. Não precisam ser tão diferentes de outros." A verdade é que o 
cristão deveria poder ser identificado no mundo. Deve-se lembrar 
sempre que a diferença em que Cristo insiste não é a que tira o homem 
fora do mundo, mas sim o homem seja diferente dentro do mundo. 
Teria que ser possível a identificação do cristão naescola, no 
trabalho, na fábrica, no emprego, no hospital e em qualquer parte. E a 
Efésios (William Barclay) 26 
diferença está em que o cristão vive, obra e se comporta não de acordo 
com o imperativo de alguma lei humana, mas sim de acordo com o 
imperativo da lei de Cristo. O professor cristão não deve satisfazer as 
prescrições da autoridade educativa ou de um diretor, mas sim deve 
satisfazer as exigências de Cristo, e isto significará quase certamente, 
uma atitude completamente diferente para seus alunos. Um operário 
cristão não deve satisfazer as prescrições do sindicato, mas sim as de 
Jesus Cristo que o farão certamente um operário de um tipo muito 
diferente, tanto que bem pode terminar sendo expulso do sindicato. O 
médico cristão jamais olhará o doente como a um caso mais, mas sim 
sempre como uma pessoa. O empregador cristão se interessará por muito 
mais que o mero pagamento do salário mínimo ou a simples criação das 
condições mínimas de trabalho. A simples verdade é que se suficientes 
cristãos se tornassem hagios — diferentes, responsáveis só perante Cristo 
— revolucionariam a sociedade. E esta é, em realidade, em verdade a 
missão cristã. 
A expressão sem mancha corresponde ao grego amomos. O termo é 
de interesse porque pertence ao vocabulário sacrificial. Segundo a Lei 
judia, antes que um animal pudesse ser devotado em sacrifício devia ser 
examinado e inspecionado; se fosse encontrado algum defeito devia ser 
rechaçado como inadequado para a oferenda a Deus. Só o melhor era 
apto para ser devotado a Deus. Esta palavra amomos concebe toda a vida 
e todo o homem como uma oferenda a Deus. Cada parte de nossa vida, 
nosso trabalho, nossos prazeres, nossos esportes, nossa vida familiar, 
nossas relações pessoais deve ser parte de nossa oferenda a Deus. Esta 
palavra não significa que o cristão deva ser respeitável; significa que 
deve ser perfeito. O cristão amomos é aquele que desterra toda 
complacência própria e toda satisfação com menos que o melhor; é um 
desafio para que o homem faça tão perfeita sua vida inteira que possa 
oferecê-la a Deus. É o fim da atitude que diz: "Sei que incorro em faltas, 
mas não posso mudar"; é o fim da atitude que sabe que não fazemos 
nosso trabalho tão bem como se poderia fazer, mas veio a conformar-se 
Efésios (William Barclay) 27 
com menos que o melhor. Significa simplesmente que a norma cristã não 
é menos que a perfeição, e que para o cristão nada valem os juízos de 
acordo com um critério humano: só pensa em dar satisfação ao escrutínio 
de Deus. 
 
O PLANO DE DEUS 
 
Efésios 1:5-6 
Nesta passagem Paulo nos fala do plano de Deus. Uma das imagens 
que o apóstolo usa mais de uma vez sobre o que Deus tem feito pelo 
homem, é a da adoção (cf. Romanos 8:23; Gálatas 4:5). Deus nos adotou 
em sua família como filhos. 
No mundo antigo, onde prevalecia o direito romano, a imagem 
tinha um significado maior que entre nós. No mundo romano a família se 
baseava no que se chamava a pátrio poder: o poder do pai. Sob a lei 
romana o pai possuía um poder absoluto sobre seus filhos enquanto 
vivessem. O pai romano podia vender seu filho como escravo; até podia 
matá-lo. De acordo com a antiga lei romana, que ainda estava em 
vigência no tempo de Paulo, o pai tinha direito de vida e de morte sobre 
seus filhos. Dion Cassius nos fala do que era a lei romana: "A lei romana 
dá ao pai uma autoridade absoluta sobre seu filho durante toda a vida do 
mesmo. Dá-lhe autoridade de reduzi-lo a prisão, se assim o desejar, de 
castigá-lo, de fazê-la trabalhar em sua fazenda como um escravo 
algemado, e até de matá-lo. Este direito se mantém mesmo quando o 
filho chegue a uma idade em que desempenhe parte ativa nos assuntos 
políticos ou chegue a ser considerado digno de ocupar o cargo de 
magistrado ou seja honrado por todos. É verdade que quando um pai 
julgava a seu filho supunha-se que consultaria os membros masculinos 
da família, mas isto não era necessário. 
Há exemplos concretos de casos em que o pai condenava seu filho à 
morte. Salustio (A conspiração da Catilina, 39) narra como um filho 
chamado Aulio Fulvio se uniu à rebelde Catilina. Foi detido na viagem e 
Efésios (William Barclay) 28 
levada de volta. E seu pai ordenou que fosse executado. Ele o fez por sua 
própria autoridade privada, e a razão que deu foi que: "Ele o havia 
engendrado, não para a Catilina contra seu país, senão para seu país 
contra Catilina." Sob o direito romano um filho não podia possuir nada; 
qualquer herança ou qualquer obséquio que lhe dessem passava a ser 
propriedade do pai. Não importava a idade do filho ou as honras e 
responsabilidades que tivesse obtido: estava absolutamente sob o poder 
do pai. É óbvio que em tais circunstâncias a adoção era um passo 
extremamente importante. Era tremendamente sério tirar o menino do 
pátrio poder para colocá-lo sob outro. Entretanto, não era estranho que 
com freqüência se adotassem meninos para evitar a extinção de uma 
família e assegurar que continuasse existindo. 
O ritual de adoção deve ter sido muito impressionante. Levava-se a 
cabo mediante uma venda simbólica na que se usavam moedas e 
balanças. Por duas vezes consecutivas o pai verdadeiro vendia o filho 
para, simbolicamente, comprá-lo de novo. Finalmente ao vendê-lo pela 
terceira vez já não o comprava de novo. Então o adotivo devia ir ao 
pretor, um dos principais magistrados romanos, para legalizar a operação 
de adoção. Só depois de tudo isto a adoção era completa. Mas quando 
era completa o era seriamente. A pessoa adotada desfrutava na nova 
família de todos os direitos de um filho legítimo e perdia todo direito em 
sua família anterior. Perante a lei era uma nova pessoa. Tão nova era, 
que até as dívidas e obrigações relacionadas com sua família anterior 
ficavam canceladas ou abolidas como se jamais tivessem existido. 
Paulo diz que isto é o que Deus fez por nós. Estávamos 
inteiramente sob o poder do pecado e do mundo. Deus por meio de Jesus 
nos tirou deste poder para nos transladar ao dEle. Esta adoção apaga e 
elimina o passado em tal medida que somos feitos novos. Passamos da 
família do mundo e do mal à família de Deus. 
 
 
 
Efésios (William Barclay) 29 
OS DONS DE DEUS 
 
Efésios 1:7-8 
Nesta breve seção deparamo-nos com três grandes concepções da fé 
cristã. 
(1) Existe a idéia de redenção. A palavra usada é apolutrosis. O 
termo vem do verbo lytroun que significa resgatar e se usa para o 
resgate do homem feito prisioneiro de guerra ou escravo. Aplica-se 
também à libertação do homem da pena de morte merecida por algum 
crime. É a palavra que se usa para referir-se à libertação divina dos filhos 
de Israel da escravidão do Egito, assim como ao resgate contínuo do 
povo eleito em tempo de tribulação. Em cada caso pensa-se em que o 
homem é redimido e liberado de uma situação da que era incapaz de 
libertar-se por si mesmo ou de uma dívida que jamais teria podido pagar 
por seus próprios meios. Paulo diz, pois, em primeiro termo, que Deus 
redimiu os homens de uma situação da qual jamais teriam podido 
redimir-se por si mesmos. Na verdade isto era precisamente o que o 
cristianismo fez pelos homens. Quando veio o cristianismo ao mundo os 
homens jaziam oprimidos pelo sentimento da própria impotência. 
Reconheciam o próprio pecado e a própria incapacidade; tinham 
consciência do fracasso de suas vidas como também de sua impotência 
para remediar essa situação. 
Sêneca abunda nessa classe de sentimentos de pura frustração. 
Sobre os homens — diz — pesa entristecedora a consciência de sua 
ineficiência no necessário. Diz de si mesmo que é um homo non 
tolerabilis: um homem intolerável. Os homens — diz num tom de 
desespero — amam seus vícios e ao mesmo tempo os odeiam. O que 
precisam — exclama — é que uma mão desça e os levante. 
Os maiores pensadores e as mentes maissensíveis do mundo pagão 
tinham consciência de estar sob o domínio de algo que não podiam 
remover por seus próprios meios. Necessitavam a libertação, o 
dinamismo de algum poder. E isto era justamente o que havia trazido a 
Efésios (William Barclay) 30 
libertação de Jesus Cristo. E segue sendo certo que Cristo pode por seu 
poder libertar o homem da escravidão da impotência perante as coisas 
que atraem e desgostam ao mesmo tempo. Para dizê-lo da maneira mais 
simples, Jesus pode ainda tornar bom o homem mau. 
(2) Existe o perdão. O mundo antigo era presa do sentido do 
pecado. Pode-se dizer que todo o Antigo Testamento não é mais que uma 
ilustração da afirmação: "A alma que pecar essa morrerá" (Ezequiel 
18:4). Os homens tinham consciência de sua própria culpabilidade e 
estavam aterrorizados, perante seu deus ou seus deuses. Diz-se às vezes 
que os gregos não possuíam o sentido do pecado. Nada mais longe da 
verdade. "Os homens", diz Hesíodo, "sentem prazer acariciando o que é 
para sua própria perdição." Todo o teatro de Esquilo se fundamenta num 
texto: "Aquele que faz o mal, o paga." Uma vez que alguém fazia algo 
mau Némesis saía em sua perseguição: mais cedo ou mais tarde Némesis 
o alcançaria; o castigo seguia-se ao pecado com tanta segurança como a 
noite ao dia. 
Se houver algo que o homem conhecia, era o sentido do pecado e 
do medo a Deus. Jesus mudou toda esta situação. Abriu o caminho a 
Deus; ensinou aos homens, não o ódio, mas sim o amor divino. E porque 
Jesus veio ao mundo os homens, até em seus pecados, descobriram o 
amor de Deus. 
(3) Existe a sabedoria e a inteligência. As duas palavras gregas são 
sofia e fronesis e Cristo nos trouxe ambas as coisas. Agora, isto é muito 
interessante. Os gregos escreviam e pensavam muito a respeito destes 
termos; se o homem possuía ambas as coisas, estava perfeitamente 
equipado para a vida. Aristóteles define sofia, sabedoria, como o 
conhecimento das coisas mais preciosas; Cícero, como o conhecimento 
das coisas humanas e divinas. A sofia era o objeto do intelecto que 
busca, da mente que questiona, dos alcances do pensamento humano. É a 
resposta aos problemas eternos da vida e da morte, de Deus e do homem, 
do tempo e da eternidade. Aristóteles definiu a fronesis como o 
conhecimento dos negócios humanos e das coisas que exigem um 
Efésios (William Barclay) 31 
planejamento. Plutarco, como o conhecimento prático das coisas que nos 
concernem. Cícero, como o conhecimento das coisas que têm que ser 
buscadas e das que têm que evitar-se. Platão, como a disposição da 
mente para julgar sobre o que se tem que fazer e sobre o que não se tem 
que fazer. 
Em outras palavras, a fronesis é a coisa mais prática do mundo. É o 
sentido são do homem que o capacita a resolver os problemas práticos da 
vida diária. Paulo afirma que Jesus nos trouxe sofia: o conhecimento das 
coisas eternas, o conhecimento intelectual que satisfaz a mente; e que 
nos trouxe fronesis: o conhecimento prático que nos capacita a tratar e 
resolver diariamente os problemas de nossa vida diária. Desta maneira o 
caráter cristão torna-se de certo modo completo. Há certas pessoas que 
se sentem cômodas no estudo: movem-se familiarmente em meio dos 
problemas teológicos e filosóficos e, entretanto, são incapazes e ineptas 
para os assuntos ordinários da vida diária. Há outras pessoas que 
afirmam pertencer ao tipo do homem prático, tão comprometidas com os 
negócios da vida que não dispõem de tempo para interessar-se pelas 
coisas últimas. À luz dos dons divinos concedidos por Cristo, ambas as 
classes são imperfeitas e parciais. Cristo nos traz a solução dos 
problemas tanto da eternidade como do tempo. Cristo dá aos homens a 
capacidade de contemplar as grandes verdades últimas da eternidade e de 
resolver os problemas de cada momento. 
 
A META DA HISTÓRIA 
 
Efésios 1:9-10 
Agora Paulo se introduz totalmente no tema. Diz que agora Deus 
nos manifestou "o mistério de sua vontade". O Novo Testamento usa a 
palavra mistério num sentido muito particular. Aqui mistério nada tem 
que ver com algo misterioso no sentido de difícil de entender, mas com 
algo que por muito tempo permaneceu em segredo e agora se revela; é 
algo que ainda permanece incompreensível para a pessoa não iniciada 
Efésios (William Barclay) 32 
em seu significado. Tomemos um exemplo. Suponhamos que alguém 
que não sabe absolutamente nada do cristianismo fosse levado a um 
serviço de comunhão. Para ele seria um mistério total; não entenderia 
nada do que estava passando. Mas para aquele que conhece a história de 
Cristo, que conhece o relato e o significado da Última Ceia, que sabe que 
Jesus deixou este memorial a seus discípulos, todo o serviço e cada ação 
do mesmo têm um significado muito claro. Assim, pois, no sentido 
neotestamentário, mistério é algo oculto aos pagãos mas claro para os 
cristãos; é um segredo cujo significado foi revelado. 
E qual era para Paulo o significado do mistério da vontade divina? 
Este mistério consistia em que o evangelho estava aberto também aos 
gentios. Aqui radicava o grande segredo de Deus. Até Jesus chegar tinha 
parecido que os judeus eram o povo escolhido de Deus. Agora Deus 
tinha revelado que seu amor e seu cuidado, sua graça, sua misericórdia, 
as boas novas de Deus, estavam destinados não só aos judeus, mas 
também a todo mundo. 
E agora Paulo verte seu grande pensamento numa só sentença. Até 
agora os homens tinham vivido num mundo dividido. Por onde se olhar 
existe esta divisão. Havia divisão entre os animais e os homens. O 
domínio do homem tinha quebrado a união social da natureza. Havia 
divisão entre o judeu e o gentio, entre o grego e o bárbaro. Sobre toda a 
redondeza do mundo não existia outra coisa senão luta, tensão, guerra, 
ódio e separação. O que se podia afirmar do mundo, também se aplicava 
a cada homem em particular. Cada pessoa é uma guerra civil em 
marcha. Dentro do homem há tensão, divisão e luta entre o bem e o mal, 
entre o justo e o injusto, sobre a paixão e a razão, entre o instinto e a 
vontade. Por onde quer que fosse neste mundo havia divisão; e Jesus 
veio ao mundo para eliminar as divisões, para resolver as tensões, para 
fechar as brechas e separações e para reunir em um todos os homens. 
Para Paulo nisto consistia o segredo de Deus. O desígnio de Deus era 
que todos os fios diferentes, todos os cabos soltos das coisas, todos os 
elementos belicosos, competitivos e agressivos do mundo chegassem a 
Efésios (William Barclay) 33 
reunir-se em unidade e união em Cristo Jesus. Cristo veio para que nEle 
o mundo fosse um. 
Surge agora outro pensamento de tremenda importância em Paulo. 
Diz que toda a história foi um desenvolvimento desse processo. Através 
de todas as épocas houve um plano, uma preparação e uma 
administração das coisas para que chegasse o dia da unidade. A palavra 
que Paulo usa para esta preparação e planejamento é de supremo 
interesse. É a palavra oikonomia, que literalmente significa 
administração doméstica. O oikonomos era o mordomo encarregado de 
que os negócios familiares partissem sobre trilhos e ininterruptamente. 
Assim. pois, Paulo concebe toda a história como planejamento, projeto, 
administração e preparação para que o mundo terminasse sendo uma 
família em Deus. 
É convicção cristã que a história tem um plano: um propósito, que é 
o desenvolvimento da vontade de Deus. Isto todos os historiadores nem 
pensadores puderam ver. 
Oscar Wilde disse em um de seus epigramas: "Oferecem a seus 
filhos o calendário criminal da Europa sob o nome de história." 
G. N. Clark disse em sua classe inaugural de Cambridge: "Não há 
nenhum segredo nem plano que descobrir na história. Não creio que 
nenhuma consumação futura poderia dar sentido a todas as 
irracionalidades das épocas precedentes. Se não se pode dar razão delas, 
muitomenos as poderá justificar." 
Em sua introdução à História da Europa H. A. L. Fisher escreve: 
"Uma emoção intelectual, entretanto, foi-me negada. Homens mais 
sábios e eruditos que eu descobriram na história uma trama, um ritmo, 
um esquema predeterminado. Estas harmonias me estão encobertas. Eu 
só posso ver que uma situação de emergência segue-se à outra, assim 
como uma onda segue-se à anterior. Só posso ver um grande fato com 
respeito ao qual, porque é único não pode haver generalizações; só uma 
regra segura para o historiador: no desenvolvimento dos destinos 
humanos deve reconhecer o jogo do contingente e imprevisto." 
Efésios (William Barclay) 34 
André Maurois diz: "O universo é indiferente. Quem o criou? Por 
que estamos girando neste diminuto montão de barro dentro de um 
espaço infinito? Não tenho a menor idéia, e estou convencido de que 
ninguém tem a mais mínima idéia." 
Acontece que estamos vivendo numa época em que os homens 
perderam a fé em que este mundo tenha algum sentido. Mas o cristão 
tem fé em que neste mundo está-se desenvolvendo o propósito divino; e 
Paulo tem a convicção de que esse propósito é que um dia todas as 
coisas e todos os homens cheguem a ser uma família em Cristo. Paulo vê 
que toda a história esteve partindo neste sentido. Em seu conceito, este 
segredo, este mistério, não foi captado até que veio Jesus. E — segundo 
Paulo — a Igreja tem a grande missão de realizar esse desígnio de 
unidade que é o propósito divino revelado em Jesus Cristo. 
 
JUDEUS E GENTIOS 
 
Efésios 1:11-14 
Aqui se encontra o primeiro exemplo da nova unidade oferecida por 
Cristo. Quando Paulo fala de nós refere-se aos de sua própria nação, os 
judeus; quando fala de vós pensa nos gentios aos quais está escrevendo; 
e quando, na última sentença, usa de novo nós pensa em judeus e gentios 
ao mesmo tempo. 
Em primeiro termo, Paulo fala dos judeus. Também eles têm sua 
parte dentro do plano de Deus. Tinham sido os primeiros em crer e 
esperar a vinda do Ungido de Deus. Através de toda a história os judeus 
esperaram o Messias e sonharam com Ele. Dentro da ordem estabelecida 
eles deviam ser a nação da qual sairia o Escolhido de Deus. 
Adam Smith, o grande economista, sustentava que todo o padrão da 
vida estava baseado no que chamava a divisão do trabalho. Queria dizer 
que a vida só pode avançar quando cada um tem uma tarefa e a realiza e 
quando os resultados reunidos de todas as tarefas chegam a ser de 
domínio comum. O sapateiro faz sapatos, o padeiro pão, o alfaiate trajes; 
Efésios (William Barclay) 35 
cada um leva a cabo sua própria tarefa e quando cada um se dedica a seu 
trabalho e o realiza com eficiência, o resultado é o bem total de toda a 
comunidade. O que é certo dos indivíduos, é também certo das nações. 
Cada nação tem seu lugar e seu parte no esquema divino de todas as 
coisas. Os gregos ensinaram ao homem o que é a beleza do pensamento 
e da forma; os romanos o direito e a ciência de governar e administrar; 
os judeus a religião. Os judeus foram o povo preparado para que dele 
saísse o Messias de Deus. Isto não significa que Deus não tivesse 
preparado também a outros povos. Se não se tivesse feito uma 
preparação das nações tampouco a mensagem cristã difundida pelo 
mundo teria encontrado um terreno apto para acolhê-lo: Deus preparou 
em todo o mundo os homens e nações para que no momento oportuno 
recebessem sua .mensagem. Mas a nação judia por privilégio singular 
constituiu-se a primeira nação que esperou e aguardou a vinda do 
Ungido de Deus ao mundo. 
 
Logo Paulo dirige-se aos gentios em cujo desenvolvimento 
distingue três etapas. 
(1) Receberam a palavra. Os pregadores levaram-lhes a mensagem 
cristã. Esta palavra recebida era duas coisas. Em primeiro lugar, era a 
palavra de verdade. Brindava-lhes a verdade a respeito de Deus, do 
mundo em que viviam e deles mesmos. Em segundo lugar, era uma boa 
nova. O cristianismo é por excelência a boa nova de Deus; é a mensagem 
do amor e da graça de Deus. 
(2) Foram selados com o selo do Espírito Santo. No mundo antigo 
— e este é um costume que ainda perdura hoje — quando se despachava 
um vulto, uma cesta ou um pacote, era selado como garantia de que 
procedia do remetente e que estava intacto. O selo indicava de onde 
procedia o pacote e a quem pertencia. A possessão do Espírito Santo é o 
selo e o sinal de que o homem pertence a Deus. É o Espírito Santo 
aquele que conduz o homem ao conhecimento de Deus; aquele que o 
capacita para enfrentar a vida e não desfalecer; aquele que lhe diz o que 
Efésios (William Barclay) 36 
deve fazer e lhe dá forças para fazê-lo. O Espírito Santo nos mostra a 
vontade de Deus e nos capacita a realizá-la. 
Agora, aqui Paulo diz algo muito importante sobre o Espírito Santo. 
Chama-o o penhor de nossa herança. O termo grego é arrabon. O 
arrabon era um característico normal do comércio grego. Consistia 
numa parte do preço de compra dado antecipadamente como garantia de 
que, no seu devido tempo, seria pago o resto do preço. Ainda existem 
muitos documentos comerciais gregos nos quais aparece a palavra. Uma 
mulher vende uma vaca e receba tantas dracmas como arrabon, quer 
dizer, como garantia e segurança de que o preço total se abonaria no 
tempo fixado. Contrata-se a algumas bailarinas para uma celebração 
pública, e lhes é feito um pagamento um tanto antecipado como garantia 
do total ao fechamento da representação. O que Paulo diz, pois, é que a 
experiência do Espírito Santo que temos neste mundo é uma antecipação 
das alegrias e bênçãos do céu; e ao mesmo tempo é a garantia de que um 
dia entraremos na plenitude do conhecimento, do poder e da alegria. É a 
garantia de que algum dia entraremos na plena possessão da felicidade e 
a bem-aventurança de Deus. 
Temos aqui a grande verdade de que a maior e mais elevada, e a 
mais cara e íntima experiência de paz e alegria cristãs que se pode 
alcançar neste mundo, é só uma antecipação da alegria em que 
entraremos um dia. É como se Deus nos tivesse dado o bastante para 
estimular nosso apetite, e o suficiente para nos dar a certeza de que um 
dia nos dará isso tudo. 
 
AS MARCAS DA IGREJA 
 
Efésios 1:15-23 
A seção de maior importância, o segundo passo na argumentação de 
Paulo, encontra-se justamente no final desta passagem. Mas antes de 
chegar ali devemos notar algumas coisas nos versículos precedentes. 
Efésios (William Barclay) 37 
Temos perante nós numa síntese perfeita, as características de uma 
verdadeira Igreja. Tinha chegado aos ouvidos de Paulo a fé em Cristo de 
seus leitores, e o amor que tinham para com todo o povo consagrado de 
Deus. As duas coisas que devem caracterizar a toda Igreja verdadeira são 
a fidelidade a Cristo e o amor aos homens. Há uma fidelidade a Cristo 
que não deriva em amor aos homens. Os monges e ermitões tinham uma 
fidelidade a Cristo que os separava de seus congêneres e os fazia 
abandonar as atividades ordinárias da vida para permanecer isolados em 
lugares desérticos. Os caçadores de hereges da inquisição espanhola e de 
várias outras épocas tinham uma fidelidade a Cristo que os fazia 
perseguir àqueles que pensavam de outra maneira. Antes da vinda de 
Jesus os fariseus tinham uma lealdade a Deus que os fazia considerar-se 
justos e desprezar àqueles que consideravam menos leais que eles. O 
cristão verdadeiro ama a Cristo e ama a seus semelhantes. Mais ainda, o 
verdadeiro cristão sabe que não pode mostrar seu amor a Cristo de outra 
maneira que amando a seus semelhantes. Por mais ortodoxa que seja 
uma igreja, por mais pura que seja sua teologia, nobres seu culto e sua 
liturgia, não é uma igreja no sentido verdadeiro da palavra se não se 
caracterizar pelo amor aos homens. Há igrejas que raramente se 
pronunciam em público a não ser para criticar e censurar; o acento de sua 
voz é de contínuacritica. Podem ser adaptadas, mas não cristãs. A Igreja 
verdadeira se caracteriza por um duplo amor: amor a Cristo e amor aos 
homens. 
F. W. Boreham cita uma passagem do Robert Buchanan em Shadow 
of the Sword onde se descreve a capela do ódio: 
"Cem anos há encontrava-se num páramo desolado e ermo da 
Inglaterra. Estava em ruínas; os muros enegrecidos e manchados com o 
limo de séculos; ao redor de seu ruído altar cresciam a urtiga e as más ervas 
até a altura dos ombros; enquanto negras névoas carregadas de chuva se 
abatiam dia e noite sobre a lúgubre cena. Sobre o portal da capela e semi-
apagado estava seu nome. Tinha sido dedicada a Nossa Senhora do Ódio. 
Até ela", diz Buchanan, "acudiam homens e mulheres em horas de paixão e 
de dor para lançar maldições sobre seus inimigos — a donzela sobre seu 
Efésios (William Barclay) 38 
falso amante, o amante sobre sua falsa dama, o marido sobre sua falsa 
mulher — implorando cada um deles que Nossa Senhora do Ódio lhes 
desse ouvidos, e que as pessoas odiadas morreram durante o ano." E logo o 
novelista adiciona: "Com tanta amplitude e profundidade brilhava a nobre luz 
cristã em suas mentes!" 
Uma capela para o ódio é uma lúgubre concepção e, entretanto, 
acaso nos mantemos sempre tão longe dela? Desprezamos os liberais ou 
os radicais, desprezamos os fundamentalistas ou os obscurantistas, 
desprezamos o que possui uma teologia diferente da nossa, desprezamos 
o católico romano ou o protestante, segundo o caso. Nossos 
pronunciamentos se caracterizam não pela caridade cristã mas por uma 
sorte de acritude condenatória. Deveríamos lembrar sempre e em cada 
momento que o amor de Cristo e o amor a nosso próximo não podem 
existir separadamente. Nossa tragédia consiste em que com freqüência, 
como disse Swift, a realidade é que "Temos suficiente religião para nos 
odiar, mas não a suficiente para nos amar uns aos outros." 
 
A ORAÇÃO DE PAULO PELA IGREJA 
 
Efésios 1:15-23 (continuação) 
Nesta passagem vemos qual é a intercessão de Paulo por uma Igreja 
a que ama e que está partindo bem. 
(1) Pede espírito de sabedoria. A palavra que usa para sabedoria é 
sofia: já sabemos que sofia é a sabedoria das coisas profundas de Deus. 
Paulo roga que a Igreja possa aprofundar cada vez mais no conhecimento 
das verdades eternas. Para que isto aconteça na igreja se requerem certas 
condições. 
(a) É necessário ter um povo que pense. Boswell nos narra que 
Goldsmith se expressou uma vez da seguinte maneira: "Assim como o 
sapateiro me provê os sapatos e o alfaiate a jaqueta, o sacerdote me 
provê de religião." Muitos agem desta maneira; entretanto a religião não 
é nada se não é um descobrimento pessoal. Como disse Platão há muito 
tempo: "Uma vida sem exame é uma vida que não vale a pena viver-se"; 
Efésios (William Barclay) 39 
assim também a religião não examinada é uma religião que não vale a 
pena ter. Para o homem que pensa, é obrigação deter-se na consideração 
de seu caminho para com Deus. 
(b) É necessário possuir um ministério que ensine. William 
Chillingworth disse: "A Bíblia, e somente a Bíblia, é a religião dos 
protestantes." Isto é verdade mas com freqüência não pensamos assim. A 
exposição da Escritura do púlpito é a necessidade primitiva de um 
despertar religioso. Não nos interessa o que pense o pregador, mas sim o 
que Deus diz. 
(c) É necessário possuir um justo sentido de proporção. Uma das 
coisas estranhas na vida da Igreja é o que em seus fóruns, tais como 
sessões e presbitérios, e até assembléias gerais, consagrem-se numa 
vintena de horas à discussão dos problemas mundanos de administração 
por cada hora que se dedica à consideração das verdades eternas divinas. 
É um fato que hoje em dia, em assembléias eclesiásticas, é estranho que 
haja alguma discussão teológica. Paulo orava para que seu povo pudesse 
aprofundar mais na sabedoria das verdades eternas. Esta oração nunca 
obterá resposta se não dedicarmos uma importante porção de nosso 
tempo a pensar nestas verdades. 
(2) Paulo ora por uma revelação e um conhecimento mais plenos de 
Deus. O crescimento cristão no conhecimento e na graça é essencial. 
Todo profissional sabe que é um risco deixar de estudar. Nenhum 
médico pensa que concluiu sua aprendizagem quando deixa as salas-de-
aula da universidade. Sabe que cada semana e quase cada dia se 
descobrem novas técnicas, medicamentos e tratamentos. E se deseja 
conservar sua habilidade como médico, e continuar sendo útil aos que 
padecem enfermidade e dor, deve manter-se em dia. O mesmo sucede 
com o cristão. A vida cristã pode descrever-se como o esforço em 
conhecer cada dia melhor a Deus. Uma amizade que não se vai 
estreitando com os anos, tende a desvanecer-se. O mesmo acontece entre 
nós e Deus. 
Efésios (William Barclay) 40 
(3) Ora por uma nova compreensão da esperança cristã. A época em 
que vivemos se caracteriza como uma época de desespero. 
Thomas Hardy escreveu no Tess: "Penso algumas vezes que os 
mundos são como as maçãs de uma árvore desarraigada. Algumas são 
excelentes e outras malogradas." Então surge a pergunta: "De que 
maneira vivemos: em forma autêntica ou em forma malograda?" E a 
resposta do Tess é: "De uma maneira malograda." 
Entre as duas guerras Sir Philip Gibbs escreveu: "Se cheirar a gás 
venenoso na rota do Edgeware não me coloco uma máscara contra gás 
nem retiro a um ambiente à prova do mesmo. Vou sair e tomar uma boa 
baforada de gás, porque saberei que a partida está perdida." Os homens 
têm a sensação de viver num mundo onde se perdeu a partida. 
H. G. Wells certa vez escreveu tristemente: "O homem que 
começou uma vez numa cova atrás de um cata-vento, acabará nas ruínas 
infectas dos bairros baixos." De todas partes surgem ecos pessimistas. 
Jamais foi tão necessário como agora fazer ouvir a mensagem da 
esperança cristã. Se a mensagem cristã for verdadeira e se Deus for como 
Jesus Cristo nos ensinou, então não o mundo está encaminhado à 
dissolução, mas sim à consumação. 
(4) Roga por uma nova compreensão do poder de Deus. Para Paulo 
a prova suprema do poder de Deus era a ressurreição. Quando o pecado 
tinha feito tudo o que estava em seu poder para destruir a Cristo e 
quando o homem tinha chegado ao limite de sua atividade humana para 
eliminá-lo, a ressurreição de Jesus foi a prova de que o poder de Deus é 
mais forte que o pecado do homem e que o propósito divino não pode ser 
detido por nenhuma ação humana. Num mundo que parece caótico é 
bom lembrar que o timoneiro desconhecido a quem os homens chamam 
Deus, mantém ainda o controle. 
(5) Paulo termina falando da conquista de Cristo de uma esfera que 
não tem muito significado para o homem de hoje. Deus diz — elevou a 
Jesus Cristo sobre todo principado e autoridade e poder e senhorio e 
sobre todo nome que se nomeia. Nos dias de Paulo os homens criam 
Efésios (William Barclay) 41 
tenazmente tanto nos demônios como nos anjos; as palavras que usa 
Paulo são denominações dos diferentes graus de anjos. O que Paulo quer 
dizer, é que não há nada nos céus e na Terra ao que Jesus Cristo não seja 
superior e maior. É como dizer: "Em Jesus possuem o maior e mais 
poderoso amigo e salvador dos céus e da Terra." Em síntese, a oração de 
Paulo é que os homens cheguem a experimentar a grandeza do Senhor e 
Salvador que Deus lhes concedeu. 
 
O CORPO DE CRISTO 
 
Efésios 1:15-23 (continuação) 
Finalmente chegamos aos últimos dois versículos do capítulo onde 
Paulo tem um dos pensamentos mais sublimes, mais aventurados e 
elevados que homem alguém tenha podido ter. Nestes versículos Paulo 
nomeia a Igreja com seu título mais sublime — o corpo de Cristo. Cristo 
é a cabeça da Igreja e esta seu corpo. 
Para entender o que Paulo quer dizer retrocedamos ao pensamento 
fundamental de toda a carta. O mundo, tal como é, vive em completa 
desunião.

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