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PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO EM SEGURANÇA AULA 5 Prof. Nivaldo Vieira Lourenço 2 CONVERSA INICIAL Nesta quinta aula (após termos estudado sobre ferramentas e métodos de gestão), iremos analisar e conhecer a evolução histórica do policiamento moderno que resultaram no Policiamento Orientado para Solução de Problemas (POSP), o qual permitiu o desenvolvimento do método I.A.R.A. A complexidade de elaborar um diagnóstico de problemas sociais, neste caso, o da segurança pública, faz com que tenhamos que estudar as oito lições referentes às estratégias para uma visão de futuro da polícia. Por fim, analisaremos o quadro desenvolvido por Bayley sobre as estratégias policiais. TEMA 1 – EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO POLICIAMENTO MODERNO Theodomiro (2000), em sua obra Policiamento Comunitário e Controle sobre a Polícia: a experiência norte-americana, retrata a história do policiamento nos Estados Unidos, dividindo-a em três eras: Era da política (1830-1930); Era da reforma (1930-1980); Era da solução de problemas com a comunidade (1980-até hoje). Era da política Na política vigorava um sistema de aplicação da lei, e a polícia era compreendida como um órgão permanente, desenvolvendo inclusive amplos serviços sociais em virtude da ausência de uma definição clara quanto às suas efetivas atribuições, o que conferia mais poder aos integrantes dessas forças, dada a sua vinculação às máquinas políticas da época, pois a polícia desenvolvia inspeções sanitárias, checava o óleo de iluminação pública de rua, monitorava pesos e medidas, além de conceder licenças. Em face das relações oriundas da profunda interferência política, a polícia tinha uma atuação flexibilizada, a qual gerava policiais militares por meio de indicação e que possuíssem força física. 3 Era da reforma Também chamada de era do Policiamento Tradicional, Policiamento Profissional ou Combate Profissional ao Crime, tinha como foco direto o controle da criminalidade, cuja missão seria exclusiva da polícia. É dessa época a utilização de patrulhas motorizadas, aparelhadas com radiocomunicadores, atuando de modo a criar uma sensação de presença policial constante, e na qual são adotadas estruturas centralizadas de comando e controle. Também houve uma delimitação da esfera de atribuição policial. A era da reforma tem uma segunda etapa, chamada de Policiamento Estratégico, que se caracterizou pela tentativa de superação das principais deficiências da fase do Policiamento Profissional, notadamente ligadas a uma relação ainda conflituosa entre polícia e comunidade, e a uma supervalorização da atuação policial meramente criminal, despida de outras ações de caráter social e comunitário. Era da solução de problemas com a comunidade A partir da década de 1980, concebeu-se uma nova forma de olhar a atuação policial, partindo da premissa de que a relação polícia-comunidade pressupõe uma reavaliação da própria natureza da função policial; ao invés de limitar-se à “repressão do crime”, a polícia passa a atuar no sentido de “solucionar problemas”. Entende-se que ao envolver os cidadãos no processo, a polícia contribui para fortalecer os laços comunitários e restaurar a capacidade da própria sociedade de enfrentar seus problemas e prevenir crimes; dessas premissas surge o que se chamou de Policiamento Orientado para a Solução de Problemas (POSP) e o Policiamento Orientado para o Problema (POP). TEMA 2 – MÉTODO I.A.R.A. Considerada uma das mais eficientes ferramentas de gestão adotadas por organizações policiais, em âmbito internacional, e de maneira difusa em nosso país, o método S.A.R.A., aqui conhecido como I.A.R.A., usualmente chamado de Policiamento Orientado para a Solução de Problemas (POSP). A formulação dessa teoria foi de Herman Goldstein, professor da Universidade de Wisconsin, nos Estados Unidos, que por meio da sigla S.A.R.A., estabeleceu os procedimentos sintetizados em Scanning, Analysis, Response 4 and Assessment, traduzido para o português, o método se chama “I.A.R.A.”, consistente nas seguintes etapas: Identificação; Análise; Resposta; Avaliação. Identificação Serão levantados os principais problemas sofridos por uma comunidade, considerando os diversos fatores sociais, econômicos e demográficos que poderão influenciar os anseios da população local. Nessa etapa é fundamental estabelecer o método e delimitar os objetivos a serem alcançados. Para identificar os problemas, deve-se ter clareza do que vem a ser um problema policial, no qual definimos como sendo aquele que aflige uma comunidade local, de maneira reiterada, manifestada em um grupo de ocorrências ou incidentes que se assemelham por condições de tempo e lugar ou características das modalidades criminosas ou contravencionais e, até mesmo, em eventos que afetam a qualidade de vida dessa população, não decorrentes de condutas criminosas, mas que nelas podem redundar. Análise Identificado o problema, deve-se compreender as causas que o provocaram, o que propiciará a síntese da questão, a ponto de se conhecer, de maneira pormenorizada, o que aflige esse agrupamento de pessoas. Nessa fase poderão ser adotados diversos modelos de análise de causa e efeito, como o triângulo do fato criminoso, que envolve a vítima, o ambiente e o infrator da lei, ou seja, o crime ocorre fundamentalmente pela conjugação de pelos menos dois desses fatores. Podemos apresentar como exemplo o Princípio de Pareto, que explica a importância de o gestor estar atento a critérios de análise, e afirma genericamente que 80% dos resultados obtidos estão relacionados a 20% dos esforços dos funcionários/servidores. Isso leva a que se chegue a conclusões intuitivas: a maior parte dos crimes acontece em um número reduzido de logradouros públicos, havendo, em muitos casos, características comuns entre cada um deles e o princípio de 5 Pareto consiste na máxima de que 20% das causas são geralmente responsáveis por 80% dos problemas. Resposta Identificado o problema e feita sua análise, é hora de agir, efetivando as respostas necessárias para os problemas que afetam certa comunidade. Esse planejamento estabelecerá os objetivos específicos e elencará uma das soluções como a mais adequada A fim de solucionar um problema deve-se evitar o uso de estratégias tradicionais de polícia, principalmente aquelas marcadas por ações e operações estritamente reativas, como presença policial, “arrastões”, “batidas” ou prisões cautelares, que se traduzem quase sempre na repetição de medidas. Busque o que não é convencional, como ações de conscientização e educação de determinada comunidade, congregue esforços da sociedade organizada, clubes de serviço, imprensa, Poder Judiciário e Ministério Público. Avaliação Identificar se os objetivos almejados e planejados, foram alcançados. Durante a avaliação se perceberá a implementação ou não das respostas esperadas ou a eventual mudança de rumos do plano original. TEMA 3 – ESTRATÉGIAS PARA UMA VISÃO DE FUTURO DA POLÍCIA, QUATRO LIÇÕES Na aula 1, elencamos uma variedade de grupos policiais, cada qual com características próprias, espalhados ao redor do mundo. Agora iremos estudar as oito lições do pesquisador e especialista em polícia David H. Bayley, contidas no texto “O Futuro do Policiamento”, com o qual é possível realizar previsões do futuro tendo por suporte os padrões da atividade policial encontrada ao redor do mundo vejamos:Primeira Lição O sistema de policiamento moderno é dominado por uma polícia gerida pelo Poder Público, explica Bayley, nada impede que a população diante do fracasso do atual mecanismo de segurança (público) se volte para outro 6 (privado). Este cenário é mais esperado em face de determinadas circunstâncias: O poder do Estado não sofre desafios políticos; Locais onde a criminalidade é encarada como séria, ameaçadora e crescente; Onde a ideologia não é contrária à segurança privada. Segunda lição Haverá aumento do contingente policial em uma realidade bem próxima. Esta constatação é devido ao esperado aumento populacional bem como pelo desmoronamento da disciplina informal encontrada nos agrupamentos sociais mais tradicionais. Em síntese, dentro de um mesmo território existirão mais policiais, o que, nas palavras de Bayley (2006, p. 231) “aumentará sua eficácia no combate ao crime; é evidentemente mais fácil impor disciplina a uma população grande numa área pequena do que impor disciplina a uma população pequena em uma área grande”. Terceira lição A estrutura policial dificilmente sofrerá modificações, mesmo quando defrontar grandes transformações políticas e sociais. As organizações policiais possuem forte resistência à tradição burocrática, e não são influenciadas pelo regime político; prova disto é que países com sistemas políticos idênticos possuem corporação policiais organizadas de forma diferente. Quarta lição Não haverá drásticas mudanças nos atuais sistemas de controle da atividade policial. A mesma lógica que informa dificuldade em alterar a estrutura policial também se aplica à correição desta atividade. Para Bayley (2006, p. 232) “A principal lição é que as estruturas administrativas são muito menos importantes para o controle do que as imposições criadas por elas. A responsabilização não depende da estrutura da polícia ou dos mecanismos específicos escolhidos para controlá-la”. 7 TEMA 4 – ESTRATÉGIAS PARA UMA VISÃO DE FUTURO DA POLÍCIA: MAIS QUATRO LIÇÕES Neste tema estudaremos mais quatro lições segundo Bayley. Quinta lição De forma direta ou indireta, a polícia sempre afeta a política, mas no futuro ocorrerão tentativas explícitas. Estas ações são comumente vinculadas a ideologias, regimes autoritários, novos Estados, dentre outros. Acredita-se que nos próximos anos a polícia exerça forte influência sobre a política em todo o mundo. Sexta lição A extensão do trabalho policial não irá aumentar. Uma exceção diz respeito aos crimes virtuais (novas tecnologias); todos os demais aspectos: aplicação da lei, investigação de crimes, controle de distúrbios civis e de tráfego não sofrerão mudanças. Nos locais onde ocorrer violência coletiva a polícia permanecerá na defesa dos interesses do Estado, como faz atualmente; a polícia irá permanecer envolvida entre o enfrentamento do crime de um lado e de problemas essencialmente não criminais de outro. Uma resolução aparentemente fácil para este conflito é entregar as ocorrências de natureza essencialmente social para instituições sociais, a exemplo de centros de recuperação de toxicômanos, casas de proteção a mulheres vítimas de violência, abrigos para crianças e adolescentes, conselheiros matrimoniais, hospitais psiquiátricos, dentre outros. Sétima lição Um dos grandes passos da polícia é admitir a complexidade e dificuldade de se prevenir o crime. Para tanto são necessários treinamento e administração que permitam estas profundas alterações. Um grande número de ocorrências de violência coletiva acaba por reduzir o trabalho policial de contato com a comunidade, e ao se concentrar na defesa do Estado, afasta-se da população. 8 Oitava lição As estratégias de policiamento no futuro serão variáveis. Vejamos três estratégias básicas que as forças policiais escolherão para atender a responsabilidade de promover a ordem social, conforme Bayley (2006, p. 241): 1. Dependendo da incidência de violência coletiva, se perigosa para o regime; 2. Preocupações da população com os crimes comuns; 3. A visão que se tem do indivíduo dentro da comunidade. TEMA 5 – QUADRO DESENVOLVIDO POR BAYLEY, SOBRE AS ESTRATÉGIAS POLICIAIS Para visualizar as Estratégias Policiais a serem adotadas, Bayley desenvolveu um quadro. Quadro 1: Estratégias policiais a serem adotadas, segundo Bailey Determinantes Estratégias Caracterizações do Sistema Policial I. Níveis altos de violência coletiva a. Baixa criminalidade b. Alta criminalidade 1. Cultura individualista 2. Cultura voltada para grupos Defesa do regime Negligência com o público (Índia) Desencorajamento Mobilização Polícia do regime Autoritário formal (Rússia) Autoritário informal (Vietnã) II. Níveis baixos de violência coletiva a. Baixa criminalidade b. Alta criminalidade 1. Cultura individualista 2. Cultura voltada para grupos Defesa da população Negligência com o público e com o regime (Noruega) Desencorajamento Mobilização Polícia sem regime Democrático formal (EUA) Democrático informal (Japão) Fonte: Elaborado com base em Bayley (2006). informal O quadro demonstra que nos países em que a população tem a criminalidade como focos de preocupação, serão desenvolvidas estratégias voltadas para a mobilização. 9 Os países de regime sem forças policiais, e os sistemas em que o trabalho da polícia não tem como atuação principal a necessidade de segurança do Estado tampouco a violência coletiva, não tiveram uma participação significativa na construção política. Todavia, assim como no sistema anterior, também devem optar por uma estratégia de controle criminal; porém, neste caso terão pouco a fazer diante da pequena taxa criminal. Em países com cultura comunitária e preocupação com o crime, o governo irá reconhecer a necessidade de mobilização da população. Como resultado esperado, a polícia irá se preocupar em atender a comunidade com um raio de incidência que ultrapasse a mera coerção de crimes, contudo, ganhará respeito e confiança. O Japão é citado como exemplo desta estratégia. Encontramos regimes no qual a cultura é individualista. Nestes casos, o futuro é dificultoso, pois a mobilização é sempre acompanhada de desconfiança pela população. Nestes casos, a atuação mais adequada será manter a polícia atuante dentro das restrições legais, mas com o objetivo de desencorajar o crime. O Brasil se encaixa nesse raciocínio dicotômico, pois de um lado tem medo da criminalidade e desejo de enfrentá-la, porém, de outro, não se abre mão de suas inclinações culturais, hábitos e costumes, a ponto de permitir que a polícia atue nesse controle informal. NA PRÁTICA Leia artigos de jornais e revistas sobre a proposta do governo brasileiro referente ao Novo Plano Nacional de Segurança. Após a leitura faça uma análise do Plano Nacional de Segurança e sua implicação em relação ao futuro da política pública de Segurança Pública, tendo como principais pontos de estudo as oito lições de Bayley que se encontram em nosso texto base. FINALIZANDO Estudamos as três eras de policiamento, que evoluíram com o passar dos anos e resultaram no Policiamento Orientado para Solução de Problemas (POSP), o qual permitiu o desenvolvimento do método I.A.R.A. Estudamos também as oito lições de Bayley, que indicam estratégias para uma visão de futuro da polícia e finalizamos com um quadro resumo,objetivando visualizar as estratégias policiais em alguns países do mundo. 10 REFERÊNCIAS BAYLEY, David H. Padrões de policiamento: uma análise internacional comparativa. 2. ed. São Paulo: Edusp, 2006. BAYLEY, David H.; SKOLNICK, Jerome H. Nova polícia: inovações nas polícias de seis cidades norte-americanas. 2. ed. São Paulo: Edusp, 2002. _____. Policiamento comunitário: questões e práticas através do mundo. São Paulo: Edusp, 2006. DIAS NETO, T. Policiamento comunitário e controle sobre a polícia: a experiência norte-americana. São Paulo: IBCCRIM, 2000. JADE, L. Veja os principais pontos do Plano Nacional de Segurança Pública. Agência Brasil. Disponível em: <http://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2017-01/veja-os-principais- pontos-do-plano-nacional-de-seguranca-publica>. Acesso em: 08 fev. 2017. MAXIMIANO, A. C. A. Introdução à administração. 5. ed. rev. e ampl. São Paulo: Atlas, 2000.
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