Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Direito do Trabalho II - Rafael Medeiros Arena da Costa - UNIGRAN 69 Aula 05 1. INTRODUÇÃO HISTÓRICA SOBRE O DIREITO COLETIVO DO TRABALHO O estudo do Direito Coletivo pressupõe o estudo do trabalho “livre” e não do trabalho “escravo”. O trabalho livre e de forma organizada surge na idade média com os pequenos artesãos, que formas as chamadas corporações de ofício. Ocorre que as corporações de ofício tinham uma formação dualista, ou seja, em uma classe estavam os mestres que detinham o conhecimento sobre a prática de certo ofício, e, esses mestres aceitavam aprendizes, os quais tinham por objetivo aprender sobre aquela prática e com isso, tornarem-se mestres também. Ocorre que, conforme mais e mais aprendizes fossem adquirindo o conhecimento necessário para tornarem-se mestres, mesmo assim estes últimos não permitiam que os aprendizes progredissem para o cargo mais elevado (até como forma de evitar a concorrência), assim, esses aprendizes passaram a ser chamados de companheiros (um estágio entre aprendiz e mestre). Conforme os tais companheiros não admitissem mais essa condição de subordinados, aconteceu a famosa “revolta dos compagnólius” (revolta dos companheiros). Muitos doutrinadores indicam a revolta dos companheiros como o marco histórico inicial do surgimento do Direito Coletivo do Trabalho, o que o prof. Otávio entende que não é o correto. Direito do Trabalho II - Rafael Medeiros Arena da Costa - UNIGRAN 70 Na revolta dos companheiros não existiu o propósito de luta pelos Direitos do grupo, mas sim de propósitos individuais. Com a Revolução Francesa foram extintas as corporações de ofício, porque as mesmas retiravam os direitos dos aprendizes.] A Revolução Francesa pregava a liberdade nas relações de trabalho, como forma de se evitar a exploração que feita pelos mestres das corporações de ofício. Porém com o tempo, e o advento da revolução industrial, aqueles mesmos que pregavam a liberdade nas relações de trabalho, perceberam que essa liberdade não se sustentava na prática diante do poder do capital. Daí que foi surgindo o entendimento de que era necessário aos trabalhadores buscarem uma forma de contrapor-se àquela força de seus empregadores. Esse é o momento histórico em que se dá o início do Direito Coletivo do Trabalho, e do próprio Direito do Trabalho. As aglomerações que foram surgindo nos parques fabris das industrias era onde se discutia a possibilidade dos trabalhadores, em conjunto, vindicarem melhores condições de trabalho. Através das reuniões que eram realizadas nos parques fabris é que se formava a consciência coletiva da classe dos trabalhadores, de que poderiam reivindicar em conjunto a solução dos seus problemas, que no geral eram comuns a todos eles (v.g.: extensa jornada de trabalho, remuneração ínfima, discriminação do trabalho de mulheres, crianças e adultos). Com as manifestações surgidas nesse período é que se firmou o entendimento de que a autonomia da vontade nas relações de trabalho teria que ser mitigada, pela ingerência Estatal na relação de trabalho, estabelecendo parâmetros mínimos que deveriam ser observados pelos empregadores. Temos ai, portanto, o surgimento do Direito Coletivo do Trabalho. 1.1 DENOMINAÇÃO DO DIREITO COLETIVO DO TRABALHO Há uma discussão doutrinária sobre qual a nomenclatura correta para a disciplina do Direito Coletivo do Trabalho. Há quem defenda que a disciplina deva chamar-se: Direito Sindical (que tem em vista o sujeito do Direito). Ficamos com a definição Direito Coletivo do Trabalho (que tem em vias o objeto do Direito) que foi adotado pelo TST em seu programa para o concurso de Juiz do Trabalho. Direito do Trabalho II - Rafael Medeiros Arena da Costa - UNIGRAN 71 1.2 AUTONOMIA DO DIREITO COLETIVO DO TRABALHO Há uma discussão sobre se o Direito Coletivo do Trabalho pode ou não ser considerado uma ciência autônoma. O que tem prevalecido em sede doutrinária é que o Direito Coletivo do Trabalho é sim uma ciência autônoma em relação aos demais ramos do Direito. Fundamenta-se tal entendimento em que o Direito Coletivo do Trabalho possui princípios próprios, e instrumentos de atuação diferentes daqueles utilizados pelo Direito Individual do Trabalho. 1.3 PROBLEMATIZAÇÃO O sistema judiciário deve integrar o objeto político do Estado, atuando como um instrumento de efetivação dos Direitos fundamentais. Como o Estado-Juiz pode contribuir para a promoção da liberdade, igualdade e dignidade das pessoas? Como proteger o meio ambiente (incluindo o do trabalho), o consumidor e os grupos vulneráveis (mulheres, negros, homoafetivos, crianças, idosos, trabalhador escravo, sem- terra, indígenas, entre outros)? A politização da Justiça ou a judicialização da política podem contribuir para a criação de um sistema juridicamente justo? E o que dizer do movimento de constitucionalização do processo, especialmente do processo do trabalho? Como fazer para que o processo contribua para o efetivo acesso substancial à Justiça? A resposta desses reclamos perpassa pela análise da própria evolução histórica do Direito do Trabalho, e das transformações do Estado ao longo dos anos e dos respectivos sistemas jurídicos criados a partir dessa ideologia prevalescente. 2. A TRANSFORMAÇÃO DO TRABALHO Nos primeiros tempos da humanidade o trabalho sempre foi exercido de forma rudimentar, fracionado e no âmbito familiar, sem portanto grande repercussão social, para uma sociedade então preocupada em estabelecer outros Direitos fundamentais, como o Direito à Vida, à Liberdade, entre outros. A transformação da forma de trabalho, será decisiva para que o mesmo passe a ser enxergado de forma diferente pela sociedade, desaguando no Direto e Processo do Trabalho que conhecemos hoje. Os fatos significativos desse período histórico são os seguintes: Direito do Trabalho II - Rafael Medeiros Arena da Costa - UNIGRAN 72 REVOLUÇÃO INDUTRIAL INICIADA NO SÉCULO XVIII: a utilização de forças mecânicas em substituição à força humana, foi um fato que gerou a concentração da produção em larga escala, constituiu-se assim na evolução do maquinismo. O marco inicial da evolução industrial foi o surgimento da MÁQUINA A VAPOR (em Soho, em 1775, para trabalhar em uma mina de coarvão); Embora a máquina a vapor tenha marcado o início definitivo da evolução do maquinismo, já antes, desde 1738 já havia sido inventada a MAQUINA DE FIAR, que foi seguida por novas máquinas que por sua vez eram instaladas em grandes parques fabris e com isso surgiram as indústrias; Finalmente o advento da ELETRICIDADE em 1880 acelerou ainda mais os meios de produção, e gerou ainda maiores transformações nos meios de trabalho; Esses fatos modificaram as condições de trabalho então vigentes, passava-se de uma condição de trabalho manufatureiro e familiar, para um trabalho de produção sistematizada e de larga escala. O uso das máquinas na produção, na qual os obreiros normalmente exerciam tarefas repetitivas, acabou gerando duas conseqüências, constantes acidentes de trabalho, troca indiscriminada da mão de obra, pois mulheres e crianças eram capazes de executar tarefas simples de mover uma manivela ou outras tarefas repetitivas. Com o advento das fábricas surgem uma nova classe social: PROLETARIADO: (na Roma antiga o termo proletariado designava os cidadãos da classe mais baixa, que não pagava impostos e era considerado útil apenas pelos filhos que gerava), modernamente era o trabalhador que vivia exclusivamente de sua força de trabalho, prestava serviços nas fábricas, em jornadas que variavam entre 14h e 16h diárias, eram trabalhadores que emigravam dos campos para as cidades em busca de melhores condições de vida inspirados pelo surgimento das indústrias; Com as fábricas começaram a se formar as aglomeraçõesdas massas operárias, nas fábricas existiam trabalhadores com um mesmo ponto de vista sobre a realidade então reinante, ou seja, como estavam submetidos às mesmas condições de vida, também possuíam a mesma forma de ver os fatos. Esse é o ambiente propicio e que serviu de embrião para o surgimento do Direito Coletivo do Trabalho. Vigia a plena liberdade de pactuação sobre as formas do trabalho, quase sempre ditadas unilateralmente pelos donos das fábricas, já que nesse período a mão-de-obra era abundante. Direito do Trabalho II - Rafael Medeiros Arena da Costa - UNIGRAN 73 Essa suposta “liberdade” na forma de contratar na verdade se revelava uma relação meramente impositiva/adesiva. O tomador da mão-de-obra estabelecia as regras de execução do trabalho (horários, forma de pagamento, etc), enquanto os trabalhadores tinham apenas uma oportunidade de negociação, aceitar ou não. Como não havia contrato escrito o empregador podia dar o contrato por rescindido a qualquer momento, mas haviam também contratos verbais de longo prazo, até mesmo vitalícios (uma servidão velada, comumente praticada no trabalho em minas e subsolo –na indústria escocesa os trabalhadores das minas costumavam serem comprados e vendidos com seus filhos, tanto que em 1774 e 1799 surgiram decretos proibindo essa forma de servidão). AMAURI MASCARO NASCIMENTO preleciona sobre as condições de trabalho nessa época: O Trabalho das mulheres e menores foi bastante utilizado sem maiores precauções. Na Inglaterra, os menores eram oferecidos aos distritos industrializados, em troca de alimentação, fato muito comum nas atividades algodoeiras de Lancashire. Aliás, as próprias paróquias –unidade administrativa civil inglesa, subdivisão territorial do condado criada pela denominação Lei dos Pobres –encarregava-se, oficialmente, de organizar esse tráfico, de tal modo que os menores se tornaram fonte de riqueza nacional. Houve verdadeiros contratos de compra e venda de menores, estabelecidos entre industriais e administradores de impostos dos pobres, fato relatado pelo historiador Claude Fohlen, que assim se expressa: “Se lhes afirmava seriamente, de modo mais positivo e mais solene, que iriam transformar-se todos, desde o momento de seu ingresso na fábrica, em damas e cavalheiros, assegurando-lhes que comeriam ‘roastbeef’ e ‘plum-pudding’, que poderiam montar cavalos de seus amos, que teriam relógios de prata e os bolsos sempre cheios, e não eram os empregadores ou seus subalternos os autores de tão infame engano, senão os próprios funcionários das paróquias.” No sórdido intercâmbio, tal paróquia podia especificar que o industrial teria que aceitar, no lote de menores, os idiotas, em proporção de um para cada vinte. O industrial de algodão Samuel Oldknow contratou, em 1796, com uma paróquia a aquisição de um lote de 70 menores, mesmo contra a vontade dos pais. Yarranton tinha, a seu serviço, 200 meninas que fiavam em absoluto silencio e eram açoitadas se trabalhavam mal ou demasiado lentamente. Daniel Defoe pregava que não havia nenhum ser humano de mais de quatro anos que não podia ganhar a vida trabalhando. Se os menores não cumpriam suas obrigações na fábrica, os vigilantes aplicavam-lhes brutalidades, o que não era geral, mas, de certo modo, tinha alguma aprovação dos costumes contemporâneos. Em certa fábrica, a cisterna de água pluvial era fechada à chave1. 1 Ibidem, p. 16. Direito do Trabalho II - Rafael Medeiros Arena da Costa - UNIGRAN 74 Ainda sobre as condições de trabalho, vejamos o relato do escritor KARL MAX: Quanto mais êxito tiverem as pretensões do capital para alongar a jornada de trabalho, maior será a quantidade de trabalho alheio de que se apropriará. Durante o século XVII, e até mesmo durante os primeiros dois terços do XVIII, a jornada normal de trabalho, em toda Inglaterra, era de 10 horas. Durante a guerra contra os jacobitas, que, foi, na realidade, uma guerra dos barões ingleses contra as massas trabalhadoras inglesas, o capital viveu dias de orgia e prolongou a jornada de 10 para 12, 14 e 18 horas. (...). Alguns anos antes da generalização dos novos inventos mecânicos, cerca de 1765, veio à luz na Inglaterra um folheto intitulado An Essay on Trade [“Um Ensaio Sobre o Comércio”]. O anônimo autor deste folheto, inimigo jurado da classe operária, clama pela necessidade de estender os limites da jornada de trabalho. Entre outras coisas, propõe criar, com este objetivo, casas de trabalho para pobres que, diz ele, deveriam ser “casas de terror”. E qual é a duração da jornada de trabalho proposta para estas “casas de terror”? Doze horas, quer dizer, precisamente a jornada que, em 1832, os capitalistas, os economistas e os ministros declaravam não só vigente de fato, mas também o tempo de trabalho necessário para as crianças menores de 12 anos2. 3. O MODELO DE MERCADO Nesse período histórico de transformação do mundo do trabalho, o modelo econômico que predominava era o PENSAMENTO LIBERAL CAPITALISTA, cujas principais teorias foram: o TRABALHO era visto como um dos FATORES DA PRODUÇÃO; a doutrina MERCANTILISTA: riqueza estava na acumulação do ouro e da prata, admitindo-se pequena ingerência do Estado para facilitar as práticas mercantis, após começou-se a dar mais importância às indústrias; doutrina da ESCOLA FISIOCRÁTICA: surge em 1750 em oposição ao mercantilismo, pugna por uma ordem social e econômica sem excessivo protecionismo e regulamentação detalhada, exaltando-se o princípio de uma ordem natural e espontânea. Deram origem ao adágio LAISSER FAIRE, LAISSER PASSER (deixe fazer, deixe passar); doutrina LIBERAL: predomina com o pensamento da igualdade entre os homens e prega a menor ingerência possível do Estado nas relações comerciais e de trabalho, reforçou o LAISSER FAIRE, LAISSER PASSER (deixe fazer, deixe passar). O contrato era 2 MAX, Karl, Salário, Preço e Lucro, p. 40. Direito do Trabalho II - Rafael Medeiros Arena da Costa - UNIGRAN 75 sinônimo de liberdade, acreditava-se no equilíbrio das relações econômicas e trabalhistas. O liberalismo firmou-se de vez como paradigma político e econômico predominante com o advento da REVOLUÇÃO FRANCESA (1789). Nas relações econômicas acreditava-se na existência de uma mão imaginária (o mercado) que regularia e resolveria os problemas advindos das relações econômicas: “uma mão invisível capaz de regular os problemas sociais e econômicos”. Sobre o contexto da REVOLUÇÃO FRANCESA: O poder na França era concentrado nas mãos do Rei que o exercia de forma absoluta. A nobreza e o alto clero possuíam as melhores e mais extensas propriedades, além de gozarem de uma série de privilégios, pois somente seus membros mais tinham acesso aos cargos da corte, aos comandos militares e às dignidades eclesiásticas. De outro lado, oprimidos pelo poder reinante, estavam os camponeses (esmagados pelo sistema feudal e altos impostos), os burgueses (a classe mais rica e instruída, mas que não detinha o poder político), e os operários (trabalhadores nas fábricas e que reinvidicavam melhores salários). O conflito desses fatores reais de poder desencadeou a revolução francesa, inspirada pelos princípios que veremos a seguir, sendo que muitos destes incorporam o ordenamento jurídico de atualmente. Os principais PRINCÍPIOS inspiradores da REVOLUÇÃO FRANCESA: igualdade de todos os homens perante a Lei; Ausência de um Direito natural que obrigasse um homem a tornar-se escravo de outro; Que o poder existe no interesse do povo e não dos seus governantes; Que todos os homens tem liberdade de crença; O principal instrumento jurídico proveniente da Revolução Francesa: a DECLARAÇÃO DOS DIREITOS DO HOMEM E DO CIDADÃO é produto da revolução francesa ocorrida em 1789 (queda da bastilha em 14.07.1789); Ocorreuem 26 de julho de 1789, como produto de um processo revolucionários iniciado em 14 de julho do mesmo ano (o Rei havia convocado uma assembléia geral com representantes supostamente populares, mas não concordou com algumas de suas decisões e decidiu fechá- Direito do Trabalho II - Rafael Medeiros Arena da Costa - UNIGRAN 76 lo o que provocou o cume da revolução francesa em 14.07.1789 quando a população invadiu a prisão de Bastilha para tomarem mais armas, diante disso pressionaram o Rei e houve a convocação de uma Assembléia Constituinte que votou a declaração dos Direitos do Homem em 26 de julho de 1789); Nesse contexto começaram a surgir de forma isolada várias Leis regulando a matéria de Direito do Trabalho, e o que marca o declínio do apogeu do paradigma liberalista. 4. O ESTADO LIBERAL O modelo de Estado desse período histórico era o liberal, em que não havia intervenção do Estado na sociedade, devendo prevalecer o pactuado entre os particulares, portanto o sistema jurídico criado nesse período era essencialmente aberto, sem normas que regulassem a atividade particular das pessoas. As normas então existentes eram aquelas assecuratórias de Direitos Fundamentais de primeira dimensão, ligados à vida a liberdade das pessoas e a política, no demais o Estado era ausente das discussões que envolvessem as pessoas. O processo é marcado pelas características do tecnicismo, legalismo, positivismo jurídico acrítico, formalismo e “neutralismo” do poder judiciário. A ação do Estado nada mais é do que a derivação do direito de propriedade em juízo. Daí a supremacia, quase absoluta, do princípio do dispositivo. 5. ESTADO SOCIAL Atuaram para a evolução de um Direito Social mínimo regulador das relações de trabalho, a ação de trabalhadores reunindo-se em associações para defesa dos interesses comuns. Foram fatos relevantes deste período: o grande número de acidentes de trabalho: foram várias as mortes e mutilações desse período; A partir destas várias tensões da sociedade industrial em formação é que surgiu a necessidade de evoluir do modelo político liberal para se chegar ao ESTADO SOCIAL (ou ESTADO PROVIDENCIA, ou ESTADO DE BEM-ESTAR SOCIAL). Ocorre que a implantação deste modelo de ESTADO SOCIAL não pode ser visto apenas como a concretização de pleitos da sociedade proletária, antes de mera conquista social, referido modelo de Estado serviu também como resposta do modelo liberalista em contraponto com a doutrina socialista (novo modelo de economia de mercado, que Direito do Trabalho II - Rafael Medeiros Arena da Costa - UNIGRAN 77 colocava em cheque o modelo liberal), que se alastrava por todo o Leste Europeu. Daí que após o advento da primeira guerra mundial (1914-1919)..., firmou-se o entendimento por uma maior preocupação do Estado liberal com a questão social, nascendo assim o ESTADO SOCIAL. CARLOS ROBERTO CUNHA, faz um resumo do que fora esse período: Um esforço adicional para implementar o desenvolvimento combinado com o bem- estar, por meio de agressiva política econômica-social, se justificava como contra-ofensiva do Ocidente não-socialista ao espectro do comunismo, na conhecida disputa hegemônica da época, travada entre Estados Unidos e a então União Soviética.3. 5.1 PRIMEIROS DIPLOMAS JURÍDICOS Nesse tempo surgiram os primeiros diplomas jurídicos relevantes na seara do trabalho, são eles: TRATADO DE VERSALHES DE 1919: colocou fim à primeira guerra mundial, criou a OIT (organização voltada para a proteção do trabalho e formação de um Direito Internacional do Trabalho, assegurador de condições mínimas de trabalho em todos os países). O art. 427, do Tratado assim dispunha: “o trabalho não deve ser considerado como simples mercadoria ou artigo de comércio, mas como colaboração livre e eficaz na produção de riquezas”. Nesse mesmo período surge o constitucionalismo social, que marca definitivamente um compromisso do Estado e da sociedade com o implemento e satisfação de tais interesses, os principais diplomas desse período são: CONSTITUIÇÃO MEXICANA DE 1917: estabelecia jornada de 8 horas –proibição do trabalho de menores de 12 anos – 6 horas de jornada para menores de 16 anos –descanso semanal –jornada máxima noturna de 7 horas –descanso semanal –proteção à maternidade –salário mínimo –adicional de horas extras –proteção contra acidentes do trabalho, entre outros; CONSTITUIÇÃO DE WEIMAR DE 1919: considerada como a base das novas democracias sociais, assegurava direitos mínimos e abertos: -trabalho sob a proteção do Estado –garante o direito de liberdade de associação –permite a participação do trabalhador no processo político –institui conselhos nas empresas, entre outros. 3 CUNHA, Carlos Roberto, Flexibilização de Direitos Trabalhistas à Luz da Constituição Federal, Sérgio Antonio Fabris Editor, Porto Alegre:2004, p. 43. Direito do Trabalho II - Rafael Medeiros Arena da Costa - UNIGRAN 78 CARTA DEL LAVORO DE 1927: marcou definitivamente a interferência do Estado nas relações de trabalho, tendo servido inclusive de inspiração para a CLT. Tinha uma visão essencialmente corporativista, já que este paradigma era extremamente difundido nesta época. Na organização corporativa, a categoria profissional, os componentes do ordenamento corporativo, não são todos os cidadãos, mas apenas os produtores. Os sindicatos dependiam o reconhecimento do Poder Público, e não poderia haver mais de um sindicato reconhecido com poderes legais de representação da categoria respectiva. 6. SISTEMAS DE PRODUÇÃO E DERRUIÇÃO DO MODELO DE ESTADO DE BEM ESTAR SOCIAL Após esse período se destacam no mundo do trabalho os novos paradigmas de produção e organização do trabalho, que repercutem no Direito laboral, os principais SISTEMAS DE PRODUÇÃO desse período são: FORDISMO: durou de 1910 até 1960. Desenvolveu o modelo de linha de produção de automóveis, significava a especialização empresarial em um só produto e cada operário realizando determinada tarefa. O regime de acumulação fordista estava centrado na produção de massas, através de uma linha montagem em que o trabalho é fragmentado, assegurando uma unidade do processo de produção. Correspondia ao paradigma do Estado de Bem estar social; Daí o conceito de Estado de bem estar social perdura até 1970, quando é colocado em cheque por três classes de fatores: FATORES POLÍTICOS: JÁ NÃO HAVIA TANTA AMEAÇA AO MODELO CAPITALISTA: o neoliberalismo havia conseguido vencer seu principais inimigos tradicionais (p. ex.: movimento socialista, o ativismo dos operários); FATORES PRODUTIVOS: INICIOU-SE A TERCEIRA REVOLUÇÃO INDUSTRIAL, A REVOLUÇÃO TECNOLÓGICA: a tecnologia dinamizou os meios de comunicação e permitiu que o gerenciamento dos meios de produção se dessem à longas distancias, até mesmo de outros países, o que estabeleceu uma nova dinâmica nas relações de produção, FULCRADA NA DESCENTRALIZAÇÀO DA PRODUÇÀO, buscando mão de obra barata até mesmo em países diferentes; FATORES ECONÔMICOS: INROMPE NA DÉCADA DE SETENTA UMA CRISE ECONOMICA MUNDIAL: influenciada pela globalização e abertura dos mercados e a competição dos produtos, e pela crise do petróleo de 1973. Direito do Trabalho II - Rafael Medeiros Arena da Costa - UNIGRAN 79 Tudo isso leva ao surgimento de um novo paradigma de meio de produção, no qual a tônica será a ruptura com o Estado do Bem estar Social do pós-guerra e a defesa da precarização das relações de trabalho, como instrumento de aumento da competitividade da produção pela diminuição dos custos da mesma. Surge ai um novo modelo de sistema produtivo, o toyotismo: TOYOTISMO: adotado pelos países do Ocidente. A atividade industrial se rege de acordo com a demanda. O consumo é a mola de impulso da produção (rompe-se com o padrão fordista da produçãoem série e em massa). A indústria possui um quadro de pessoal bastante enxuto, e conforme a demanda são contratados novos trabalhadores precariamente. Há uma acentuação da tecnologia e o operário manipula várias máquinas. Há a descentralização da produção para varias empresas, tudo sobre o gerenciamento de uma empresa mãe que cuida de manter a unidade da produção. Essa mudança paradigmática, e novo ataque aos Direitos do Trabalho já estabelecidos iniciado n Europa nos anos 1970, irá repercutir na sociedade brasileira durante os anos 90, especialmente durante os anos do Governo FHC. Modernamente a OIT, seguida por alguns países Europeus, primando pela salvaguarda de Direitos Sociais mínimos, tem se levantado postulando o estabelecimento de barreiras à produtos de países que não respeitam um mínimo de Direitos sociais de seus trabalhadores, cometem o chamado dumping social. DUMPING SOCIAL: é a designação atribuída a sistemas produtivos marcados pela informalidade laborativa ou pelo implemento de fórmulas relacionais de acentuada desproteção e despojamento de Direitos do Trabalho, além da depredação do meio ambiente laboral, cujo maior expoente mundial são os Tigres Asiáticos e a China; Estamos em um momento em que, pela E.C 45/04, o Direito do Trabalho dá mostras de sua auto afirmação? Ou não? 7. CRISE NO DIREITO DO TRABALHO Há consenso doutrinário de que o processo do trabalho passa por um momento de crise em seus supostos, ruptura paradigmática e surgimento de novos postulados. A compreensão deste fenômeno crítico pressupõe a análise do contexto histórico da origem do próprio Direito do Trabalho, para daí a compreensão de quais são os paradigmas até pouco vigentes e que agora se colocam em cheque e passam por este momento de crise. Nesse sentir começaremos pela essência do próprio conceito do que seja Direito: O Direito não é finito. Direito do Trabalho II - Rafael Medeiros Arena da Costa - UNIGRAN 80 Não há como conceber o Direito senão como o produto inacabado das constantes interações humanas, mas é possível dimensionar os campos de composição do Direito. Grosso modo, admitido tal paradigma, podemos dizer que o Direito possui três dimensões de abordagem e análise: Sob o aspecto dos fatos: o Direito ocorre e é formado a partir dos fatos havidos na sociedade. Ou seja, só há Direito pela ingerência dos fatos reais e concretos da vida social. São esses fatos reais e concretos que darão origem ao Direito. Daí falar-se em dimensão FÁTICA do Direito; Sob o aspecto das idéias: o Direito é formado por idéias, e essas são estabelecidas a partir dos fatos vividos em sociedade. Ou seja, a forma de interpretação dos fatos da sociedade, o valor que se dá a esses, também influencia na formação do Direito. Daí falar-se em dimensão AXIOLÓGICA do Direito; Sob o aspecto das normas jurídicas: os fatos da sociedade somados à valoração que é feita dos mesmos, inspiram a criação de estruturas jurídicas que servirão para regular essa convivência em sociedade. Daí falar-se em dimensão NORMATIVA do Direito; Ocorre que não há uma relação estanque ou ordinariamente organizada entre esses vários ingredientes da formação do Direito, antes disso, se trata de uma relação simbiótica em que a constante interação de todos produz um efeito circular de continua transformação do Direito, v.g.: se certo fato inspira tal paradigma, e juntos deságuam na construção de determinada estrutura normativa, após o advento dessa, os demais fatos vindouros também serão influenciados pela nova norma, e com isso surgirá um novo paradigma, que poderá levar a realização de outros fatos, e esses exigirem a construção de nova estrutura normativa, e assim por diante. AMAURI MASCARO NASCIMENTO preleciona sobre o engenho de criação do Direito: Na gênese da norma jurídica está presente a energia dos fatos e valores que atuam reciprocamente, pressionando uns sobre outros, pondo-se a norma jurídica como a síntese integrante que se expressa como resultado dessa tensão4. Estudar a História do Direito do Trabalho pressupõe conhecer essas dimensões formadoras do Direito, para daí enxergar na evolução temporal a influência de cada um desses elementos de construção do Direito laboral. 4 NASCIMENTO, Amauri Mascaro, Curso de Direito do Trabalho, ed. Saraiva, 20ª ed., São Paulo: 2005, p. 04. Direito do Trabalho II - Rafael Medeiros Arena da Costa - UNIGRAN 81 7.1 TRANSFORMAÇÃO DO CONCEITO DE DIREITO DO TRABALHO Estudar a história do Direito do Trabalho pressupõe conhecermos seu conceito, e qual a implicância da modificação do mesmo para o processo do trabalho. Não há consenso doutrinário sobre qual seja o conceito de Direito do Trabalho, para o professor Amauri Mascaro, “o direito do trabalho, tem sido mais vivido do que conceituado5”, o que é correto, a dinâmica da vida econômica é tamanha, que suas constantes transformações também implicam em constantes mudanças na conceituação do Direito do Trabalho (fato X valor X norma). Para se definir um conceito de Direito do Trabalho é preciso ter em mente seus dois elementos indispensáveis: Quanto aos SUJEITOS envolvidos no Direito do Trabalho: divide-se em duas correntes doutrinárias: corrente RESTRITIVA: formada pela doutrina tradicional, entende que os sujeitos envoltos no Direito do Trabalho são apenas os empregadores e os empregados (urbanos, rurais e domésticos), este ultimo entendido como trabalhador subordinado, sendo que se trata de uma interpretação superada; corrente AMPLIATIVA: modernamente se tem pensado o Direito do Trabalho como o ramo jurídico de regula as relações entre todas as espécies de tomadores de mão- de-obra, e todas as espécies de trabalhadores por conta alheia, incluído os autônomos pessoa física, seja trabalho subordinado ou não, contínuo ou não; Quanto ao CONTEÚDO regulado pelo Direito do Trabalho: do mesmo modo contrapõem-se duas correntes doutrinárias: corrente RESTRITIVA: pela qual o Direito do Trabalho deveria apenas regular as relações de um tipo especial de trabalho: a relação de emprego, e outras formas de trabalho executadas por trabalhadores de pouca capacidade econômica: pequenos operários, trabalhadores avulsos e artífices. Essa corrente era a prevalecente até o advento da E.C 45/04; corrente AMPLIATIVA: defende que o Direito do Trabalho deve cuidar de todas as formas de trabalho humano, seja por conta própria, seja subordinado, seja oneroso, seja gratuito. Trata-se da corrente prevalecente desde o advento da E.C 45/04; 5 Idem, p. 05. Direito do Trabalho II - Rafael Medeiros Arena da Costa - UNIGRAN 82 Assim, modernamente o Direito do Trabalho pode ser conceituado como o ramo autônomo do Direito que regula as relações jurídicas de trabalho lato sensu, havidas entre todas as espécies de tomadores de mão-de-obra, e todas as espécies de trabalhadores por conta alheia, incluídos os autônomos pessoa física, seja trabalho subordinado ou não, contínuo ou não. OBS: Este trabalho compreende um estudo/síntese de propriedade intelectual de Wander Medeiros Arena da Costa e não pode ser utilizado para qualquer fim comercial sem autorização expressa. __BIBLIOGRAFIA DA AULA CORREIA, Marcus Orione Gonçalves, e MAIOR, Jorge Luiz Souto, O que é Direito Social?, in Curso de Direito do Trabalho, vol. I, Teoria Geral do Direito do Trabalho, CORREIA, Marcus Orione Gonçalves (ORG.), ed. LTr, São Paulo: janeiro, 2007. DELGADO, Maurício Godinho, Princípios de Direito Individual e Coletivo do Trabalho, 2ª ed., ed. LTr, São Paulo:2004. DELGADO, Maurício Godinho, Direito do Trabalho e inclusão Social –O desafio brasileiro in Revista LTr, ed. LTr, Revista LTr, ano 70, nº 10, São Paulo:outubro/2006. LEITE, Carlos Henrique Bezerra, Curso de Direito Processual do Trabalho, ed. LTr, 8ª Ed., São Paulo:2010.NASCIMENTO, Amauri Mascaro, Curso de Direito do Trabalho, ed. Saraiva, 20ª ed., São Paulo:2005. MAIOR, Jorge Luiz Souto, Breves considerações sobre a história do Direito do Trabalho no Brasil, in Curso de Direito do Trabalho, vol. I, Teoria Geral do Direito do Trabalho, CORREIA, Marcus Orione Gonçalves (ORG.), ed. LTr, São Paulo: janeiro, 2007. MAX, Karl, Salário, Preço e Lucro, p. 40 CUNHA, Carlos Roberto, Flexibilização de Direitos Trabalhistas à Luz da Constituição Federal, Sérgio Antonio Fabris Editor, Porto Alegre: 2004. Direito do Trabalho II - Rafael Medeiros Arena da Costa - UNIGRAN 83 LUTA, Teu dever é lutar pelo direito, mas, se acaso um dia encontrares o direito em conflito com a justiça, luta pela justiça. Decálogo do advogado (Eduardo Couture).
Compartilhar