Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
UNIVERSIDADE VEIGA DE ALMEIDA FACULDADE DE DIREITO DIREITOS HUMANOS PROF. JOSEMAR ARAÚJO - josemar@josemararaujo.com FOLHA DE APOIO 02 Órgãos Internacionais do Pós Segunda Guerra Mundial A internacionalização dos direitos humanos constitui , um mo¬vimento extremamente recente na história, que surgiu a partir do pós-guerra, como resposta às atrocidades e aos horrores cometidos durante o nazismo. Apresentando o Estado como o grande violador de direitos humanos, a Era Hitler foi marcada pela lógica da destruição e da descartabilidade da pessoa humana, o que resultou no extermínio de onze milhões de pessoas. O legado do nazismo foi condicionar a titularidade de direitos, ou seja, a condição de sujeito de direitos, à pertinência a determinada raça — a raça pura ariana. o século XX foi marcado por duas guerras mundiais e pelo horror absoluto do genocídio concebido como projeto político e industrial. No momento em que os seres humanos se tornam supérfluos e des¬cartáveis, no momento em que vige a lógica da destruição, em que cruel¬mente se abole o valor da pessoa humana, torna-se necessária a reconstrução dos direitos humanos, como paradigma ético capaz de restaurar a lógica do razoável. A barbárie do totalitarismo significou a ruptura do paradigma dos direitos humanos, por meio da negação do valor da pessoa humana como valor fonte do direito. Diante dessa ruptura, emerge a necessidade de reconstruir os direitos humanos, como referencial e paradigma ético que aproxime o direito da moral. Nesse cenário, o maior direito passa a ser, adotando a terminologia de Hannah Arendt, o direito a ter direitos, ou seja, o direito a ser sujeito de direitos. Nesse contexto, desenha-se o esforço de reconstrução dos direitos humanos, Como paradigma e referencial ético a orientar a ordem interna¬cional contemporânea. Se a Segunda Guerra significou a ruptura com os direitos humanos, o pós-guerra deveria significar sua reconstrução. Nasce ainda a certeza de que a proteção dos direitos humanos não deve se reduzir ao âmbito reservado de um Estado, porque revela tema de legí¬timo interesse internacional. Sob esse prisma, a violação dos direitos hu¬manos não pode ser concebida como questão doméstica do Estado, e sim como problema de relevância internacional, como legítima preocupação da comunidade internacional. O Tribunal de Nuremberg A necessidade de uma ação internacional mais eficaz para a proteção dos direitos humanos impulsionou o processo de internacionalização desses direitos, culminando na criação da sistemática normativa de proteção internacional, que faz possível a responsabilização do Estado no domínio inter¬nacional quando as instituições nacionais se mostram falhas ou omissas na tarefa de proteger os direitos humanos. O processo de internacionalização dos direitos humanos — que, por sua vez, pressupõe a delimitação da soberania estatal — passa, assim, a ser uma importante resposta na busca da reconstrução de um novo paradigma, diante do repúdio internacional às atrocidades cometidas no holocausto. Nesse contexto, o Tribunal de Nuremberg, em 1945-1946, significou um poderoso impulso ao movimento de internacionalização dos direitos humanos. Ao final da Segunda Guerra e após intensos debates sobre o modo pelo qual se poderia responsabilizar os alemães pela guerra e pelos bárbaros abusos do período, os aliados chegaram a um consenso, com o Acordo de Londres de 1945, pelo qual ficava convocado um Tribunal Militar Interna¬cional para julgar os criminosos de guerra. Em 8 de agosto de 1945, os Governos do Reino Unido, dos Estados Unidos, Provisório da República Francesa e da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, celebraram um acordo estabelecendo este Tribunal para o julgamento dos crimes de guerra, cujas ofensas não tivessem uma particular localização geográfica. De acordo com o art. 54, os seguintes Estados das Nações Unidas expressamente aderiram ao acordo: Grécia, Dinamarca, Iugoslávia, Países Baixos, Checoslováquia, Polônia, Bélgica, Etiópia, Austrália, Honduras, Noruega, Panamá, Luxemburgo, Haiti, Nova Zelândia, Índia, Venezuela, Uruguai e Paraguai. O Tribunal foi investido do poder de processar e punir as pessoas responsáveis pela prática de crime contra a paz, crimes de guerra e crimes contra a humanidade, como definido pela Carta (International law, p. 381). A condenação criminal dos indivíduos que colaboraram para a ocorrência do nazismo fundamentou-se, assim, na violação de costumes inter¬nacionais, ainda que muita polêmica tenha surgido, com base na alegação da afronta ao princípio da legalidade do direito penal, sob o argumento de que os atos punidos pelo Tribunal de Nuremberg não eram considerados crimes no momento em que foram cometidos. O significado do Tribunal de Nuremberg para o processo de internacio¬nalização dos direitos humanos é duplo: não apenas consolida a ideia da necessária limitação da soberania nacional como reconhece que os indiví¬duos têm direitos protegidos pelo Direito Internacional. desse modo, mudança significativa nas relações interestatais, o que vem a sinalizar transformações na compreensão dos direitos humanos, que, a partir daí, não mais poderiam ficar confinados à exclusiva jurisdição do¬méstica. São lançados, assim, os mais decisivos passos para a internacio¬nalização dos direitos humanos: A proibição de crimes contra a humanidade e, pela primeira vez, julgou-se um Estado responsável no âmbito internacional, legalmente e politicamente, pelo que ocorreu dentro de seu território, com seus próprios nacionais. Nuremberg foi estabelecido no Direito Internacional quando a Assembleia Geral da ONU, unanimemente, aprovou a Carta de Nuremberg (incluindo o princípio de crimes contra a humanidade) A Organização das Nações Unidas (ONU) Após a Segunda Guerra Mundial, relevantes fatores contribuíram para que se fortalecesse o processo de internacionalização dos direitos humanos. Dentre eles, o mais importante foi a maciça expansão de organizações in¬ternacionais com propósitos de cooperação internacional. O Direito Internacional pode ser classificado como o Direito anterior à Segunda Guerra Mundial e o Direito posterior a ela. Em 1945, a vitória dos Aliados introduziu uma nova ordem com importantes transfor¬mações no Direito Internacional, simbolizadas pela Carta das Nações Uni¬das e pelas suas Organizações. A criação das Nações Unidas, com suas agências especializadas, de¬marca o surgimento de uma nova ordem internacional, que instaura um novo modelo de conduta nas relações internacionais, com preocupações que in¬cluem a manutenção da paz e segurança internacional, o desenvolvimento de relações amistosas entre os Estados, a adoção da cooperação internacio¬nal no plano econômico, social e cultural, a adoção de um padrão interna¬cional de saúde, a proteção ao meio ambiente, a criação de uma nova ordem econômica internacional e a proteção internacional dos direitos humanos. Para a consecução desses objetivos, as Nações Unidas foram organi¬zadas em diversos órgãos. Os principais órgãos das Nações Unidas são a Assembleia Geral, o Conselho de Segurança, a Corte Internacional de Jus¬tiça, o Conselho Econômico e Social, o Conselho de Tutela e o Secretaria¬do, nos termos do art. 72 da Carta da ONU. Adiciona o art. 72 (2) que órgãos subsidiários podem ser criados, quando necessário. Assembleia Geral Compete à Assembleia Geral discutir e fazer recomendações relativa¬mente a qualquer matéria objeto da Carta. Todos os membros das Nações Unidas são membros da Assembleia Geral, com direito a um voto (arts. 92 e 18). As decisões em questões importantes são tomadas pelo voto da maio¬ria de dois terços dos Membros presentes e votantes . Questões importantes incluem aquelas enumeradas no art. 18 (2) e outras, a depender do voto da maioria dos membros presentese votantes (art. 18 (3)). Conselho de Segurança É o órgão da ONU com a "principal responsabilidade na manutenção da paz e segurança internacionais" (art. 24). É composto por cinco membros permanentes e dez não permanen¬tes. Os membros permanentes são China, França, Reino Unido, Estados Unidos e, desde 1992, Rússia, que sucedeu a URSS-. Os não permanentes são eleitos pela Assembleia Geral para mandato de dois anos, considerando a contribuição dos membros para os propósitos das Nações Unidas e a distribuição geográfica equitativa (art. 23 (1)). Cada membro do Conselho de Segurança tem direito a um voto. As deliberações do Conselho em ques¬tões processuais são tomadas pelo voto afirmativo de nove membros. Em relação às questões materiais, as deliberações também são tomadas pelo voto afirmativo de nove membros, incluindo, todavia, os votos afirmativos de todos os cinco membros permanentes (art. 27 (3)). Dessa previsão é que decorre o poder de veto dos membros permanentes. A Corte Internacional de Justiça Nos termos do art. 92 da Carta, é o principal órgão judicial das Nações Unidas, composto por quinze juízes. Seu funcionamento é disciplinado pelo Estatuto da Corte, que foi anexado à Carta. Dispõe a Corte de competência contenciosa e consultiva. Contudo, somente os Estados são partes em questões perante ela (art. 34 do Estatuto). Secretariado O Secretariado é chefiado pelo Secretário-Geral, que é o principal funcionário administrativo da ONU, indicado para mandato de cinco anos pela Assembleia Geral, a partir de recomendação do Conselho de Segurança (art. 97). O Conselho de Tutela A competência do Conselho de Tutela atém-se a fomentar o processo de descolonização e de autodeterminação dos povos, a fim de que territórios tutelados pudessem alcançar, por meio de desenvolvimento progressivo, governo próprio. Exerceu um papel vital, que, atualmente, encontra-se es¬vaziado. Conselho Econômico e Social É composto por cin¬quenta e quatro membros, tem competência para promover a cooperação em questões econômicas, sociais e culturais, incluindo os direitos humanos (art. 62). Cabe ao Conselho Econômico e Social fazer recomendações des¬tinadas a promover o respeito e a observância dos direitos humanos, bem como elaborar projetos de convenções a serem submetidos à Assembleia Geral. Nos termos do art. 68, poderá o Conselho Econômico e Social criar comissões que forem necessárias ao desempenho de suas funções. Nesse sentido, foi criada a Comissão de Direitos Humanos da ONU. A Comissão de Direitos Humanos Estabelecida em 1946, após mais de 50 anos de trabalho, em 24 de março de 2006, a Comissão teve sua última sessão, sendo abolida em 16 de junho de 2006 e substituída pelo Conselho de Direitos Humanos. A justificativa é que a Comissão de Direitos Humanos tem sofrido uma crescente crise de credibilidade e profissionalismo. Estados têm se valido de sua condição de membros da Comissão não para fortalecer os direitos humanos, mas para uma atitude defensiva, de autoproteção ante críticas ou mesmo para criticarem outros Estados. Consequentemente, agravou-se a crise de credibilidade da Comissão, o que acabava por abalar a reputação da própria ONU como um todo. Se a ONU há de levar os direi¬tos humanos a sério, com o mesmo grau de importância que os temas de segurança e desenvolvimento, parecia essencial a substituição da Comissão por um Conselho de Direitos Humanos, cujos membros fossem eleitos diretamente pela Assembleia Geral da ONU. A antiga Comissão de Direitos Humanos era integrada por cinquenta e três membros governamentais eleitos, para mandato de três anos, pelo Conselho Econômico e Social. A Comissão se reportava a esse Conselho, e qualquer resolução ou decisão com consequências financeiras requeria sua aprovação final. Era extremamente rara a recusa ao endosso das decisões da Comissão por parte do Conselho Econômico e Social. Conselho de Direitos Humanos A criação do Conselho estaria a refletir a primazia dos direitos humanos na Carta da ONU. Objetiva o novo Conselho conferir maior credibilidade à temática dos direitos humanos no âmbito da ONU, com base no princípio do escrutínio universal e da não seletividade política. Seus membros ficam condicionados a um critério explícito de respeito aos direitos humanos, tendo em vista que a eleição de seus 47 membros pela Assembleia Geral deve levar em consideração a contribuição dos candidatos para a promoção e proteção dos direitos humanos. Além disso, poderá a Assembleia Geral, por voto de dois terços de seus membros, suspender os direitos do Estado-membro que cometer graves e sistemáticas violações de direitos humanos. Fonte: PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e o direito constitucional internacional. São Paulo: Saraiva, 2010.
Compartilhar