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UNIDADE I - Constitucionalismo

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FACULDADE SETE DE SETEMBRO
CURSO DE BACHARELADO EM DIREITO
Professor Me. Bruno Cunha Weyne
Teoria da Constituição (2º Semestre)
UNIDADE I – CONSTITUCIONALISMO
	
1 INTRODUÇÃO
	O termo constitucionalismo é relativamente recente no vocabulário político e jurídico do mundo ocidental. Conforme Luís Roberto Barroso (2013, p. 26-27), “Data de pouco mais de duzentos anos, sendo associado aos processos revolucionários francês e americano. Não obstante, as ideias centrais abrigadas pelo em seu conteúdo remontam à Antiguidade Clássica, mais notadamente ao ambiente da Pólis grega, por volta do século V a.C.” (ibid., p. 27).
	“Constitucionalismo significa, em essência, limitação do poder e supremacia da lei (Estado de direito, rule of the law, Rechtstaat)” (ibid., p. 27). Embora o termo sugira a existência de uma Constituição, tal associação nem sempre é necessária ou verdadeira. Há casos em que o ideal constitucionalista está presente independentemente de uma Constituição escrita (Reino Unido), assim como há inúmeros casos em que esse ideal inexiste, apesar da vigência formal e solene de Constituições escritas (ibid., p. 27).
	Uadi Lammêgo Bulos (2012, p. 64) e Marcelo Novelino (2013, p. 17-18), por sua vez, sustentam que o termo constitucionalismo possui dois sentidos:
Sentido amplo – é o fenômeno relacionado ao fato de todo Estado possuir uma Constituição em qualquer época da humanidade, independentemente do regime político adotado ou do perfil jurídico que se lhe pretenda atribuir. Constitucionalismo confunde-se com a própria história da Constituição.
Sentido estrito – é a técnica jurídica de tutela das liberdades, surgida nos fins do século XVIII, que possibilitou aos cidadãos exercerem, com base em Constituições escritas, os seus direitos e garantias fundamentais, sem que o Estado lhes pudesse oprimir pelo uso da força e do arbítrio. Nesse horizonte, o termo compreende duas noções identificadoras básicas, a saber: o princípio da separação dos poderes e a garantia de direitos como instrumentos de limitação do exercício do poder estatal consagrado nas Constituições com o objetivo de proteger as liberdades fundamentais.
2 CONSTITUCIONALISMO ANTIGO E MEDIEVAL
	Atenas é historicamente identificada como o primeiro grande precedente de limitação do poder político e de participação dos cidadãos nos assuntos públicos. Para Cláudio de Sousa Neto e Daniel Sarmento (2012, p. 68), “Na Grécia, entre os séculos VI e IV a.C., floresceram algumas ideias e instituições que podem ser vistas como correspondentes a um modelo antigo de constitucionalismo”. Esses autores explicam que, “Na polis grega, vigorou, durante certo período, a democracia direta, por meio da qual os cidadãos, sem intermediários, deliberavam em assembleias (ecclesia) reunidas em praça pública (ágora) sobre os principais assuntos de interesse geral” (ibid., p. 68). Todavia, convém advertir que, mesmo no período democrático em Atenas, a sociedade grega era rigidamente estratificada, de modo que os direitos à igualdade (isonomia) e ao pleno exercício da palavra (isogonia) eram assegurados somente a poucos privilegiados, quais sejam: aos atenienses do sexo masculino, desde que filhos de atenienses e em pleno gozo de suas liberdades. Tratava-se de uma democracia aristocrática, na qual estavam excluídos da vida política, em virtude da sua própria natureza, as mulheres, os escravos e os estrangeiros (cf. RABENHORST, 2001, p. 16; WEYNE, 2013, p. 33). A esse respeito, conclui-se que, embora houvesse na Grécia um regime que se preocupava com a limitação do poder das autoridades e com a contenção do arbítrio, tal limitação 
“visava antes a busca do bem comum do que a garantia de liberdades individuais. A liberdade, no pensamento grego, cingia-se ao direito de tomar parte nas deliberações públicas da cidade-Estado, não envolvendo qualquer pretensão à não interferência estatal na esfera pessoal. Não se cogitava na proteção de direitos individuais contra os governantes, pois se partia da premissa de que as pessoas deveriam servir à comunidade política, não lhe podendo antepor direitos de qualquer natureza. Tal concepção se fundava numa visão organicista da comunidade política: o cidadão não era considerado em sua dignidade individual, mas apenas como parte integrante do copo social. O cidadão virtuoso era o que melhor se adequava aos padrões sociais, não o que se distinguia como indivíduo. A liberdade individual não era objeto da especial valoração inerente ao constitucionalismo moderno”. (SOUSA NETO; SARMENTO, 2012, p. 68-69).
	
Também em Roma algumas instituições do período republicano, a partir de 529 a.C., já prenunciavam a concepção moderna de separação dos poderes, sobretudo a sua repartição por instituições que se controlavam e se temiam reciprocamente, tais como o Consulado (composto pelos Cônsules, os quais eram os principais agentes executivos), a Assembleia (que, a rigor, eram diversas e detinham o poder de elaborar leis) e o Senado (cujo caráter formal de mero órgão consultivo encobria seu papel de fonte material e efetiva de poder), representativas de estamentos sociais diferentes, de forma a propiciar um equilíbrio entre eles. 
	A Idade Média correspondeu a um período caracterizado pelo amplo pluralismo político, tendo em vista não haver qualquer instituição que detivesse o monopólio do uso legítimo da força, da produção de normas ou da prestação jurisdicional. O poder político, em tal época, fragmenta-se em múltiplas instituições, como a Igreja, os reis, os senhores feudais, as cidades, as corporações de ofício e o Imperador, sem que houvesse qualquer divisão clara de competências entre elas, nem uma supremacia inconteste de qualquer uma. Não existia nada semelhante ao Estado Moderno, titular de soberania no âmbito de seu território. Mas é no final dessa época que surgem ideias que antecipam o constitucionalismo moderno, resultantes das celebrações, entre reis e estamentos sociais superiores, de pactos que reconheciam aos integrantes desses estamentos certos direitos e prerrogativas, erigindo limitações jurídicas ao exercício do poder político. Como exemplo mais conhecido, pode-se citar a Magna Carta, firmada em 1215 pelo Rei João Sem Terra, pela qual se comprometia e se obrigada a respeitar determinados direitos dos nobres ingleses – v.g. não criar novos tributos sem prévia autorização dos nobres, concedida em assembleia –, obtendo, em contrapartida, o reconhecimento do seu poder. Por evidente, os benefícios desses pactos não eram destinados a todos os cidadãos, mas só a uma pequena parcela deles, o que os afasta das Constituições modernas (SOUSA NETO; SARMENTO, 2012, p. 69-70).
3 CONSTITUCIONALISMO MODERNO
	O constitucionalismo moderno preconiza a limitação jurídica do poder do Estado em favor da liberdade individual e surgiu na Modernidade, como forma de superação do denominado Estado Absolutista (existente em parte da Europa dos séculos XVI e XVII), no qual os monarcas não se sujeitavam ao Direito. Para Sousa Neto e Sarmento (2013, p. 70), os seguintes desenvolvimentos históricos foram essenciais para o surgimento do constitucionalismo moderno: (1) a ascensão da burguesia como classe hegemônica; (2) o fim da unidade religiosa na Europa, com a Reforma Protestante; e (3) a cristalização de concepções de mundo racionalistas e antropocêntricas legadas pelo Iluminismo no séc. XVIII. Sousa Neto e Sarmento (2012, p. 70-72) esclarecem o seguinte a respeito desses pontos:
“O Absolutismo exerceu um papel fundamental na formação do Estado moderno e no estabelecimento das bases que permitiram o desenvolvimento da economia capitalista. Na Idade Média havia a convivência de ordenamentos jurídicos particulares, como os das corporações de ofício e dos feudos, com ordenamentos jurídicos com pretensões universalistas: o direito romano e o direito canônico. A fragmentação verificada no período medieval era um obstáculo grave ao desenvolvimento das forças econômicas emergentes. Cada feudo tinha suas próprias regrasjurídicas, sua própria moeda, seu próprio sistema de pesos e medidas. O pluralismo impedia a expansão do comércio, reduzindo os limites dos mercados. A partir da organização dos Estados modernos, a pluralidade de fontes de produção normativa cede lugar ao ordenamento jurídico estatal. O Estado moderno se construiu tanto em luta contra as organizações políticas menores, no sentido da unificação do poder, quanto em luta contra a Igreja, com o intuito de obter a secularização do poder político. A anterior situação de pluralismo jurídico é substituída pelo monismo, com a monopolização da produção normativa do Estado.
Não por coincidência um dos principais teóricos do absolutismo, Thomas Hobbes, justifica a centralização do poder por meio de pressupostos modernos e individualistas. Para sair do ‘Estado de Natureza’, que é por ele considerado como um estado de guerra de todos contra todos, os indivíduos abrem mão de toda a sua liberdade, por meio do contrato social, em favor do Estado. Na obra de Hobbes, o contrato social somente pode consistir numa doação quase total e incondicionada de cada um ao soberano. O direito é produto da autoridade do soberano e não das leis da natureza: autoritas non veritas facit legem. Não importa o conteúdo do ato normativo, deve ele ser considerado válido, desde que tenha emanado do soberano.
Porém realizada a centralização da produção normativa pelo Estado Absolutista, o poder ilimitado dos governantes passou a significar um entrave para a continuidade do desenvolvimento do capitalismo: a burguesia emergente pretendia proteger a liberdade a propriedade e os contratos também do eventual arbítrio dos governantes. Emerge a noção de que também os governantes deveriam se submeter a ordenamentos jurídicos providos de estabilidade e racionalidade. Daí a plena convergência entre os interesses da classe econômica ascendente – a burguesia – e o ideário do constitucionalismo, de contenção do poder estatal em favor da liberdade individual.
Por outro lado, com o fim da unidade religiosa no continente europeu, extinguira-se a possibilidade de fundamentação do poder político na vontade divina, uma vez que essa justificativa deixara de se alicerçar na crença generalizada dos governados. A reação contra as guerras e perseguições religiosas deflagradas pela Reforma e Contrarreforma nutriram a ideia de que era necessário promover a tolerância e fomentaram o desenvolvimento da concepção segundo a qual deveriam ser reconhecidos determinados direitos invioláveis aos súditos. Era necessário fornecer uma base racional e secularizada para o poder político, sob pena de se perpetuar o cenário de guerra e instabilidade que vitimava gravemente o continente europeu.
Naquele contexto, passou-se a valorizar o indivíduo concebido como um ser racional, titular de direitos cuja dignidade independia do lugar que ocupasse no corpo coletivo. Evolui-se para o reconhecimento de direitos universais, pertencentes a todos. A sociedade não mais era concebida como um organismo social, formado por órgãos que exerciam funções determinadas (clero, nobres, vassalos). Ela passa a ser concebida como um conjunto de indivíduos, como uma sociedade ‘atomizada’, formada por unidades iguais entre si. As atividades sociais (o trabalho, por exemplo) deixam de ser atributos naturais relativos ao lugar ocupado no organismo social, e passam a decorrer da vontade livremente declarada pelos indivíduos. O contrato se torna o instituto por excelência de formalização de vínculos sociais.
Em harmonia com essa visão, desenvolveram-se diversas teorias de contrato social, que passaram a justificar a existência do Estado em nome dos interesses dos indivíduos, que sairiam ganhando com a superação do ‘Estado de Natureza’ e a ‘fundação da sociedade civil’. A versão liberal do contratualismo, que teve em John Locke o seu mais importante formulador, sustentava a ideia de que, ao celebrar o contrato social, as pessoas alienam para o Estado apenas uma parcela da liberdade irrestrita de que desfrutavam no Estado de Natureza, retendo, no entanto, determinados direitos naturais, que todos os governantes devem ser obrigados a respeitar. Esse jusnaturalismo difere daquele que predominara na Antiguidade e na Idade Média por duas razões fundamentais. Em primeiro lugar, por não se basear na vontade divina, nem em imposições extraídas da Natureza, mas em princípios acessíveis à razão humana. Em segundo lugar, por conferir primazia aos direitos individuais. O jusnaturalismo antigo e medieval era objetivista: a lei natural correspondia a uma ordem objetiva, criada por Deus, a qual não poderia deixar de ser observada pelo Estado. O jusnaturalismo moderno, de tipo lockeano, é subjetivista: identifica determinados ‘direitos naturais’, atribuídos aos indivíduos, que não podem ser violados pelas autoridades públicas, tendo sido ressalvados no pacto social”.
Dito isso, pode-se concluir que o constitucionalismo moderno assenta-se em três pilares: a contenção do poder dos governantes, por meio da separação de poderes; a garantia de direitos individuais, concebidos enquanto direitos negativos oponíveis ao Estado; e a necessidade de legitimação do governo pelo consentimento dos governados, pela via da democracia representativa. No entanto, consoante Sousa Neto e Sarmento (2012, p. 72), na prática, o terceiro pilar nem sempre foi valorizado como o eram os dois primeiros, tendo em vista “a generalizada adoção do voto censitário e masculino nos Estados constitucionais até meados do século XX, com base na justificativa de que apenas os homens mais instruídos, de melhor condição social, reuniriam as condições que lhes permitiriam expressar, por meio do seu voto, a vontade da nação”.
A seguir, serão expostos os lineamentos gerais das três versões mais influentes de constitucionalismo moderno: as experiências inglesa, francesa e norte-americana. Em seguida, serão abordadas duas fases distintas do constitucionalismo moderno, que dizem respeito ao Estado Liberal-Burguês e ao Estado Social. Conclui-se esta primeira unidade com comentários sobre algumas tendências do constitucionalismo hoje.
3.1 O modelo inglês de constitucionalismo
	- Não chegou a existir absolutismo na Inglaterra, na medida em que, como visto, desde o fim da Idade Média, o poder real encontrava-se limitado por determinados costumes e pactos estamentais – dos quais o mais conhecido é a Magna Carta de 1215.
	- O século marcante para a definição da experiência constitucionalista inglês é o XVII, caracterizado pelas fortes tensões entre a Coroa e o Parlamento e por numerosas revoltas políticas, que culminaram na Revolução Gloriosa de 1688, que depôs a dinastia dos Stuarts.
	- Documentos constitucionais de grande importância constitucional no século XVII: Petition of Rights (1628); Habeas Corpus Act (1679); e o Bill of Rights (1689). Todos eles asseguravam liberdades para os súditos ingleses, impondo limites à Coroa e transferindo poder ao Parlamento.
 	- O respeito às tradições constitucionais é uma das ideias centrais do modelo de constitucionalismo inglês. Embora haja diversos documentos constitucionais escritos, não há um texto constitucional único que os consolide e os organize. Inexiste, pois, uma Constituição escrita na Grã-Bretanha. Convém assinalar que a autoridade do Direito Constitucional não decorre apenas dos referidos documentos esparsos, mas também de convenções constitucionais e de princípios do commom law, forjados pelos tribunais.
- O poder constituinte inglês assenta-se no respeito às tradições imemoriais, sendo estranha aqui a ideia do exercício desse poder por meio de ruptura com o passado, como se dá na França e nos Estados Unidos da America. O constitucionalismo britânico é, por conseguinte, historicista, uma vez que a Constituição e os direitos fundamentais encontra fundamento nas tradições históricas do povo inglês, e não num ato de vontade do constituinte ou no exercício abstrato da razão.
- Princípio da supremacia política do Parlamento: assentado pelaRevolução Gloriosa, significa que o Poder Legislativo pode editar norma com qualquer conteúdo, não havendo a possibilidade de invalidação das suas decisões por outros órgãos. Daí se falar no caráter flexível da Constituição britânica, por poder ser ela alterada pela mesma forma como são editas as leis infraconstitucionais. A profundidade do enraizamento dos valores constitucionais na Inglaterra, contudo, torna pouco provável a sua violação por atos parlamentares�.
3.2 O modelo francês de constitucionalismo
- O constitucionalismo moderno na França tem como marco inicial a Revolução Francesa, iniciada em 1789, a qual representou um verdadeiro rompimento com relação ao passado, já que os revolucionários buscavam não apenas modificar pontualmente o Antigo Regime, mas, sobretudo, pretendiam um novo Estado e uma nova sociedade, à luz do ideário iluminista da igualdade, da liberdade e da fraternidade.
	- Emanuel Joseph Sieyès, no âmbito da teoria constitucional, publica em 1789 a obra “O que é o terceiro Estado?” (Qu’est-ce que Le Tier État? Tradução brasileira: “A Constituinte burguesa”), na qual defende que o poder constituinte exprimiria a soberania da Nação, estando completamente desvencilhado de quaisquer limites impostos pelas instituições e pelo ordenamento do passado. O poder constituinte fundaria uma nova ordem jurídica, criando novos órgãos e poderes – poderes constituídos – ao primeiro vinculados.
	- Diferentemente da Inglaterra, o modelo de constitucionalismo francês assenta-se na visão iluminista de que é possível e desejável conformar racionalmente o futuro. A Constituição, nesse sentido, deve corresponder a uma lei escrita, não se confundindo com um repositório de tradições imemoriais, podendo romper com o passado e dirigir o futuro da Nação, para tanto, inspirando-se em valores universais centrados no indivíduo. 
	- O Poder Legislativo assume o papel de protagonista no modelo constitucional francês, encarnando teoricamente a soberania e sendo visto como um garantidor mais confiável dos direitos do que o desgastado e corrompido Judiciário do Antigo Regime. Essa valorização da lei deve-se, ainda, ao pensamento de Rousseau, em especial com o sua obra Contrato Social, onde sustenta que aquela é expressão da vontade geral.
	- O culto à lei emanada do Poder Legislativo, no entanto, acabou conduzindo ao legalismo formalista, no qual os juízes eram vistos como meros aplicadores autômatos ou mecânicos de normas elaborada pelo legislador, e os direitos fundamentais valiam apenas nos limites das leis que os consagravam. Igualmente, a Constituição, nesse caso, não tinha o papel de autêntica norma jurídica com poder de ser invocada por litigantes nos tribunais, limitando-se a desempenhar o papel de proclamação política, que deveria inspirar a atuação legislativa.
	- A instabilidade política francesa, com numerosas turbulências e mudanças de regime – o que ensejou a elaboração de nada menos do que 13 Constituições desde 1971 até a então vigente Constituição de 1958 – levou o Código Civil a desempenhar o papel de “Constituição real” da sociedade”, o qual deveria conter regras racionais, estáveis e universais para a disciplina da vida social, em sintonia com a ideologia liberal-burguesa. Essa concepção foi acolhida pelo Código de Napoleão de 1804.
3.3 O modelo norte-americano de constitucionalismo
	- O constitucionalismo norte-americano nasce antes mesmo da promulgação da Constituição do país e da própria Declaração de Independência. Isso se deve ao fato de a colonização dos Estados Unidos ter sido feita, em geral, por imigrantes que escapavam da perseguição religiosa na Europa, o que contribuiu decisivamente para que a cultura política norte-americana se assentasse em ideias como a necessidade de limitação do poder dos governantes e de proteção das minorias diante do arbítrio das maiorias.
	- A Constituição dos Estados Unidos foi aprovada pela Convenção de Filadélfia em 1787 e depois ratificada pelo povo dos estados norte-americanos, estando vigente até hoje. Inovou ao criar um novo modelo de organização política – o Estado Federal –e ao instituir o presidencialismo e o sistema de freios e contrapesos, associado à separação de poderes.
	- A Constituição norte-americana é um texto extremamente sintético, composto originariamente de apenas 7 artigos, e que, durante seus mais de 220 anos de vigência, sofreu apenas 27 emendas. Embora seja extremamente difícil modificar formalmente tal Constituição, as cláusulas constitucionais mais importantes são dotadas de plasticidade, o que abre a possibilidade de sua atualização pela via interpretativa, para adaptá-las às novas demandas e aos novos valores que emergiram com as mudanças experimentadas pela sociedade americana desde aquela época. Daí se falar que, embora rígida, trata-se de uma living Constitution.
	- Assim como na França, o modelo constitucional norte-americano inspirou-se no jusnaturalismo liberal, como evidencia o texto da Declaração de Independência do país, cujo trecho do preâmbulo merece ser transcrito: “Consideramos estas verdades como evidentes por si mesmas, que todos os homens são criados iguais, dotados pelo Criador de certos direitos inalienáveis, que entre estes estão a vida, a liberdade e a procura da felicidade. Que a fim de assegurar esses direitos, governos são instituídos entre os homens, derivando seus justos poderes do consentimento dos governados; que, sempre que qualquer forma de governo se torne destrutiva de tais fins, cabe ao povo o direito de alterá-la ou aboli-la e instituir novo governo, baseando-o em tais princípios e organizando-lhe os poderes pela forma que lhe pareça mais conveniente para realizar-lhe a segurança e a felicidade”. Aliás, embora não haja em tal modelo a compreensão de que cabe à Constituição dirigir os rumos da vida nacional, vislumbra-se claramente a ideia de ruptura com o passado por meio do exercício do poder constituinte.
	- O modelo constitucional norte-americano representa a tentativa de conciliar dois vetores, porquanto busca concomitantemente fundar o exercício do poder político no consentimento dos governados (vetor democrático) e estabelecer mecanismos que evitem que esse poder seja opressivo, ameaçando a liberdade individual (vetor liberal).
	- Diferentemente dos dois modelos vistos, o constitucionalismo norte-americano sustenta a concepção de que a Constituição é norma jurídica e, como tal, pode e deve ser invocada pelo Poder Judiciário na resolução de conflitos, mesmo quando isso implique a restrição ao poder das maiores albergadas pelo Legislativo ou pelo Executivo. Embora não conste explicitamente no texto constitucional, o Direito estadunidense desenvolveu a noção de que os juízes, ao decidirem conflitos, podem reconhecer a invalidade de leis que contrariem a Constituição, deixando de aplicá-las ao caso concreto. A esse respeito, costuma-se fazer referência à formulação jurisprudencial da Suprema Corte pelo Juiz John Marshall, no célebre julgamento do caso Marbury v. Madison, em 1803, a partir do qual se firmou – o controle judicial de constitucionalidade das leis (judicial review) – como princípio fundamental do Direito Constitucional desse país. 	Assim, a supremacia da Constituição não é, como na França, apenas uma proclamação política, mas também um princípio jurídico judicialmente tutelado. 
	 
3.4 O constitucionalismo liberal-burguês 
	- Começa no final do século XVIII e vai até a 1ª Guerra Mundial (1914-1918), originando-se a partir das Revoluções Liberais (Francesa e Norte-Americana) e havendo sido influenciado por pensadores como Locke, Montesquieu, Rousseau, bem como por Thomas Jefferson e pelos Federalistas. 
	- A partir dessa primeira fase do constitucionalismo moderno, em especial com o as primeiras Constituições escritas – a Norte-Americana, de 1787, e a Francesa, de 1791 – a Constituição passa a ser rígida, originando a ideia de supremacia constitucional, de acordo com a qual a Constituição de um país situa-se no topo do ordenamentojurídico, sendo Lei Suprema do Estado e fundamento do sistema jurídico. Tal noção, como visto, é tratada com peculiaridades por cada um dos modelos acima estudados.
	- É nessa fase também que emerge a noção de Estado de Direito, vinculado às ideias de “império da lei” (a limitação do poder do Estado pelo Direito se estende ao soberano), de direitos fundamentais como direitos da burguesia (igualdade, liberdade e propriedade em sentido apenas formal) e de Estado como mero defensor da ordem e da segurança públicas, não devendo intervir na esfera social nem na econômica, a qual deve permanecer sujeita apenas à ação “espontânea” do próprio mercado, para fins de promoção do bem comum.
	- É nessa fase do constitucionalismo que os direitos civis e políticos (1ª geração ou dimensão) emergem. Esses direitos fundamentais, ligados ao valor liberdade, eram concebidos como direitos negativos, somente exigiam abstenções por parte do Estado. O Estado era tido como o principal adversário dos direitos, o que justificava a sua estrita limitação, em prol da liberdade individual.
	- O constitucionalismo liberal-burguês também afirmava o valor da igualdade, mas apenas numa perspectiva formal (igualdade de todos perante a lei). Embora tenham sido combatidos os privilégios estamentais do Antigo Regime e a concepção organicista de sociedade, que tornava os direitos e deveres de cada um dependentes da respectiva posição na estrutura social, tal fase do constitucionalismo moderno ignorava a opressão que se manifestava nas relações sociais e econômicas, que permitiam ao mais forte explorar o mais fraco. 
	- A liberdade era igualmente concebida em termos estritamente formais, como ausência de constrangimentos externos, impostos pelo Estado à ação dos indivíduos. Não havia uma preocupação com a liberdade real das pessoas, a qual pressupõe a existência de condições materiais mínimas necessárias para que cada um possa fazer conscientemente as suas escolhas e persegui-las em sua vida particular.
3.4 O constitucionalismo social 
	- A pressão social dos trabalhadores e de outros grupos excluídos no regime liberal, aliada ao temor da burguesia diante dos riscos e ameaças de rupturas revolucionárias inspiradas no ideário da esquerda, levaram a uma progressiva mudança nos papéis do Estado, que ensejou, por sua vez, a cristalização de um novo modelo de constitucionalismo. O marco histórico do constitucionalismo social tem seu início pouco antes do fim da Primeira Grande Guerra Mundial (1918). 
- A igualdade formal conferida a patrões e empregados em suas relações contratuais, com total liberdade para estipular as condições de trabalho, resultou no empobrecimento brutal das classes operárias. O agravamento das desigualdades sociais provocou a indignação dos trabalhadores assalariados, dos camponeses e das classes menos favorecidas que passaram a exigir dos poderes públicos não só o reconhecimento das liberdades individuais, mas também a garantia de direitos relacionados às relações de trabalho, à educação e, posteriormente, à assistência aos hipossuficientes.
- No plano das ideias, contribuíram para esse desfecho diversas vertentes de pensamento, como o marxismo, o socialismo utópico e a doutrina social da Igreja Católica, que, embora divergindo quanto à solução, convergiam na crítica aos abusos a que conduzia o individualismo exarcebado do capitalismo selvagem, que prosperara sob a fachada do constitucionalismo liberal-burguês.
- A progressiva extensão do direito de voto a parcelas da população até então excluídas do sufrágio também contribui para a mudança de cenário, ao permitir que demandas voltadas à alteração do status quo penetrassem nos órgãos do Estado.
	- A crise econômica, no início do século XX, contribui decisivamente para a crise do regime liberal. Os preços perdiam preços nos mercados internos e no mercado internacional. A economia de mercado, sem amarras, se mostrava incompatível com o desenvolvimento econômico e com a estabilidade social. A crise culmina com a quebra da Bolsa de Nova York em 1929. A crise demandava, para o seu enfrentamento, a enérgica atuação estatal, e não a sua abstenção.
	- No novo cenário, o Estado, de mero garantidor das regras que deveria disciplinar as disputas travadas no mercado, o Estado foi se convertendo num ator significativamente mais importante – algumas vezes, até protagonista – dentro da arena econômica (e social), exercendo diretamente muitas atividades de produção de bens e serviços. No novo cenário, o Estado incorpora funções ligadas à prestação de serviços públicos. No plano teórico, a sua atuação passa a ser justificada também pela necessidade de promoção da igualdade material, por meio de políticas públicas redistributivas e do fornecimento de prestações materiais para as camadas mais pobres da sociedade, em áreas como a saúde, a educação e a previdência social.
	- Em tal contexto, foi flexibilizada a proteção da propriedade privada, que passou a ser condicionada ao cumprimento da sua função social, e relativizada a garantia da autonomia negocial, diante da necessidade de intervenção estatal em favor das partes mais débeis das relações sociais. Igualmente, a separação dos poderes foi flexibilizada, para possibilitar uma atuação mais forte dos poderes públicas na seara social e econômica.
	- Nesse cenário, passam a ser consagrados nas Constituições nacionais, ao lado dos direitos individuais clássicos (civis e políticos), direitos sociais e econômicos, posteriormente identificados como direitos de segunda geração (ou dimensão), ligados à igualdade material.
	- O constitucionalismo social, contudo, enfrenta crise desde as últimas décadas do século XX. A globalização econômica reduziu a capacidade dos Estados de formular e de implementar política públicas para atender os seus problemas sociais e econômicos, na medida em que gerou o fenômeno da desterritorialização do poder. A globalização realizou-se sob a influência do pensamento neoliberal, que prega a redução do tamanho do Estado, a desregulação econômica, a restrição dos gastos sociais, e a flexibilização das relações de trabalho por parte do Estado, com ao finalidade de atrair o investimento produtivo e de alcançar maior competitividade no mercado global.
	- No cenário geopolítico, a falência dos Estados socialistas, simbolizada pela queda do muro de Berlim em 1989 parecia apontar para uma vitória inexorável do regime capitalista, que agora, sem um rival com o qual disputasse a influência, poderia atuar sem fazer muitas concessões. E, para completar o quadro, despontava o crescente déficit público de muitos Estados, inclusive do 1º Mundo, potencializado pelo grande aumento da expectativa de vida da população, gerando expressiva elevação dos gastos em saúde pública e previdência social. Em tal contexto, muitos anunciavam a morte do Estado social e do modelo constitucional que lhe corresponde.
REFERÊNCIAS
BARROSO, Luís Roberto. Curso de direito constitucional contemporâneo. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2013.
BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de direito constitucional. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.
NOVELINO, Marcelo. Manual de direito constitucional. 8 ed. São Paulo: Método, 2013.
RABENHORST, Eduardo Ramalho. Dignidade humana e moralidade democrática. Brasília: Brasília Jurídica, 2001.
SOUSA NETO, Cláudio Pereira; SARMENTO, Daniel. Direito constitucional: teoria, história e métodos de trabalho. Belo Horizonte: Fórum, 2012.
WEYNE, Bruno Cunha. O princípio da dignidade humana: reflexões a partir da filosofia de Kant. São Paulo: Saraiva, 2013.
� Existe uma tendência, sem embargo, de alteração desse modelo de soberania irrestrita do Parlamento inglês, em matéria de direitos fundamentais, tendo em vista a aprovação, em 1998, do Human Rights Act, que possibilitou ao Judiciário britânico a declaração de incompatibilidade de leis editadas pelo Legislativo com os direitos previstos em tal documento. Embora essa declaração não implique a invalidação da lei, elacria um fato político relevante, gerando forte pressão para a revogação da norma violadora de direitos humanos.

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