Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
A Questão Filosófica do Princípio de Individuação e as Restrições Decorrentes das Condenações de 1277 69R. Mestr. Hist., Vassouras, v. 5, p. 61-74, 2003 Notas 11 Pierre Duviols, Algunas reflexiones acerca de las tesis de la estructura dual del poder incaico, Historica, v.IV, n.2, dic, pp.183-196, Lima, 1980. 12 Ana Raquel M. da C. M. Portugal. O conceito de ayllu nas crônicas de inte- resse peruano do século XVI, Dissertação de Mestrado em História, Unisinos/RS, 1995, pag.12. 13 “...La España del XVI es una nación mesiánica. La gloria y la riqueza caída tan de improviso sobre sus hombros han llevado a la mayoria al convencimiento de que éste es el pueblo destinado a la gloria. En su glosa a la situación, los escritores de XVI comparan siempre a España con Roma o Israel. Si Roma fue cabeza de la humanidad, Israel era el pueblo selecto, el único que tenía razón frente a sus numerosos enemigos. Como ellos, España tiene obligatoriamente una empresa que llevar a cabo”. Fernando Diaz-Plaja, História de España en sus documentos, siglo XVI, Madrid, Catedra, 1988, pag.10. 14 panaca - “miembros de la elite cusqueña” Maria Rostworowski de Diez Can- seco, Historia del Tahuantinsuyu, Lima, IEP, 1988, pag.201. 22 Willian Robertson, The history of America, London, 1777. 23 Ake Wedin, El concepto de lo incaico y las fuentes, Uppsala, Akaemiförlaget, 1966, pag.8. 24 Corneille de Pauw, Recherches philosophiques sur les Américaines, Euvres de Pauw, t.I-III, Paris,1768-69. 25 Willian Prescott, History of the conquest of Peru, London, Routledge, 1862. 26 Marcos Jiménez de la Espada, De las antiguas gentes del Perú, Madrid, 1892, Prólogo e Apéndice I in Pedro Cieza de Léon, La guerra de Quito, Biblioteca Hispano- Americana, t.I, Madrid, 1877 e outras obras. 27 Clements Markhan, The Incas of Peru, London, 1910. 28 José de la Riva-Agüero, La Historia del Peru, Lima, 1910. 29 Philip Ainsworth Means, Ancient civilizations of the Andes, New York ,1931. 30 John H. Rowe, op, cit, 1963. 31 Ake Wedin, op. cit., 1966. 32 Para Louis Baudin a divisão lógica era propiciada pela diferenciação profis- sional e cronológica, ou seja, cronistas que conheceram o Império Inca, os que chegaram depois da destruição deste e aqueles que não estiveram no Peru, mas recolheram os dados dos primeiros conquistadores, in El imperio socialista de los incas, Santiago, 1928. Para Raúl Porras Barrenechea, a divisão deve ser feita em Incário, Descobrimento, Conquista, Guerras Civis da conquista e Cronistas pré-toledanos, toledanos e pós-toledanos, in Los cronistas del Perú(1528-1650) y otros ensayos, Lima, Banco de Crédito del Perú, 1986. 33 Franklin Pease, op. cit. 1978, pag.33. A Invenção da América Latina Héctor H. Bruit Professor de História da América do Curso de Pós-Graduação da UNI- CAMP Resumo O artigo visa explicitar o processo de invenção e adoção do nome e idéia de América Latina. A latinidade e a idéia de América Latina, têm a ver com a consciência cultural do continente. O nome e a idéia não existiram na consciência dos intelectuais americanos do século XIX. O nome se popularizou após a Segunda Guerra mundial. Palavras-chave latinidade - consciência - cultural - historiografia - literatura Eduardo Vieira da Cruz 70 R. Mestr. Hist., Vassouras, v. 5, n. 1, p. 61-74, 2003 A Invenção da América Latina 71R. Mestr. Hist., Vassouras, v. 5, p. 69-88, 2003 Em 1991, publicou-se um livro com um título carregado de significado: La fortune d’um nom, América (Ronsin, 1991). De fato, o nome próprio que designaria o Novo Mundo, América, colocado na parte sul do continente no famoso mapa de Martin Waldseemuller de 1507, logo passaria a nomear também a parte norte. Todavia, o sucesso desse nome apagou o fato de que esse nome, América, sería arrebatado, no século XIX, pelo único país no mundo que não tinha nome: os Estados Unidos de norte-américa. Com a doutrina Monroe, esse nome de tanto sucesso passou a designar o país do norte, enquanto que a primeira América, a de Colombo, Cabral, Vespuccio e Moctezuma, passou a ser chamada de América Latina marginalizando as populações indígenas e negras. E este novo nome, também teve muito sucesso não obstante as resistências da Espanha que no fundo sempre se sentiu mais visigótica, fenícia, vândala, moura e judia, que latina. Em seu Ensaio político sobre a ilha de Cuba, publicado em Paris em 1826, Humboldt alertava para a injustiça histórica de chamar de americanos só os cidadões dos Estados Unidos da América do Norte. Realmente, o nome de América Latina, independentemente das razões ideológicas e políticas que envolveram seu nascimento, veio para rebatizar um continente que tinha perdido seu nome originário. Se atribui aos franceses esta invenção. Não obstante, a invenção foi de dois sul-americanos, o argentino Carlos Calvo e o colombiano José Maria Torres Caicedo Carlos Calvo foi um jurista importante, especialmente pelos tratados de Direito Internacional público e privado que publicou por volta de 1868. Nestas obras ele formulou o principio de que nenhum governo deveria apoiar com as armas reclamações pecuniárias de países devedores. Este principio se tornaria famoso em 1902, quando Venezuela enfrentou a fúria das potencias européias pelo não pagamento de empréstimos. Então, o ministro das Relações Exteriores da Argentina, Luis M. Drago, invocou Héctor H. Bruit 72 R. Mestr. Hist., Vassouras, v. 5, p. 69-88, 2003 o principio de Calvo, ficando com o nome de doutrina Drago. Por volta de 1864, Calvo publicou, em Paris, uma obra monu- mental em vinte volumens com um título tão cumprido como a própria obra: Recueil complet dês traités, conventions, capitulations,armistices et outres actes diplomatiques de tous lês Etats de l’Amérique latine compris entre lê golfe du Mexique et lê Cap Horn depuis l’année 1493 jusqu’à nos jours... Era a primei- ra vez que se empregava a expressão América Latina numa obra acadêmica. Calvo disse na dedicatória a Napoleão III que a obra era um reconhecimento e gratidão da raça latina à inteligência superior do Imperador. A finalidade do jurista argentino, que também se apresentava como historiador, economista e geógrafo nos círculos acadêmicos de Paris, era dar a conhecer um continente muito mal conhecido na França e na Eu- ropa em geral. De fato, o que se sabia provinha da imagem desenvolvida no século XVIII por Buffon, Reynal e Robertson entre outros. Isto é, o mundo americano era hostil, degenerado, nocivo e sofocante. O colombiano Torres Caicedo, também residente em Paris, lançou a idéia de criar a liga Latino-américana. Em 1865, publicou um livro com o título Unión Latinoamericana. O projeto de Caicedo era organizar um movimento contrario à política pan-americana dos Estados Unidos. Ele escreveu: “Hay uma América anglosaxona, dinamarquesa, holandesa etc., Hay uma española, francesa, portuguesa e a este grupo que denominación científica darle sino el de latina”? (Ardao,1986). A expressão usada com freqüência na década de sessenta era “raças latinas”, até existia uma publicação periódica com esse nome, Revue des Races Latines. Nessa época, França se preparava para invadir México. O ideólogo desse expansionismo era o historiador Michel Chevalier, então senador do Império francês. Em seu livro, Le Mexique ancien et moderne, publicado em 1863, desenvolveu a idéia de que França era a herdeira das nações católicas e lhe correspondia levar à América a tocha das raças latinas, A Invenção da América Latina 73R. Mestr. Hist., Vassouras, v. 5, p. 69-88, 2003 isto é, francesa, italiana, espanhola e portuguesa. Considerava que estas três últimas nações estavam em decadência. França era a única nação católica que podia deter o expansionismo protestante e anglosaxão.Esta missão começaria em México (Phelan,1993) É significativo que nos artigos escritos na Revue dex Deux Mon- des e em seu livro sobre México, Chevalier não usou a expressão América Latina. Na volumosa correspondência do Mariscal Bazaine com Napo- leãn III e com o Ministério das Relações Exteriores, entre 1862 e 1865, publicada no México por Genaro Garcia, não existe a idéia de América Latina, não existe a idéia de pan-latinismo. A finalidade de conquistar México, era basicamente econômica: “De acuerdo al estado actual de la civilización mundial, la prosperidad de América no es indiferente a Europa, porque ella alimenta nuestra industria y vivifica nuestro comercio. Tenemos interés que la república de los Estados Unidos sea poderosa y próspera; pero no tenemos ninguno en que se apodere de todo el Golfo de México, domine, desde allí, las Antillas y la América del Sur”(García, 1973). Se observa, nesta carta de Napoleão III ao general Forey datada de 1862, que as regiões são designadas com os nomes usados ao longo do século XIX, isto é, América do Sul, Antilhas, Estados Unidos e Novo Mundo. Não é fácil determinar se o nome de América Latina tinha alguma divulgação na França e na Europa ocidental na segunda metade do século XIX . Não conhecemos todos os números da Revue Das races Latines e é mais que provável que em alguns números se falasse ou se usasse a expressão América Latina. Nos dois números que temos podido consultar, de 1858, nos permitem afirmar que a revista era mensal e dedicava Héctor H. Bruit 74 R. Mestr. Hist., Vassouras, v. 5, p. 69-88, 2003 um extenso capítulo a “les hommes de la race latine”. No número de julho, esse homen era José de San Martin, no número de agosto se fala sobre o general espanhol Leopoldo O’Donnel. Tinha uma outra sessão dedicada à correspondência italiana, espanhola, belga, e a correspondência da América do Sul. Esta sessão tinha um conteúdo econômico, mas também há estudos sobre as cidades italianas, espanholas, etc. Temos também, a correspondência dos americanos residentes em Paris. Pela variedade e riqueza dos temas discutidos, a correspondência de Juan Bautista Alberdi talvez seja a mais importante. Seu remetente era o compatriota Francisco Javier Villanueva, médico residente no Chile. Esta correspondência abarca um longo período, de 1855 a 1881. Alberdi fala de tudo. Os fatos e processos político-econômicos da Europa e da América, particularmente da França e da Argentina, são objeto de sua atenção; a intervenção francesa no México, a intervenção espanhola no Peru, a Guerra da Tríplice Alianzça, o Congresso Americano de Lima, etc. Fala de políticos, diplomatas, escritores, poetas, publicações periódicas, livros. Por exemplo, se refere, entre outros, a Carlos Calvo que qualifica de oportunista. Porém, não escreveu uma só linha relativa a questão da latinidade, nem se utiliza da expressão América Latina. Não há nada sobre o livro de Chevalier nem sobre a expansão da latinidade como objetivo da política exterior francesa. (Alberdi, 1967). Do lado americano, chama nossa atenção o fato relevante de que a expressão América Latina não foi usada em nenhum momento por qualquer dos diplomatas assistentes ao Congresso Americano de Lima (Congressos Americanos de Lima,1938). Também, e isto é o mais importante, a idéia de latinidade, a expressão América Latina, não existiram na consciência político-cultural dos intelectuais do continente. Se realmente a França usou a latinidade para justificar seu expansionismo, este instrumento caiu no vácuo , não passou de uma ingênua utopia. Isto, mesmo que muitos intelectuais do continente americano se tenham voltado para as letras francesas no século A Invenção da América Latina 75R. Mestr. Hist., Vassouras, v. 5, p. 69-88, 2003 XIX. Mas a influência francesa foi bastante relativa. Na realidade, houve também uma forte influência anglo-saxónica e alemã. Como exemplos, podemos citar dois dos intelectuais sul-americanos de mais prestígio no continente: Andrés Bello e Domingo Faustino Sarmiento. Pode até ser surpreendente para alguns, que Bello lia muito mais autores de língua inglesa que francesa. Num apanhado de autores românticos, cinqüenta ao todo, no inventário da biblioteca de Bello, vinte e um eram de língua inglesa, onde se destacam Dickens, Scott, Byron, Longfellow e Macaulay; só doze autores franceses, entre os quais Lamartine, Hugo, Beaumarchais, Rousseau. Os restantes são espanhóis e alemães. (Rodriguez Monegal, 1979). No caso de Sarmiento, um texto dele é mais claro que qualquer comentário: “Los políticos que quieran llegar a ser en América los represen- tantes de la raza latina, quisieran pararse en medio de la calle donde transitan carros, animales, pasajeros y todo el ajuar del comercio de todos los pueblos del mundo. Pretenderían dividir el mundo en dos mitades y ya que el istmo de Panamá va a ser camino público, decirse que a este lado está el atraso, el despo- tismo de régulos ignorantes,cortados a la medida de los que han dejado producirse aquí y allí la raza latina, sin mirar el rostro del soldado que la vigia y gobierna, que es cobrizo y tostado, llamando latino al araucano, al azteca, quichua, al guaraní, al charrúa, amos de la raza de los amos que los oprimen... Lleguemos a enderezar las vías tortuosas en que la civilización europea vino a extraviarse en las soledades de esta América. Reconozcamos el árbol por sus frutos: son malos, amargos a veces, escasos siempre. La América del Sur se queda atrás y perderá su misión pro- videncial de sucursal de la civilización moderna. No detenga- mos a Estados Unidos en su marcha: es lo que en definitiva proponen algunos. Alcancemos a Estados Unidos. Seamos la América, como el mar es el océano. Seamos Estados Unidos (Sarmiento,1883). Héctor H. Bruit 76 R. Mestr. Hist., Vassouras, v. 5, p. 69-88, 2003 Este texto que forma parte das conclusões de Conflicto y Armonia de lãs Razas em América, publicado em 1883, é contundente e não deixa lugar a dúvidas em relação à idéia de latinidade. Na realidade, a idéia de latinidade era associada a idéia de monarquia, de conservadorismo, de anti-liberal, de anti-republicano. A latinidade é européia, nasceu na Roma antiga, está estreitamente ligada a Igreja Católica, ao autoritarismo monárquico. Desta forma foi discutida por alguns dos intelectuais do século XIX, como José Victorino Lastarria em seu livro La América. A idéia de uma influência francesa única nos intelectuais ameri- canos do século XIX, foi produto da propaganda hispânica que os acusava de afrancesados e de ferir o idioma com galicismos desnecessários. Desde a publicação do livro de Pedro Henríquez Ureña, Seis ensayos em busca de nuestra expresión, de 1928, os estudiosos da literatura continental chegaram a conclusão que já no século XIX, a literatura americana apresentava um forte cosmopolitismo. Quer dizer, não só se lia Lamartine e Balzac, mas também Scott, Byron e Goeth (Girardot, 1994). Bastaria revisar as obras de José Victorino Lastarria, Juan Bau- tista Alberdi, Manuel Bilbao, Esteban Echeverria, Juan Montalvo, Justo Sierra, etc. Para perceber que a idéia de América Latina não formava parte de seus pensamentos. Quando nomeian o continente, usan as expressões América, Hispáno-américa, Ibero-américa ou Sul-américa. Quase uma excepção, foi Santiago Arcos que usou a expressão América Latina em seu livro sobre Argentina, La Plata, Étude Historique, publicado em Paris em 1865. Não obstante, a expressão mais usada por este escritor é raças latinas. A mesma coisa pode-se dizer de Francisco Bilbao, que usou a expressão “raça latino-americana”, em uma conferência em Paris em 1856. Mas não voltaria a usar essa expressão em seus trabalhos mais importantes, como o Evangelho Americano.Pelo contrário, A Invenção da América Latina 77R. Mestr. Hist., Vassouras, v. 5, p. 69-88, 2003 condenou duramente a invasão francesa de México e situou o imperialismo francês no mesmo nível dos imperialismos norte-americano e russo (1999, Abramson). Nos Estúdios Econômicos de Alberdi, obra editada em 1916 e a mais importante das obras póstumas, chama nossa atenção o primeiro sub-título do terceiro capítulo: “La América em España, o antecedentes de la pobreza que forma la condición económica de la América Latina”. Nas quatrocentas páginas do livro, Alberdi chama o continente de Hispano- América ou América do Sul. Então, parece ser que a expressão América Latina do sub-título, foi obra dos editores. Sería necessário consultar o manuscrito. O mesmo pode-se falar de José Martí. Para o pensador cubano, América, Nossa América, só pode ser a América indígena, a negra, a mestiça, a “criolla”, a América do século XVI, isto é, Ibero-América. Os Estados Unidos são a Norte-América. Em nenhum momento, passa pelo pensamento de Martí a idéia de latinidade, pois América, Nossa América, deve procurar em suas raízes, no autóctone, sua cultura, seu governo, seu progresso. Rejeita a disjuntiva de Sarmiento de civilização ou barbárie: “Por eso el libro importado ha sido vencido en América por el hombre natural. Los hombres naturales han vencido a los letrados artificiales.El mestizo autóctono ha vencido al criollo exótico. No hay batalla entre la civilización y la barbarie, sino entre la falsa erudición y la naturaleza’’(Martí,1973). José Enrique Rodó, o mais afrancesado dos escritores do início do século XX, porque a devorado a Renan e a Anatole France, usou a expressão América Latina duas vezes em seu livro Ariel, publicado em 1900, em um discurso de 1905 em homenagem a Anatole France que visitava Montevideo, em uma corta nota jornalística com o título de “La voz de la Raza” a propósito da Primeira Guerra Mundial e no Mirador de Próspero. Porém, a expressão só tem um significado literário, sem conotações ideológicas Héctor H. Bruit 78 R. Mestr. Hist., Vassouras, v. 5, p. 69-88, 2003 que a vinculem com a latinidade. Muito pelo contrário, quando Rodo fala sobre o continente, sobre a unidade americana, sempre esta pensando em Hispano-américa. Mas vejamos um texto do escritor uruguaio: “No necesitamos los suramericanos, cuando se trata de abonar esta unidad de raza, hablar de una América Latina; no necesitamos llamarnos latinoamericanos para levantarnos a un nombre general que nos comprenda a todos, porque podemos llamarnos algo que signifique una unidad mucho más íntima y concreta: podemos llamarnos “iberoamericanos”, nietos de la heroica y civilizadora raza que sólo políticamente se ha fragmentado en dos naciones europeas; y aun podríamos ir más allá y decir que el mismo nombre de hispanoamericanos conviene también a los nativos del Brasil; y yo lo confirmo con la autoridad de Almeida Garret; porque siendo el nombre de España, en su sentido original y propio, un nombre geográfico, un nombre de región, y no un nombre político o de nacionalidad, elPortugal de hoy tiene, en rigor,tan cumplido derecho a participar de ese nombre geográfico de España como dos partes de la península que constituyen la actual nacionalidad española; por lo cual Almeida Garret, el Poeta por excelencia del sentimiento nacional lusitano, afirmaba que los Portugueses podían, sin menoscabo de su ser independiente, llamarse también, y con entera propiedad, españoles”(Rodó,1956). Este texto pertenece ao livro El Mirador de Próspero, publicado em 1913. Um outro intelectual importante, contemporâneo de Rodo, foi José Carlos Mariátegui. Uma revisão de suas Obras Completas, permite observar o uso da expressão América Latina quatro vezes nos Siete Ensayos sobre la realidad peruana, e isto no ensaio sobre educação. A expressão aparece em Temas de nuestra América, que réune artigos publicados entre 1924 e 1928. Na realidade a expressão está contida como título de um dos artigos: “La América Latina y la disputa boliviano-paraguaya”, e aparece uma vez no contexto do artigo. Não obstante, o artigo anterior se refiere A Invenção da América Latina 79R. Mestr. Hist., Vassouras, v. 5, p. 69-88, 2003 ao ibero-americanismo e pan-americanismo. Aqui, Mariátegui discute o significado histórico, político e econômico dessas expressões. O interessante, é que o pensador peruano opõe a essas duas expressões, a idéia de uma américa indo-ibérica. É mais que evidente que o escritor que mais reivindicou o direito dos indígenas, não podia aceitar essa noção de latinidade que nada tem a ver com os povos aborígenes. Usou a expressão América Latina, mas não se deu ao trabalho de discuti-la, porque talvez a encontrasse injusta e inoportuna. (Mariátegui,1994). Da mesma forma, outro intelectual importante de inicio do século XX, o mexicano José Vascocelos em seu livro sobre questões americanas, Bolivarismo y Monrroísmo, editado em 1929, usa as expressões hispano- américa, ibero-américa, novo mundo. Para este pensador, a latinidade devia ser alguma coisa exótica na medida em que ele pensava América como o continente criador de uma raça superior, a raça cósmica, que era a fusão final de todas as raças. (Vasconcelos, 1935) Uma rara excepção, é o livro de Francisco Garcia Calderon, Les Démocraties latines de l’Amérique, de 1914. Este diplomata perua- no que tem vivido por anos em Paris, que fala e escreve com perfeição o francês, segundo disse no prefácio do livro Raimond Poincaré, não só usou a expressão América Latina, mas talvez tenha sido o primeiro intelectual americano a discutir a importância e o significado da latinidade. Considerou que a latinidade do continente, era o resultado de três forças de pressão: o catolicismo, a legislação romana e a cultura francesa. A lei romana foi a base da legislação espanhola a partir de Alfonso X o Sábio, com as Par- tidas. O catolicismo está indissoluvelmente unido à autoridade romana na pessoa do Rei: na Espanha e na América, o Príncipe é ao mesmo tempo pastor da Igreja. Sob a dupla pressão do catolicismo e da legislação romana, América se latinizou. América aprende a respeitar as leis e se disciplina tanto na vida religiosa como na vida civil. Finalmente, as idéias francesas, juntam-se a essas duas forças, preparam primeiro a revolução, depois passam Héctor H. Bruit 80 R. Mestr. Hist., Vassouras, v. 5, p. 69-88, 2003 a governar os espíritos americanos desde a independência até nossos dias (Garcia-Calderon,1914). No geral, se pudéssemos fazer um balanço de todos os escri- tores americanos que se interessaran por traçar o perfil do continente, sua identidade, observaríamos que a maior parte se mostrou preocupado com as questões autóctones, pelas raízes históricas definidas da cultura nacional ou continental. Foi o caso de Sarmiento com Facundo; Ezequiel Martinez Estrada com Radiografia de la Pampa de 1933; Ricardo Rojas com Eu- ríndia de 1924; Alfonso Reyes com Visión de Anáhuac de 1917. Enfim, escritores importantes do século XX, como Octavio Paz, Samuel Ramos, German Arciniegas, Benjamin Subercaseaux, Lezama Lima, Haya de la Torre, Pedro Henríquez Ureña, preferiram falar de América, de Hispano- América ou de Ibero-América. Todavia, outro intelectual que discutiu a questão da latinidade dos americanos, foi o peruano Victor Raúl Haya de la Torre em seu livro de 1928, A donde va Indoamérica? Nesta obra ele propõe o nome de Indo-américa para o continente, não apenas para reivindicar as raças aborígenes, mas com a finalidade idoló- gica de iniciar um movimento político de alcance continental para despertar essa enorme mola comprimida. Para Haya de la Torre, o nome de indo-smérica designa a nova América, a América revolucionaria, a Américado século XX. América Latina, era o nome da América republicana do século XIX, e Ibero-américa correspondia à América colonial. É interessante transcrever um par de pa- rágrafos deste pensador: “Es el latinoamericanismo una invención gala?, como afirma Jiménez de Asúa. yo no lo acompañaria en su afirmación. Históricamente, el latinoamericanismo me parece una expresión renacentista. Cercada la América por la Inquisición, vivía, A Invenção da América Latina 81R. Mestr. Hist., Vassouras, v. 5, p. 69-88, 2003 intelectualmente, en la Edad Media. Francia nos importa de contrabando una proyección del Renacimiento, del paganismo, en la acepción eminente del vocablo, del pensamiento latino re- surrexo en Europa. Es innegable que nuestra revolución contra el imperialismo feudal español tiene, intelectualmente, raíz libe- ral francesa, médula latina. Nuestro paradojal republicanismo se contextura en mucho a la francesa. Bolivar es un latinista brillante y jura, románticamente, luchar por la independencia de América, desde el Aventino, frente a las ruinas de Roma, cuna de las concepciones clásicas de los derechos del demos. Los Enciclopedistas, la Revolución Francesa y la legislación napoleónica de inspiración latina acodan en América. La in- dependencia se inspira en Francia y varios países, entre otros el Perú, adoptan hasta la división política y la denominación burocrática de la república francesa. Haití, república negra que habla frances, se independiza antes que nosotros. Sus arcas ayudan cuantiosamente a Bolivar, protegido del plan Pétion y cuando México les pide auxilios económicos para la lucha con- tra Espanha, hallan los haitianos que no tienen más fondos. La expresión latinoamericanismo corresponde, pues, innega- blemente, a nuestra época republicana y responde más a ella que el restringido y colonial hispanoamericanismo... Los vanguardistas, los apristas, los antiimperialistas de Amé- rica, inclinados a la interpretación económica de la historia, hemos adoptado la denominación Indoamérica como expresión fundamental” (Haya de la Torre, 1936). A proposta de Haya não vingou por varias razões: o preconceito contra o indígena e a penetração na consciência dos americanos da idéia de América Latina. Na realidade, foi na década de trinta que começaram a aparecer os primeiros trabalhos históricos com o nome de América Latina elaborados por escritores franceses. Com efeito, os livros de André Siegfried, Amérique Latine, 1934, e Victor Tapié, Histoire de l’Amérique latine au XIX siècle, Héctor H. Bruit 82 R. Mestr. Hist., Vassouras, v. 5, p. 69-88, 2003 de 1945. Especialmente importante foi o livro de Siegfried, uma espécie de Bíblia dos sul-américanos na época da Segunda Guerra Mundial, particularmente pela interpretação econômica das causas que levavam a inestabilidade política do continente nessa década. Para o historiador francês, o colapso fianceiro de 1929 tinha sido a causa fundamental. Mas não todos os autores franceses usaram a expressão nesse início do século XX. Assim, o geógrafo Pierre Denis, usou o nome de América do Sul em seu valioso estudo sobre o continente de 1933 da Geografia Universal de Vidal de la Blache, volumen XV. Todavia, antes que os franceses, William S. Robertson, já famoso por seus estudos sobre Francisco de Miranda e a revolução da independência, publicou em Nova Iorque em 1922 a History of the Latin- American Nation. Na realidade, foi no período da Segunda Guerra, que o nome de América Latina se popularizou, especialmente pelos estudos dos historiadores e economistas norte-americanos. Vejamos alguns títulos importantes: Preston E. James, Latin American, N. York, 1942. Este livro, é um dos primeiros, senão o primeiro, estudo sério da geografia econômica do continente. William Rex Crawford, A Century of Latin-American Thought, Cambridge, Mass, 1949. Este livro é um estudo destinado a identificar e definir o perfil das pricipais tendências do pensamento continental nos séculos XIX e XX. É uma espécie de manual do pensamento latino-americano. Willy Feuerlein e E. Hannan, Dollars in Latin American, N.York, 1941. Evidentemente, este livro é o primeiro estudo sobre as rela- ções econômicas e financeiras dos Estados Unidos com América Latina nos anos que antecedem à Segunda Guerra e aos anos da guerra. A inversão norte-americana é estudada em detalhes. Fred J. Rippy, Latin América and the industrial age, N.York, 1947. Talvez o primeiro estudo sobre este tema da industrialização feito A Invenção da América Latina 83R. Mestr. Hist., Vassouras, v. 5, p. 69-88, 2003 por um dos maiores especialistas em assuntos econômicos do continente, especialmente dos investimentos britânicos e franceses na América no século XIX. Samuel F. Bemis, The Latin American policy of United State, N. Haven,1943. Um livro fundamental e primeiro na análise das intervenções norte-americanas na América Central, e sua relação com a doutrina do “destino manifesto”. Todavia, temos que lembrar que o Handbook of Latin American, fudamental para os estudos acerca do continente, começou a ser editado em 1935. De fato, foram os historiadores norte-americanos que divulgaram o nome de América Latina neste continente, pois muitos desses estudos foram traduzidos para o espanhol na década de cinqüenta. Na década de quarenta alguns pensadores latino-americanos iniciaram o questionamento da latinidade do continente. Entre eles, o peru- ano Luis Alberto Sánchez com seu livro, Existe América Latina?, de 1945. Mesmo não sendo aparentemente seu objeto de discussão, é possível ler nas entrelinhas que a questão que o motivou a escrever o livro é a latinidade. América Latina existe, essa é a resposta de Sánchez, mas essa existência é ambígua porque ela está fundada em um elemento estranho à maioria da população, isto é, a latinidade. Por outro lado, a latinidade tem permitido à minoria branca pensar e até sentir que a América é européia, e que os indígenas, negros e mestiços sofreram um processo de branqueamento. Pode-se observar também, entre parênteses, que tem sido intelectuais peru- anos os que mais se preocuparam com a latinidade do continente. A razão disto talvez seja o fato de que a sociedade peruana, e em geral, toda a socie- dade andina, é de forte tradição indígena e mestiça, populações estas que têm conservado, de todas as formas imaginadas, as seculares tradições e práticas pré-hispânicas. Se é certo a afirmação de Haya de la Torre de que França Héctor H. Bruit 84 R. Mestr. Hist., Vassouras, v. 5, p. 69-88, 2003 introduziu o liberalismo no continente americano, essa filosofia fundada nas noções de Estado, Nação e individualismo, nunca foi compreendida pelas populações indígenas para as quais não existe a nação peruana, boliviana, equatoriana, chilena; o que existe é uma comunidade quíchua-aimara sem fronteiras nacionais. O Estado liberal é menos compreendido ainda, pois o poder central só poderia estar encarnado na figura do cacique ou do inca. O individuo é sobrepujado pelo coletivo. Depois de vários anos, o pensador peruano parece convencido de que não era possível questionar o nome de América Latina, pois reeditou seu livro com outro título: Examen Espectral de América Latina. (Sánchez, 1945) A reflexão de Sánchez, mereceu um artigo crítico do histo- riador Fernand Braudel nos Annales. O livro é considerado, com razão, “deslumbrante”, porém a crítica é tangencial ao problema central levantado pelo escritor peruano. Braudel não toca explicitamente no assunto de se o continente merece ser chamado de latino, mas desenvolve a tese obvia de que existem varias Américas Latinas, não apenas determinadas pelos contrastes geográficos,mas também pelos contrastes políticos, culturais e econômicos. A debilidade deste livro, na opinião de Braudel, é sua estrutura monocrômica, seu empenho em suprimir as diferenças, de querer reduzir os problemas a um problema só. Acaso, implicitamente, Braudel rejeitava a latinidade do continente na medida que esta quer impor uma uniformidade incômoda (Braudel, 1948). Pensamos, que o nome América Latina se estabelece definiti- vamente após a Grande Guerra. De fato, esse nome se consagra em 1948 quando se funda a CEPAL, Comissão Econômica Para América Latina, como organismo das Nações Unidas. Entretanto, a expressão América Latina se difunde intimamente associada ao conceito de sub-desenvolvimento que aparece na década de cin- A Invenção da América Latina 85R. Mestr. Hist., Vassouras, v. 5, p. 69-88, 2003 qüenta. Então, América Latina passa a ser sinônimo de inestabiliade política crônica; estrutura produtiva atrasada e em certos casos arcaica; dependência total ao capital norte-americano; estrutura fundiária reorganizada pelo ca- pital monopólico; acentuado crescimento demográfico. São estes processos concretos, próprios do século XX, que deram conteúdo histórico à idéia de América Latina. No fundo, o que queremos dizer, é que a questão do nome não é puramente semântica, nominativa. Pelo contrário, envolve realidades históricas concretas e específicas, e estas pertencem ao século XX. O nome de América Latina tornou-se tão popular nos últimos cinqüenta anos, tão expressivo, que já serve não só para designar o difícil século XIX, mas para nomear à América Colonial. É o caso, entre outros, da História da América Latina, editada pelo historiador inglês Leslie Bethell. O volume primeiro, relativo ao século XVI, leva por título: Colonial Latin América. Isto não só é um ato de imprudência historiográfica, mas também e sobretudo, uma forma discriminatória das populações indígenas e negras do continente. O historiador italiano Ruggiero Romano escreveu, com a pru- dência que lhe foi característica, o seguinte: “Ninguém ousaria, e de fato ninguém ousa, falar de latinidade da América na época colonial: o acordo, a esse respeito, é total” (Romano,1973). Parece ser que o acordo não foi nem será respeitado. Héctor H. Bruit 86 R. Mestr. Hist., Vassouras, v. 5, p. 69-88, 2003 Abstract The aim of the present article is to make explicit the invention process that led to the name and Idea of Latin América.The so called “latinidade” and the central concept around Latin América are certainly linked to the cultural consciousness of the whole continent. However, the name did not exist in the mind of the American intelligentsia of the xix century and it became popular only after the Second World War. Keywords latinidade - cultural consciousness - history - literature A Invenção da América Latina 87R. Mestr. Hist., Vassouras, v. 5, p. 69-88, 2003 Referências ABRAMSON, Pierre-Luc. Las Utopías Sociales en América Latina en el Siglo XIX. México: F.C.E., 1999. II Parte, cap. II. ALBERDI, Juan Bautista. Epistolario, 1855-1881. Santiago: Ed. Andrés Bello, 1967. ARDAO, Arturo. “Panamericanismo y Latinoamericanismo”, in Leopoldo Zea (Org.), América Latina en sus Ideas. México: Siglo XXI/ UNESCO, 1986, pág. 157-171. BRAUDEL, Fernand. “Y a-t-il una Amérique Latine? Paris: Annales, E.S.C., n 4, 1948. Congresos Americanos de Lima. Recopilacíon precedida de Prólogo por Alberto Ulloa. Archivo Diplomático Del Peru. Lima: Imprenta Torres Aguirre, 1938. (Vol-2). GARCIA CALDERON, Francisco. Les Démocraties Latines de L’Amérique. Paris: E. Flammarion Editeur, 1914. GARCÍA, Genaro. La Intervención Francesa en México Según el Archivo Del Mariscal Bazaine. México: Porrúa, 1973, vol.54. GUTIERREZ GIRARDOT, Rafael. “Conciencia Estética y Voluntad de Estilo”, in Ana Pizarro (Org.), América Latina. Palabra, Literatura e Cultura. Campinas: UNICAMP/Memorial, 1994, vol. 2 HAYA DE LA TORRE, Victor Raúl. A Donde Va Indoamérica? Santiago: Ed. Ercilla, 1936. MARIÁTEGUI, José Carlos. Obras Completas. Lima: Ed. Amauta, 1994. MARTÍ, José. Cuba, Nuestra América, los Estados Unidos. México: Siglo XXI, 1973, pág. 113. Héctor H. Bruit 88 R. Mestr. Hist., Vassouras, v. 5, p. 69-88, 2003 PHELAN, John. “El Origen de la Idea de Latinoamérica”. In Leopoldo Zea (Org), Fuentes de da cultura latinoamericana. México: F.C.E., 1993, vol. 1, pág. 463-475. RODÓ, José Enrique. Obras Completas. Compilación y Prólogo por Alberto J. Vaccaro. Buenos Aires: Ed. Antonio Zamora, 1956 . RODRÍGUEZ MONEGAL, Emil. El Otro Andrés Bello. Caracas: Monte Avila Editores, 1979. ROMANO, Ruggiero. Mecanismos da Conquista Colonial. São Paulo: Ed. Perspectiva, 1973, pág. 123. RONSIN, Albert. La fortune d’um nom: América. Lê baptême du Nouveau Monde à Saint-Die-des-Vosges. Cosmographie Introductio suivi dês Lettes d’Amerigo Vespucci. Grenoble: Ed. Jérôm Millon, 1991. SANCHEZ, Luis Alberto. Existe América Latina? México, F.C.E. Ex- amen spectral de América Latina, Buenos Aires: Losada, 1962 (1945). SARMIENTO, Domingo Faustino. Conflicto Y Armonia De Las Razas en América, in Leopoldo Zea (Org.) Fuentes de la Cultura Latinoamericana. México: F.C.E., 1993 (1883), vol. 1, pág. 401-411. VASCONCELOS, José. Bolivarismo Y Monroísmo. Temas iberoameri- canos-Santiago: Ed. Ercilla, 1945.
Compartilhar