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3- Arquitetura como expressão do lugar

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TEXTO 03
ARQUITETURA COMO EXPRESSÃO DO LUGAR
Este texto defende a idéia de que o gesto arquitetônico e a postura do arquiteto são atitudes que devem ser regidas pela ética comprometida com a instituição / pessoa abrigada, com o significado do que cria, com a cultura na qual estão imersos e com a natureza local, quando o objetivo é a produção de uma arquitetura que expresse o “lugar” na qual está inserida. 
Inicialmente, é importante esclarecer que ética não pode ser confundida com moral, neste texto ética deve ser basicamente entendida como o estudo das relações que se estabelecem a cada caso. 
A arquitetura por sua vez, é um jogo de relações: criação e natureza, cheios e vazios, figura e fundo, criador e criatura. Cada relação tem suas próprias regras e que o respeito a essas regras é o verdadeiro compromisso ético de cada um com os agentes envolvidos.
A postura de respeito abre caminho para o entendimento do que parece ser hoje diretriz para o conhecimento e intervenção o mundo: a postura sistêmica. Temos que entender que vivemos em sistemas inter-relacionados, e que cada ação resulta em uma reação positiva ou não para as futuras gerações. 
1- Compromisso ético com a instituição / pessoa abrigada
Se ética diz respeito ao estudo das relações, a arquitetura que enseja essas relações é tarefa ética por natureza. E se qualquer relação é baseada na existência de partes que interagem, certamente o arquiteto é uma delas e não pode se eximir de sua contribuição. 
O arquiteto funciona cotidianamente como ponte entre o desejo e a matéria. Pelo arquiteto passam as vontades de cada pessoa que lhe encomenda a materialização do seu sonho, da sua forma exclusiva de ser e estar no mundo. Assim, cada projeto deve ser o resultado da relação entre arquiteto e cliente.
2- Compromisso ético com o significado do que cria
É importante a consciência de que cada arquiteto interpretará de forma única o desejo do cliente e que este deve ter compromisso ético com o significado do que cria, em face do perigo de se povoar o mundo de formas vazias.
Historicamente a arquitetura tem sido a marca mais exposta e reveladora das visões particulares de mundo. Foi assim, por exemplo, no maneirismo, com sua incerteza e fragmentação, é assim no deconstrutivismo, com sua leveza, sua multiplicidade de eixos e sua desmaterialização, tão consoantes com o mundo contemporâneo. 
3- Compromisso ético com a cultural na qual estão emersos	
	
O arquiteto cria a imagem da cultura: uma ambiência fisicamente presente que expressa os padrões funcionais, rítmicos característicos que constituem uma cultura. 
Arquitetura como concretização e materialização do espírito do homem no mundo físico. Sem esse fundamento, qualquer obra seria vazia, mera especulação, forma pela forma. Caso existisse um projeto para um acampamento de ciganos, deveria ser projetado um “lugar” completamente diferente de um acampamento indígena, por exemplo, embora pudessem ser localizados em um mesmo lugar geográfico.
4- Compromisso ético com a natureza local	
Vale salientar que a ética do relacionamento da arquitetura com a sociedade se faz desde a forma de implantação do edifício até sua opção tecnológica, ou como diria Juan Mascaro: às decisões arquitetônicas têm um custo. 
Os impactos ecológicos da prática arquitetural não são pequenos e interferem na nossa relação com a natureza e a posteridade. O que se vê atualmente são decisões arquitetônicas que implicam na utilização de tecnologias desperdiçadoras de recursos e em padrões de consumo preocupados apenas com o custo inicial ou altamente consumidores de bens não renováveis, e energia. 
A ética com a natureza pressupõe, além da harmonia com o lugar e da redução dos impactos ecológicos, o equilíbrio entre o “habitat” natural e cultural. A arquitetura dita bioclimática coloca pontos importantes a respeito da integração com o meio cultural, natural e social; maximização do uso de trabalhadores e materiais locais, minimizando importações; apropriação do clima local como elemento de projeto, minimizando equipamentos mecânicos; adequação ao atendimento as necessidades sociais básicas da região em que se localiza.
5- Exemplos	
Não são poucos os exemplos de obras arquitetônicas que expressam o local na qual estão inseridas. 
Na arquitetura vernacular, exemplo significativo é a aldeia dos índios Pueblo, no novo México, onde a sua organização compacta em semicírculo, com as aberturas voltadas para o Sul, (onde está o sol no hemisfério Norte) e as faces cegas voltadas para o Norte (de onde vem o frio). A disposição da aldeia também tem grande relação com os costumes e visão de mundo da sua cultura. O sol, dentro da sua concepção panteísta, é também uma divindade que todos referenciam e para qual se voltam cotidianamente, enquanto devem se protegem dos maus espíritos que vêm do Norte. Por outro lado, a compacidade do assentamento revela o caráter gregário (vivem em bando) da tribo, com as individualidades harmonicamente assentados em torno de um pátio comum.
Quanto a arquitetura não vernacular, podemos citar como exemplo o Panteón de Roma, templo encimado por uma cúpula, onde a iluminação, que provém de uma abertura circular no alto da construção, reflete-se nas paredes laterais e ganha uma qualidade difusa (MOORE 1991). Este edifício revela o caráter do ideal romano à época e sua visão de mundo: o cosmo estruturado, Roma como centro do mundo e a conexão com o divino pelo eixo vertical que liga o centro da esfera aos céus.
Até meados do século XX, o arquiteto se via, de certo modo, obrigado a considerar as condições climáticas para o projeto do envoltório das edificações; era preciso conhecer com certos detalhes os efeitos positivos e negativos do da natureza do local, para o desenvolvimento de estratégias adequadas ao seu aproveitamento ou rejeição.
A partir do surgimento do estilo internacional, desenvolveu-se um modo de projetar cada vez mais desvinculado das especificidades culturais e climáticas do sítio. Mies van der Rohe, com suas “cortinas de vidro”, criou um verdadeiro ícone de edifícios de escritório. O conseqüente “edifício estufa” foi assim exportado como um símbolo de poder, sem sofrer readaptações às características culturais e climáticas do local de destino. 
No entanto, alguns edifícios do século XX de estilo pós-moderno, high-tec, construtivista e o deconstrutivista mostram experiências significativas de preocupação crescente dos arquitetos com a melhoria da qualidade da edificação.
A poderosa cascata no pavilhão de Sevilha do arquiteto Nicholas Grimshaw, por exemplo, fez com que o edifício consumisse apenas um quarto da energia que seria necessária se fosse climatizado com ar condicionado.
O instituto do mundo árabe de Jean Nouvel teve sua fachada mais importante revestida com dispositivos em forma de diafragma que lembra a tapeçaria árabe. Estes elementos têm sua forma controlada eletronicamente, criando diferentes condições de iluminação e oferecendo proteção contra o sol.
Na contemporaneidade pós-moderna, tempos de individualismo e relações virtuais, sem desprezar o belo e a plasticidade das formas, a arquitetura terá que forçosamente reencontrar o meio ambiente cujo equilíbrio é de fundamental importância para sobrevivência da espécie humana na terra. 
A arquitetura tem compromisso com o lugar e com o espírito que o habita, não há mais o lote como entidade abstrata, unidade de operação fora de qualquer vizinhança. Cabe ao arquiteto a interpretação do lugar único, uma vez que não tem mais sentido o trabalho descontextualizado, como se o objeto arquitetônico pairasse desvinculado do sítio ou do entorno onde se insere.

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