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5 -Arquitetura solar em Machu Picchu

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TEMA: ARQUITETURA VERNACULAR
Em Machu Picchu, um modelo pioneiro da arquitetura solar
Enéas Macedo Filho, em Folha de São Paulo de 31/08/1980
	Habitar uma cidade energeticamente auto-suficiente graças ao aproveitamento das radiações solares não será um privilégio das próximas gerações. Há pouco mais de 500 anos, toda a população incaica de Machu Picchu, no altiplano dos Andes, já se servia desta modalidade energética para o aquecimento de suas residências, que, aliás, eram concebidas em padrões de arquitetura solar, semelhantes aos desenvolvidos atualmente nos mais avançados centros de pesquisas norte-americanos.
	A constatação foi feita por um pesquisador brasileiro, Reinaldo Escada Chohfi, ao final de dois anos de estudos daquelas ruínas peruanas. Durante este tempo, ele descobriu outros detalhes igualmente fascinantes, como a localização privilegiada de Machu Picchu, que lhe garantia temperatura amena no verão e fresca no inverno, com o armazenamento quase homogêneo de calor nas duas estações. 
	Ao lado destas revelações, que por si só irão ajudar no desenvolvimento das atuais tecnologias solares, outra importante frente de pesquisas será aberta a partir do potencial climático de Machu Picchu. Brevemente, o local será usado como laboratório climático, no qual serão observadas importantes mudanças no clima do planeta, como resultado da crescente devastação da Amazônia.
A ENERGIA RACIONAL
	Do pouco que se conhece da história de Machu Picchu, consta que ali habitavam pessoas especiais do império Inca, que cultuavam o Sol, com uma veneração que era zelada pelas “Virgens do Sol”. Mas a curiosidade de Reinaldo Chohfi não foi despertada por estes detalhes, mas sim pelas fotos das ruínas, que o motivaram para uma pesquisa solar mais profunda no local.
	Isto aconteceu em 1978, e Arnaldo, que na época já estudava planejamento de cidades selares no Cabrillo College, na Califórnia, começou imediatamente a levantar os dados climáticos de Machu Picchu. Neste trabalho preliminar, ele já pôde observar que toda a orientação da cidade era dirigida para um maior ganho das radiações solares.
	Inicialmente, constatou que Machu Picchu foi orientada ao Leste, assim como as janelas de todas as casas, a fim de que fosse possível a penetração dos raios selares matutinos no interior das residências. As paredes principais das casas, voltadas para a mesma direção, foram construídas em posição inclinada, para funcionarem corno verdadeiros coletores solares. A cidade possuía cerca de 200 edificações, dispostas em vários níveis, para que todas pudessem receber igualmente as radiações, e eram separadas, o que garantia um perfeito isolamento térmico.
	Um detalhe que deixou o especialista brasileiro muito impressionado foi o emprego de terra como aterro das paredes dos fundos das casas, o que servia como isolante térmico. Finalmente, Reinaldo constatou que o lay-out da cidade obedecia a um zoneamento solar perfeito, com casas retangulares, tendo seu lado maior voltado para o Leste.
	“Para quem não sabe, é bom que se diga que todos estes detalhes observados constam da mais avançada técnica da arquitetura solar. O zoneamento solar que existia em Machu Picchu sequer foi ainda empregado em projetos urbanísticos atuais. É bom recordar também que aquela cidade foi totalmente auto-suficiente em energia. E uma sociedade que habita uma cidade nestas circunstâncias, tem um comportamento muito diferente das sociedades atuais.A independência energética assegura uma grande estabilidade social e política, além de uma excepcional situação econômica. Isto sem dizer que, pela reduzida perda da energia térmica do organismo humano, os habitantes de cidades como Machu Picchu atingem um excelente desenvolvimento intelectual, fato notório ocorrido com os incas” – explica Reinaldo Chohfi.
	As construções daquela cidade – acrescenta o pesquisador –, tinham outras características térmicas, de princípios técnicos idênticos aos desenvolvidos atualmente. Foi o caso das paredes das residências, que se resumiam em duas seções de pedras com terra no meio. Para obter semelhante isolamento térmico, hoje nos EUA se usa duas placas de madeira prensando uma outra de fibra de vidro. 
	
	Na opinião de Reinaldo, Machu Picchu já poderia ser considerada uma cidade solar semente pela sua localização. Ao analisar os registros climáticos de uni período de 10 anos, Chohfi constatou que, nos dias de verão, Machu Picchu fica coberta por nuvens que bloqueiam a radiação direta e o superaquecimento. À noite, estas nuvens descem, conservando o calor como numa estufa. Nos dias de inverno, a presença destas nuvens é tão maciça, a radiação é mais intensa e o calor também é parcialmente conservado à noite, pela mesma forma de nuvens baixas. Além disto, nos dias de inverno há uma série de nuvens que se fixam nos picos circundantes a Machu Picchu, atuando como refletores da radiação, que é convergida para a área da cidade.
	Outro subproduto desta excepcional situação climática, conforme detectou Reinaldo Chohfi, foi a agricultura, que em Machu Picchu atingiu safras e níveis de qualidade das culturas únicos em todo o império incaico.
	Nos próximos quatro anos o pesquisador brasileiro pretende concluir os estudos solares a respeito de Machu Picchu, que serão apresentados em tese de doutoramento. Durante este período, ele construirá uma maquete da antiga capital inca, que será observada em laboratório, sob o efeito de um sol artificial. Ao final destas experiências, Chohfi pretende aperfeiçoar a tecnologia existente.
	“A arquitetura solar é a mais moderna que existe. É o urbanismo com a dinâmica da terra, e não contra, como ocorre hoje. Aliás, nos Estados Unidos há toda uma preocupação com o tema e também existe algo que poderia classificar de consciência solar. Aqui no Brasil não tem nada disto, apesar de possuirmos um potencial de radiação solar superior. Para se ter uma idéia do disparate energético entre os, dois países, basta ver que, neste ano, os Estados Unidos vão acionar a primeira usina solar para a geração de eletricidade e, futuramente, quando este número de usinas crescer, eles irão desligando gradualmente suas centrais nucleares. Enquanto isto, o Brasil estará ligando suas primeiras usinas nucleares. Acho que isto – conclui Reinaldo Chohfi – exemplifica bem os desacertos da nossa política energética”.

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