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Em prol do Direito dos Animais

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Texto enviado à Revista Juris Poiesis 
 
OLIVEIRA, Fábio Corrêa Souza de; LOURENÇO, Daniel Braga. 
Em prol do Direito dos Animais: inventário, titularidade e 
categorias. Jurispoiesis (Rio de Janeiro), v. 12, p. 113-157, 2009. 
 
 
TÍTULO: 
 O direito ao Direito dos Animais: 
notícias, titularidade e categorias. 
 
 
Fábio Corrêa Souza de Oliveira1 
Daniel Braga Lourenço2 
 
Resumo:	
  
Este artigo pretende abordar os principais avanços relativos ao tema dos direitos dos 
animais. Analisam-se a importância e a evolução da temática assim como a sua 
validação filosófica. A filosofia dos direitos dos animais coloca marcada ênfase na 
discussão dos direitos dos animais propriamente ditos. Aborda-se a distinção conceitual 
entre as concepções do bem-estar animal e a dos direitos dos animais, já que a última 
demanda, de modo mais intenso e amplo, a abolição das instâncias de exploração dos 
	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  
1 Professor Permanente do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Direito da Universidade Estácio 
de Sá (UNESA), Professor Adjunto de Direito Constitucional da Universidade Federal do Estado do Rio 
de Janeiro (UNIRIO) e Coordenador do Núcleo de Direito Constitucional do IBMEC/RJ. Mestre em 
Direito e Doutor em Direito Público pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Pesquisador 
Visitante e Pós-Graduação Lato Sensu na Faculdade de Direito de Coimbra (2004 – CAPES). Pós-
Doutorando em Teoria do Estado e Teoria da Constituição na Universidade Federal de Santa Catarina 
(UFSC) (2007-2009 – CNPQ).	
  
2 Professor de Biodireito e Direito Ambiental da Faculdade de Direito da Universidade Federal Rural do 
Rio de Janeiro - UFRRJ. Doutorando em Direito pela UNESA na área de “Direitos Fundamentais e 
Novos Direitos” e Mestre em “Direito, Estado e Cidadania” pela Universidade Gama Filho - UGF/RJ. 
Especializou-se em Direito do Petróleo Avançado pelo Clube do Petróleo/COPPE e em Direito Ambiental 
pela Fundação Getúlio Vargas - FGV/RJ, onde também possui MBA em Direito Econômico e 
Empresarial. É advogado membro do “Animal Legal Defense Fund” - ALDF (Profesional Volunteer), da 
Humane Society e Professor Colaborador do Centro de Bioética da Universidade de Harvard. Acumula os 
cargos de Diretor Jurídico do Instituto Abolicionista Pelos Animais - IAA e Assessor Jurídico da ONG 
Espaço Gaia, ambos trabalhos voluntários. Integra os Conselhos Editoriais da Revista Brasileira de 
Direito Animal, da Editora Evolução e da Revista Eletrônica Pensata Animal. É autor da obra “Direito 
dos Animais: Fundamentação e Novas Perspectivas” (Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 2008, 566p.) e 
de artigos científicos relacionados ao Direito Ambiental, Ética Ambiental, Bioética, e Direito dos 
Animais. 
animais. O debate dos direitos dos animais insere-se, portanto, como tema de relevantes 
questionamentos no campo da filosofia, da ética normativa e do próprio Direito. 
 
Palavras-chave: Animais, direito dos animais, bem-estar animal, ética, 
 
Abstract: 
 
This article documents and analyses the key developments relative to the general 
premises of animal rights. It shows the importance and the evolution of the category as 
well as its philosophical validity. Few areas of applied philosophy have witnessed more 
dramatic growth in the recent past than has bioethics and, relative to the animal issue, 
the morality of turning animals into food, clothes, performers, competitors and tools for 
research. In addition, the philosophy of animal rights has had a significant influence on 
the reinvigoration of the animal rights plea in the sense that at least some nonhuman 
animals arguably possess the capacity to have interests of their own that should be 
protected by fundamental rights. The article focuses on the distinction between the 
animal welfare and the animal rights view, as the former perspective requires, in a broad 
sense, the abolition of human exploitation of these animals. The animal righst debate, 
broadly conceived, is an enduring topic in philosophy, normative ethical theory and law. 
 
Keywords: Animals, animal rights, animal welfare, ethics, 
 
 
I. NOTA INICIAL 
 
 Este estudo está afinado, especialmente, à linha Direitos fundamentais e novos 
direitos, um dos dois eixos temáticos desenvolvidos pelo Programa de Mestrado e 
Doutorado em Direito da Universidade Estácio de Sá. O título da linha não poderia ser 
mais talhado a abarcar a perspectiva aqui esposada; como se diz comumente, cai como 
uma luva. Isto seja pela expressão direitos fundamentais, seja pela expressão novos 
direitos. 
 Expõem-se e defendem-se, neste texto, novos direitos integrantes de um novo 
Direito, enquanto cadeira, ramo do conhecimento, qual, o Direito dos Animais. E, nesta 
esteira, direitos fundamentais para além da espécie humana, direitos fundamentais dos 
animais (não-humanos), com o que se poderia, em certa medida, retratar como novos 
direitos fundamentais. A nomenclatura é feliz: direitos fundamentais e não direitos 
humanos, vez que mais larga, holística, capaz de manifestar o reconhecimento de que 
outros seres, para mais dos humanos, têm dignidade intrínseca, direitos próprios. 
 A vertente Direitos fundamentais e novos direitos, como flagrantemente 
explicita o seu título, traz uma carga visionária, manifesta cláusula aberta, dirige os 
olhos para o futuro ainda quando não o (ante)veja ou vislumbre. A presente 
investigação se propõe a oferecer sinalizações de um vindouro possível. Que seja 
melhor para todos os viventes, a natureza, o planeta, irmanados, onde espera a 
emancipação daqueles hoje submetidos pela força, contra a vontade, escravizados, 
instrumentalizados, ceifados. O dominador a que estamos de apontar, dada a sua 
condição moral, frente às escolhas que faz, o juízo entre certo e errado, é, imperioso 
admitir, nesta lei da selva, o homem. O porvir, conquanto não esteja, ao menos em 
parte, encampado pelo dever-ser do sistema jurídico vigente. Por isto, parcialmente, é 
compreensão de lege ferenda. Se o presente é o passado do futuro, façamo-lo desde já. 
 Um último registro de começo. Como ficará patente ao longo do trabalho que se 
apresenta, o reconhecimento do Direito dos Animais não se dá por caridade humana, 
não está a depender do alvedrio do homem. É preciso, neste ponto, inverter o 
referencial. Rompe-se, nesta pedra de toque, com o antropocentrismo: o homem é a 
medida de todas as coisas (Protágoras). Não é o homem que dá o Direito, que confere 
os direitos. O homem não é senhor, amo. A humildade é bem-vinda. Ele, em um 
raciocínio, sentimento, de equivalência, como antes dito, reconhece. Em que pese o 
caráter histórico das elaborações humanas, o contato entre sujeito e objeto, entende-se 
que a afirmação do Direito dos Animais é dever humano, correspondente ao direito dos 
animais a terem os seus direitos aceitos, respeitados. Daí porque notar e acolher o 
direito ao Direito dos Animais. 
 
II. INTRODUÇÃO3 
 
 Em meio ao conjunto de novidades concebidas na Ciência Jurídica, há uma que 
se afigura como a maior, o grande novel, pois que de raiz, novidade de fundo, quebra de 
paradigma nuclear. Não é mais do mesmo e nem variação acerca do mesmo tema: os 
direitos humanos. A novidade fulcral, sob qualquer ângulo, é o despontar, o paulatino 
avanço e difusão do que se vem a chamar de Direito dos Animais. 
 Muito embora a progressiva aceitação do Direito dos Animais pela comunidade 
acadêmica e jurídica em geral, segue ordinariamente percebida com ares de 
estranhamento, de excentricidade. Às vezes, com incredulidade ou com escárnio.Fazendo uma analogia com a teoria dos movimentos sociais tal qual proposta por John 
Stuart Mill, pode-se dizer que a recepção ao Direito dos Animais passa, 
costumeiramente, por três estágios: 1º) ridicularização, 2º) oposição violenta e 3º) 
aceitação.4 Se é assim, poder-se-ia cogitar que a esmagadora maioria da humanidade 
está situada no primeiro ou no segundo estágio. Porém, não parece ser deste modo. É 
que a posição amplamente majoritária é a da indiferença. E a indiferença é, em muitas 
ocasiões, sinônimo de ignorância. Ninguém pode se importar com o que desconhece, 
não existe estreitamento, conexão. O curioso, nesta seara, é que o saber está a um passo 
	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  
3 Em considerações desta matiz, OLIVEIRA, Fábio Corrêa Souza de. Direito dos Animais. In: Função 
social do Direito Ambiental. (Coord. Mauricio Mota) Rio de Janeiro: Campus, p. 324-347, 2009. 
4 Tal analogia é feita pelo importante documentário Terráqueos (Earthlings), produção estadunidense de 
2005. Documentários constituem uma excelente fonte de conscientização, com alto impacto na questão 
dos animais (uma imagem vale mais do que mil palavras). Na produção brasileira, entre outros, veja-se A 
carne é fraca, feito pelo Instituto Nina Rosa. 
curto, muito perto, bastando atentar para o entorno, para o que se processa diante de nós 
a cada dia: animais enjaulados em zoológicos, pássaros em gaiolas, animais criados e 
abatidos para alimentação e/ou vestuário, caça esportiva, animais sacrificados em 
supostas práticas religiosas, animais em circo, touradas, rinhas, e.g. 
 Todavia, é devido observar que a indiferença não é conseqüência tão somente da 
ignorância. Pode-se ser indiferente também àquilo que se sabe. E, no que tange aos 
animais, tal atitude é igualmente freqüente. Tanto que muitos preferem não saber mais 
para não verem as suas convicções ou comportamentos abalados. Daí outra barreira, às 
vezes de dificílimo vencimento ou até intransponível, que o caminhar do Direito dos 
Animais enfrenta: a decisão deliberada por não tomar ciência. É compreensível: uma 
postura de preservação, de manutenção de hábitos, de uma tradição, de um sentido de 
conforto. É que o Direito dos Animais impõe descentrar ou centrar o homem em outro 
lugar, sobre outros pilares. Uma acentuada transição de paradigmas: intensamente 
revolucionário, algo similar à virada copernicana. E mudanças drásticas não costumam 
acontecer sem estremecimentos, resistências, sem notas dramáticas, sem rompimentos, 
sem perda ou, melhor, troca. A questão pode gerar desconforto, ferir suscetibilidades. 
Vale observar que inclusive entre os especialistas, os doutos, entre os cultores 
dos direitos fundamentais, do Direito Ambiental, predomina, usualmente, a falta do 
saber ou da reflexão, a desídia pela matéria, o descuido. Normalmente, a meditação é 
centrada no homem, o único personagem, o mais é contexto, figurante, paisagem. 
Muitos respondem: com tantos e graves problemas humanos, não é cabível se ocupar 
dos animais. Em uma ilustração singela: diante do grande número de seres humanos 
vivendo nas ruas, sem o mínimo existencial, soa absurdo pensar e agir a bem dos 
animais que também estão ao léu, abandonados, sujeitos a toda sorte de infortúnios, 
violências, doenças, fome, sede, frio. É sentença consoante o paradigma da 
simplicidade (Edgar Morin), tributária de sistema binário, disjuntivo, que opera na 
exclusão, uma lógica dualista, maniqueísta, incapaz de absorver a complexidade do 
problema. Não existe alternativa: é preciso escolher entre o homem e o animal, que 
estão em oposição. Este juízo de confrontação, o qual de pronto coloca o interesse 
humano acima de qualquer outro, não permite a integração. 
Basta ver a produção jurídica brasileira tradicional ou convencional para atestar 
como a abordagem é incipiente. Quase sempre a temática passa despercebida ou 
depreciada, tanto pela literatura quanto por eventos (congressos, palestras, debates). 
Mas, como já aduzido, há, também no cenário acadêmico nacional, uma novidade, uma 
doutrina diversa da corriqueira, uma outra tese que, embora seja ainda bem minoritária, 
vem ganhando espaço, adeptos, e a passos largos. Nada obstante a sua pouca idade, 
conta cerca de uma década, já tem motivos de sobra para ser celebrada. Segue um 
ligeiro inventário. 
Obra precursora é Direito dos Animais, que data de 1998, autoria de Laerte 
Fernando Levai. Dois anos após vinha a público o livro A tutela jurídica dos animais, 
de Edna Cardozo Dias. No ano seguinte, Direito dos Animais, de Diomar Ackel Filho. 
Na seqüência, em 2003, O Direito & os animais, de Danielle Tetü Rodrigues. Mais 
recentemente, em 2008, Os animais e o Direito, de Eduardo Luiz Santos Cabete, e 
Direito dos Animais: fundamentação e novas perspectivas, de Daniel Braga Lourenço, 
além da obra coletiva intitulada A dignidade da vida e os direitos fundamentais para 
além dos humanos: uma discussão necessária. No corrente ano, 2009, o livro 
Abolicionismo animal, de Heron José de Santana Gordilho. No ano de 2007 foi lançada 
a Revista Brasileira de Direito Animal, única publicação do gênero no Brasil. Cumpre 
destacar também a produção de Sônia Felipe: entre outros textos, os livros Por uma 
questão de princípios: alcance e limites da ética de Peter Singer em defesa dos animais 
e Ética e experimentação animal: fundamentos abolicionistas, assim como lembrar das 
preciosas contribuições de Rita Leal Paixão, Tamara Bauab Levai, João Epifânio Regis 
Lima, Sérgio Greif e Thales Trez (relativamente ao tema da experimentação animal) e 
de Carlos Naconecy (fundamentação ética dos direitos dos animais). 
É fácil perceber o acentuado aumento de atenção que a matéria vem 
conquistando na academia. Dissertações e Teses de Doutorado, inclusive entre a 
bibliografia antes citada; bem como Monografias de Graduação e de Pós-Graduação 
Lato Sensu. No Mestrado em Direito da Universidade Estácio de Sá foi defendida, no 
ano passado, a Dissertação Tutela dos direitos dos animais, de Mery Chalfun. Com 
defesa prevista para 2010, escreve sobre o tema, no Mestrado em Direito da UNESA, 
Tatiana Marselha. Ainda no Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Direito da 
UNESA funciona atualmente, segundo semestre de 2009, a partir da iniciativa da 
Professora Renata Braga Klevenhunsen, Coordenadora Adjunta do Programa, Grupo de 
Estudos em Direito dos Animais. 
 Na Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia (UFBA) funciona o 
Núcleo Interdisciplinar de Pesquisa e Extensão em Direito Ambiental e Direito Animal, 
onde trabalha o Professor Heron Gordilho. Até o final deste ano está agendada, na 
UFBA, a defesa da Dissertação de Tagore Trajano, denominada Animais em juízo: 
personalidade, capacidade e direitos. Na Universidade Federal de Santa Catarina, no 
Departamento de Filosofia, há pesquisa institucionalizada acerca do assunto, sob a 
liderança da Profa. Sônia Felipe. Digna de nota é a pioneira iniciativa da criação da 
cadeira Direito dos Animais na recém-criada Faculdade de Direito da Universidade 
Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ). Na UFRRJ, o aluno, se optar pela 
especialização em Direito Ambiental, após cursar a disciplina Direito Ambiental, que é 
obrigatória, no 8º período, irá passar por seis cadeiras específicas ao longo do último 
ano. Dentre elas, necessariamente, Direito dos Animais. 
Em 2008, na UFBA, teve lugar o I Congresso Mundial de Bioética e Direito dos 
Animais, promoção conjunta da UFBA e do Instituto Abolicionista Animal (IAA). Na 
Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC/RJ), em fins de julho do ano 
que segue, aconteceuo 12º Festival Internacional Vegano, realizado pela Sociedade 
Vegetariana Brasileira (SVB). Na mesma época, ocorreu o I Encontro Carioca de 
Direito dos Animais, no auditório da Procuradoria-Geral do Município do Rio de 
Janeiro (PGM/RJ). 
No que tange ao Poder Judiciário, vale registrar duas decisões proferidas pelo 
Supremo Tribunal Federal. No Recurso Extraordinário nº 153.531-8-SC, o STF julgou a 
nefasta prática intitulada farra do boi, que mais apropriadamente seria denominada 
farra com o boi, pois o animal, a toda prova, não se diverte – e é muito espantoso que 
algum humano se divirta (lazer) com tal ato ignóbil –, ao contrário sofre, é lesionado 
(com pedras, facas, paus, queimaduras), morto, fere a Constituição. Apesar da 
proibição, o funesto costume, que habitualmente tem ocasião na época da Semana Santa 
– nada mais contraditório – continua a acontecer. Na Ação Direta de 
Inconstitucionalidade nº 1.856-RJ, o Supremo declarou a inconstitucionalidade da lei do 
Rio de Janeiro que regularizava a rinha de galo, outra prática lúgubre, sombria. 
Atualmente, aguarda julgamento, no STF, o Recurso Extraordinário nº 494.601-RS, que 
impugna lei do Rio Grande do Sul que autoriza o sacrifício de animais não-humanos em 
nome da liberdade de culto. O preceito constitucional especialmente em causa, como 
notório, é o art. 225, § 1º, VII, in verbis: 
 
“Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, 
bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-
se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo 
para as presentes e futuras gerações. § 1º Para assegurar a efetividade desse 
direito, incumbe ao Poder Público: (...) VII- proteger a fauna e a flora, 
vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função 
ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a 
crueldade.” 
 
Também a rinha de galo – computadas as variações, igualmente macabras, como 
rinha de cachorro – permanece a acontecer, muito embora a decisão do STF. Em 29 de 
outubro de 2009, noticiou-se que a polícia civil estorou, na cidade de Volta Redonda, 
uma das maiores rinhas de galo do Estado do Rio: cerca de 120 animais foram 
apreendidos, muitos com ferimentos graves, mutilados, cegos. No dia 4 de novembro 
deste ano, segundo reportagem veiculada pelo Jornal da Paraíba, a juíza da 5ª Vara da 
Fazenda da Capital, Maria de Fátima Lúcia Ramalho, averbou que a rinha de galo é uma 
prática lícita (legal, constitucional), sustentando tratar-se de esporte milenar sem 
nenhuma vedação pelo ordenamento normativo pátrio. E a polêmica, mais uma vez, se 
fez. O que espanta deveras é a ignorância do julgado antes aludido do STF (ADI nº 
1.856-RJ), o qual, vez que em controle concentrado/abstrato, opera eficácia erga omnes. 
Logo, a referida decisão que avalizou o galismo não poderia ter sido tomada, sob pena 
de desrespeito ao Supremo Tribunal Federal. 
Na questão do relacionamento entre humanos e animais, a cultura vem 
ostentando papel ainda mais forte, como justificativa de ações, do que aquele 
desempenhado nas questões entre humanos, apesar de filosoficamente inconsistente 
(senso comum). O apelo à cultura é curioso, inúmeras vezes paradoxal e evidencia 
claramente incoerências e o tanto que há a mudar na conduta humana perante os 
animais. Um exemplo demonstra otimamente o que se diz. Enquanto redigimos este 
artigo a opinião pública, ou parte dela, está estarrecida – não que não deva estar, 
inclusive nós – com a notícia de que se descobriu na cidade de Suzano, na Grande São 
Paulo, um abatedouro de cachorros e gatos, que eram recolhidos nas ruas, engordados e 
posteriormente mortos para consumo preferencialmente por orientais (a maior parte da 
carne era encomendada por restaurantes coreanos). O local, segundo a polícia, 
funcionava há pelo menos três anos.5 
Razão para se assombrar com a notícia não falta. Mas, a pergunta é: por que se 
abalar apenas quando o processo do morticínio é respeitante aos cães ou aos gatos? E os 
bovinos, os porcos, os galináceos, os patos, as codornas? O ponto, como se vê, está na 
discriminação, arbitrária no que toca ao direito (à vida, entre outros) dos animais, ao 
	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  
5 Veja-se trecho da reportagem: “De propriedade de um casal, que foi preso em flagrante nesta quinta, o 
abatedouro ficava nos fundos de uma casa. “Eles matavam com um machado e, depois, queimavam o 
couro com maçarico”, afirmou o delegado Anderson Giampaoli, da 2ª Delegacia de Saúde 
Pública. Semanalmente, eram vendidas dez carcaças, cada uma variando entre R$ 180 e R$ 220, diz a 
polícia. (...) No freezer da casa, a polícia encontrou 70 quilos de carne, que incluía, além dos cães, dois 
gatos inteiros. Segundo os investigadores, o dono da casa contou que pegava qualquer animal na rua. 
Alguns eram mantidos no quintal esperando pela encomenda.” Disponível em: 
http://g1.globo.com/Noticias/SaoPaulo/0,,MUL1376300-5605,00.html. Acesso em 16 nov. 2009. 
sabor (com o perdão da figura – ou dissabor) da cultura. Assim, ingerir determinada 
carne pode ser convencionalmente admitido, na dependência da cultura de cada 
comunidade, ou pode receber o rótulo de carne exótica. E o comércio da tal carne 
nomeada de exótica, lucrativo, considerado refinado, símbolo de status, em um mundo 
onde a vida e o corpo são mercadorias, é crescente. Carne de cavalo, de jacaré, de tatu, 
de capivara, de rã, de javali, de avestruz, entre tantos outras. Por que a morte de uns não 
gera estranhamento ou ojeriza e de outros sim? Tom Regan, no livro Jaulas vazias, faz 
um relato similar para chegar à conclusão da incongruência do juízo do homem-médio.6 
A coisificação dos animais é decorrência de uma pré-compreensão antiga, 
arraigada, não refletida e insensível, que tem base inclusive na religião enquanto 
fenômeno histórico. E, desta feita, os animais não-humanos, de acordo com o 
pensamento comum, interpretação do direito positivo, ocupam um limbo jurídico: nem 
são sujeitos de direito e nem são objetos no significado clássico, com os seus caracteres 
tradicionais. Em um exemplo: nós podemos queimar uma camisa de nossa propriedade, 
mas não podemos fazer o mesmo com os cães que a lei nos concede em domínio, isto é, 
a condição de dono que a legislação atribui não permite poder ilimitado sobre a coisa, 
não é dado fazer o que for com ela. E isto, note-se, independente de prejuízo causado a 
outro ser humano. Sumamente incrível, terrível, é, em uma formulação antropocêntrica, 
afirmar que se o seu cachorro tem a pata cortada ou os olhos arrancados pela maldade 
alheia, por um vizinho destemperado – e a ilustração não é de laboratório, não é rara, os 
animais variam e os algozes também, contam-se motivos dos mais torpes –, não é o 
próprio animal, o qual suportou a dor e agora se vê mutilado, que teve direito aviltado, 
não é ele, a rigor, a vítima, e sim você, porque afrontado no seu estado de proprietário. 
O animal? É coisa! 
A concepção antropocêntrica embala o especismo. Especismo é o preconceito 
alicerçado na espécie, discriminação contra as outras espécies, atribui direitos aos 
membros de uma espécie em detrimento das demais, ou seja, o critério é o 
pertencimento ou não à espécie. Espécie humana, claro. Desconsideram-se os interesses 
dos outros seres, tornados objetos, instrumentos do homem. Desconsideram-se fatores 
de igualdade, como a capacidade de sofrer, de sentir dor, o direito à vida, à liberdade. É 
binário, simplista: dentro (da espécie humana, titular de direitos) ou fora (da espécie 
humana, não possuidor de direitos). Porém,esta noção vem denotando sinais de 
enfraquecimento, de desgaste, mostra-se insuficiente, é cada vez mais questionada, 
abandonada. Uma (outra) virada copernicana está em curso. 
 
III. VOZES DISSIDENTES 
 
Conforme se verificou, restou consolidada no âmago da moralidade ocidental a 
visão de que o homem ocupa o centro de todas as preocupações. Nesse sentido, fácil é 
verificar que a maioria esmagadora dos sistemas jurídicos opera sob as bases da 
dicotomia pessoa-coisa(animal) e que, portanto, a história das sucessivas gerações de 
direitos passa a ser identificada como uma forma de inclusão social e jurídica da própria 
espécie humana e tão somente dela. Artificialmente construiu-se a ideia de que a 
categoria humano é a única fundante e coincidente com a noção de “direito”. 
	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  
6 “Pelas razões que explico na parte I, pessoas como eu – pessoas que acreditam nos direitos dos animais 
– sentem, em relação às águias e elefantes e porcos e toninhas, a mesma coisa que a maioria sente em 
relação a cães e gatos”. REGAN, Tom. Jaulas vazias. Porto Alegre: Lugano, 2006, p. 3. 
 Entretanto, esse processo de auto-identificação do direito com o ser humano é 
também uma triste história de exclusão, a exclusão de tudo aquilo que não se enquadre 
nessa categoria de humanidade. Nunca é demasiado lembrar que muitos seres humanos 
foram, em determinados momentos, retirados arbitrariamente da esfera da consideração 
moral e jurídica.7 
Ao longo da história sempre houve vozes dissidentes, que se posicionaram 
contra o paradigma da instrumentalização da vida animal. Da tradição greco-romana, 
em apertada síntese, poderíamos lembrar dos importantes nomes de Plutarco e Porfírio8, 
que defendiam abertamente a existência da racionalidade em determinadas espécies, 
bem como de Sêneca e Ovídio, que centraram esforços na demonstração das 
capacidades sensitivas dos animais. Não poderíamos deixar de citar o elucidativo 
exemplo de Pitágoras, que acreditava firmemente na teoria da transmigração das almas 
entre homens e animais (metempsicose) e que recomendava, com igual fervor, a 
abstinência do consumo de carne. 
Mais recentemente, já nos séculos XVIII e XIX temos a importante obra do 
teólogo Humphry Primatt, A dissertation on the duty of mercy and the sinn of cruelty 
against brute animals, publicada em Londres em 1776, mesmo ano da revolução pela 
independência estadunidense. Primatt sustentava a precisa ideia de que a inclusão na 
comunidade moral deveria levar em consideração interesses comuns compartilhados e 
não a simples configuração biológica dos seres vivos. O pai do utilitarismo clássico, 
Jeremy Benhtam, em 1789, ano da Revolução Francesa, tendo lido Primatt, 
publica Uma introdução aos princípios morais e da legislação, tendo afirmado que a 
capacidade de sentir dor e de sofrer, presente nos animais, deve ser levada em 
consideração no cômputo da moralidade9. 
As primeiras normas ligadas diretamente à proteção dos animais surgiram neste 
cenário, no início do século XIX na Inglaterra (Martin´s Act – 1822) e França (Lei 
Grammont – 1850), e a elas seguiu-se a fundação das primeiras entidades protetoras dos 
	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  
7	
  Os cristãos, nos primeiros tempos que se seguiram à crucificação de Jesus, em espetáculos grotescos, no 
coliseu romano, no qual, inclusive ao lado ou contra animais, explorados, como objetos, em prol da 
diversão da turba, disputando a própria vida sob pena do perecimento de outra, eventos sanguinários, 
brutais, componentes da suposta evolução civilizatória de Roma. Na outra margem, os bárbaros, os 
subjugados, sem direitos ou apenas com os direitos outorgados, benevolamente, pelo senhor, pelo 
dominador. Ao longo da história, para mais ilustrações, as mulheres, os povos originais do continente 
depois chamado americano, negros, judeus. Com a escusa da classificação genérica, é de marcar que 
grupos (antes, durante ou depois) oprimidos também se mostraram opressores: a inquisição patrocinada 
pela Igreja Católica, a escravidão também existente entre os negros. 	
  
8	
   PLUTARCO. On the eating of flesh; PORFIRIO. On Abstinence from animal food; SÊNECA. 
Abstinence and the philosophical life. In: WALTERS, Kerry S.; PORTMESS, Lisa. Ethical 
vegetarianism: from Pythagoras to Peter Singer. State University of New York Press, 1999. 
9	
  Nesse sentido célebre é a passagem em que o autor compara a capacidade de sofrer do homem em 
relação aos demais animais: “Talvez chegue o dia em que o restante da criação animal venha a adquirir os 
direitos que jamais poderiam ter-lhe sido negados, a não ser pela mão da tirania. Os franceses já 
descobriram que o escuro da pele não é motivo para que um ser humano seja irremediavelmente 
abandonado aos caprichos de um torturador. É possível que algum dia se reconheça que o número de 
pernas, a vilosidade da pele ou a terminação do osso sacro são razões igualmente insuficientes para se 
abandonar um ser senciente ao mesmo destino. O que mais deveria traçar a linha intransponível? A 
faculdade da razão, ou, talvez, a capacidade da linguagem? Mas um cavalo ou um cão adultos são 
incomparavelmente mais racionais e comunicativos do que um bebê de um dia, uma semana, ou até 
mesmo um mês. Supondo, porém, que as coisas não fossem assim, que importância teria tal fato? A 
questão não é ‘Eles são capazes de raciocinar?’, nem ‘São capazes de falar?’, mas, sim: ‘Eles são capazes 
de sofrer? (BENHTAM apud SINGER, Peter. Libertação Animal. Salvador: Evolução, 2008, p. 9).	
  
animais, da qual é exemplo a Sociedade Real Britânica de Proteção dos Animais 
(1824). 
Henry Salt, amigo pessoal de Ghandi, retomando de certa forma os 
ensinamentos de Primatt, em 1892 dá prosseguimento à temática com o primoroso livro 
Animal Rights: considered in relation to social progress10, seguido de perto pelo 
filósofo moral Leonard Nelson (Alemanha, 1924) e pelo jurista Cesare Goretti (Itália, 
1928)11. 
Durante os anos 50, enquanto as fazendas industriais começavam a se alastrar no 
cenário rural, os defensores dos animais ainda estavam, de modo geral, atrelados à 
discussão de temas relacionados ao bem-estar dos animais ditos de estimação, à 
contestação da vivissecção, e ao problema da caça esportiva. Foi somente a partir dos 
trabalhos pioneiros de Rachel Carson, intitulado Silent springs (1962), e de Ruth 
Harrison, denominado Animal machines (1964), que houve uma retomada vigorosa de 
obras relacionadas à defesa dos direitos dos animais em sentido mais profundo e 
abrangente. Brigid Brophy, em 1965, publica The rights of animals no periódico Sunday 
Times, fazendo clara e provocativa alusão à obra clássica de Thomas Paine, The rights 
of man. 
No mesmo período, Richard Ryder, então psicólogo sênior do Warneford 
Hospital (Oxford), impressionado com a utilização abusiva de animais na pesquisa 
médica, envia diversas cartas ao jornal London Daily Telegraph, relatando a crueldade 
dos experimentos. Tomando conhecimento de seu engajamento, Brophy recomenda 
então que ele entrasse em contato com um grupo de pesquisa recém-formado por pós-
graduandos de Filosofia que discutiam seriamente o tema da Ética Animal na 
Universidade de Oxford. Ryeder aceita a recomendação de Brophy e se une ao casal 
canadense Stanley e Roslin Godlovitch e a John Harris e publica,em 1970, o artigo 
Experiments on animals, onde cunha o termo especismo12 para designar, como antes 
anotado, uma forma de injustiça que significa tratamento diferenciado para aqueles que 
não integram a mesma espécie. O psicólogo procurava, então, traçar um paralelo de 
nossas atitudes perante as demais espécies e as atitudes racistas e sexistas. Segundo o 
autor, todas essas formas de discriminação são fundamentalmente baseadas em 
características arbitrárias sendo, por tal motivo, insustentáveis sob o ponto de vista 
moral. 
Ainda na década de 70, juntaram-se ao grupo de Oxford os filósofos Stephen 
Clark, Peter Singer e o teólogo Andrew Lindzey. Em 1971, os Godlovitch organizam e 
publicam a obra Animals men and morals, de cujo pósfácio pode se ler a seguinte 
elucidativa passagem: “Demandamos que os princípios da liberdade, igualdade e 
	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  
10	
   Mas, pode ser replicado, simpatia vaga por animais inferiores é uma coisa, e o reconhecimento 
definitivo de seus ‘direitos' é outra; onde está a razão para supor que devemos avançar da primeira fase 
para a última? A razão está exatamente no fato de que todo grande movimento de libertação seguiu essa 
linha. Opressão e crueldade fundam-se invariavelmente na privação de imaginação simpática; o tirano ou 
atormentador não pode ter um sentido genuíno de semelhança com a vítima de sua injustiça. Quando o 
sentido de afinidade finalmente acorda, o ultimato à tirania está dado e a concessão final de ‘direitos' é 
apenas uma questão de tempo." SALT apud FELIPE, Sônia T. Fundamentação ética dos Direitos dos 
Animais, Pensata Animal, v. 11, maio de 2008. Disponível em: http://www.pensataanimal.net. 
11	
   NELSON, Leonard. System der wissenschaftlichen Ethik und Pädagogik (Sistema de uma ética e 
pedagogia científicas) e GORETTI, Cesare. L'animale quale soggetto di diritto. 
12	
  A consolidação da terminologia veio com a sua obra Victims of Science (1975) e com o referendo do 
vocábulo pelo English Oxford Dictionary, em 1986. 
fraternidade sejam estendidos aos animais. Que a escravidão dos animais se junte à 
escravidão humana no cemitério do passado”. 
Infelizmente, a obra tem pouca repercussão e o grupo vida curta. Ao tentar 
reavivar o tema, Peter Singer encaminha, em 1973, uma resenha do aludido livro para a 
New York Review of Books e surpreende-se com a calorosa acolhida. Em setembro do 
mesmo ano se junta ao Departamento de Filosofia da Universidade de Nova York e 
publica em 1975 a obra Libertação animal, editado no Brasil originalmente pela Lugano 
(Porto Alegre), em 2004, e posteriormente pela editora Evolução (Salvador), em 2008. 
Singer, alicerçado em bases utilitaristas, desenvolve argumentação envolvente 
no sentido de a inserção na comunidade moral deveria levar em consideração não a 
inteligência ou a linguagem, mas sim o denominador comum consistente na capacidade 
de ser sensível ao sofrimento (senciência). A igualdade seria um conceito moral e não 
factual, por meio da qual deveríamos proteger interesses semelhantes de forma análoga. 
Desta coerente conclusão, decorre o princípio da igual consideração de interesses por 
meio do qual, segundo elucida Sônia T. Felipe, “devemos igual respeito a todos os 
sujeitos capazes de ter preferências, não privando-os daquilo que eles próprios escolhem 
para garantir seu bem, independentemente de estarmos diante de um sujeito com 
preferências racionais ou sencientes”13. Não é por outra razão que se qualifica tal 
proposição como utilitarista preferencial, pois a preferência seria um interesse 
qualificado pelo atributo de senciência titularizado pelo seu detentor. Os animais 
possuidores destas preferências devem poder tê-las levadas em consideração no 
balanceamento moral direto de nossas condutas. 
 Como utilitarista, Singer evita conectar a sua retórica à abordagem de direitos 
propriamente ditos, pois entende que a concepção de direitos subjetivos pode se 
apresentar como verdadeira “barreira” edificadas em torno dos interesses, que, em 
princípio, poderia prejudicar o cálculo agregado utilitário de custo/benefício14. Apesar 
disto, todo este poderoso arsenal acadêmico, de bases éticas, científicas e filosóficas, 
começou a ser apropriado e utilizado pelo Direito para alicerçar os pilares dos 
denominados legal rights for animal”, conhecidos por Animal Rights (Direito dos 
Animais). 
 Em 1976, Tom Regan, professor de Filosofia da Universidade da Carolina do 
Norte, publica Animal Rights and human obligations em parceria com Singer e All that 
dwell therein (1982) e, finalmente, The case for Animal Rights (1983).15 A abordagem 
de Regan trabalha com o conceito de sujeito-de-uma-vida e propõe direitos subjetivos 
fundamentais como alicerces de uma ética deôntica em favor dos animais. Avança em 
comparação ao utilitarismo preferencial de Singer no sentido de que a abordagem dos 
direitos garante a inviolabilidade de determinados interesses mesmo quando da sua 
violação eventualmente derivassem benefícios para terceiros (ética centrada no 
indivíduo). Ser um sujeito-de-uma-vida é, na visão de Regan, condição suficiente para 
se ter valor inerente, quaisquer que sejam os atributos de ordem pessoal ou de utilidade 
	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  
13 FELIPE, Sônia T. Cit. 
14 Não é por outra razão que Singer hoje tem uma aproximação mais forte com o movimento ligado ao 
bem-estar animal (que se preocupa basicamente com o modo pelo qual tratamos os animais, impondo 
salvaguardas na tentativa de evitar o paradoxal “sofrimento desnecessários” nas mais diversas instâncias 
que utilizam os animais como instrumentos) do que com o movimento do direito dos animais 
propriamente dito, que possui uma abordagem de abolição das instâncias de exploração dos animais 
(animais possuiriam valoração inerente e, por conta disso, direitos subjetivos fundamentais). 
15 Dentre outros trabalhos de Tom	
   Regan, vale destacar a obra Jaulas vazias, que conta com edição 
brasileira pela Lugano (2006). 
dos agentes ou pacientes morais, sejam eles humanos ou não. A circularidade lógica de 
seu raciocínio consiste no fato de que se os direitos humanos podem efetivamente ser 
fundamentados sob o postulado do valor inerente dos indivíduos, não há como se 
justificar a exclusão dos animais não-humanos, a não ser por uma flagrante e especista 
violação do princípio do respeito (quebra da coerência). De outro lado, somente se 
forem aceitos os critérios de inclusão animal (boa parte dos animais são criaturas, assim 
como os seres humanos, conscientemente capazes de experimentar bem-estar e de 
empreender ações a fim de desfrutar dele), podem ser legitimados os direitos humanos 
sob a mesma fundamentação (evitando-se o problema dos casos marginais). O 
imperativo ético decorrente é de que devemos abolir todas as instâncias de exploração 
dos animais (alimentação, vestuário, diversão, experimentação, etc.) e não meramente 
regulamentá-las. 
 Na mesma direção de Regan podemos citar ainda a importante contribuição dos 
juristas Steven M. Wise, autor de Rattling the cage e Drawing the line; bem como de 
Gary L. Francione, que publicou Animals, property and the law, Rain without thunder, 
Introduction to Animal Rights: your child or the dog? e, mais recentemente, Animals as 
persons, entre outros tantos. 
 
 
IV. ALTERNATIVAS TEÓRICAS PARA O ENQUADRAMENTODOS 
ANIMAIS COMO AUTÊNTICOS SUJEITOS DE DIREITO 
 
A concepção que não enxerga qualquer valoração inerente no animal não-
humano teve grande acolhida na dogmática civilista tradicional. A maior parte dos 
doutrinadores abraça a visão de que os animais possuem natureza jurídica de bens 
móveis (semoventes), de coisas, de objetos de direitos. Repetindo as lições kantianas, 
afirmam que os animais devem ser protegidos não por possuírem valoração intrínseca, 
mas sim porque a crueldade e o abuso contra animais podem tornar o homem mais 
insensível frente aos seus semelhantes (tese do transbordamento moral), ou seja, não 
haveria deveres diretos para com os animais não-humanos, eles não teriam acesso à 
relação jurídica e tampouco seriam titulares de direitos subjetivos. 
A posição predominante, encampada pela doutrina e pelo legislador, portanto, 
abarca uma visão dita de bem-estar ou meramente protecionista. Essa posição assume 
como legítimo o tratamento instrumental dos animais (como meios para fins humanos), 
desde que certas salvaguardas sejam impostas. Nessa linha, são editadas normas como, 
por exemplo, as que regulam o abate de animais para consumo, exigindo a utilização de 
métodos de insensibilização prévia à sangria e retalhamento. Tais leis são usualmente 
denominadas, de forma bastante paradoxal, de normas de abate humanitário. Em 
momento algum do respectivo processo legislativo se discutiu ou se expressou qualquer 
preocupação com o fato de que a utilização em si dos animais para alimentação pudesse 
ser moralmente contestável. 
 A visão dos direitos, por sua vez, rejeita a premissa de que animais possuam 
natureza jurídica de coisa, de objeto ou de uma mera modalidade de propriedade, e, por 
entender que ao menos alguns deles possuam interesses a serem protegidos por direitos, 
proclama que não podem ser submetidos a qualquer forma de exploração ou 
instrumentalização, ainda que cercada de todas as pretensas salvaguardas para se evitar 
o também paradoxal sofrimento desnecessário. Sinteticamente, portanto, no que diz 
com a exploração e utilização dos animais, é possível dizer que os bem-estaristas 
defendem a sua regulamentação, enquanto os que postulam pelo abolicionismo, assim 
pelos direitos dos animais, buscam a sua supressão. 
Decorrência lógica da afirmação de que animais titularizam direitos subjetivos é 
o fato de possuiriam natureza jurídica de sujeitos de direito. Neste contexto, restaria 
indagar sobre as alternativas existentes que viabilizam proceder a este deslocamento de 
objeto para sujeito. Sinteticamente, haveria dois caminhos básicos a trilhar consistentes 
na: (1) personificação dos animais (animais integrariam a categoria jurídica de “pessoa”, 
equiparados aos absolutamente incapazes); e (2) utilização da teoria dos entes 
despersonalizados (animais fariam parte da categoria jurídica de sujeitos de direito, tal 
como os entes despersonificados ou despersonalizados). 
Poder-se-ia cogitar também na alternativa da inserção dos animais não-humanos 
em uma categoria intermediária situada entre as coisas e as pessoas, como um tertium 
genus. Esta parece ter sido a solução legislativa encontrada por alguns países europeus, 
com a retirada expressa dos animais da categoria de coisa, tal como se verifica na 
legislação civil alemã. Todavia, ao que tudo indica, a construção de um estatuto jurídico 
para o animal como um meio termo entre as classificações de sujeito de direito e objeto, 
tal qual também propõe François Ost, parece recuar no sentido de um bem-estarismo 
alargado, o qual se basearia meramente na atribuição de deveres ao homem para com os 
animais, porém não na concessão de direitos fundamentais a estes últimos. 
Outra alternativa aos caminhos anteriormente sugeridos consistiria na inserção 
da questão dos direitos dos animais na doutrina dos chamados direitos sem sujeito, tal 
qual admitem Brinz e Köppen, e, entre nós, Carvalho de Mendonça. Entretanto, será 
demonstrado na explanação da teoria dos entes despersonalizados, ao procedermos à 
necessária distinção conceitual entre sujeito de direito e pessoa, que a abordagem dos 
chamados direitos sem sujeito perde seu sentido primordial, além de restar induvidoso 
que seres sencientes devem ser tratados como possuindo valoração inerente. 
 A primeira alternativa, consistente em personificar os animais equiparando-os 
aos absolutamente incapazes, encontra barreiras severas no que se refere à sua 
implementação prática, tanto em termos de modificação legislativa como também com 
relação a preconceitos culturais e psicológicos arraigados. Por essa razão, a utilização da 
teoria dos entes despersonalizados pode sinalizar um caminho mais suave e efetivo no 
que diz com a alteração do estatuto jurídico dos animais não-humanos. Esta opção 
consiste, portanto, na utilização da teoria dos entes despersonalizados para fundamentar 
a concessão de direitos subjetivos fundamentais para os animais. 
 Como se viu, ao longo do tempo foi edificada uma indevida e atécnica 
identificação entre os conceitos de sujeito de direito, pessoa e ser humano. 
Paralelamente, a bipartição conceitual entre pessoas e coisas proporcionou a 
consolidação, no século XX, da teoria da personalidade jurídica, por meio da qual “a 
noção de sujeito de direito passou a ser uma prerrogativa de todos os seres 
pretensamente racionais”16. Como decorrência, forma-se, portanto, uma equivocada 
vinculação e equiparação dos conceitos de pessoa e de sujeito de direito. 
Grande parte dos autores de Direito Civil, afeitos a uma posição conservadora, 
reproduz irrefletidamente essa concepção, alçando-a à condição de verdadeiro dogma. 
	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  
16 RABENHORST, Eduardo Ramalho. Dignidade humana e moralidade democrática. Brasília: Brasília 
Jurídica, 2001, p. 58. 
Nessa linha, podem ser colhidos exemplos em Orlando Gomes17, Washington de 
Barros18, Maria Helena Diniz19, Carlos Roberto Gonçalves20, Sílvio Venosa21, entre 
tantos outros. 
No entanto, como se passará a demonstrar, os conceitos merecem importante 
distinção. De acordo com as precisas lições de Fábio Ulhoa Coelho, tem-se que o 
conceito de sujeito de direito identifica-se como sendo “o centro de imputação de 
direitos e obrigações pelas normas jurídicas”, o que leva à imperiosa conclusão de que 
“nem todo sujeito de direito é pessoa e nem todas as pessoas, para o direito são seres 
humanos”22. 
O mencionado autor utiliza dois critérios de classificação para os sujeitos de 
direito: o primeiro divide-os em personificados e despersonificados, pois os sujeitos 
podem ser pessoas ou não. O segundo distingue entre os sujeitos humanos e os não-
humanos23. Assim sendo, a categoria “sujeito de direito” seria um gênero que abarcaria, 
de um lado, sujeitos personalizados (que seriam as pessoas propriamente ditas: naturais 
– seres humanos – e jurídicas) e, de outro, sujeitos não-personificados. Quanto a esses 
últimos, destaca o jurista os seguintes aspectos: 
 
[...] mesmo os sujeitos de direito despersonalizados são titulares de direitos 
e deveres. O atributo da personalização não é condição para possuir direitos 
ou ser obrigado a qualquer prestação. Recupere-se o conceito de sujeito de 
direito – centro de imputação de direitos e obrigações referidos pelas 
normas jurídicas. Todos os sujeitos nele se enquadram, de modo que 
também os despersonificados são aptos a titularizar direitos e deveres 24. 
 
Adverte, ainda, com clareza:17 “Sujeito de direito é a pessoa a quem a lei atribui a faculdade ou a obrigação de agir, exercendo poderes 
ou cumprindo deveres.” GOMES, Orlando. Introdução ao Direito Civil. Rio de Janeiro: Forense, 1998, p. 
142. Grifos nossos. 
18 “Na acepção jurídica, pessoa é o ente físico ou moral, suscetível de direitos e obrigações. Nesse 
sentido, pessoa é sinônimo de sujeito de direito ou sujeito da relação jurídica.” BARROS, Washington 
Monteiro de. Curso de Direito Civil, vol. 1, São Paulo: Saraiva, p. 62. Grifos nossos. 
19 “[...] para a doutrina tradicional pessoa é o ente físico ou coletivo suscetível de direitos e obrigações, 
sendo sinônimo de sujeito de direito.” DINIZ, Maria Helena. Compêndio de Introdução à Ciência do 
Direito. São Paulo: Saraiva, 1993, p. 461. Grifos nossos. 
20 “No direito moderno, pessoa é sinônimo de sujeito de direito ou sujeito da relação jurídica.” 
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, vol. 1, São Paulo: Saraiva, 2003, p. 74. Grifos 
nossos. 
21 “A sociedade é composta de pessoas. São essas pessoas que a constituem. Os animais e as coisas 
podem ser objeto de Direito, mas nunca serão sujeitos de Direito, atributo exclusivo da pessoa.” 
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil. v. 1. São Paulo: Atlas, 2005, p. 139. 
22 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Civil. v. 1. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 138. 
23 COELHO afirma: “A rigor, o segundo critério de classificação dos sujeitos de direito não tem 
relevância jurídica. [...] A distinção, contudo, é útil à compreensão do instituto e sua funcionalidade. 
Homens e mulheres, portanto, são sujeitos de direitos humanos personificados; nascituros são sujeitos 
humanos despersonificados; fundações, sujeitos de direito não-humanos personificados; massa falida, um 
não-humano despersonificado e assim por diante.” COELHO, Fábio Ulhoa. Cit., p. 141. Por fidelidade à 
construção do autor, vale ressaltar que não chega a trabalhar expressamente com a idéia de animais como 
sujeitos de direito não-humanos despersonificados. 
24 Idem, p. 139. 
Muitos autores conceituam personalidade jurídica como a aptidão para 
titularizar direitos e obrigações. Assim fazendo, tomam por equivalentes as 
categorias de pessoa e sujeito de direito; não consideram, ademais, os entes 
despersonificados como espécie de sujeitos de direito. A conseqüência é a 
desestruturação lógica do modelo de exame dos institutos jurídicos aqui 
considerados 25. 
 
A distinção entre pessoa e sujeito de direito parece também ter sido abraçada por 
outros doutrinadores contemporâneos26 entre os quais Gustavo Tepedino27, Cristiano 
Chaves de Farias28 e Rafael Garcia Rodrigues29. Os professores paranaenses José 
Lamartine Corrêa de Oliveira e Francisco José Ferreira Muniz, em artigo intitulado “O 
Estado de Direito e os Direitos da Personalidade”, publicado pela Revista dos 
Tribunais, chamam a atenção para a referida confusão conceitual: 
 
Em uma visão positivista, normativista, formalista, da pessoa e da própria 
ordem jurídica, ao contrário, termina-se por reduzir a noção de pessoa a um 
centro de imputação de direitos e deveres e a se atribuir sentido idêntico às 
noções de pessoa e de sujeito de direitos 30. 
 
Claudio Henrique Ribeiro da Silva, corroborando a necessidade de distinção 
conceitual, em brilhante parecer adverte, acertadamente: 
 
A equiparação dos conceitos de pessoa e sujeito de direitos tem gerado, em 
doutrina, algumas perplexidades, que, ainda que na maior parte das vezes 
não resultem em imbróglio ou insegurança na solução de casos concretos, 
têm colaborado para eternizar questões e debates já totalmente superados. 
	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  
25 Idem, p. 141. 
26 SERPA LOPES chegou a afirmar que “o sujeito de direito é o que possui aptidão, possibilidade jurídica 
para adquirir direitos e contrair obrigações, trate-se ou não de um homem.” LOPES, Miguel Maria de. 
Curso de Direito Civil. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1962, p. 257. 
27 As pessoas jurídicas são sujeitos de direito – como também podem sê-lo os entes despersonalizados 
(basta pensar no condomínio ou na massa falida) –, dotadas de capacidade de direito e de capacidade 
postulatória, no plano processual, segundo as conveniências de política legislativa. Tal constatação 
permitiu que, ao longo do tempo, fosse estendida, pela doutrina e jurisprudência brasileiras, a proteção 
recém-consagrada aos direitos da personalidade às pessoas jurídicas.” TEPEDINO, Gustavo (Coord.). A 
Parte Geral do novo Código Civil: estudos na perspectiva Civil-Constitucional. Rio de Janeiro: Renovar, 
2003. p. XXVII). 
28 “De maneira simples, é possível lembrar que existem determinados entes despersonalizados (como a 
sociedade de fato, o condomínio, a herança jacente e vacante...) que podem ser sujeitos de direito, sem 
que tenham personalidade jurídica. Evidencia-se, pois, que a personalidade jurídica não pode estar 
aprisionada no conceito simplório de sujeito de direito. Há de ser mais do que isso.” (FARIAS, Cristiano 
Chaves de. Direito Civil: teoria geral. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005, p. 98. 
29 “O novo Código Civil apresenta em seus primeiros dispositivos a consagração da fórmula que 
contempla todos os homens como pessoas. Pessoas que, em nosso cotidiano, de forma vulgar, é vocábulo 
utilizado como sinônimo de ser humano; mas que ao Direito adquire significação própria e peculiar, de 
modo que ser pessoa constitui a possibilidade de ser sujeito de direito, ou seja, titular de um direito [...]. A 
pessoa portanto vale, não podendo ser confundida com o sujeito de direito, pois que partem de premissas 
e têm funções diversas.” RODRIGUES, Rafael Garcia. In: TEPEDINO, Gustavo, Ob. cit., p. 1 e 32, 
passim. 
30 OLIVEIRA, José Lamartine Corrêa de; MUNIZ, Francisco José Ferreira apud TEPEDINO, Ob. cit., p. 
31-32. 
Desta espécie são, a título de exemplo, certas discussões acerca da 
personalidade dos nascituros, da legitimidade processual de alguns entes 
despersonalizados ou mesmo o debate sobre o “direito dos animais” 31. 
 
A situação do nascituro32 é realmente bastante emblemática para ilustrar a que 
ponto chegam as conseqüências da aludida confusão conceitual entre as categorias de 
pessoa e sujeito de direito. O artigo 2º do Código Civil é bastante claro ao dispor que “a 
personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, 
desde a concepção, os direitos do nascituro”. Ora, o sistema parece absolutamente claro 
ao estatuir que o nascituro possui direitos, embora ainda não seja pessoa. Ribeiro da 
Silva, a esse respeito, observa: 
 
Seria cômico, se não fosse quase trágico, o debate em que se perderam e 
ainda se perdem os autores, sobre a existência ou não da personalidade no 
nascituro. O nó górdio desta questão, que parte sempre da premissa de que 
só as pessoas são sujeitos de direito (equiparação), reside na impossibilidade 
de aceitar o inegável fato de que o sistema atribui direitos aos nascituros 
(art. 2º, segunda parte, CC/2002; e art. 4º, segunda parte, CC/1916) no 
mesmo artigo do Código Civil em que lhes nega a personalidade. Como 
conciliar tais dispositivos sem atribuir direitos a quem não tem 
personalidade? Não sabemos. Não reconhecemos, em todo o ordenamento, 
dispositivo mais claro no sentido de estender a qualidade de sujeito de 
direitos a um ente despersonalizado. Diz, literalmente não só que quem não 
nasceu não é pessoa, mas também reafirma que, ainda assim, (não sendo 
pessoa) tem seus direitos reconhecidos. Mas, como o dogma da equiparação 
(pessoa = sujeito de direito) já houvesse se estabelecido entre os 
doutrinadores,dividiram-se estes entre os que conferiram personalidade 
jurídica ao nascituro (já que tem direitos), e os que tentaram, através de 
categorias jurídicas gerais (condição), explicar que o nascituro não tinha 
direitos, mas apenas expectativas ou direitos sob condição suspensiva 33. 
 
A aplicação da teoria dos entes despersonalizados soluciona com maestria e 
lucidez a questão do nascituro. De acordo com as límpidas lições de Fábio Ulhoa 
Coelho, “os sujeitos despersonificados podem ser humanos ou não-humanos”34, de 
modo que “antes do nascimento com vida, o homem e a mulher não têm personalidade, 
mas, como já titularizam os direitos postos a salvo pela lei, são sujeitos de direito”35. 
	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  
31 SILVA, Claudio Henrique Ribeiro da. Apontamentos para uma teoria dos entes despersonalizados. Jus 
Navigandi, Teresina, a.9, n. 809, 20 set. 2005. Disponível em: 
<http://www.jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=7312>. Acesso em 27 mar. 2006, p. 3. Vale observar 
que o professor Claudio da Silva, ao que tudo indica, parece ter sido o primeiro doutrinador a admitir 
abertamente a aplicabilidade da teoria dos entes despersonalizados aos animais. 
32 Nascituro vem do latim nasciturus, significando aquele que está por nascer. Daí a definição de Limongi 
França, para quem o termo trata “da pessoa que está por nascer, já concebida no ventre materno.” 
FRANÇA apud ALMEIDA, Silmara Juny de Abreu Chinelato. Tutela civil do nascituro. São Paulo: 
Saraiva, 2000, p. 7. 
33 RIBEIRO DA SILVA, op.cit., p. 4. 
34 COELHO, Fábio Ulhoa. Ob. cit., p. 145. 
35 Ibid., p. 145. 
Assim, de acordo com o melhor entendimento, o nascituro é um sujeito de direito 
despersonificado humano. 
Em artigo intitulado “Direito do Nascituro à Vida” 36, o eminente José Carlos 
Barbosa Moreira expõe, com a clareza de sempre, a mesma opinião, ao afirmar que a 
“personalidade” (conceito umbilicalmente atrelado ao de “pessoa”) e a “possibilidade de 
ser titular de direitos” (noção vinculada à de “sujeito de direito”) consubstanciam 
realidades necessariamente distintas. 
Outros sujeitos despersonificados não-humanos foram reconhecidos pelo 
Direito. O artigo 7º do Código de Processo Civil prevê que “toda pessoa que se acha no 
exercício dos seus direitos tem capacidade para estar em juízo”. Ressalte-se, no entanto, 
que o seu artigo 12 faz referência expressa a alguns entes despersonalizados em relação 
aos quais se reconhece capacidade processual: a massa falida, a herança jacente ou 
vacante, o espólio, as sociedades sem personalidade jurídica (sociedade em comum e 
em conta de participação) e o condomínio 37. A jurisprudência também permite que os 
consórcios e diversos fundos existentes no mercado de capitais possam ser 
representados em juízo por seus administradores38. Nessa linha, Ribeiro da Silva afirma 
	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  
36 MOREIRA, José Carlos Barbosa. Direito do nascituro à vida. Revista da Academia Brasileira de 
Ciências Jurídicas, Rio de Janeiro: Renovar, n. 25, 2006, p. 209. 
37 Os processualistas que permanecem atados ao dogma da identidade entre pessoa e sujeito de direito 
necessitam se recorrer de soluções artificiais para justificarem a condição de parte de entes 
despersonalizados, criando, desnecessariamente, categorias como capacidade judiciária ou personalidade 
judiciária. Situação interessante é a do condomínio edilício. O art. 63, § 3º da L. 4.591/64 estabelece 
claramente que ser ele titular de um direito subjetivo, qual seja o de possuir direito de preferência na 
hipótese de eventual alienação de unidades inadimplentes. Em razão dessa previsão, alguns doutrinadores 
entendem necessário recorrer à sua personificação para justificar a atribuição desse direito, ou seja, 
sustentam que o condomínio possuiria personalidade jurídica (Maria Helena Diniz, Lamartine Corrêa de 
Oliveira). Se atentarmos para a distinção conceitual proposta entre sujeito de direito e pessoa, não se 
precisará chegar a tanto. Em verdade, o mencionado art. 63, § 3º nada mais é do que prova cabal dessa 
distinção. O condomínio não é pessoa e, apesar disso, como ente despersonalizado, titulariza direitos 
subjetivos próprios. Caio Mário da Silva Pereira, autor do Anteprojeto da Lei n.º 4.591/64, parece 
referendar esse posicionamento ao asseverar que “[...] o condomínio não é pessoa jurídica. Acontece que, 
sem lhe conceder a personificação, o legislador em certas circunstâncias trata-o como se fosse dotado de 
personalidade. [...] Ao aludir, então, à adjudicação em nome do condomínio, a lei abdica de sua 
personificação. Ora, ao intérprete cabe entender e aplicar a lei, tal como é e vem redigida. O hermeneuta 
não se deixará dominar por idéias preconcebidas para interpretar somente à luz de conceitos vetustos. O 
grande trabalho do aplicador é construir pelo entendimento e pela boa compreensão da lei. E se esta se 
desgarra de conceitos tradicionais, para exprimir noções vigentes no tempo atual e para dar solução a 
problemas que a vida contemporânea suscita, não pode ser explicada senão à luz dos novos conceitos. [...] 
E nem se diga que o Legislador de 1964 inovou em nosso direito. Ao revés, já encontrou abertos 
caminhos exemplares. O espólio, posto que não tenha personalidade jurídica, é representado pelo 
inventariante, comparece em escritura de alienação e adquire direitos. A massa falida, igualmente, é 
representada, e lhe é reconhecida a faculdade de cumprir contratos bilaterais de que resulta eventualmente 
a aquisição de direitos. E tudo se passa sem que jamais se exigisse, num ou noutro caso, o 
reconhecimento de personalidade jurídica à herança ou à massa falida” SILVA, Caio Mário Pereira da. 
Condomínio e incorporações. Rio de Janeiro: Forense, 1997, p. 343-345. A mesma situação pode ser 
vislumbrada na hipótese de contrato de gestão a ser celebrado entre autarquias qualificadas como 
agências executivas e o respectivo Ministério supervisor, prevista expressamente pela L. 9.649, de 
27/5/98. O Ministério não possui personalidade jurídica (é mero órgão integrante da União Federal), mas 
teria aptidão para figurar como contratante. 
38 “Consórcio. Interposição de ação por consorciado, em que é postulada a restituição do montante das 
prestações pagas, monetariamente atualizado, contra a administradora. Competência da empresa que 
administra o consórcio na arrecadação e aplicação dos recursos dos participantes, bem assim na aquisição 
e entrega dos respectivos veículos. Aplicação do art. 12, VII, do CPC” (STJ, RT 784/205). 
que “[...] a doutrina processual vem reconhecendo, muito mais do que a material, que 
certos entes despersonalizados são sujeitos de direitos, e, nesta qualidade, aptos a 
figurar em um dos pólos da relação jurídica processual” 39. Mais recentemente, a própria 
entidade familiar e as futuras gerações são também enquadradas nessa importante 
categoria, asssim com diversos entes no âmbito do Direito Público, como as Câmaras 
Municipais, as Assembléias Legislativas Estaduais e órgãos da Administração Direta 
nos contratos de gestão firmados com o Poder Público.Como se não bastasse, a Lei n. 
8.249/92, que dispõe sobre as sanções aplicáveis aos agentes públicos nos casos de 
enriquecimento ilícito, em seu art. 10, inciso III, admite, a contrario sensu, a 
possibilidade de doação a entes despersonalizados. Outros exemplos de sujeitosde 
direito não-personificados seriam os consórcios de consumidores, as coligações 
partidárias, e as serventias dos cartórios extrajudiciais, entre tantos outros. 
A teoria dos entes despersonalizados, baseando-se na distinção conceitual entre 
pessoa e sujeito de direito, conforme se verificou, permite, portanto, que se prescinda da 
qualificação do ente como pessoa para que ele venha a titularizar direitos subjetivos. No 
que diz respeito aos animais ela poderá ser aplicada para caracterizá-los como 
autênticos sujeitos de direitos despersonificados não-humanos, tal qual propõe a 
criteriosa classificação de Ulhoa Coelho. Como se procurou demonstrar, somente uma 
visão extremamente dissociada da realidade seria incapaz de realizar que a maior parte 
das normas de proteção aos animais, incluindo-se, em especial, as que vedam os maus-
tratos, abusos e crueldades, trata de regras em que o objeto jurídico tutelado é a 
incolumidade física e psíquica do prório animal, ou seja, são regras em que o 
destinatário da norma e aquele que é beneficiado diretamente pela sua observância é o 
ser que sofre as consequências da conduta lesiva. 
Tecnicamente, o que se pretende é que animais, consoante alertava o jurista 
italiano Cesare Goretti, já em 1928 (L´animale quale soggetto di diritto), embora 
despersonalizados, sejam “sujeitos de direito”40, ou seja, ainda que se entenda que não 
sejam pessoas, nem por essa razão deixariam de poder usufruir de um patrimônio 
jurídico que lhes garantisse o mínimo existencial. A vantagem da teoria dos entes 
despersonalizados se situa justamente na prescindibilidade da “adequação típica” do 
animal na categoria de pessoa para que ele venha a titularizar determinados direitos 
subjetivos fundamentais. Com Ihering (1818-1892) há a construção da idéia de sujeito-
interesse, por meio da qual se afirma ser a utilidade, e não a vontade, a força motriz do 
Direito. Os direitos subjetivos, nesse sentido, servem para garantir os interesses 
fundamentais decorrentes da vida sensitiva, pois “todo o Direito positivado é a 
expressão de um interesse reconhecido pelo legislador como merecedor e demandante 
de proteção” 41. Os interesses, por sua vez, podem ser derivados de condutas volitivas 
complexas ou mesmo de impulsos sensíveis bastante básicos que, em última análise, 
poderiam se resumir às sensações. 
Demogue, partidário da teoria do interesse de Ihering, consolida, em artigo 
intitulado La notion de sujet de droit – caracteres et conséquences”, publicado em 1909 
	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  
39 Ob. cit., p. 9. 
40 Goretti parece também ser adepto da teoria da equiparação ao afirmar que: “Quanto l’animale mediante 
l’addomesticamento non si ribella all’ordinamento umano, esso accetta come necessario questo ordine e 
nel suo riconoscimento vi ha l’affermazione della sua personalità giuridica” GORETTI apud DEL 
VECCHIO, Giorgio. A Justiça, São Paulo: Saraiva, 1960, p. 361. 
41 IHERING, Rudolf Von. L´espirit du droit romain dans les diverses phases de son dévelloppement. t. 
IV. Tradução de O. Melénaere. Paris: A. Marequ. p. 329. Tradução nossa. 
pela Revue de Droit Civil, as bases teóricas da doutrina acerca dos “sujeitos de 
direitos”42. Em tal trabalho, afirma que a essência da noção de sujeito de direito reside, 
de fato, no elemento interesse, com o que a noção do conceito torna-se 
inarredavelmente ampla, devendo abraçar toda uma esfera de seres que detenham 
interesses tuteláveis: 
 
Dado que o objetivo do Direito é alcançar a satisfação [dos interesses], o 
prazer, todo ser vivo que detenha as faculdades emocionais, e somente eles, 
são aptos a serem sujeitos de direitos, ainda que a razão lhes falte de forma 
definitiva ou temporária. A criança, o louco, curável ou incurável, podem 
ser sujeitos de direitos, pois podem sofrer. O próprio animal pode o ser [...] 
tendo, como nós, reações físicas e psíquicas dolorosas ou agradáveis [...] 43. 
 
Mais modernamente, David S. Favre, Professor de Direito da Michigan State 
University, louvando-se na abordagem dos interesses, em passagem bastante 
elucidativa, esclareceu que “a chave para o acesso à arena jurídica deve se pautar pela 
capacidade que determinados seres possuem de titularizarem interesses.”44 Caminhando 
por essa trilha, explica Favre que os parâmetros para acomodar as necessidades dos 
animais no âmbito do sistema jurídico devem se pautar não em capacidades naturais 
como a consciência, a senciência, ou a aptidão em articular linguagem, mas, sim, na 
possibilidade de titularizarem interesses validamente sustentáveis. Características 
humanas, ainda que compartilhadas pelos animais, não são medidores eficientes para se 
julgar a capacidade de ser sujeito de direito. Para Rosco Pound, os interesses estão 
latentes, esperando por reconhecimento. 
De uma forma ou de outra, no contexto de uma nova concepção de cidadania, a 
cidadania ambiental, propõe-se a extensão do conceito de sujeito de direitos a 
determinados entes, os quais Silva-Sanchez denomina de “novos sujeitos de direito”, 
entre os quais se encontram os animais45. Olmiro Fereira da Silva constata com 
propriedade que há um impasse estrutural no Direito Ambiental, “uma vez que a 
paridade natural contrasta com a disparidade jurídica nas relações ambientais 
básicas”46 existente entre os entes ambientais humanos e não-humanos. A partir da 
noção ulpiana de justiça (Honeste vivere, alterum non laedere, suum cuique tribuere; 
Digesta 1.1.10.1; Inst. 1.1.3), o autor constrói a idéia segundo a qual não haveria justiça 
ambiental centrada em um paradigma que exclua da realização do Direito determinados 
entes do repertório ambiental não-humano, pois a esses sujeitos não é atribuído o suum 
devido. A solução para o dilema encontrar-se-ia na ampliação da titularidade ambiental 
para que tais entes não-humanos “ganhem foros de sujeitos jurídicos, o quanto pode 
	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  
42 O jurista belga Edmond Picard, citado por Del Vecchio, antes mesmo de Demogue, em 1908, considera 
como possível “une organisation juridique où l’animal serait directement traité en sujet de certains droits” 
PICARD, Edmond. Le droit pur. Paris: Flammarion, 1908, p. 70. 
43 DEMOGUE, René. La notion de sujet de droit: caracteres et conséquences. Revue de Droit Civil, 
1909, p. 620. Tradução nossa. 
44 FAVRE, David S. Judicial recognition of the interests of animals, a new tort. Michigan Law State 
Review, 2005, p. 335. Tradução nossa. 
45 SILVA-SÁNCHEZ, Solange S. Cidadania ambiental: novos direitos no Brasil. São Paulo: 
Humanitas/FFLCH/USP, 2000. 
46 SILVA, Olmiro Ferreira da. Direito Ambiental e Ecologia: aspectos filosóficos contemporâneos. 
Barueri-SP: Manole, 2003. p. 36. 
permitir a relacionalidade jurídica, ainda que dentro de determinados limites também 
estruturais, mas que suplantem o antropocentrismo dogmático e enviesado.”47. 
No que se refere a essa superação, baseando-se na conceituação de William 
Duarte Costa, para quem “sujeitos da relação jurídica são aquelas pessoas ou agregados 
patrimoniais que figuram nos extremos da relação jurídica, assumindo a posição ativa e 
passiva”, alerta ainda aquele autor para o fato de que não seria algo tão estranho ou 
impensável atribuir subjetividade a entes não-humanos, “ainda que de modo 
‘despersonalizado” 48. Destaca, por fim, que a evolução dasubjetividade jurídica está 
evidente na dogmática jurídica, pois, além da pessoa física, há a personalidade jurídica 
das sociedades, do Estado e até de um patrimônio. Aduz que, sendo a subjetividade uma 
ficção e, como tal, passível de mudanças, ao sabor dos tempos e das necessidades, e, 
especialmente, por não haver impedimentos jurídicos ou lógicos para que se proponha 
sua alteração, com inflexão na intersubjetividade jurídica, propugna-se por tal abertura e 
ampliação desse referencial 49. 
 
IV. CATEGORIAS DOGMÁTICAS50 
 
Afirmar que os animais não-humanos são titulares de direitos, como o direito à 
vida, à integridade física, à liberdade, ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, 
tem um resultado natural: a possibilidade de aplicação de categorias tradicionalmente 
utilizadas no terreno dos direitos humanos para o campo dos direitos dos animais não-
humanos. É o que se passa a tratar. As categorias selecionadas, exemplificadamente, 
são: 1) o princípio da presunção de constitucionalidade e os casos suspeitos, 2) o 
mínimo existencial, 3) o princípio da vedação de retrocesso, 4) a ponderação de bens e 
5) a vinculação, a discricionariedade e as políticas públicas. 
 Milita em favor dos atos do Poder Público uma presunção de conformidade com 
a Constituição.51 Esta presunção é relativa, iuris tantum, pode ser derrubada por 
pronunciamento contrário. Em termos diretos: os atos estatais são reputados 
constitucionais até que se prove o contrário. Suposição através da qual se imagina que 
os agentes públicos exerçam as suas funções em respeito aos comandos formais e 
materiais da Lei Fundamental. Como ministra Perelman, “as presunções são admitidas 
de imediato, como ponto de partida das argumentações”.52 Deveras, a presunção de 
constitucionalidade é um lugar de saída, um elemento que se apresenta ao início da 
atividade hermenêutica e que, uma vez posta, irá influenciá-la, repercutir na 
	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  
47 Ibid., p. 37. 
48 Ibid., p. 106. 
49 Ibid., p. 102. 
50 Uma versão deste item foi originalmente apresentada no I Congresso Mundial de Bioética e Direito dos 
Animais (outubro de 2008) por Fábio Corrêa Souza de Oliveira, sob o título Categorias dos direitos 
humanos aplicadas aos direitos dos animais não-humanos: do caminho em curso ao caminho a 
percorrer. 
51 Sobre o princípio em causa, OLIVEIRA, Fábio Corrêa Souza de. Por uma teoria dos princípios: o 
princípio constitucional da razoabilidade. 2. ed. rev. atual. ampl. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007, 257-
262. 
52 PERELMAN, Chaïm. Argumentação. In: Enciclopédia Einaudi. V. 11. Lisboa: Imprensa Nacional: 
Casa da Moeda, 1987, p. 79. O Professor da Universidade de Bruxelas cita a existência de uma 
“presunção de credulidade natural, que faz com que nosso primeiro movimento seja acolher como 
verdadeiro o que nos dizem e que é admitida enquanto e na medida em que não tivermos motivo para 
desconfiar”.	
  
interpretação/aplicação.53 Como é a constitucionalidade que se presume, na hipótese de 
dúvida, incerteza, vacilação, prevalece a suposição de conformidade com a Lei 
Fundamental. A doutrina diz, então, ao se referir à dúvida razoável, que o Judiciário 
somente está autorizado a declarar a inconstitucionalidade quando ela for flagrante. O 
ônus da prova recai sobre quem alega a mácula. Na dúvida, repita-se, pro 
constitucionalidade. 
Nada obstante, firmou-se, tradicionalmente, uma postura, força na produção 
estadunidense, na vertente de que se a medida for restritiva de direitos individuais, 
destacadamente se empregar, como critério de discriminação, fatores tidos, a priori (no 
mínimo), como proibidos, a suposição da constitucionalidade se inverte, ou seja, a 
presunção vem a ser a da inconstitucionalidade, com o efeito da aferição jurisdicional se 
credenciar mais rigorosa ou veemente.54 Estas hipóteses são intituladas casos suspeitos. 
É tomada por suspeita qualquer medida que restringe a vida, a liberdade, a 
propriedade, tal como a que utiliza, como motivo de separação, dados naturais, 
independentes da vontade, isto é, características não escolhidas, incontornáveis: raça, 
cor, nacionalidade, sexo, filiação, altura. Comando que encampa a posição, na Carta 
brasileira, entre outros e especificamente, é o art. 7º, XXX.55 Nestes casos, suspect 
classifications, o ônus probante é do Estado, é o Poder Público que está incumbido de 
comprovar que a medida (seja lei, ato administrativo ou decisão judicial) é compatível 
com a Constituição. Caso não fique clara a conformidade, o resultado deve ser a 
invalidade. 
Em um raciocínio de semelhança, ampliando a metódica descrita, postula-se: 
uma medida que promove distinção entre animais humanos e não-humanos com 
alicerce, unicamente, na espécie de cada ser, qualidade natural, invariável pelo desejo 
ou pela eleição, especialmente quando restritiva ou aniquiladora dos direitos individuais 
dos animais não-humanos, a vida, a liberdade e o seu meio ambiente equilibrado, sejam 
bens encontrados no próprio ecossistema (terra, água, ar, luz, alimentos) ou edificados 
(o ninho de um pássaro, uma toca, o estoque de mantimentos), pois que o conceito de 
propriedade não parece refletir adequadamente o fenômeno, traz o sinal da presunção de 
inconstitucionalidade. 
As categorias raça, cor, nacionalidade, sexo, porque carecem de coerência frente 
aos animais não-humanos, possuem correlato na categoria espécie, a qual, embora seja 
engenho do homem assim como as outras citadas, é, para todos os efeitos desta reflexão, 
	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  	
  
53	
  Todavia, Manoel Gonçalves Ferreira Filho, em comentário sobre o Executivo e o Legislativo, assinala: 
“A presunção de que os atos destes dois Poderes sejam legítimos e visem ao interesse geral mantém-se no 
plano jurídico-formal. Do ângulo da opinião pública, não. São eles compostos de ‘políticos’ e estes são 
objeto de escárnio, pois, todos duvidam, trabalhem para o interesse geral”. FERREIRA FILHO, Manoel 
Gonçalves. Poder Judiciário na Constituição de 1988: judicialização da política e politização da justiça. 
In: Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro: Renovar, n. 198, p. 1-17, out./dez. 1994, p. 15. Se 
há dúvida de que os agentes eleitos, mas não só eles, atuam em favor da coletividade humana, imagine em 
prol dos animais não-humanos. De resto, a crise do Estado brasileiro afeta os três Poderes. 
54 Tb. PERELMAN, Chaïm. Ética e Direito. Tradução por Maria Ermantina Galvão. São Paulo: Martins 
Fontes, 1999, p. 668. Na doutrina nacional, CASTRO, Carlos Roberto de Siqueira. O devido processo 
legal e a razoabilidade das leis na nova Constituição do Brasil. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1989, p. 
171 e 172. 
55 Art. 7º, XXX: “proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por 
motivo de sexo, idade, cor ou estado civil”. Conquanto a redação fale “proibição de diferença de salários, 
de exercício de funções e de critério de admissão”, o entendimento pacificado é o de que as interdições 
não estão circunscritas a tais hipóteses, possuindo incidência geral, ou seja, aplicam-se para as 
situações/relações como um todo. 
imanente, acompanha, irrenunciavelmente, a entidade. Não é possível esposar a idéia de 
que qualidades naturais somente são aplicáveis aos humanos para o fim de cuidar da 
presunção de inconstitucionalidade

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