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GRUPO Fugacidade, Ritimo e Forma.Autor. Afonso H. Lisboa da Fonseca (1)

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GRUPO - FUGACIDADE, RITMO E FORMA
Este livro expõe o modelo de trabalhos com grupos
da Psicologia Humanista, ao mesmo tempo em
que busca ampliar uma compreensão e explicação
de seus fundamentos.
Uma concepção abrangente, voltada para a .
consideração pelo indivíduo, como singularidade,
no grupo e pelo grupo. Busca, desta forma,
um clima que possa, simultaneamente, potencializar
a criatividade do indivíduo e do grupo, otimizando a
capacidade destes na realização de suas tarefas.
N. charn.: PSI 302.3 F676g
Autor: Fonseca, Afonso Henrique Lisboa da
Titulo. Grúpo : fugacidade. ritmo e
Ilmllllllllllllllllllll~11111I1I11 1111111111111111111111111111111111111 ~~~~:~ 13
Ex.2
Afonso H. Lisboa da Fonseca
PSicólogo, psicoterapeuta e facilitador de grupos,
trabalhando na linha dos referenciais da gestalterapia
e da abordagem centrada na pessoa.
Participou de programas de treinamento do "Center
85'1 ""346 .•••{or the Studies of the Person" no Brasil, E.U.A. E
Jí~l~\l~í~J~~~JI~l~::~d::~;~~:;~:~~e::'~:~~:i:;:::~:
• "",,4;O"S""~.""u@'",:'!:""~' r, ~/ 111 1\1 .
FUGAC IDADE
RITMO E FORMA
PROCESSO DEGRUPO
E FAC1LlTAÇAoNA
PSICOLOGIA
HUMANISTA
GRUPO - FUGACIDADE, RITMO E FORMA
Processo de Grupo e Facilitação na Psicologia Humanista
ÍNDICE
Prefácio 9
Introdução 13.
CAPÍTULO 1
A Proposta do Grupo Vivencial 19
CAPÍTULO 2
Grupo, Fugacidade, Ritmo e Forma
O Trágico e o Plástico na Vivência Grupal ; 47
CAPÍTULO 3
"Toques" Sobre o Processo da Facilitação
A Configuração de Fragmentos 79
CAPÍTULO 4
Empatia, Visibilidade e Disciplina
Empatia, Controle da Diferença ou Pregnância da Outri-
dade 117
CAPÍTULO 5
Multiplicidade, Diferença, Experienciação,
Intensidade e Retorno
Dimensões Terapêuticas do Grupo Vivencial 131
CAPÍTULO 6
Grupo) Sociedade de Consumo e Necessidades Humanas 147
CAPÍTULO 7
Grupo e "Pessoa" ................................ 169
CAPÍTULO 8
O que Chamamos de "Grupo"? 175
PREFÁCIO
o filósofo político Ernest Becker, no seu livro Angel in Armor,
atesta que: "O Homem é o único animal criado pela evolução que
pode usar seu poder para uma liberação maior dos indivíduos, da
contínua ação coerciva dos grupos" (p. 112). O que será que isso
significa? .
Que grupos controlem seus membros raramente é contestado. A
sociedade,por exemplo, continua a limitar as inovações individuais
a despeito do seu valor para o grupo. No seu ensaio, Individual
Liberty and Public Control, Bertrand Russell sugeriu que o próprio
progresso pode também acarretar a ilusão que não é necessária mais
nenhuma inovação. "Cada geração é tolerante somente com as ino-
vações do passado. As do seu próprio tempo encontram as mesmas
perseguições como se jamais se tivesse ouvido falar do princípio da
tolerância."
Os psicólogos não foram tímidos em culpar o grupo pelos males
do indivíduo. Catl Ro er, por exemplo, acusou: "As influências
culturais é que são o fator principal das más condutas". Ele vê os
membros da espécie humana "como essencialmente construtivos na
sua natureza fundamental, mas estragados pela sua experiência"
(1981). "A única questão", Rogers adverte, é: "Será que estou vivendo
de um modo que é plenamente satisfatório para mim, e que verda-
deiramente me expressa?" (1961, p. 119). Esta atitude pode ser um
passo importante no processo de liberação do indivíduo da coerção
dos grupos. Entretanto, por ignorar a relação inseparável entre o
grupo e seus membros e quando seguida como princípio generali-
zador, tende a funcionar somente para uns poucos indivíduos e
realmente não "libera os indivíduos da contínua coerção dos grupos".
A responsabilidade do indivíduo na formação da cultura não
pode ser posta de lado. "Quem faz esta cultura", perguntou RolIo
9
May, "se não estas mesmas .pessoas como você e eu? ... Não há
sel]. senão na interação com uma cultura, e nenhuma cultura que
não se conceitua de selves" (1982). Então será que deveremos nos
voltar para Os grupos a fim de liberar os indivíduos? Deveríamos
entender a' proposta de Becker como um mero manifesto de revolu-
cionários políticos? Um pequeno grupo de fanáticos que ganha o
apoio das massas e depõe o grupo dominante, será que realmente
libera o indivíduo? Além de impor uma nova moralidade, a nova
ordem freqüentemente difere muito pouco da velha e o indivíduo
não passa melhor do que antes. Não, não é nem o indivíduo nem
o grupo: é o Homem que tem o poder de liberar os indivíduos.
O Homem é você e eu, os pais de nossos pais e os filhos de
nossos filhos, nossos atos, nossos artefatos, como vivemos e morre-
mos. "Sentamos juntos e conversamos", escreveu Schopenhauer no
seu ensaio sobre a indestrutibilidade do nosso Ser pela Morte, "e '
ficamos excitados, e nossos olhos brilham e nossas vozes ficam
agudas: assim também outros sentaram e conversaram mil anos
atrás: era a mesma coisa, e eram as mesmas pessoas: e será assim
também daqui a mil anos. O dispositivo que nos impede de perceber
isto é o tempo".
Assim, ao nos perguntarmos se estamos vivendo de um modo
que "verdadeiramente nos expressa" e realizando quem somos, no
tempo, e realizando as conseqüências das nossas ações, estamos
assumindo a responsabilidade pela cultura e liberando os indivíduos
da coerção dos grupos. Mas exatamente como os indivíduos são
influenciados pela cultura e a influenciam é muito complexo. Tendo
nascido numa cultura e ordem social que já estava formada e na
qual pessoalmente tivemos muito pouco a dizer na sua formação,
somos nós próprios moldados, algumas vezes para pior. Nossos atos,
como indivíduos, tomados juntos alteram e redefinem a cultura e a
ordem social, tanto direta quanto indiretamente. Assim o Homem
está numa posição peculiar de criar algo que ele está seguindo.
Ignorar a influência e a responsabilidade do grupo ou ignorar a
influência e a responsabilidade do indivíduo são igualmente graves.
Para as transições práticas precisamos deste livro do Fonseca
e outros como ele. Este livro nos ajuda a entender a natureza dos
grupos que têm como um dos seus propósitos explícitos a liberação
dos membros individuais da sua própria repressão. Entender a natu-
reza dos grupos é um passo adiante na direção da compreensão de
como você e eu podemos inovar, inventar, expressar originalidade e
10
contribuir com consciência para o todo do qual somos parte, nossos
atos (tomados juntos) definindo uma sociedade mais sábia e efetiva.
[ohn Keith W ood
Estância Jatobá, 26 de janeiro de 1988:
REFERÊNCIAS
Rogers, C. R., On Becoming e Person, Boston, Houghton Mifflin, 1961.
___ ' , Notes on Rollo May, Perspectives, 2(1}, Humanistíc Psychology
Institute, San Francisco, p. 16, 1981.
May, R., The problem of evil: An <;,pen letter to Carl Rogers, Iournal oi
Humanistic Psychology, Summer issue, 1982.
11
INTRODUÇÃO
o conjunto de ensaios que compõe este volume não carrega
pretensões de que eles se configurem como um conjunto que abranja
a globalidade do tema, que o esgote ou mesmo que o trate exausti-
vamente. Compõe-se, entretanto, de reflexões, observações, associações
e elaborações teóricas que emergem essencialmente da simples pro-
posição, vivência e prática dos grupos vivenciais' e da sua facili-
tação, a partir, originalmente, dos modelos formulados por Rogers
e companheiros, em particular nos anos 70, com marcadas influências
do clima da Psicologia Humanista de então e, portanto, da Gestal-
terapia.
Julgamos importante que possamos, enquanto conjunto de pro-.
fissionais e de estudantes, refletir coletiva e sistematicamente sobre
nossos objetos de estudo, perspectivas, posturas e métodos de trabalho
e contribuir, a partir de nossas reflexões particulares, para um
processo coletivo de elaboração teórica criativa e eficiente, que possa
realimentar os nossos modelos e possibilidades de trabalho.
Naturalmente que uma teorização desse tipo não pode confun-
dir-se com umcientificismo estéril, ou com a simples especulação
abstrata, desvinculada dos processos concretos. Sabemos dos limites .
e dos malefícios do cientificismo ou da "erudição" que, em suas
suspeitas esoterizações de todos os conhecimentos, servem, de modos
cada vez mais nítidos, à manutenção e à reprodução de estruturas
necrófilas de desempenho do poder. Conhecemos com freqüência os
limites da ciência como forma de conhecimento e intervenção huma-
nos, nós em particular, que confrontamos e que vivemos cotidiana-
mente as evidências de que a produtividade em nossos trabalhos
está sempre inteiramente impregnada do artístico.
* Para efeitos práticos, sempre que nos referimos ao grupo, aqui estamos
considerando a modalidade do grupo vivencial de fim de semana, que é uma
forma mais completa e que inclui as demais.
13
Existe, entretanto, um preconceito generalizado contra a teori-
zação, preconceito que não se radica numa crítica saudável da teo-
rização como modo exclusivo ou como modo maior de conhecimento,
nem na crítica do teoricismo abstrato e vazio, ou na crítica da teoria
como modo primário de conhecimento, mas que pretende banir toda
e qualquer forma de teorização, como inútil, como desnecessária,
como espúria.
Existe uma variedade de equívocos e de indícios de suspeição
numa tal postura.
Sabemos que a vida precede a teorização e que existe aí uma
relação hierarquizada. A teorização, entretanto, é um momento, ainda
que subalterno, irrecusável da produção e da aplicação de conhe-
cimento e da própria produção da realidade, principalmente quando
consideramos a intrínseca e irrevogável natureza coletiva desses
processos. Marco de referência, a teorização é um nível fundamental
de comunicação no processo de criação e recriação de conhecimentos
e da própria realidade física e social. De modo que bani-lasignifica
a obstrução de suas possibilidades nesse sentido. .
Acredito que existe um tipo particular de equívoco ao nível
da Psicologia Humanista. Contrariando certas tendências da psico-·
terapia ou do que se chama de "aconselhamento", ou. do trabalho
com grupos, as linhas da Psicologia Humanista fundaram-se numa
postura experimental. Postura esta que prescinde de teorização,seja
ela moral, ínterpretativa, técnica, "iluminada" e outras, no momento
particular de sua prática. Essa postura, perfeitamente válida e inova-
dora da Psicologia Humanista, no seio das psicologias ocidentais,
não significa, entretanto, uma abolição da teorização como uma das
formas possíveis de seu crescimento e de comunicação entre os seus
praticantes.
Lamentavelmente, isso nem sempre tem sido bem entendido, e
execra-se, desinformadamente, a teorização em si como um modo
espúrio de desenvolvimento e de comunicação, ao mesmo tempo em
que se patina flagrante e festivamente num lodaçal de conceitos alie-
nígenas e alienados, de chavões coloridos e fúteis e de lugares-comuns,
que militam. no sentido da pretensão de garantir uma abstenção ao
movimento da realidade e de manter estática uma certa ordem do
mundo.
Reconhecemos os limites da teorização e mesmo da ciência,
Como dissemos, como forma de comunicacão humana e como instru-
mentos de produção de conhecimentos, de crescimento e da criação
e recriação da realidade, mas não podemos deixar de reconhecer a
sua importância, dentro dos seus limites próprios.
Mesmo porque a boa teorização impõe-se por si mesma,auto-
-evidencia-se, não pede licença, nem mesmo àqueles que a articulam,
14
num momento individual de um processo que é eminentemente
coletivo.
De um modo simples e despretencioso, é isso que pret~ndemos
que sejam os momentos mais criativos. dos presente~ ensaios. M~-
mentos modestos de um processo coletivo de produçao do conheci-
mento e de produção da realidade, no âmbito .em particular dc:s qu~
trabalhamos com grupos. Se faz ou não sentido essa pretensao, so
os seus efeitos poderão dizer. A tentativa, no entanto, é natural e
spontânea, sincera e alegre; e a nosso ver, justifica-se simplesmente
por isso.
A teorizacão sobre os grupos vivenciais tem sido muito limitada
c escassa, ainda que· hajam contribuições significativas. Mesmo da
parte daqueles que os propuseram originalm~nte, na forma que eles
têm tomado na Psicologia Humanista. Acreditamos mes~o ·que estes
que elaboraram o model~ origi~al - .no qu.e pese a n9-ueza des~e
modelo - nunca consegurram dizer satisfatoriamente as linhas gerais
daquilo que têm intuído. É evidente que seria imp~ssível, e mesmo
contraproducente, uma descrição minuciosa e exaustiva. No .e~tan!o,
o que presenciamos não é uma sábi~ abstenção
A
d~ exphclt~ço~S
excessivas mas uma impotência no dizer. Impotência que nao e,
naturalmente dos indivíduos, mas de sua articulação coletiva, e
que decorre,' em grande parte, do preconceito e da aversão à teori-
zação de que vimos tratando.
Isso dá lugar, por um lado, ao surgimento, ao desdobramento,
em vários níveis, de uma série de distorções, que são .bas!a~te
evidentes. E, por outro, a uma dissipação progressiva das intuiçoes
originais e das implicações de sua. prática, que,. ~elo simples fato
de não serem comunicadas e efetivamente explicitadas, perdem-se
progressivamente, exaurindo-se abortivamente sem terem efetivado as
suas potencialidades e involuindo precocemente, em vez de serem
transcendidas na prática pela crítica efetiva.
Isso é, evidentemente, um efeito maior do riiilismo que grassa
no âmbito da Psicologia Humanista e que exigiria um outro espaço
para ser efetivamente comentado.
Acreditamos na importância do modelo de trabalho dos grupos
vivenciais, tanto em termos de suas aplicações mais freqüen.tes, na
clínica psicológica, nos grupos de crescimento, na pedagogia =.
como em inúmeros outros campos, praticamente inexplorados, quais
sejam, por exemplo, o d~. autogestão na ?:gatiiza~ão da sociedade
civil, o das relações familiares, da educaçao ambiental, das nego-
ciações coletivas e outros.
Por isso é que reconhecemos a importância de "conversarmos"
sobre os fundamentos do que fazemos em nosso trabalho, sobre o
15
que aprendemos, descobrimos, sobre as associações que nos ocorrem,
sobre as dificuldades, dúvidas e "grilos" em geral, no sentido de uma
movimentação criativa de nossos modelos de trabalho, de nossas
perspectivas, de nossas posturas e métodos.
Este volume tem a pretensão de servir de veículo para al-
guns aportes em conversas desse tipo. Apartes que se originam,
nessa -sua forma, de alguém que conhece bem - porque consciente-
mente co~primido por ela - a estreiteza dos seus próprios limites,
mas cônscio também da relevância da efetivação da simples alegria
de dizer, sem que, portanto, seja necessário concorrer à remissão
dos pecados.
O que aqui está colocado nestes ensaios deriva da prática con-
creta do grupo vivencial e surge espontaneamente como uma reflexão
necessária a um aprofundamento e clarificação de referenciais de
trabalho. Surge, também, como uma inevitável elaboração teórica
dessa prática, elaboração essa que se dá muito mais pelo seu prazer
do que pela pretensão de uma verdade privilegiada.
Buscamos inicialmente (capítulo 1) mapear os contornos da
proposta do grupo vivencial. Acreditamos que um esboço dessa
proposta pode ser útil, tanto no sentido de delimitá-Ia como no
sentido de clarificá-Ia para quem por ela se interessa e nela even-
tualmente se inicia. A seguir (capítulo 2), tentamos abordar dimensões
do grupo que fogem aos arcabouços conceituais com os' quais ele
tem sido tratado e,. diga-se de passagem, com os quais a própria
psicologia tem sido tratada, e que, não obstante, são dimensões
fundamentais da vivência grupal e da produção de seus efeitos. Dizem
respeito ao caráter "coletivo" e fugaz da vivência grupal e, em
particular, à natureza trágica (no sentido nietzschiano) de sua pro-
posta. Sempre implícita, mas nunca explicitada, como ocorre aliás,
com as posturas da Psicologia Humanista.Acreditamos, como já foi mencionado por Rogers, O'Hara e
Wood, que o grupo vivencial configura o resgate de uma modalidade
antiga de regeneração e de revitalização da socialidade humana e do
indivíduo. Nesse sentido, parece bastante interessante pensá-lo se-
gundo as perspectivas sociológicas elaboradas por Michel Maffesoli,
que tematiza a vivência nos espaços coletivos em todas as sociedades
como uma forma de vivência intensa da socialidade humana. A
seguir, coletamos no capítulo 3 uma série de reflexões relativas a
temas do processo da facilitação. Essas reflexões visam elucidar
questões concretas desse processo e explicitar um certo conhecimento
a elas relativo.
. A empatia é um tema maior da Abordagem Centrada na Pessoa
e da Gestalterapia, e mesmo de todas as abordagens psicoterapêuticas.
16
Tem um papel muito importante na facilitação do grupo vivencial
e mesmo crucial em certos momentos. Não são poucos, entretanto,
os riscos conceituais e as possibilidades de distorção e de uso mani-
pulativo dessa idéia de empatia. Tentamos no capítulo 4 tratar
desses riscos e possibilidades, fazendo uma crítica do conceito e
tentando ressaltar a importância da preservação e mesmo do privile-
giamento da tensão de diferença entre os sujeitos de uma relação
empática. No capítulo 5 tentamos elucidar alguns aspectos psicote-
rapêuticos do grupo vivencial. Aspectos que consideramos não-for-
mais e aspectos que podem ser compreendidos a partir da perspec-
tiva das teorias da terapia da Abordagem Centrada na Pessoa e da
Gestalterapia. Os capítulos 6, 7 e 8 buscam trabalhar referenciais
para uma contextualização do grupo vivencial. É cada vez mais
evidente que os subsídios teóricos fornecidos pela Psicologia Huma-
nista, e mesmo pela Psicologia, não dão conta de uma compreensão
ampla do grupo vivencial, sendo necessário o concurso de outras
áreas de ciência e da filosofia. Nesses três capítulos tentamos pensar
o grupo a partir da perspectiva de sua pertinência ao contexto da
estrutura de necessidades da sociedade de consumo (capítulo 6).
No capítulo 7 tentamos pensar de um modo menos individualizante
o conceito de pessoa e a importância e implicações de uma tal
perspectiva para a concepção e prática da proposta do grupo viven-
cial. No capítulo 8, por fim, buscamos conceituar o "grupo" segundo
referenciais mais amplos do que os que nos pode propiciar a teori-
. zação da Psicologia Humanista. É possível que uma compreensão
mais abrangente e contextualizante do grupo nos possa propiciar
importantes subsídios para a sua compreensão, para a compreensão
de seus processos e para a compreensão da vivência particular de
seus participantes. .
São Paulo, dezembro de 1987.
17
CAPÍTULO 1
A PROPOSTA DO GRUPO VIVENCIAL
"A palavra nasce substancialmente, vez após vez,
entre homens que, nas suas profundidades, são cap-
tados e abertos pela dinâmica de um elementar estar
juntos. O inter-humano propicia aqui uma abertura
àquilo que de outra maneira permanece fechado."
(M. Buber em Do Diálogo e do
Dialógico)
"Ao transcender a' si próprio, o indivíduo agrega
a outros elementos contraditórios para formar um
todo que, por seu turno, valoriza sua existência. ( ... )
Só podemos existir na medida em que fizermos parte
de uma ordem na qual integramos a nossa diferença
assumida /Ium todo que vai além de /Iós."
(M. Maffesoli em A Sombra de
Dionísio)
A proposta do grupo vivencial, tal como a trabalhamos aqui,
é uma proposta já desenvolvida e testada por mais de trinta anos,
desde os seus primórdios, com os chamados "Grupos de Encontro".
B, não obstante, uma proposta precariamente explícita, em particular
no que se refere a suas modalidades mais recentes. Isso parece
dever-se, em grande parte, ao profundo empirismo de suas origens,
que, tendo revelado importantes frutos, parece chegar a um esgota-
mento inescapável, que solicita o concurso de uma explicitação ade-
quada dos modelos de trabalho elaborados e uma vigorosa e compe-
tente reflexão teórica sobre eles, sobre seus efeitos e contextos, para
que novas, desconhecidas e incertas florescências possam ser via-
bilizadas,
Um trabalho desse tipo, naturalmente, só pode ser desenvolvido,
como trabalho coletivo, pelo conjunto de profissionais que por ele
se interessa.
O que aqui pretendo é tentar explicitar uma visao pessoal e,
certamente, incompleta e provisória, da proposta do grupo vivencial,
tal como a tenho aprendido, vivido e recriado - como inevitavel-
19
mente o faz quem quer que a operacionalize -, de modo a colaborar
com esse processo coletivo de. explicitação e reflexão acerca de suas
formas e conteúdos.
1. MODALIDADE DO GRUPO VIVENCIAL
I.
'I
A proposta dos grupos vivenciaís e da facilitação tem uma
estrutura básica que possibilita uma certa variedade de modalidades.
Pretendemos empreender inicialmente a uma descricão sucinta destas
modalidades. '
Quanto ao seu caráter mais geral, Os grupos podem ser "resi-
denciais" OU "não-residenciais". Osgi'upos resídenciaís . são grupos
com mais de um dia de duração, com atividadesde reunião "formal"
de grupo e com a possibilidade de reuniões e encontros informais
entre os participantes. Nessa modalidade, os participantes fazem
conjuntamente as suas refeições e alojam-se num mesmo local, pelo
período de duração do grupo, sendo necessário que se providencie
a infra-estrutura para tal. Podem ter dois dias de duração, por
exemplo, ou' desenvolverem-se em um final de semana, o que é mais
comum, ou ainda durante uma semana, dez ou quinze dias.
Os grupos "não-residenciais" são grupos que têm a' duração de
menos de um dia, e os participantes fazem as suas refeições, ou pelo"
menos dormem, em suas residências. Os participantes desse tipo de'
grupo podem reunir-se uma única vez, ou por várias vezes sucessi-
vamente, como um mesmo conjunto 'de pessoas, com sessões de
maior ou menor duração, mais ou menos intensivamente.
Podem reunir-se igualmente, por exemplo, durante um final de
se!llana - sexta-feira à noite; sábado, pela manhã, à tarde e/ou
à noite; e domingo pela manhã e/ou à tarde, a critério dos parti-
cipantes -, sendo que, como foi dito, dormem em suas residências,
fazendo por conta própria as suas refeições (não são raros,entre-
tanto, os grupos que decidem fazê-Ias conjuntamente).
Esses grupos não-residenciais podem ser mais ou menos exten-
sivos, contando, de um modo geral, com o mesmo conjunto de parti-
cipantes. Podem assim reunir-se durante um dia de semana, ou uma
vez por semana, ou ainda durante um certo período de tempo, como
três, seis, meses, um ano etc. .
Existem, naturalmente, algumas diferencas estruturais entre os
grupos de caráter residencial e os de caráter não-residencial. Além
das diferenças relativas às questões de infra-estrutura, é importante
ressaltar as diferenças relativas aos modos de convivência dos parti-
cipantes, já que nos grupos residenciais eles compartilham uma certa
20
cotidianidade particular nos momentos de refeição, nos horários
vagos e de lazer, dormindo num mesn;o. co~junto de a~os~~tos .. O
compartilhamento dessa cotidianidade e, ~nexIstente ou s~g~lÍ1cat1V~-
mente reduzido nos grupos não-residenciais, tendendo a limitar-se as
"reuniões formais" de grupo, que são apenas um dos tipos possíveis
de atividade comum nos grupos residenciais. Nestes, portanto, os
participantes têm amplas oportunidades para .co?tatos informais em
relações diádicas ou múltiplas, o que potencializa enormemente as
possibilidades da vívência grupal, que dispõe então de uma contex-
tualização vivencial mais ampla ..
Não obstante, a proposta básica do grupo e a relação básica
do facilitador com este e com os participantes é a mesma.
Quanto ao número de participantes, os grupos vivenciais podem
. também variar. O mínimo ideal parece ser o de um conjunto de dez
ou doze' participantes. O que não impede que se façam grupos
menores de atétrês participantes, por exemplo. Deve-se, nesses
casos, naturalmente, esperar um processo mais "concentrado", diga-
mos. Se pensamos, por exemplo, que a terapia diádic~ é u~ grupo
de dois participantes e que pode ser bastante produtivo e intenso,
vemos que não há por que não fazer pequenos grup?s, mes~o que
com três participantes apenas, desde que esses estejam motlvados,
disponíveis e conscientes do tipo do grupo.
O "pequeno grupo" pode ter até vinte participantes.
Um bom número para grupos residenciais de cur~a duração -
um fim de semana, por exemplo - parece ser o de vinte e c.mco a
trinta pessoas. Grupos maiores podem ser ev:ntualmente reahz~dos.
Em grupos com um maior período de duraçao pod:m' ~aver trinta,
cinqüenta, oitenta, cem participantes. Grupos excepcionais podem ter
mais que isso. .
2. ENCONTRO, ESPONTANEIDADEE AFIRMAÇÃO
Uma característica fundamental dos grupos vivenciais é que o
Iacilitador não tem nenhum programa a priori par~ o grup~. O <J~e
interessa à sua proposta é que as pessoas, as realidades exístenciais
ue se encontram no grupo, efetivamente se encontrem. Que se
descubram, que se criem e recriem ativamente, a partir da esponta-
n idade da dinâmica das relações da multiplicidade de suas perspec-
tlvas pessoais e coletivas, tanto em termos da subjetividade, comp~r-
tumentos e ações de seu conjunto global como em termos da subje-
tividade, comportamentos e ações dos segmentos deste e das pessoas
Individuais.
21
Ê nesse sentido que o facilitador investe o poder que lhe faculta
a possibilidade de criar esse encontro e de nele manter-se como
facilitador; é nesse sentido que ele investe suas capacidades, habili-
dades, sentidos e o momento de sua própria atualidade existencial.
De modo que a proposta do grupo vivencial é, em síntese, a
da ~riação, e participação nos desdobramentos espontâneos, da opor-
tunidade de um encontro particular e imediato de pessoas num
microgrupo transitório, isto é, efêmero, a partir da influência autô-
noma da multiplicidade de suas dimensões constituintes, quer sejam
elas pessoais, subgrupais ou efeitos do conjunto do coletivo grupal.
Criada a oportunidade do encontro, interessa que se configurem
e que se desdobrem plenamente - segundo os padrões automoti-
vados, autodirigidos e regulados por seus agentes - as relacões
interindividuais e intersubgrupais, as relações indivíduos-grupo ~ as
configurações grupais espontâneas que se constituem na contingência
própria desse encontro particular. Interessa igualmente o livre fluxo,
constituição, reconstituição e desdobramento, e a ativa e eventual
expressividade, motivada pelo interesse de seus agentes, da expe-
riência subjetiva concomitante às relações contingentes ao encontro.
O que é que se. encontra no encontro, através dos agentes
pessoais que a ele constituem?
Numa certa perspectiva, são as relações sócio-culturais e histó-
ricas que os constituem como pessoas e que intermediam as suas
interações, que, de uma forma ou de outra, influenciam a consti-
tuição de suas atualidades existenciais e a constituicão dos sub-
sistemas de que eles participam no contexto do grupo. São, por
outro lado, as formas particulares da pessoalidade de cada um deles
e do "momento" de então de suas atualidades existenciais. São as
necessidades, interesses, capacidades, potencialidades e sentidos desse
momento que confundem no encontro, constituindo-o e reconstituin-
do-o e sendo por ele constituídos e reconstituídos.
Interessa que, como "encontro", essa confluência de momentos
de atualidades existenciais se constitua e se desdobre, multidimen-
sional e dinamicamente, a partir da participação automotivada de
c~da um de. seus agentes individuais, dos subsistemas que as condi-
çoes pessoais comuns, eventualmente, determinam, e a partir dos
fluxos e refluxos subjetivos, objetivadores e objetivados do processo
coletivo global do conjunto em que eles se articulam.
.0 .grup? vivencial não tem, pois, nenhum tipo de programa
a prtori. O interesse de sua proposta é o de que o seu "aconteci-
t " dmen o se engen te como processo espontâneo de constituicão e de
?esd~bramento das relações interpessoais, intersubgrupais ~ grupais
imediatas de seus participantes, a partir de seus interesses pessoais
e coletivos.
22
O momento da atualidade existencial de cada um dos parti-
cipantes individuais, assim como a situação de cada um dos sub-
sistemas eventuais em que eles se articulam a partir de suas condições,
necessidades e interesses, são privilegiados como focos autônomos e
ativos de constituição e reconstituição do encontro/processo grupal.
Interessa, pois, que este se constitua e se desdobre dinamicamente
de modo heterogêneo e descentralizado, como processo multidimen-
sional, gerado a partir dos dinamismos próprios das relações da
multiplicidade de dimensões de seus elementos constituintes.
A proposta do grupo vivencial só pode, pois, ser ?ensad!,
compreendida e explicada adeq,:adamente a partir da c~nfIgu:açao
de uma diversidade de perspectivas que abordem a particularidade
da vivência das várias de suas dimensões simultâneas, distintas, mas
dialeticamente articuladas. De modo que parece interessante pensar
distinta e simultaneamente a proposta do grupo vivencial da perspec-
tiva do "grupo" enquanto sistema global, da perspectiva do partici-
pante individual, da perspectiva dos subsistemas em que eles event?al
ou necessariamente se articulam dentro do grupo e da perspectiva
do facilitador/equipe de facilitadores.
Na perspectiva do grupo como sistema global é importante res-
saltar a sua intrínseca dependência para com o facilitador, ou para
com a equipe de facilitação. Dependência que pode diluir-se, à
medida do transcurso do processo grupal, mas que é fundamental
nos primórdios deste.
No que pesem as características "democráticas", digamos, ~e
sua proposta, o grupo vivencial constitui-se necessariamente a partir
do poder do Iacilitador. Na verdade, como observei em um outro
texto,' ao criar o grupo, o facilitador cria um universo para o seu
poder.
Este poder carece de ser visto em (pelo menos) dois níveis
distintos. Como "poder institucional", oriundo do sistema social
mais amplo, e que se presentifica nas credenciais e habilitações para
as práticas institucionais que o facilitador desenvolve; e como o
poder que em grande parte deste deriva, mas que se gera ao nível,
digamos, da "interioridade" do sistema grupal particular. Ainda que
derive basicamente do primeiro - ou seja, que se origine extrinse-
camente ao sistema grupal particular, na estrutura institucional da
sociedade -, este segundo nível tende, nos casos bem-sucedidos, a
diferenciar-se particularmente dentro do sistema grupal, a consti-
1. Fonseca, A. H. L., "Instituição, Poder e Vida - Idéias sobre a Faci-
litação de Grupos Centrada na Pessoa", in Rogers, C. R., Wood, J. K., Q'Hara,
M, M., Em Busca de Vida, São Paulo, Summus, 1983.
23
. difei t' '. f di' t d /tuír-se, 1 erenciar-se e me amor osear-se com o esenvo vimen o o I
seu processo. Nesse momento, então, não se trata simplesmente do'
poder extrinsecamente conferido pela estrutura do sistema social
mais amplo, mas é, agora, um nível de poder intrínseca e particular-
mente elaborado e conquistado pelo facilitador no próprio processo
de constituição e desdobramento do grupo como sistema singular.
O desempenho competente e racional de sua função por parte
do facilitadorpermite ao grupo gerir consensualmente e sem mani-
pulações o poder institucional que lhe diz respeito e a gerar a dimen-
são particular de poder que se constitui com o encontro grupal. .
Desempenhando competentemente as suas funções, o' facilitador rea-
firma-se e confirma-se como agente racional de poder institucional,
articulando o poder institucional pelo qual se credencia com a di-
mensão' singular de poder emergente do encontro grupal, possibili-
tando e potencializando asua constituição, exercício e desdobra-
mentos.'
Dessa forma, os dois níveis .de poder articulam-se dinamica-
mente, . diferenciando-se o segundo a partir do primeiro e sendo por
ele potencializado. De passagem, isto significa dizer que não havendo
o primeiro nível, o segundo não haverá, ou, em havendo, estaremos,
pelo menos, diante de uma exceção.
"De posse" do poder que lhe facultam as suas credenciais e
. habilitações, o facilitador "decide" usar de uma certa forma p.arti-
cular este poder e criar o grupo vivencial. Num primeiro nível,
ele decide providenciar a infra-estrutura, propor o grupo, divulgar,
inscrever' e receber os participantes, executando ou administrando
todas as. tarefas pertinentes ao "pré-grupo".'
Ao nível da vivência geral, propriamente dita, não é qualquer
tipo de encontro de pessoas que interessa à investidura do poder. do
facilitador, é um certo tipo específico e caracterizado. Não é; por
exemplo, um tipo de encontro em que ele vá servir como "orien-
tador" do grupo e das pessoas; ou um tipo de encontro em que ele
vá dar aulas aos participantes ou prédicas morais ou ministrar
qualquer forma de sabedoria; não é, por exemplo ainda, um tipo de
encontro no qual ele vá ser o "comandante" ou o chefe supremo,
ainda que exista a especificidade de sua função institucional.
O tipo de encontro que o facilitador funda com o seu poder,
e em cujo transcurso o investe deliberada e ativamente, tem como
2. lbidem.
* É importante observar que, num certo sentido concreto, o grupo não
existe nesse momento como um sistema globalizado de relações descentrali-
zadas, mas como um sistema de relações biunívocas entre o facilitador, ou
. seus prepostos, e cada um dos participantes.
24
especificidade mais geral o f~to de
A
qu~ interessa ao fac1litador que
o conjunto das relações, dos intercâmbios de todos os generos entre
os participantes do grupo se constitua, paula!~naI?ente, d~ um modo
descentralizado, a partir da ação, da expenencia, dos interesses e
excitações de cada um dos participantes e dos subgrupos a que eles
necessariamente pertencem, ou eventualmente engendram no contexto
grupal imediato ..
Interessa ao facilitador a "ordem orgânica" que se cria como
"Processo Grupal", a partir da interação .da t?ultiplicidade, ~e dife-
renças presentes no encontro. Interessa o mter].og~ do exerc~cl<: e da
criacão e recriacão dessas diferenças, decnaçao e recnaçao do
brilho mais ou menos intenso do(s) Euts) em encontro e confronto
com o(s) Tu(s). Do brilho momentâneo e delicado does) Nós. Inte-
ressa ao facilitador a afirmação ea recriação espontânea das pre-
sencas, determinadas' pelas ações, interesses e excitações da atuali-
dad~ existencial dos participantes e dos subsistemas em que eles se
organizam. .
Quando pessoas estão juntas, organizadas a partir das influên-
cias descentralizadas da multiplicidade de dimensões human.as. pre-
sentes em seu encontro, isso acontece de modo bastante intenso.
De modo que, com relação ao-...:'grupo" enquanto sistema global..
interessa ao falicitador que ele se .organize dina.~ic~mente,.e. que =
desdobre plenamente, como a reahdadee consclenCl~ ~ulhdlm~nsl0-
nalmente articuladas que se elaboram com confluência, tensional-
mente diferenciada e dinâmica, das influências da ação, dos inte-
resses e excitações da atualidade existencial ~e cada um dos pa~ti-
cipantes e dos subsistemas em que eles. se articulam .. Na p:rspecttva
de sua globalidade o grupo vivencial é Isto, esta configuração h~r~o-
nicamente diferenciada e dinâmica, constituída apartir, e constltull~-
te da atualidade existencial de seus participantes. Interessa ao faci-
litador. que cada uma das influências dessas atualidades existenciais
seja como um deus .na plenitude de seus po~eres. !nteressa que o
grupo, como experiência subjetiva, como. confI~ura~a~ ~e processos
particulares de objetivação e como conhf~raçao. dinâmica ~e. pro-
dutos objetivados: seja. a resultante n:uItldImens~?nal:_ harmoOlca" ~
tensionalmente diferenciada das relaçoes desse pateao de deus .
Nesse sentido a sua perspectiva de poder é essencialmente. "po-
liteísta". Não interessa ao facilitador uma. unificação ou uma centra-
lização - explícita ou' camufiada - do processo grupal, a partir
da influência do poder de que dispõe.' Interessa que este processo
3. Maffesoli, Michel, A Sombra de Dionisio, 'Rio de Janeiro, Graal, 1985,
p. 71.
25
constitua-se como articulação dinâmica da multiplicidade de focos
de influência efetivamente presentes no encontro grupal.
Nos limites de sua duração, o grupo é para o participante o
ambiente social humano imediato. A ele esse participante conflui e
constitui com as várias dimensões de sua atualidade existencial, com
seu conhecimento, com sua dominância de necessidades e de inte-
resses, com suas excitações, com as condições de seus sentidos, com
as suas capacidades e potenciais, e, em particular, com as emer-
gências da configuração presente de suas questões existenciais. Dessa
forma, ele participa, constitui, cria e recria o "grupo", em colabo-
ração com os demais participantes, ao mesmo tempo em que é, de
modos mais ou menos intensos e profundos, constituído, criado e
recriado pela apreensão e vivência dos dinamismos desse e de suas
próprias vivências e interações pessoais particulares.
Interessa à proposta do grupo vivencial que o participante viva
intensamente, a partir dos critérios próprios de suas motivações e
interesses, a expansão, em todas as direções, da sua experiência e
da sua ação no contexto da vivência grupal. Tanto na relação com
o grupo como sistema global como na relação com os subsistemas
do grupo e no nível da relação interindividual. Interessa à proposta
do grupo vivencial que ele experimente naturalmente, e a partir de
sua própria recepção, os efeitos múltiplos da retroação e das respostas
aos produtos de suas objetivações; que ele se recrie com essa vivência,
que ela crie e recrie nesse interjogo de influências os seus processos
de objetivação. Interessa que ele desfrute e frua, na plenitude de
suas intensidades naturais, a experiência de ser, estar e movimen-
tar-se no interior do contexto grupal efêmero: que ele "curta",
arrisque, tente, erre e acerte, a partir do critério dos interesses da
dominância de suas necessidades presentes.
Num certo sentido, a situação grupal em questão é uma situação
fútil, perfeitamente dispensável e descartável, só serve para isso
mesmo, para uma experimentação, que não obstante pode ser rica
e enriquecedora. É uma situação viva e profundamente real, e como.
tal pode ser profunda e intensamente vivida, ainda que isso se dê
eventualmente de um modo manso. Significa estar coletiva e pessoal-
mente, grupal e interindividualmente, com gente, de um modo pre-
sentemente imediato, na multiplicidade simultânea de dimensões que
isso implica.
De modo que, criada a oportunidade do encontro de pessoas,
privilegiada a afirmação dos elementos da multiplicidade natural de
dimensões de suas presenças, enquanto indivíduos e como coletivo,
interessa à proposta do grupo vivencial que ele seja para o parti-
cipante individual, nos limites de sua duração, um espaço de uma
(até fútil) experienciação e experimentação de si, a partir dos cri-
26
/
/
térios próprios dos interesses de sua atualidade exis.tet;c~al, no inter-
jogo natural de influências, sempre de dupla constItul?aO, presentes
na multiplicidade de dimensões do encontro grupal singular.
Como observamos, então, criada a oportunidade do encontro,
interessa ao facilitador investir no sentido da autogestão do grupo
e na criacão de condições para uma participação automotivada das
pessoas; ~ poder institucional que lhe per~ite criar o grup.o. e ser dele
o facilitador. Interessa investir nesse sentido as suas habilidades e a
sua presença pessoal, ocupando, d~~sa forn;a, o ~eu lugar pessoal e
institucional próprios. Cabe ao facilitador,a medida que o gru~o s~
desenvolve, uma entrega a uma certa diluição d.e ~eu papel. IJ?S!I-
tucional à um processo ativo de metamorfose, recnaçao e redefinição
deste, a partir dos efeitos concretos do seu dese~p~n_ho no contexto
da realidade grupal particular. De fato, essa diluição da presença
do poder institucional do facilitador não significa .q~e esse poder
tende a extinguir-se. Significa, antes, que ele se rel~tI.vIza e coloca-se
a serviço da criação de condições para a expressividade natural e
autônoma, e para os desdobramentos naturais plenos dos elementos,
da multiplicidade de dimensões e de relações constituintes do mo-
mento do encontro grupal e do momento da atualidade das pessoas
que dele participam. O poder institucional de que dispõe o facilitador
coloca-se, assim, a serviço da expressividade natural das pesso.as, a
partir da dominância dos interesses .e necessidades de sua atualidade
existencial no contexto da vivência grupal; a serviço da criação
de condições para a atualização das possibilidades do engen~ram.ent?
natural das relacões interindividuais, da dialética das relaçoes indi-
víduos-grupo, índivíduos-subgrupos. subgrupos-grupo e subgrupos-
-subgrupos. A serviço da paulatina constituição, expressividade e
existência do grupo, a partir da dinâmica dessas relações, como
sistema global, singular e efêmero, tanto nos termos de sua subjeti-
vidade coletiva particular como em termos de seus processos de
objetivação e dos produtos objetivados desses. Sist~rr:a que s~ auto-
constitui e reconstitui, que se atualiza e que se dISSIpa ao final de
seu transcurso.
À medida que o grupo se inicia e se desdobra, as relações, que
na fase do "pré-grupo" são apenas biunívocas entre os facilitadores
e os participantes individualmente, complexificam-se, com .o encontro
simultâneo desses no interior do conjunto grupal, configurando-se
dinamicamente numa rede de interações de níveis extremamente
variados, que vão desde as relações interindividuais, passando pelas
relacões dos indivíduos com os subgrupos e com o grupo como
globalidade, pelas relações entre os subgrupos até à dinâmica global
de relações subjetivas, objetivadoras e objetivadas do processo grupal.
Todas essas relações são naturalmente mediadas, de uma forma ou
27
de outra, pelo papel institucional do facilitador e pelo seu desem-
....penho pessoal.
O ponto máximo de "concentração" da função institucíonal do
facilitado r no interior do processo grupal é quando ele "abre" o
grupo, quando ele "dá a largada oficialmente", explicitando para os
participantes "recém-encontrados" a sua .proposta para esse encontro,
o seu papel como facilitador, o seu estado de espírito, expectativas
etc. A partir daí, ele deixa paulatinamente de ser o "centro" (que
. nos bons grupos será cada vez mais difícil de encontrar), à medida
queafloram e em que se configuram e se diferenciam ativamente
os vários níveis de relação, de experienciação, de expressividade e
objetivação. De um modo ou de outro, ele sempre está presente, em
sua função institucional, no processo do grupo enquanto globalidade.
Em geral, entretanto, essa função encontra-se diluída no "fundo"
do processo, ainda que possa, momentaneamente, assumir um caráter
figural para, em seguida, diluir-se novamente nesse fundo.
Pressupõe-se no facilitador um fascínio natural e entusiasmado
pelas pessoas, pelos dinamismos e pela expressivídade dos dinamis-
mos de suas atualidades existenciais. Pressupõe-se igualmente um
fascínio pela paulatina e complexa emergência e configuração da
realidade grupal, nas articulações de seus vários níveis de. sutileza
ou de evidenciação, de intensidade ou de diluição. No seu conjunto
e nas articulações de que ele participa .mais diretamente, essa reali-
dade não é simplesmente para ele uma alteridade, mas uma confi-
guração de processos subjetivos e de objetivação da qual ele é ine-
rentemente parte, ator institucional e pessoal.
Esse fascínio envolve, naturalmente, o fascínio pelo modo como
ressoam em si próprio, como trans-formam a si próprio, a expressi-
vidade, a afirmação da outridade de cada pessoa participante, a
outridade dos subsistemasque eventualmente se configuram no
processo grupal e a outridade do próprio grupo como coletivo
global. De modo que o facilitador não está isento nem é exterior à
realidade grupal, como uin sujeito que manipula um objeto que lhe
é independente. Institucionalmente o grupo se constitui a partir da
função que ele encarna. Pessoalmente, a experiência da realidade
grupal constitui-se particularmente nele - da mesma forma que se
constitui nos demais participantes - corno área de subjetividade
coletivamente compartilhada, e intimamente articulada à experiência
de sua subjetividade pessoal particular, com a qual interage intensa-
mente - a exemplo do que acontece com os demais participantes
~, incitando-a a um contínuo e eventualmente intenso processo de
regeneração e recriação, que igualmente se dá no sentido inverso.
Dessa forma, o facilitador compartilha, a seu modo particular
e idiossincrásico, a subjetividade coletiva particular que se elabora
28
no encontro grupal. Num certo sentido, a sua função é a da objeti-
vaçãoj criação ativa dessa subjetividade e dos processos e P~O?utos
de objetivação dela. Nisso reside, em grande parte, a sua. ~tlV1dade
de facilitação, o que livremente aproxima da arte essa atividade.
A um só tempo, não obstante, o faci1itado~ ~a~ parte da .idep.ti-
da de dessa subjetividade, da identidade da subjetividade coletiva do
grupo, e é com relação a ela diferente. Seu processo pes~oal de
identidade, sua subjetividade pessoal conferemcl~e heterogeneidade ~
a possibilidade de um distanciamento c?~ ~elaçao a ela. Essa dupli-
cidade permite~lhe. expressar essa subJetl.vIAda~e no seu comporta-
mento e na sua ação no contexto da vivencia grupal, ao mesmo
tempo em que permite-lhe confrontá-Ia. e intr?duzir eventualmente,
a partir das dimensões heterogêneas e diferenciadas de se~s .,::ompor-
tamentos e ações, elementos dissimilares e novos ?e. r.ecnaçao d~la,
elementos que advêm da interação com e~sa. subJetlV1da~e COle!IV~
do grupo, que ele compartilha, de sua propna e exclusiva subjeti-
vidade pessoal particular.
Essa inevitável tensão e conflito é uma das fontes mais férteis
das possibilidades ~ri~ti~~s da facilit~~ão. Talvez seja _ in~etess~nt~
observar que essa dissimilitude do Iacilitador com relaçao a subjeti- .
vidade coletiva do grupo nem sempre se manifesta de modo. explo-
sivo ocorrendo normalmente como simples e eventualmente despre-, ..
tensiosa participação.
Dessa forma é interessante considerar que ninguém participa
de um grupo impunemente - muito menos, .e principalm:~te, o
facilitador. E isso é particularmente verdade para um facilitador
que se disponha a efetivamente participar. e faci1it~r o .grupo. ~s
possibilidades de plasticidade de sua atualidade existencial estarao
em temporada de "ouriçamento" e inevitavelmente transformar-se-ão
em condições, fonte e elementos de sua atividade de. facilitação,
atualizando as possibilidades de autotransformação de sua pessoa.
No essencial, e de modos mais ou menos intensos são a atualidade
de si mesmo .e as possibilidades da dinâmica de seus processos de
auto-trans-form-ação· que o facilitador investe na sua atividade de
facilitação. De modo que além de propiciar elementos heterocriativos
esta atividade é assumidamente autocriativa.
Talvez a esse respeito seja interessante recordar Hesse: "Só se
vive intensamente à custa do próprio Eu ... "
E facilitar grupos exige e motiva uma intensidade de vivência.
Intensidade que não precisa ser dramática ou explosiva, podendo
ser tranqüila e suave. De forma que não se quer dizer que as
transformações por que passa o facilitador - ou os participantes
_ careçam necessariamente de ser sempre radicais ou dramáticas.
29
Longe disso. Podem-no ser; eventualmente, mas em geralsão apenas
homeopáticas e múltiplas, confluindo em processos de mudança
já em andamento. Freqüentemente, oriundas no processo grupal,
só se configuram muito tempo depois, quando as pessoas preenchem
em suas vidas práticas as suas condições de possibilidade.
O facilitador participa, pois, ativamente, como pessoa, acom-
panha e cria (como os outros participantes) os fluxos do processo
grupal nas suas dimensões simultaneamente subjetivas e objetiva-
doras, ao mesmo tempo em que sofre os efeitos desse processo, o
que recria continuamente as possibilidades de sua participação no
grupo, a sua atividade de facilitação.
Assim sendo, é importante que, na relação com o grupo como
sistema e com as pessoas individuais, o facilitado r possa elaborar
e expressar permanentemente o lado pessoal da duplicidade "insti-
tuição-pessoa" em que está envolvido.
Ele não pode - por impossível - simplesmente abdicar de sua
condição institucional. Mas pode, assumindo-a, elaborar um certo
distanciamento, um certo descolamento e transcendência com relacão
a ela, ao mesmo tempo em que atualiza, elabora e expressa natural-
mente a sua diferenciação como pessoa. A superação. de sua condição
institucional e a fluidez do trânsito entre essa condição e a sua
condição de pessoa é um dos aspectos fundamentais do processo da
facilitação. Como, aliás, parece ser de toda a atividade em impor-
tantes áreas da psicologia.
Ao nível do grupo, esse trânsito entre a institucionalidade e a
pessoa do facilitador configura-se à medida que ele privilegia, nos
seus comportamentos e ações no contexto da vivência grupal, os
influxos naturais da experiência de suavivência pessoal particular
nesse contexto, a expressividade de sua atualidade existencial, ao
mesmo tempo em que desempenha as práticas institucionais neces-
sárias à criação e desdobramento' do grupo.
Ao nível da relação com os participantes individuais, esse trân-
sito entre a pessoalidade e a institucionalidade do facilitador tem a
ver com uma relação e comunicação idiossincrática, temperadas de
razoável tolerância, com cada pessoa, quando for o caso, e no
momento oportuno. Uma comunicação sintônica e sincrônica com a
comunicação dela, aberta para as ressonâncias em si próprio das
diferenças e novidades particulares da pessoa em questão.
Ê importante que a franqueza para consigo próprio e para com
o outro seja um dos elementos fundamentais do processo de relação
do facilitador com os demais participantes. Isso, naturalmente, tem
a ver com o que Rogers definia como "congruência" ou "genuini-
dade". Por outro lado, é importante considerar efetivamente as
30
ntitudes de empatia e de respeito incondicional pela validade da
ixperiência e da pessoa de um participante que se expressa. Um
.slorço, animado pelo fascínio, para a compreensão do sentido pes-
S al e idiossincrático da comunicação do outro, sentido e outro nos
[uais interessam para o facilitador a diferenca essencial com relacão
u si próprio, a alteridade essencial. É interessante entender nesse
sentido que isso quer dizer que o facilitador privilegia, disponibilíza
franqueia, na relação com a pessoa, o momento de sua própria
atualidade existencial, confrontando a pessoa - no seio de uma
disposição mais ampla de tolerância -, se for o caso, ou sendo
umigável, caloroso ou humanamente fraterno.
Marcando e afirmando naturalmente a sua diferença própria
, m relação ao outro, com relação a sua expressividade e comuni-
'ação, o facilitador colabora para que ele se identifique, crie e
r crie os limites de seu próprio Eu, ou seja, os limites de sua dife-
rença particular."
É importante - tanto para as pessoas individuais em questão
c mo para o grupo como um todo - que o facililador tenha chegado
a um certo grau de familiaridade com o fato da diversidade e da
multiplicidade infinita das formas de vida, das formas da experiên-
cia e de sua expressividade, das formas das relações interpessoais,
das formas e situações do humano, enfim, mesmo quando se apre-
icntem de modos que possam parecer bizarros. A multiplicidade de
luis formas que se apresentam no grupo exige que o facilitado r
possa entendê-Ias como naturais. Não se improvisa, evidentemente,
.ssa capacidade. As formas, entretanto, da vida e da expressividade
da atualidade existencial das pessoas são inevitavelmente idiossicrá-
slcas, inevitavelmente diferentes com relação as nossas. Ê interessante
que possamos nos fascinar e até nos entusiasmar com a descoberta
delas, descoberta que é sempre criação também, ou seja, descoberta
m que estamos sempre implicados no descoberto.
Para a proposta do grupo vivencial o que importa é que as
pessoas sintam-se seguras e confiantes para se comunicarem em
. nsonância com os fluxos de sua própria experiência. Que possam,
IIU medida de seu interesse, expressar a particularidade de sua atua-
lidade existencial e sentir, pelo menos, e às vezes até principal-
111 nte, que de parte do facilitador elas são reconhecidas como forma
de existência e de expressão humana incondicionalmente válidas
• 1110 tais. O grupo em geral tem um profundo senso de aceitação.
R gers observava que, em sua experiência de grupo, freqüentemente
11 [uilo que um participante tinha de mais íntimo, de mais pessoal,
4. Maffesoli, M., op. cit., p. 83.
31
de mais idiossincrásico, era sempre reconhecido, quando se expres-
sava, como profundamente compartilhado.
De modo que é interessante que o facilitador esteja natural-
mente preparado por sua prática, vivência e disposições· pessoais
para a novidade de cada forma de ser e estar, porque é essa novidade,
a particularidade e a expressão da particularidade mais ou menos
momentânea de cada pessoa, uma fonte e dimensão fundamental
do processo grupal.
A esse respeito parece-me bastante interessante um trecho de
um poema de Fernando Pessoa, que uma colega me mostrou quando
comemorávamos todos numa "adega" de Curitiba o encerramento de
um curso de Gestalt:
o meu olhar é nítido como um girassol,' .
Tenho o costume de andar pelas estradas
Olhando para a direita e para a esquerda,
E de vez em quando olhando para trás ...
E o que vejo a cada momento
É aquilo. que nunca antes eu tinha visto,
E eu sei dar por isso muito bem ...
Sei ter o pasmo essencial
Que tem uma criança se, ao nascer,
Reparasse que nascera deveras ...
Sinto-me nascido a cada momento
Para a eterna novidade do Mundo ... 5 .
Sendo assim, é interessante que o facilitador esteja preparado
para interagir, quando for o caso, com a diferença dos modos idios-
sincrásicos de ser, estar e expressar-se. Preparado para ser surpre-
endído e espantar-se, vale dizer transformar-se ~ ainda que homeo-
paticamente -, por. eles. Para confrontá-los, quando for o caso,
mas sobretudo e antes de tudo para descobri-Ios, aprendê-Ias em
sua especificidade própria, compreendê-los, Estará assim, também e
invariavelmente, descobrindo e apreendendo a outridade de si pró-
prio, uma vez que, tal como aponta Buber, o Eu se constitui na
relação com o Tu (vale especificar: com a diferença do Tu).
Dito isto, espero ter esboçado, em grandes pinceladas, as carac-
terísticas básicas da proposta do grupo vivencial, que contém implí-
citas, naturalmente, a proposta da facilitação.
5. Pessoa, Fernando, O Eu Profundo e os Outros Eus: Seleção Poética;
seleção e nota editorial de Afrânio Coutinho, Rio de Janeiro, Nova Fronteira,
1980.
32
Reunido o grupo, é interessante ofacilitador dar-lhe abertura,
de acordo com o seu estilo pessoal e explicitar que o grupo não tem
nenhuma programação definida a priori e que se centra no encontro
e no desdobramento do encontro particular dessas pessoas parti-
culares, nesse lugar particular, por um período limitado de tempo.
Rapidamente o coletivo grupal começa a dar "sinal de vida" - já
que individualmente os participantes o dão mais cedo ainda - e,
se o facilitador não atrapalhar muito, assumirá natural e autono-mamente a atividade de elaboração do processo grupal. Recoste-se
na sua almofada, abra os olhos, os ouvidos, o coração e a imagi-
nação e seja simplesmente gente. Mas não esqueça, e· sobretudo
não queira esconder, que você é "também" instituição - o facili-
tador - e dispõe de um poder diferenciado que se origina tanto
dentro quanto fora do grupo. Desempenhe ativa e desencucada-
mente esse poder, a serviço da configuração da particularidade
singular, polifacetada e dinâmica do grupo e da expressividade e
criação da atualidade existencial de seus participantes.
3. ALGUNS REFERENCIAIS TEORICOS
DA FACILITAÇÃO
Um amigo sábio e conhecedor dos processos de nossa aprendi-
zagem tobserva sempre que é difícil, senão impossível, explicar a
alguém "o gosto que tem a sardinha". O mais interessante, nesse
caso, é dar a própria sardinha para a pessoa comer, assim ela
aprenderá, em "primeira mão", o gosto da sardinha e nunca mais
esquecerá.
A aprendizagem da prática da facilitação do grupo vivencial
não foge, naturalmente, a esse modelo de aprendizagem humana.
O imprescindível para ela é a própria vivência da facilitação, de
preferência na companhia de alguém que já tenha uma prática
significativa dessa vivência.
Só assim é que pode haver uma razoável familiarização com a
operacionalização e vivência da prática da proposta do grupo vi-
vencial, com o próprio grupo, em seu processo; evidências e suti-
lezas, com as pessoas no contexto grupal e com o desempenho do
papel de facilitador.
Mesmo assim, parece. interessante a constituição e explicitação
de referenciais teóricos para a facilitação, da mesma forma que a
reflexão e a contínua criação e recriação deles. Isso é importante
em particular porque, diante da abertura própria da proposta do
* Professor K. Sato.
33
grupo vivencial e do caráter pessoal que pode assumir em certos
momentos o desempenho do facilitador, interpreta-se com freqüência
que "qualquer um" pode facilitar grupos vivenciais e que "o que se
fizer está bem feito".
Na prática, não parece ser bem assim. Facilitar o grupo viven-
cial exige uma compreensão, assimilação e aceitação efetivas da sua
proposta, ao mesmo tempo que uma vivência significativa de grupos
e do processo da facilitação. Exige uma compreensão da posição de
si como facilitador, no contexto e no processo da vivência grupal,
e uma compreensão e habilidade para o desempenho da dialética
da simultaneidade das condições de si próprio, como pessoa, fluida
cambiante; e como instituição, facilitador. O que só advém, eviden-
temente, com a prática efetiva. Exige, por outro lado, um estado
de razoável satisfação de suas próprias necessidades pessoais, de modo
que não se seja levado a utilizar o poder de que se dispõe como
facilitador para manipular egocentricamente o grupo, em função de
suas necessidades insatisfeitas.
E importante compreender, na prática da facilitação, a dupli-
cidade básica dos níveis de relacionamento do facilitador: 1) com a
estrutura, gênese e dinâmica do grupo, como sistema global, com
sua consciência, subjetividade, comportamento e ações coletivas, e
2) com as pessoas individuais, no contexto da vivência grupal. Há
ainda que se considerar a relação do facilitador com os subsistemas
que se constituem no seio do grupo.
Ainda que se interpenetrem, esses níveis básicos de relação do
facilitador são, também, concretamente distintos (ver adiante).
Como observamos antes do início do grupo - em função do
fato de que, de um modo geral, os participantes não têm um contato
entre si - predominam relações biunfvocas entre o facilitado r e
cada um dos participantes. Quando o grupo se reúne, para além
dessas relações, que tendem a diluir-se, configura-se paulatinamente
entre os participantes uma rede multidimensional de relações, em
níveis mais ou menos sutis, mais ou menos explícitos, que tende a
ser em grande parte autônoma com relação ao Iacilitador. Ê na
criação de condições para o desenvolvimento dessa rede de relacões
e de sua autonomia que o facilitador investe o seu poder e a· sua
habilidade.
De um modo geral, não é com o facilitador que se desenvolvem
as relações mais importantes do participante no contexto do grupo,
ainda que as relações com o facilitado r tenham para este o seu lugar
de relevância nas reuniões formais. Nada mais longe da proposta
do grupo vivencial do que um facilitador que corre a dar uma
34
It nção ostensiva, ou a acudir, a qualquer pessoa que se manifesta.
li C tipo de "íacilitador-ambulância" está simplesmer:te desin~or-
li ndo ou muito mais ligado em controlar ° grupo, atraves desse tipo
d mecanismo, em consonância com os seus próprios medos pessoais,
III mais interessado, ainda, no estrelismo de sua própria pessoa, sem
IJU , de fato, cogite a possibilidade de ser útil, desempenhando dessa
[orma um "teatro" de muito mau gosto.
O fato de que as relações mais significativas para os partící-
I untes, mesmo quando nas reuniões formais do g~u'p0' desenv.ol-
vnm-se não com o facilitador mas com outros participantes, eXIge.
'V ntualmente do facilitado r modéstia e parcimonia, e urna boa dose
natural de discriminação, para identificar quando é, ou não, rele-
V inte o seu impulso de participar. De um modo geral, as relações
uruis relevantes para os participantes estão inseridas nas próprias
r lações particulares com os demais, no contexto da vivência sin-
Kular, São relações com outros participantes individuais, co~ sub-
K1'lIPOS ou com o coletivo grupal, sendo as relações com o facilitador
ipcnas urna das formas possíveis, ainda que possam vir. a ser bastante
nificatívas. O Iacilitador tem que se contentar e VIver bem com
so, ainda que seu ego possa eventualmente querer mais.
De qualquer forma, existem momentos relevantes em que o
fn i1itador se mobiliza ou é mobilizado pelo momento da vivência
ti um participante. Nesses momentos é importante que o facilitador
tcja atento e aberto para o participante, para entendê-Io, para
I' sponder efetivamente às suas demandas, mesmo que s~Ja apenas
I ura confrontá-I o sincera, natural e diretamente, a partir de seu
I nto de vista pessoal, e não técnico, e das contingências da situação.
I)a( ser importante uma atenção constante do facilitador:. mesmo
[LlC eventualmente difusa, para com o grupo e seus participantes,
1i nção na qual os facilitadores da equipe devem se revezar orgânica
na turalmente.
N as reuniões vivenciais formais do grupo é interessante que o
Incilitador tenha uma prática e possa manifestar as condições facili-
íudoras preconizadas pela Abordagem Centrada na Pessoa, da mesma
f rrna que esteja familiarizado com os princípios da Gestalterapia.
A efetivação dessas condições e princípios permite a criação de
um clima de segurança psicológica para que o participante se en-
tr egue ao fluxo de. sua própria experiência organísmica e ação
naturais, potencializando a sua centração no presente delas e uma
mobilização de sua criatividade.
Por outro lado, a manifestação dessas condições e princípios
videnciarn para o participante um compromisso assumido do poder
lustitucional no grupo com os livres engendramentos e fluxos e com
35
a expressividade auto-regulada .da experiência de sua atualidade
existencial no contexto da vivência grupal.
Manifestando as condições e princípios preconizados pela Abor-
dagem Centrada na Pessoa e pela' Gestalterapia, o facilitador pode
constituir-se para o participante como um "outro", assumido em sua
diferença, potencializando e possibilitando ao participante uma cen-
tração no presente de sua experiência e na particularidade ativa de
si próprio como pessoa.
O principal mobilizador de sua atuação no grupo é, para o
facilitador, a sua própria experiência organísmica no momento e no
contexto da vivência grupal particular, a sua própria experiência,
na confluência de sua atualidade existencial com a situação grupaI
particular. Ê o fluxo de sua consciênciaorganísmica, o fluxo de seus
interesses e excitações, o fluxo da configuração dinâmica de seus
sentimentos, conhecimento, raciocínio e intuição, como resultante da
confluência das dominâncias de sua atualidade existencial com os
vários acontecimentos, e configurações de acontecimentos da vivên-
cia grupal, que se constitui como elemento privilegiado e fonte de
mobilização de seu desempenho no contexto da vivência.
Sem esquecer, naturalmente, que, em sendo ofacilitador, nunca
ele é "simplesmente uma pessoa entre outras" no contexto da vi-
vência grupaI. Ocupa, inevitavelmente, uma posição e dispõe de um
papel, institucionais dentro do grupo, e carece de saber o que fazer
com isso, e como.
Pessoalmente, todavia, o facilitador é um partícipe da particula-
ridade da situação grupalque se cria com o encontro. A realidade
grupal particular configura-se também nele próprio como fluxo de
uma certa subjetividade coletiva, que ele compartilha, e como fluxo
de processos coletivos de objetivação. Em momento algum, como
observamos, o grupo particular é para ele meramente um objeto
passível. de intervenções isentas. Por outro lado, ao expressar-se no
grupo, ele duplamente expressa e cria a si próprio, ao mesmo tempo
em que constitui, cria e expressa o grupo particular; Como facilitador,
possui um poder particular, e deve possuir a habilidade a este
concernente, de influência no sentido da constituicão da realidade
grupal, a partir de sua posição privilegiada. Espera-se, desta forma,
que ele tenha igualmente, e atualize, a habilidade de expressar natu-
ralmente o grupo, no seu desempenho, como produto integrado da
multiplicidade de influências que o constituem, sendo assim um
agente efetivo e criativo da articulação dessa multiplicidade, da
expressão e criação dela como vivência grupal particular.
. O facilitador tem também com relação, ao grupo, enquanto
SIstema global, uma relação dúplice, no sentido de que, em certos
36
momentos, ele interpreta (em essência, no sentido teatral, e não no
J icanalítico) e expressa a subjetividade coletiva do grupo que nele
próprio se constitui, sendo, assim, momentaneamente "isomórfico"
Wood) com relação a ela. Noutros momentos, sua subjetividade
l dividual confronta essa subjetividade coletiva que nele próprio se
. nstitui: daí, ele reinterpreta, recria ou rejeita-a de modo que,
Il expressar-se, ele. expressa a sua diferença, a sua disparidade com
,. ilação à subjetividade coletiva particular do grupo - que se, cons-
tui em cada participante, ainda que idiossincrasicamente i e=,
Il tencializando, assim, os fluxos de sua constituição e reconstituição.
Dessa forma, o facilitador alterna ritmicamente - com o fluxo
d s interesses e excitações de sua experiência no contexto imediato
da vivência grupal - momentos de "isomorfia", em que ele objetiva,
xpressa, e, portanto, cria e recria interpretativamente a subjetividade
. letiva particular do grupo com momentos em que confronta, com
exercício da disparidade de sua própria subjetividade individual,
fl subjetividade coletiva do grupo, co-laborando, a partir de sua
liíerença pessoal, com os fluxos de constituição e reconstituição
dessa subjetividade coletiva. '
Isso está, naturalmente, pressuposto no comportamento normal
de qualquer um dos participantes do grupo, sendo o facilitador
upenas um participante diferenciado pela posição, prática e poder
diferenciados de que dispõe.
Nessas condições, o desempenho de uma equipe de facilitação
rem características peculiares e interessantes. Nela, os facilitadores
t m uma eerta "homogeneidade" de comportamento - determinada
I ela posição compartilhada no contexto do grupo, por sua prática,
Interesses ete. -, ao mesmo tempo em que têm dimensões hetero-
ti neas, díspares, de subjetividade e de comportamento, a partir de
uas individualidades. Ê interessante que os dois extremos dessa
I laridade possam ser sempre reafirmados no desempenho da equipe,
da mesma forma que o fluxo da tensão dinâmica entre ambos.
\ interessante que os facilitadores reafirmem, em seus comporta-
m ntos e ações, o compartilhamento de sua condição, de seus inte-
rc ses comuns, de sua prática e experiências, ao mesmo tempo em
que se diferenciain segundo ditames de suas individualidades e atua-
lidades existenciais, e da vivência destas no contexto do grupo. Dessa
r rma, ao mesmo tempo em que se constitui homogeneamente como
r co de geração e de facilitação do grupo, a equipe de facilitadores
I de responder -de um modo diversificado, multiplamente diferen-
'lodo, à multiplicidade de dimensões das pessoas individuais, das
,. ilações interpessoais, dos subgrupos e do conjunto do coletivo
rupal.
37
Existe, assim, uma tensão criativa e dinâmica entre unidade e
diversidade no interior da equipe de facilitacão e nas relacões desta
com o restante do grupo, tensão que articula' e que se artic~la com a
multiplicidade de dimensões presentes na vivência grupal particular.
Parece evidente a importância de que haja um consenso básico
entre os Iacilitadores com relação à concepção da proposta do grupo
vivencial e com relação ao papel e modos de desempenho do facili-
tador. Parece importante, da mesma forma, que os facilitadores se
entendam e se entrosem num nível pessoal, sem que isso signifique,
naturalmente, a pressuposição de um unanimismo ou de uma relacão
perfeita. Parece fora de dúvida, todavia, que é fundamental um
entrosamento básico e uma afinada compreensão entre os facilita-
dores, no período de seu desempenho como tais, no contexto da
vivênci.a grupal. Compreensão e entrosamento estes que são exigidos
a funcionar naturalmente até em níveis não-verbais.
Uma cisão significativa entre os facilita dores tende a levar o
grupo, em seu conjunto, também a uma cisão em sua estrutura
básica. O que tende a gerar uma falta profunda de confianca no
ambiente grupal e, por conseqüência, uma acentuada insegurança.
Ainda que o conflito natural seja um dos mais importantes "motores"
do grupo, uma cisão desse tipo parece levar bem mais à paralisia
do 9ue a qualquer processo criativo, sendo o tempo do grupo con-
sumido em contendas estéreis e insolúveis. (O que, diga-se de pas-
sagem, é sempre um objetivo maior de um mau facilitador.) .
Há: .nos _primórdios. do grupo, um peso relativamente grande
da ~artICIpaçao da equipe de facilitação nas relações grupais. À
medida que se elabora e complexifica a rede de relacões entre os
par~cipantes, ~á uma saudável e desejável diluição desta partici-
paçao da eqmpe de facilitação. Diluição esta que nunca é total,
naturalmente. O que se pode dizer é que se tornam mais sutis
. delica~~s e_diferenciadas as articulações entre os membros da equipe
de facilitação e entre estes e os participantes individuais e o conjunto
do sistema grupal. L
4. CONSTITUIÇÃO DA EQUIPE DE FACILITAÇÃO
.Um aspecto aparentemente dos mais simples, mas na verdade
dos mais importantes e delicados, no processo de constituicão do
grupo vivencial, é o da composição de uma equipe de facilitação.
, . Nad~ ,impede que um pequeno grupo seja facilitado por um
uruco Iacilítador, desde que ele esteja efetivamente habilitado para
tal. Em g~ral, en~r.etanto, é interessante e mesmo importante que os
grupos sejam facilitados por pelo menos dois facilitadores. No caso
38
11' p quenos grupos ou de grupos de tamanho médio, o segundo
I1 'ilitador pode mesmo ser um treinando mais apto. Nos ca~os de
I' I])OS maiores (mais de vinte pessoas), é de fundamental impor-
I ncia que trabalhem dois ou três facilitadores.
Acredito que três facilitadores já constituem uma equipe "gran-
ti ". Não parece interessante a idéia comun: .de que deve ~aver um
uirnento, proporcional ao número de partlCIpantes: no numero de
r I .ílitadores. Ainda que isso seja naturalmente relativo e que grupos
muito grandes exijam uma quantidade maior de facilitadores. ~rês
I'ocilitadores, entretanto, podem muito bem - desde qu~efetlva~
mente habilitados - facilitar grupos de, por exemplo, oitenta ate
cem participantes, que são grupos excepcionais.
O processo psicossocial de um grupo. vivencia~.' ao lado dos
momentos agradáveis e de segurança, caI?mha fre~~entemente por
rcas extremamente particulares, de conflito, de dúvida, de perple-
xidade, de espanto, de frustração, de indeíinição e mudanJa, d~
d sorientação e novidade. O Iacilitador, como obser~amos, nao esta
imune à influência dessas experiências e ao pote~clal de transf~r-
mação da vivência grupal. Na duração dela, n!OVlme.nta-se. ~ambem
a sua subjetividade, a sua atualidade e questoes eXIstenCIaIS, suas
crenças e incertezas, potência e vulnerabilidade. De forma. que, num
nível genérico da subjetividade grupal, que ~leAcompartilha, e n~
nível de sua própria subjetividade pessoal, a vlv,encIa grupa~, mexe
com ele. "Mexida" esta que, perfeitamente toleravel e manejável nos
limites humanos naturais, está longe de ser irrelevante; ao mesmo
tempo em que se constitui como um processo fundamental de elabo-
ração de sua atividade de facilitação. Razão porque, dentre outras,
não interessa que seja "engessada" por uma atitude de pretensa
invulnerabilidade ou de distanciamento (que eventualmente pode
aparecer sob a forma de um rígido caráter "caloroso", "compreen-
sivo", "sensível" ou coisas c., gênero) .
Na sua posição singular enqua.nto tal.dentro do grup~,. o fa~i1i-
tador experiencia de um modo muito particular todas as cunensoes,
fluxos e refluxos subjetivos, objetivadores e objetivados do processo
grupal. A posição única que ele ocupa; .tanto instltuc.io~al quanto
pessoalmente, determina uma forma part1c~l~r. de sohdao em ~ua
vivência. Solidão que não tem grandes mistérios, mas que deriva
simplesmente desta sua condição particular. Essa solidão, entretanto,
ainda que natural, pode, se não for adequadamente elaborada, levar
a modos meramente irracionais de intervenção no processo grupal.
Como "minoria", ao ocupar no grupo essa posição única, a
sutileza, o caráter diáfono, inefável e mesmo inverossímel de certas
experiências, relativas a um ou outro participante individual, rela-
tivas a segmentos ou a dimensões particulares do processo grupal,
39
relativas ao conjunto do grupo, ou relativas mesmo a si próprio,
tendem a ser distorcidas, ou a perder a sua consistência de realidade;
tendem a parecer "alucinatórias", ou a ser devidamente expurgadas
pelos seus mecanismos de defesa.
Para uma boa facilitação, e até mesmo para o próprio cresci-
mento natural do facilitador, é aí que reside o problema. É impor-
tante que essas experiências sutis, diáfanas, ou mesmo aparente-
mente inverossímeis existam e se expandam, de acordo com seus
sentidos e potência próprios na subjetividade do facilitador, consti-
tuindo-se fluidamente como elementos particulares das configurações
de seus processos de objetivação. Freqüentemente essas experiências
são ressonâncias expressivas de "processos nobres", digamos, da
apreensão da vivência de um participante, da apreensão das arti-
culações criativas da subjetividade coletiva do grupo particular ou
mesmo da experiência pessoal do próprio facilitador. Negá-Ias, esca-
moteá-Ias, distorcê-las, expurgá-Ias significa a extinção de possibi-
lidades criativas da relação com a pessoa do outro participante, com
o grupo ou mesmo com a sua própria atualidade existencial. Infeliz-
mente, é um processo freqüente na prática de muitos facilitadores.
Processo que não se interrompe aí, levando o facilitador a investir
o seu poder no controle e manipulação do grupo, para cornpati-
bilizar o processo deste com o conteúdo do seu medo de certas áreas
de sua experiência.
Nesse sentido é que é importante, no contexto da vivência
grupal, a relação do facilitador com outro facilitador que compar-
tilhe com ele, apesar de suas idiossincrasias, a mesma posição pes-
soal e institucional, podendo compartilhar, dessa forma, o mesmo
nível de experiência, que de outro modo seria vivenciado solitaria-
mente. O compartilhamento da sutileza, do caráter inefável, diáfano
e mesmo inverossímel de certas experiências importantes reduz as
possibilidades de que elas se manifestem como fantasmáticas, "aluci-
natórias", carentes de realidade ou fóbicas, permitindo ao Iacili-
tador melhores possibilidades de elaboração e de integração delas
na sua subjetividade e na sua atividade de facilitação, enriquecendo
esta atividade pelo resgate e afirmação de conteúdos experienciais
importantes, engendrados no interior do processo grupal, e que do
contrário seriam distorcidos ou expurgados da consciência do
facilitador.
Por outro lado, quando funcionam mais de um facilitador, cada
um deles tem mais liberdade para relaxar, ou mesmo para se retrair,
quando for o caso, já que haverá pelo menos um outro atento às
comunicações dos participantes. Havendo um facilitador apenas,
quando ele se retrai há sempre a possibilidade de que um participante
que se comunica se sinta ignorado, ou preterido, mesmo que não
seja necessária em todos os momentos a atenção do facilitador.
40
/
É importante considerar, também, que eventualmente um faci-
litador pode passar por momentos difíceis durante uma vivência. A
presença de outro facilitador propicia uma possibilidade. adequada
de diálogo e eventualmente de apoio, o que apenas excepclOnalment~
é possível ~ e. menos ainda satisfatório - com um simples parti-
cipante do grupo.
É importante considerar a inevitabilidade de problemas, con-
flitos e confrontos naturalmente humanos entre os membros da
equipe de facilitação. Numa equipe de facilitadores mais amadure-
cidos e acostumados a essas dimensões de suas relações elas são
relativizadas, ainda que não possam ser escamoteadas ou sub~sti-
madas, constituindo-se,' então, como focos relevantes de expressaoj
cria cão da experiência e. da atualidade existencial de cada uma das
partes, e configurando-se, portanto, como criativas no contexto da
vivência grupal.
Idealmente , Os facilitadores devem estar acostumados, em suas
relacões com o grupo e no interior da equipe, à naturalidade de uma
"atitude dialógica" (Buber) - que privilegia o encontro e a recriação
de si mesmos .a partir do contato aberto e confronto com a diferença
-, de modo que tais problemas e conflitos, competição, confrontos
etc. podem ser importantes fontes de aprendizagem tanto para as
partes como para o grupo como um todo, se esse chega a envolver-se.
Por outro lado, é importante ter em mente que o próprio
processo da vivência grupal freqüentemente e~idenc~a, mobiliza e
aguça conflitos latentes entre os membros da equipe, nao raro mesmo
criando-os ..
À parte os conflitos insolúveis, é fundamental, não obstante,
que se imponha entre os membros. da equipe de facilitação um
respeito e confiança recíprocos pelo desempenho does) outro(s)
companheiro(s), mesmo quando não se tem muito claro, eventual-
mente, o sentido de um certo comportamento ou colocação. Isso
não se consegue simplesmente com boas intenções, derivando natu-
ralmente, apenas, de uma familiaridade com a proposta e com a
vivência do grupo e da facilitação, e de um entrosamento, de fato,
da equipe; entrosamento este que inclusive precede o momento do
encontro grupal, podendo transcendê-lo.
Ê importante, também, que esse entrosamento propicie condi-
ções naturais para um apoio recíproco, natural e sincero entre os
facilitadores. Apoio mais ou menos difuso, mas sempre disponível.
que de modo algum significa a alimentação de um espírito corpo-
rativista na equipe de facilitação contra os "outros", ou seja, contra
s demais participantes do grupo.
41
B interessante não negligenciar o fato de que são possíveis e
naturais as rupturas inevitáveis e as incompatibilidades irredutíveis
entre os membros da equipe - mesmo que se tenham integrado
satisfatoriamente no período antecedente ao grupo. Rupturas e incom-
patibilidades que freqüentemente

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