Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ NÚCLEO DE ALTOS ESTUDOS AMAZÔNICOS DOUTORADO EM DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL DO TRÓPICO ÚMIDO MARCELO FERREIRA TORRES A PESCA ORNAMENTAL NA BACIA DO RIO GUAMÁ: sustentabilidade e perspectivas ao manejo Belém 2007 MARCELO FERREIRA TORRES A PESCA ORNAMENTAL NA BACIA DO RIO GUAMÁ: sustentabilidade e perspectivas ao manejo Belém 2007 Tese apresentada ao Núcleo de Altos Estudos Amazônicos – NAEA, como requisito do Curso de Doutorado em Desenvolvimento Sustentável do Trópico Úmido-PDTU para a obtenção do grau de doutor em Ciências Sócio-Ambientais pela Universidade Federal do Pará – UFPA Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Biblioteca do NAEA __________________________________________________________________ Torres, Marcelo Ferreira A Pesca Ornamental na Bacia do Rio Guamá: sustentabilidade e perspectivas ao manejo / Marcelo Ferreira Torres; orientador David Gibbs McGrath. – 2007. 287 f.; 29 cm Inclui bibliografias Tese (Doutorado) – Universidade Federal do Pará, Núcleo de Altos Estudos Amazônicos, Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Sustentável do Trópico Úmido. Belém, 2007. 1. Pesca – Pará. 2. Pesca – Legislação - Pará. 3. Pesca – Aspectos econômicos – Pará. 4. Política pesqueira – Pará. 5. Desenvolvimento sustentável – Pará. 6. Pesca artesanal. I. McGrath, David Gibbs, orientador. II.Título. CDD 21 ed. 639.2098115 Marcelo Ferreira Torres A PESCA ORNAMENTAL NA BACIA DO RIO GUAMÁ: sustentabilidade e perspectivas ao manejo Aprovado em 31 / 10 / 2007 . Banca Examinadora: ________________________________ Prof. Dr. David Gibbs McGrath Orientador ________________________________ Prof. Dr. Juarez Pezzuti Examinador Interno ________________________________ Profa. Dra Oriana Trindade Almeida Examinadora Interna ________________________________ Profa. Dra Flávia Lucena Frédou Examinadora Externa ________________________________ Prof. Dra Victoria Judith Isaac Examinadora Externa Conceito: _______________________ Tese apresentada ao Núcleo de Altos Estudos Amazônicos – NAEA, como requisito do Curso de Doutorado em Desenvolvimento Sustentável do Trópico Úmido-PDTU para a obtenção do grau de doutor em Ciências Sócio-Ambientais pela Universidade Federal do Pará – UFPA Dedico este trabalho à minha mãe, D. Amélia, e à minha esposa, Ellen, que me apoiaram desde o início e souberam ser pacientes. AGRADECIMENTOS A Deus, pela sua magnificência como o Criador da vida, que me possibilitou existir, perscrutar e admirar a natureza em toda sua perfeição. Ao meu orientador Prof. David McGrath, pela amizade e orientação na realização desta tese, e pelas valiosas contribuições ao meu conhecimento durante suas aulas no curso de doutorado e animados bate-papos no seu escritório. À minha co-orientadora e amiga Dra. Flávia Frédou, e também ao seu esposo Dr. Thierry Frédou, que muito ajudaram no desenvolvimento de meu trabalho, sempre dispostos em contribuir, e sempre afetuosos em nosso dia-a-dia de trabalho no curso de Oceanografia da UFPA. Obrigado pela confiança creditada a mim. Ao amigo e mestre pescador Orlandino Jorge dos Santos, que com todo o conhecimento empírico de uma vida inteira dedicada à pesca, fez-me perceber que o saber acadêmico deve muito aos saberes tradicionais. Agradeço ainda pelo mesmo não medir esforços durante a realização dos trabalhos de campo, sempre ajudando e participando ativamente de todo o trabalho. Ao NAEA, que me deu a possibilidade de realizar este doutoramento, e ao “staff” de professores e técnicos, que também contribuíram com meu crescimento durante minha permanência nesta casa. À CAPES, que financiou a bolsa de estudos ao longo do curso. À SECTAM, que possibilitou o financiamento do trabalho de campo através do Fundo Estadual de Ciência e Tecnologia – FUNTEC (Edital 01/2003 - Processo no 307.290). Aos mestres queridos: Ronaldo Borges Barthem, Victoria Judith Isaac, David Gibbs McGrath e recentemente à Flávia Lucena Frédou, que ao longo de anos muito contribuíram e ainda contribuem para o meu aperfeiçoamento acadêmico e profissional. Aos colegas de doutoramento, que possibilitaram agradáveis momentos de discussão durante as aulas do curso e nas nossas reuniões informais, sempre muito divertidas. Aos colegas do Laboratório DIMAR/CG/UFPA, especialmente à Andréa Pontes Viana, que foram sempre amáveis e prestativos, durante os trabalhos de campo e durante a rotina de trabalho. Aos meus alunos (“desorientandos”) que participaram dos trabalhos de campo e enfrentaram comigo as difíceis horas de trabalho, pela companhia e colaboração. Aos colegas da Escola Agrotécnica Federal de Castanhal-PA, em especial à Andréa Maria Mello Costa Lima (Chefe da Coordenação Geral de Ensino - CGE) e ao Prof. Dr. Cícero Paulo Ferreira (Diretor do Departamento de Desenvolvimento Educacional – DDE), pelo apoio em importantes momentos necessários à finalização da redação deste trabalho. À toda a equipe de profissionais da Biblioteca do NAEA, pela paciente revisão do texto e contribuições à formatação final, em especial à Rosângela Caldas Mourão. A todos que contribuíram direta ou indiretamente na realização deste empreendimento, meus sinceros agradecimentos. Feliz aquele que transfere o que sabe e que aprende o que ensina. Cora Coralina RESUMO No presente trabalho fez-se uma análise da pesca ornamental na bacia do rio Guamá, em seu trecho médio, em uma área localizada no município de Ourém, nos limites deste e Capitão Poço, à jusante, e São Miguel do Guamá, à montante. A análise concentrou-se sobre as zonas ripárias, onde se assenta uma vegetação de mata ciliar que se apresenta abundante em algumas partes, enquanto noutras ela praticamente inexiste. A região como um todo se encontra sob forte impacto antrópico, causado principalmente por atividades de agricultura e pecuária extensiva, além da exploração de jazidas de seixo. A atividade pesqueira se resume praticamente à pesca de subsistência, sendo que há algumas poucas famílias que também se dedicam alternativamente à pesca ornamental. Considerando-se este cenário, procurou-se avaliar a influência que os impactos antrópicos causados pela pesca ornamental e pela modificação da paisagem trouxeram às comunidades ícticas e, em especial, aos peixes ornamentais. Constatou-se que as áreas com maior cobertura vegetal, menor presença de atividades humanas e de pesca apresentaram diferenças estatisticamente significativas entre os indicadores ecológicos que descrevem as comunidades ícticas, tais como riqueza e diversidade, além de apresentar um índice extremamente alto de espécies endêmicas, quando comparadas àquelas áreas com impactos mais severos. A descaracterização das áreas marginais, com uma perda de 47% da cobertura vegetal nas zonas ripárias nos últimos 19 anos pode ter influenciado a redução do número de espécies em até 37% nas áreas mais impactadas. A atividade de pesca ornamental foi caracterizada como tendo um pico de atividade nos meses de estiagem, sendo realizadaalternativamente como fonte de subsistência por poucas dezenas de pessoas, que a praticam de forma extrativista e concentram seu esforço sobre apenas algumas poucas espécies de valor comercial. Dentre estas, observou-se que em número de indivíduos a captura está 97% representada por Otocinclus sp. e por Corydoras julii, enquanto em relação à renda bruta há um domínio dos acaris (Loricariidae), que correspondem a 56% da receita total. A pesca ornamental praticada nestes moldes em Ourém e Capitão Poço demonstrou pouco impacto às comunidades ícticas, concluindo-se que o principal fator responsável pela perda de biodiversidade foi a remoção da mata ciliar às margens do rio. Palavras-chave: Pesca ornamental. Rio Guamá. Conservação de recursos pesqueiros ornamentais. ABSTRACT This study presents an analysis of ornamental fisheries in Guamá Basin, in its middle course, which one is in the northeast Micro region of Para state, placed between Capitão Poço and São Miguel do Guamá. In the present study a relative diagnosis to the change in the vegetal covering of the region-target became, evidencing an advance in the deforestation of the ciliar bush throughout the edges of the Guamá River. There are strong evidences of anthropogenic disturbs may cause a significant depreciation from its ichthyologic biodiversity due to reduction of the ciliar bush of basic importance for the maintenance of such communities. In the period from 1986 until 2005 the ciliar bush area presented a reduction of 47%, whereas the deforested area presented a rise of 36,5%. In the Guamá basin, the uses of the land for agriculture, cattle, lumber extraction and mining they had been stretch intensified in the last few decades, generating impacts of high magnitude for ichthyofauna, having the deforestation caused about 37% losses of fish species. The ornamental fishery is practiced by families of fishermen who dedicates just a time for this and still owns extractives characters. The summer concentrates the most of fishery activity, but it is insignificant and it has no evidence of overexploitation from stock fish. The most important species are Otocinclus sp. and Corydoras julii, which ones corresponding 97% of total caught. Loricariid catfishes are the most important and contribute with 56% of total income. To the level of ictiofauna, in particular, of the commercialized species as ornamental fish, we conclude that ornamental fishery is not dangerous to the local species; the impacts also have been perceived more severely in the areas with less ciliar bush, high level of human activities and fisheries too. Some ecological parameters such as richness and diversity were significantly different, keeping high values only in the best areas characterized for a ciliar bush having great conditions. Key Words: Ornamental fishery. Guamá River. Ornamental resources management and conservation. LISTA DE ILUSTRAÇÕES Esquema 1 - Atores socioeconômicos na cadeia produtiva da pesca ornamental no Guamá. 66 Esquema 2 – Cadeia de custódia e diferença de custos associados ao cardinal tetra capturado em Barcelos-AM, exportado e vendido em Boston (USA). 66 Esquema 3 - Dinâmica de interação entre as variáveis ecológicas e socioeconômicas que regem o sistema pesca ornamental. 234 Mapa 1 - Localização da área de estudo em destaque azul no mapa. 26 Mapa 2 - Bacias hidrográficas dos principais afluentes do rio Guamá. 28 Mapa 3 - Áreas de produção pesqueira ornamental na bacia do rio Guamá e tributários. 54 Mapa 4 - Principais itens comercializados oriundos do rio Guamá, considerando- se as áreas de produção no sentido de jusante à montante. 65 Mapa 5 - Imagem orbital da bacia do rio Guamá com destaque para a área de cobertura das imagens utilizadas no presente trabalho. 113 Mapa 6 - Mapa temático do uso e cobertura do solo para o ano de 1986. 115 Mapa 7 - Mapa temático do uso e cobertura do solo para o ano de 2005. 116 Mapa 8 - Localização das unidades amostrais ao longo da área de estudo. 150 Quadro 1 - Impactos aos recursos hídricos observados em quatro localidades em Ourém. 123 Quadro 2 - Métodos de pesca empregados e respectivas utilizações 148 Quadro 3 - Caracterização e classificação das unidades amostrais em relação às mudanças na cobertura dos solos e atividades antrópicas impactantes. 149 Quadro 4 - Relação das unidades amostrais 151 LISTA DE GRÁFICOS Gráfico 1 - Evolução das exportações brasileiras em comparação ao comércio mundial de peixes para fins ornamentais. 40 Gráfico 2 - Demonstrativo das exportações brasileiras em relação aos cinco maiores produtores/exportadores mundiais de peixes para fins ornamentais. 41 Gráfico 3 - Tempo em horas diárias gasto na atividade pesqueira por pessoa. 61 Gráfico 4 - Distribuição da produção da pesca ornamental em 2006. 62 Gráfico 5 - Participação relativa das espécies ornamentais para a composição das receitas brutas com a pesca ornamental em 2006. 64 Gráfico 6 - Variação sazonal dos fatores abióticos condutividade, pH, potencial redox, oxigênio dissolvido e temperatura da água do rio Guamá. 167 Gráfico 7 - Variação dos fatores abióticos do rio Guamá, em relação aos ecossistemas explorados. 169 Gráfico 8 - Representatividade das famílias de peixes em número de espécies. 172 Gráfico 9 - Distribuição por unidades amostrais das médias, variâncias e desvios da média da abundância relativa (CPUE) por artes de pesca. 173 Gráfico 10 - Distribuição bimensal das médias, variâncias e desvios da média da abundância relativa (CPUE), de acordo com a arte de pesca empregada. 174 Gráfico 11 - Distribuição das médias, variâncias e desvios da média da abundância relativa, em relação aos impactos à cobertura do solo. 175 Gráfico 12 - Distribuição das médias, variâncias e desvios da média da abundância relativa (CPUE), em relação à intensidade pesqueira. 176 Gráfico 13 - Distribuição por unidades amostrais das médias, variâncias e desvios da média da riqueza observada (S) por artes de pesca. 178 Gráfico 14 - Distribuição bimensal das médias, variâncias e desvios da média da riqueza observada (S), de acordo com a arte de pesca empregada. 179 Gráfico 15 - Distribuição das médias, variâncias e desvios da média da riqueza (S), em relação aos níveis de impactos pela alteração na cobertura do solo. 180 Gráfico 16 - Distribuição das médias, variâncias e desvios da média da abundância, em relação à intensidade pesqueira nas áreas consideradas. 181 Gráfico 17 - Riqueza de espécies observada (S) e estimada pelo índice de Margalef (d) em relação aos períodos em meses. 182 Gráfico 18 - Riqueza de espécies observada e estimada pelo índice de Margalef em relação às unidades amostrais. 183 Gráfico 19 - Riqueza de espécies estimada pelo método de Rarefração em relação aos impactos oriundos da mudança na cobertura dos solos. 184 Gráfico 20 - Número de espécies exclusivas em relação às áreas quanto aos impactos relativos às alterações da cobertura do solo. 185 Gráfico 21 - Distribuição por unidades amostrais das médias, variâncias e desvios da média da diversidade (H’) por artes de pesca. 190 Gráfico 22 - Distribuição bimensal das médias, variâncias e desvios da média da diversidade (H’), de acordo com a arte de pesca empregada. 191 Gráfico 23 - Distribuição das médias, variâncias e desvios da média da diversidade (H’) de acordo com os impactos pela alteração na paisagem. 192 Gráfico 24- Distribuição das médias, variâncias e desvios da média da diversidade (H’), de acordo com a intensidade pesqueira. 193 Gráfico 25 - Agrupamentos resultantes da análise de cluster sobre as abundâncias de espécies por unidades amostrais. 194 Gráfico 26 - Análise MDS com utilização do fator impactos pela alteração na cobertura do solo para as 21 áreas amostradas. 195 Gráfico 27 - Análise de cluster sobre as abundâncias de espécies por unidades amostrais, usando como fator os meses. 200 Gráfico 28 - Análise de agrupamento e ordenação para os dados de riqueza obtidos no período seco (setembro-novembro). 201 Gráfico 29 - Análise de agrupamento e ordenação para os dados de diversidade obtidos no período seco (setembro-novembro). 202 Gráfico 30 - Análise de agrupamento e ordenação para os dados de riqueza obtidos no período de transição (janeiro-março). 204 Gráfico 31 - Análise de agrupamento e ordenação para os dados de diversidade obtidos no período de transição (janeiro-março). 205 Gráfico 32 - Análise de agrupamento e ordenação para os dados de riqueza obtidos no período de chuvas (maio). 207 Gráfico 33 - Análise de agrupamento e ordenação para os dados de diversidade obtidos no período de transição (janeiro-março). 208 LISTA DE TABELAS Tabela 1 - Valor médio das exportações de peixes ornamentais por continentes, no período de 1985 – 2005. 42 Tabela 2 - Valor médio das exportações de peixes ornamentais pelos países sul- americanos, no período de 1985 – 2005. 43 Tabela 3 - Número de indivíduos e freqüência relativa das principais espécies capturadas, considerando-se a sazonalidade das chuvas no ano de 2006. 63 Tabela 4 - Categorização das áreas marginais do rio quanto à área de cobertura vegetal ciliar remanescente nas zonas ripárias do rio Guamá e afluentes. 119 Tabela 5 - Áreas correspondentes às classes de vegetação. 120 Tabela 6 - Atividades responsáveis pela degradação ambiental na região. 121 Tabela 7 - Situação dos ambientes de pesca em relação aos impactos percebidos. 124 Tabela 8 - Modificações em termos da abundância e composição das espécies ícticas da bacia do rio Guamá. 125 Tabela 9 - Relação das espécies que se tornaram raras. 125 Tabela 10 - Impactos no meio aquático de rios e igarapés em Ourém. 126 Tabela 11 - Estatus da atividade reprodutiva de peixes nas áreas de pesca impactadas. 126 Tabela 12 - Análise de variância das médias amostrais das variáveis abióticas, considerando o fator tempo. 165 Tabela 13 - Análise BIO-ENV das variáveis abióticas, utilizando a correlação não-paramétrica de Spearman (ρ). 166 Tabela 14 - Análise de variância das médias amostrais das variáveis abióticas, considerando os igarapés, lagos e canal principal. 168 Tabela 15 - Análise de variância das médias amostrais das variáveis abióticas considerando os impactos causados pelas mudanças na cobertura do solo. 170 Tabela 16 - Análise de variância das abundâncias relativas por artes de pesca, considerando os meses, unidades amostrais e impactos. 177 Tabela 17 - Análise de variância da riqueza por artes de pesca, considerando os meses, unidades amostrais e impactos. 182 Tabela 18 - Ranking das espécies de maior freqüência de ocorrência entre as estações e ao longo do ano, e das espécies de maior abundância numérica. 185 Tabela 19 - Dominância de espécies por unidades amostrais e por categorias referentes aos impactos. 186 Tabela 20 - Dominância de espécies pelos meses do ano 187 Tabela 21 - Análise de variância da diversidade por artes de pesca, considerando os meses, unidades amostrais e impactos. 187 Tabela 22 - Índices ecológicos de abundância, riqueza, eqüitabilidade e diversidade calculados por cruzeiros. 188 Tabela 23 - Índices ecológicos de abundância, riqueza, eqüitabilidade e diversidade calculados por estações de coleta. 189 Tabela 24 - Dissimilaridade média entre grupos de amostras (DISS/SD) e porcentagem de contribuição das principais espécies nos clusters formados. 198 Tabela 25 - Análise de variância das médias amostrais da abundância relativa (CPUE), riqueza (S) e diversidade (H’) considerando os clusters. 199 Tabela 26 - Análise de variância das médias amostrais da abundância relativa (CPUE), riqueza (S) e diversidade (H’) no período seco (set.-nov.). 203 Tabela 27 - Análise de variância das médias amostrais da abundância relativa (CPUE), riqueza (S) e diversidade (H’) no período de transição (jan.-mar.). 206 Tabela 28 - Análise de variância das médias amostrais da abundância relativa (CPUE), riqueza (S) e diversidade (H’) no período chuvoso (maio). 208 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS ACEPOPA Associação dos Criadores e Exportadores de Peixes Ornamentais do Estado do Pará ADEPARA Agência de Defesa Agropecuária do Estado do Pará BACEN Banco Central do Brasil CODEAMA Centro de Desenvolvimento, Pesquisa e Tecnologia do Estado do Amazonas CONAMA Conselho Nacional do Meio Ambiente DIMAR Laboratório de Dinâmica, Avaliação e Manejo de Recursos Pesqueiros DOU Diário Oficial da União FAO Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação IBAMA Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística ICLARM International Center for Living Aquatic Resources Management IDESP Instituto de Desenvolvimento Econômico e Social do Estado do Pará INFRAERO Empresa Brasileira de Infra-Estrutura Aeroportuária INPE Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais LAIT Laboratório de Análise de Imagens do Trópico Úmido MAPA Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento MMA Ministério do Meio Ambiente OFI Ornamental Fish International SEAP/PR Secretaria Especial de Aqüicultura e Pesca da Presidência da República SECTAM Secretaria Executiva de Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente SEDECT Secretaria de Estado de Desenvolvimento, Ciência e Tecnologia SEDESA/MAPA Serviço de Sanidade Agropecuária do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento SEPAq Secretaria de Estado de Pesca e Aquicultura SEPOF Secretaria de Estado de Planejamento, Orçamento e Finanças SUDAM Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia SUDEPE Superintendência do Desenvolvimento da Pesca UFPA Universidade Federal do Pará UMIACS University of Maryland Institute for Advanced Computer Studies WWF World Wide Fund for Nature SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO GERAL 21 1.1 ANTECEDENTES E PROBLEMATIZAÇÃO 21 1.2 ÁREA DE ESTUDO 25 1.2.1 Características do Meio Físico 26 1.3 DEFINIÇÃO DA ÁREA E HIPÓTESES 33 1.4 OBJETIVOS 35 1.4.1 Objetivo Principal 36 1.4.2 Objetivos Específicos 36 1.5 ESTRUTURA DA TESE 36 2 A PESCA ORNAMENTAL NA BACIA DO RIO GUAMÁ 38 2.1 INTRODUÇÃO 38 2.2 MATERIAIS E MÉTODOS 52 2.2.1 Coleta de Dados e Desenho Amostral 52 2.3 RESULTADOS 55 2.3.1 Caracterização Socioeconômica do Município de Ourém 55 2.3.2 Caracterização Socioeconômica da Pesca Ornamental 59 2.3.3 Produção da Pesca Ornamental 61 2.3.4 A Cadeia de Comercialização da Pesca Ornamental 65 2.3.5 Esforço de Pesca e Consequências aos Estoques 67 2.3.6 Processamento dos Peixes Ornamentais desde a Captura à Exportação 68 2.3.6.1 Processos Iniciais da Pesca Ornamental e Fatores Limitantes 68 2.3.6.2 Processamento Final dos Peixes para Exportação 75 2.3.7 O Gerenciamento e o Ordenamento da Pesca Ornamental 77 2.3.7.1 A Gestão Governamental77 2.3.7.2 A Legislação 79 2.4 DISCUSSÃO 83 2.5 CONSIDERAÇÕES FINAIS E PERSPECTIVAS RELATIVAS AO PRESENTE CAPÍTULO 103 3 A QUESTÃO AMBIENTAL E IMPLICAÇÕES PARA A PESCA ORNAMENTAL 105 3.1 INTRODUÇÃO 105 3.2 MATERIAIS E MÉTODOS 111 3.2.1 Coleta de Dados 111 3.2.2 Análise de Dados 119 3.3 RESULTADOS 120 3.3.1 Impactos Decorrentes das Alterações Ambientais 120 3.4 DISCUSSÃO 127 3.5 CONSIDERAÇÕES FINAIS E PERSPECTIVAS RELATIVAS AO PRESENTE CAPÍTULO 137 4 PADRÕES ECOLÓGICOS DA BIODIVERSIDADE ÍCTICA NO RIO GUAMÁ 139 4.1 INTRODUÇÃO 139 4.2 MATERIAIS E MÉTODOS 147 4.2.1 Coleta de Dados 147 4.2.2 Seleção de Variáveis Indicadoras 152 4.2.3 Análise de Dados 154 4.2.3.1 Programas Computacionais 154 4.2.3.2 Análise Descritiva das Amostras 154 4.2.3.3 Análise das Variáveis do Meio Físico 155 4.2.3.4 Análise da Estrutura da Comunidade Íctica 156 4.2.3.4.1 Diversidade 156 4.2.3.4.2 Riqueza 158 4.2.3.4.3 Constância de Ocorrência e Dominância de Espécies 159 4.2.3.5 Análises Multivariadas 159 4.2.3.5.1 Construção da Matriz de Dados 159 4.2.3.5.2 Análise de Agrupamento 160 4.2.3.5.3 Análise de Ordenação 161 4.2.3.5.4 Análise de Similaridade 162 4.2.3.5.5 Relação entre Padrões Ecológicos da Comunidade de Peixes e os Impactos relativos à Mudança na Cobertura do Solo e à Pesca 163 4.3 RESULTADOS 164 4.3.1 Variações do Ambiente 164 4.3.2 Padrões de Abundância e Biodiversidade 170 4.3.3 Padrões de Riqueza de Espécies 177 4.3.4 Constância e Dominância de Espécies 184 4.3.5 Padrões de Diversidade Ecológica 187 4.3.6 Padrões de Similaridade entre as Comunidades 193 4.4 DISCUSSÃO 209 4.4.1 Variáveis Abióticas 209 4.4.2 Composição da captura e Biodiversidade 211 4.4.3 Constância e Dominância 213 4.4.4 Padrões de Abundância 217 4.4.5 Padrões de Riqueza 219 4.4.6 Padrões de Diversidade 223 4.4.7 Padrões de Similaridade entre as Comunidades de Peixes 225 4.4.8 Impactos pela Pesca Ornamental 229 5 DISCUSSÃO GERAL 232 5.1 O MANEJO DA PESCA ORNAMENTAL NA AMAZÔNIA 232 5.2 PERSPECTIVAS PARA ESTUDOS FUTUROS 241 5.3 CONCLUSÕES 243 REFERÊNCIAS 245 ANEXOS 267 1 INTRODUÇÃO GERAL 1.1 ANTECEDENTES E PROBLEMATIZAÇÃO Historicamente, o extrativismo de peixes ornamentais ou pesca ornamental, como é chamada, desenvolveu-se na Amazônia no início do século passado em uma região localizada entre a Colômbia, Brasil e Peru (BARTHEM et al., 1995). Surgida inicialmente como alternativa econômica às populações ribeirinhas que antes subsistiam apenas do extrativismo de produtos silvestres, da caça e também da pesca, a captura de peixes ornamentais progrediu a uma atividade de tempo integral e, nas últimas décadas, em algumas áreas da região amazônica ela passou a ser a principal fonte de renda e emprego para milhares de pessoas, que direta ou indiretamente subsistem da extração dos peixes vivos principalmente para venda aos mercados aquariofilistas nacional e internacional (PRANG, 2004). Até o início da década de 1980, as várias dificuldades representadas pelo acesso às áreas de captura, falta de recursos técnicos para a manutenção dos espécimes vivos, transporte inadequado, doenças, entre outros aspectos, contribuíam para elevados índices de mortalidade e vultosos prejuízos às micro e pequenas empresas que se dedicavam à comercialização destes produtos, que eram oriundos apenas do extrativismo (TORRES, 1994). Na atualidade, entretanto, em muitas regiões tais circunstâncias não mais se verificam, pois com o acúmulo de experiências e investimentos do setor produtivo, a mortalidade recrudesceu a níveis mínimos, situando-se entre 3 a 15% do total capturado dependendo da espécie considerada (TORRES, 2006). Com os recentes avanços tecnológicos, a rápida expansão dos mercados via globalização e a melhoria dos sistemas de comunicação ao nível global, o comércio de peixes ornamentais cresceu vertiginosamente, ameaçando a sobrevivência da atividade extrativista e colocando em risco de colapso os estoques de algumas espécies-alvo (TORRES, 2006). Concomitantemente a estes eventos, a Amazônia tornou-se o palco de várias transformações na sua paisagem natural como resultado de processos antrópicos diversos que resultaram no desflorestamento de grandes áreas, cujas conseqüências ao nível da ictiofauna ainda são desconhecidas e somente há pouco começaram a ser melhor compreendidas cientificamente em outras partes do mundo (CROSS; MOSS, 1987; BROWN, 2000; STAUFFER et al., 2000; GERHARD et al., 2004; McCLEARY et al., 2004). Entre os principais efeitos podem-se citar a perda de biodiversidade e as alterações nos padrões das comunidades ecológicas, que demonstram modificações nas relações de dominância e de abundância entre espécies. Torres (2006) afirma que os peixes ornamentais são, em grande parte, bastante suscetíveis às ações antrópicas causadoras de impactos aos ecossistemas florestais nas zonas ripárias, pois a retirada da vegetação ciliar os predispõem a severas ameaças de extinção local, principalmente pela modificação das condições ambientais nos ecótonos marginais dos rios e igarapés, às quais os peixes encontram-se adaptados. Segundo o mesmo autor, estes peixes são, em sua maioria, espécies de pequeno porte que têm hábitos sedentários ou que realizam curtas migrações ao longo dos igarapés, mantendo com as matas ciliares uma forte dependência baseada no uso de variadas fontes tróficas disponibilizadas ao longo do ano, em sincronia com o ciclo hidrológico, além do uso de abrigos para nidificação ou proteção contra predadores, entre outras. O desconhecimento acerca dos impactos que a pesca ornamental, bem como as mudanças na paisagem e uso do solo nas zonas ripárias causam às comunidades ícticas também é alarmante, especialmente no caso das espécies ou famílias com elevado grau de endemismo, como as dos peixes loricarídeos (acaris), além de dezenas de espécies de caracídeos (tetras, pacus, piranhas, etc), ciclídeos (carás) e calictídeos (papa-areias, tamoatás e cascudos), que são a base dos itens comercializados para os mercados aquariofilistas nacional e internacional (TORRES, 1994). O extrativismo de peixes ornamentais além de economicamente importante para a subsistência de milhares de pessoas em toda a Amazônia, suprindo um comércio de milhões de dólares anualmente, também desponta como uma possível solução a vários problemas relacionados à sustentabilidade ambiental e econômica das populações ribeirinhas em algumas áreas (WHITTINGTON et al., 2000; NORRIS; CHAO, 2002). Isto porque o respeito às próprias características de exploração dos recursos tende a promover uma diminuição da pressão sobre a floresta e sobre a fauna silvestre, e também permite o livre acesso às populações ribeirinhas sem oportunidade de trabalho (CHAO; PRANG, 1997). A pesca ornamental, pela sua fragilidade e importância, necessita urgentemente de um plano de manejo adequado às suas características e que contemple não apenas medidas de restrição à pesca, mas principalmente a conservação de áreas que garantam a sobrevivência dos estoques e a manutenção das funções sistêmicas do ambiente, pois sua sustentabilidade depende destas condições (TORRES, 2006). O conceito de sustentabilidade significa que um recurso deve ter continuidade no tempo como entidade biológica e produtiva e, em se tratando da pesca, que este recurso preste benefícios contínuos tanto a nível econômico como social; é, portanto, um processo harmonioso que deve integrar o aproveitamento racional dos recursos, o direcionamento dos investimentos, a orientação do desenvolvimento tecnológico e as ações institucionais que satisfaçamas necessidades e aspirações das comunidades envolvidas na atividade pesqueira (HANESSON, 1993; BAYLEY, 1995). Apesar de que esta possa ser uma atividade promissora, a situação é de alerta, pois há estudos que apontam o declínio de alguns estoques dentre as principais espécies ornamentais, indicando sinais de sobrepesca. A inexistência de um bom gerenciamento destes recursos ao longo de décadas e o aumento da demanda contribuíram para o comprometimento de alguns estoques, conforme fora constatado para o cardinal (Paracheirodon axelrodi) e o disco (Symphysodon discus) no Estado do Amazonas (BAYLEY; PETRERE, 1989; CRAMPTON, 1999). Outras espécies ornamentais que também são apontadas como vulneráveis, segundo a resolução 054/2007 da Secretaria de Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente (SECTAM, 2006) que homologa a lista de espécies da flora e da fauna ameaçadas de extinção no Estado do Pará, são o acari zebra (Hypancistrus zebra) e o pacu capivara (Ossubtus xinguense) no sistema Xingu-Iriri. Além destes há o pacu curupeté (Mylesinus paucisquamatus, renomeado para Carlana paucisquamatus), um bagre pimelodídeo (Aguarunichthys tocantinsensis) e um batracoidídeo (Potamobatrachus trispinosus) considerados vulneráveis; e um anostomídeo (Sartor tucuruiense) além de três espécies de ciclídeos (Crenicichla cyclostoma, Crenicichla jegui e Teleocichla cinderella) considerados criticamente ameaçados, todos da bacia do rio Tocantins (SECTAM, 2006). Este quadro é potencialmente perigoso na Amazônia oriental, cuja pesca ornamental é desenvolvida desde o estuário e alcança todos os grandes tributários das bacias amazônica, do nordeste paraense e do Tocantins-Araguaia (TORRES, 2006). O extrativismo responde pela quase totalidade dos espécimes de peixes ornamentais exportados do Brasil, representados por espécies de água doce e marinhas capturadas em seus habitats naturais (NOTTINGHAM et al., 2005). Dentre estas a maior parte é composta por peixes continentais (CHAO; MARCON, 2000; ALBUQUERQUE-FILHO, 2003). Segundo Torres (2006), no município de Ourém, localizado na mesorrregião do Nordeste paraense, as atividades extrativistas ainda são importantes fontes de renda ou de suprimentos à alimentação das famílias que vivem em comunidades mais isoladas. Dentre aquelas verifica-se a pesca ornamental, que é praticada por um número restrito de pessoas, mas que dela subsistem pelo menos por alguns meses do ano, na estação seca. Esta atividade, que se iniciou na região no final da década de 1960, significa para os ribeirinhos que a praticam uma consistente fonte de renda alternativamente à agricultura familiar. O contexto ambiental em que se realiza tal atividade é que desperta maior interesse, visto que a região supracitada encontra-se sob fortes pressões de desflorestamento (CAPOBIANCO et al., 2001) devidas a atividades diversas, como a pecuária extensiva, agricultura, além de atividades mineradoras. Estas têm produzido alterações da paisagem nas zonas ripárias do rio Guamá, que podem estar afetando prejudicialmente os ecossistemas marginais, com riscos potenciais à biota aquática. Considerando tais questões, procuramos avaliar a situação das comunidades ícticas frente à pesca e aos impactos causados pelas mudanças na cobertura dos solos nas zonas ripárias de uma região da Amazônia Oriental, localizada na porção média do rio Guamá, entre os municípios de Ourém e Capitão Poço, Estado do Pará. O propósito é de estabelecer um modelo adequado que possa servir como base para uma estratégia de conservação destes recursos pesqueiros nesta bacia hidrográfica e que possa ser replicável para outras microbacias onde se realiza a pesca ornamental. 1.2 ÁREA DE ESTUDO Para o presente estudo foi escolhida uma área do rio Guamá com aproximadamente 70 km de extensão, que apresenta junto às áreas ripárias diferentes extratos de vegetação ciliar, cujas características variam desde áreas completamente desflorestadas até outras com relativamente abundante vegetação. Esta área situa-se entre os paralelos de 47º21’W e 47º02’W, incluindo os pequenos povoamentos ao longo da PA-251 no trecho de São Miguel do Guamá a Ourém (Mapa 1). MAPA DE LOCALIZAÇÃO (Área de Estudo ) Localização: País: Brasil Estado: Pará Sistemas de Coordenadas: Datum SAD 69 CidadesMalha Rodoviária Legenda: UTM UPS { Vilarejos Mapa 1 – Localização da área de estudo (em destaque azul no mapa). Fonte: Torres (2007) 1.2.1 Características do Meio Físico O conhecimento do meio físico ajuda a compreender como a biota responde às pressões adaptativas na própria estruturação das comunidades ícticas. Também são importantes porque fatores ambientais tais como clima, topografia e solos podem determinar as trajetórias de mudanças no uso e cobertura dos solos, e nos processos de formação e consolidação de fronteiras agrícolas (McCRACKEN et al., 2002). Por isso as mudanças no uso e cobertura do solo que tiveram lugar em todo o nordeste do Estado nas últimas décadas constituem um importante fator que pode estar impactando de forma significativa as comunidades de peixes em toda a região, com conseqüências indiretas sobre a atividade pesqueira. a) Hidrografia A bacia do rio Guamá tem uma área de drenagem de 87.389,5 km2 que corresponde a 7% da área do Estado do Pará, e segue no sentido leste-oeste, servindo de divisor natural entre vários municípios. Este rio, que mais se assemelha a um afluente do rio Capim, se localiza no setor que define o limite nordeste da Amazônia, na subárea do alto rio Capim/região Bragantina do Pará (correspondente à célula espacial 20 na setorização proposta por Ab’Saber (1994). Com um curso total de aproximadamente 380 km, nasce nas matas dos municípios de Ipixuna e de Nova Esperança do Piriá, acima de Paragominas, seguindo por Capitão Poço e Garrafão do Norte, a sudoeste, e finalmente dirigindo-se para norte-nordeste até o município de Ourém. Deste ponto em diante o rio flete para oeste, divisando São Miguel do Guamá de outros três municípios. Junta-se então ao rio Capim na altura da cidade de São Domingos do Capim e, engrossado a partir deste ponto, vem desaguar na baía do Guajará, em Belém. Seus afluentes mais importantes pela margem esquerda são os rios Capim, Acará e Moju (Mapa 2). Os mapas produzidos não ilustram precisamente a origem do rio, formada pela anastomose de vários igarapés e riachos temporários. Observa-se tão somente que o rio toma forma na parte sul do município de Capitão Poço e, subindo, separa-o de Garrafão do Norte, cuja divisa se faz através do Igarapé Tauari; depois divide aquele município separando-o de Santa Luzia do Pará e, em seguida, de Ourém. Margeia os municípios de Irituia, São Domingos do Capim e Bujaru, delimitando-os do município de São Miguel do Guamá, à direita; também separa Bujaru dos municípios de Inhangapi e Santa Izabel do Pará; e ainda separa Acará dos municípios de Benevides, Ananindeua e Belém. Mapa 2 – Bacias hidrográficas dos principais afluentes do rio Guamá. Fonte: SECTAM (2006). A área aqui investigada estendeu-se pelo município de Ourém, desde o limite territorial entre este e São Miguel do Guamá, às proximidades do povoado de Urucuriteua (47º21’W), até o povoado de Igarapé-Açu, no município de Capitão Poço (47º02’W). Nesta porção do sistema hídrico o rio Guamá limita a oeste os municípios de Ourém (na margem direita) e Capitão Poço (margem esquerda). O rio Cuxiú, um de seus afluentes, serve de limite natural, à noroeste, entre aquele município e o de São Miguel do Guamá. Bacia do Rio Guamá Bacia do Rio Mojú Bacia do Rio Acará Bacia do Rio Capim O rioGuamá é o de maior importância para o município de Ourém, servindo de limite natural entre este e o município de Capitão Poço, em toda sua porção norte e leste. Para este rio converge toda a trama de pequenos afluentes que se inserem nos municípios da microrregião do Guamá; uns, em direção sul/norte, como os rios Irituia, Pacuí-Miri, Pacuí-Claro, Pacuí-Grande e Pacuí-Açu; outros, em direção sudoeste/nordeste, como os igarapés Água-Azul, Trapiche, e os rios Arauaí e Jacaiacá; e na direção norte/sul têm-se os igarapés Induá e o Capitão Poço, o qual passa pela sede municipal homônima. O rio Guamá também possui outros afluentes de grande extensão como o rio Cuxiú, que atravessa o município de Garrafão do Norte, além dos igarapés Jipuúba, Tucumã, Paixão, Mamorana e Araçarana. O rio Irituia, afluente da margem esquerda do rio Guamá, que tem a direção sul-norte, possui como afluentes, pela margem direita, os igarapés Borges, Itabocal, Açu-de-Cima, Açu-de-Baixo, Patauateua, Ajará, Puraquequara e Peripindeua, que serve de limite entre os municípios de Irituia e Mãe do Rio. Destaca-se ainda o rio Caeté, com início na foz do rio Grande, em Ourém. b) Climatologia O regime climático em toda a região Norte é definido e marcado pela presença e deslocamento da Zona de Convergência Intertropical (ZCIT) que caracteriza os períodos chuvosos e menos chuvosos nesta região. Ao nível da Amazônia Oriental, o clima é quente úmido, com períodos de estiagem variando de 1 a 2 meses (IBGE, 2006). Por isso as bacias hidrográficas do nordeste paraense são bastante influenciadas por este regime pluviométrico, com períodos de cheia e seca bem marcados, encontrando-se sob o “Domínio Morfoclimático dos Planaltos Amazônicos ou Dissecados, das áreas colinosas e planícies revestidas por florestas densas” (IBGE, 2006). Seguindo a classificação de Köppen-Geiger (apud PEEL et al., 2007) esta região compreende a chamada Zona Climática A ou Zona Tropical Chuvosa, que abrange três variedades climáticas: Af (clima tropical úmido ou equatorial), Aw (clima subtropical com chuvas de inverno) e Amw (clima de monção com chuvas de inverno), dentre os quais o último predomina na área das bacias dos rios Capim e Guamá. De acordo com as informações disponíveis (SECTAM, 2006) e os dados climatológicos apresentados pela Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia (SUDAM, 1984), o clima predominante ao longo da bacia do Guamá é considerado mesotérmico e úmido, com temperatura média anual elevada, em torno de 25ºC. O período mais quente tem médias mensais em torno de 25,5ºC e as temperaturas mínimas, de 20ºC. Seu regime pluviométrico fica, geralmente, entre 2.250 mm/ano e 2.500 mm/ano. As chuvas, apesar de regulares, não se distribuem igualmente durante o ano, sendo de janeiro a junho sua maior concentração (cerca de 80%), implicando grandes excedentes hídricos e, conseqüentemente, grandes escoamentos superficiais e cheias dos rios. Segundo o Instituto de Desenvolvimento Econômico e Social do Estado do Pará (IDESP, 2006) a umidade relativa do ar se mantém em torno de 85%. c) Pedologia Segundo os dados da Secretaria Executiva de Estado de Planejamento e Finanças (SEPOF, 2006), na área em questão existe uma predominância de solos com horizontes B Latossólicos, caracterizados pelos seguintes tipos: Latossolo Amarelo, textura média e textura argilosa; Latossolo Amarelo Cascalhento, textura média; Latossolo Amarelo Distrófico, textura média; Latossolo Vermelho-Amarelo Distrófico, textura argilosa e textura média. Além destes há ainda solos Podzólicos Vermelho-Amarelo, Concrecionário, Podzólico Vermelho, textura argilosa; e Podzol Hidromórfico. Também estão presentes solos Aluviais e Hidromórficos Indiscriminados, além do Plintossolo e Gley Pouco Húmico. Apresenta também solos areno-quartzosos representados pela Areia Quartzosa e Concrecionários Lateríticos Distróficos, textura indiscriminada. Nas áreas inundáveis, próximas aos rios Guamá e Capim aparecem Gley Pouco Húmico Distrófico, textura argilosa; solos Aluviais Eutróficos e Distróficos; e Hidromórficos Indiscriminados. d) Geologia O rio Guamá tem suas cabeceiras numa extensa e contínua área de platô do Terciário (Formação Barreiras), seguindo através de trechos de chapadas formadas por rochas do Paleozóico e Cenozóico, até alcançar a planície sedimentar de inundação do Quaternário, onde o rio se alarga. Na região que corresponde ao município de Peixe-Boi, também localizado no nordeste paraense e banhado por um rio homônimo existe, nas suas proximidades, um alto estrutural que se estende entre o rio Capim e seu afluente da margem direita, o rio Surubim. Esta área está coberta pela Formação Itapecuru, a qual se mostra levemente arqueada e fraturada no sentido NW–NE, o que determina o direcionamento dos rios desta região (SECTAM, 2006; SEPOF, 2006). De acordo com as fontes acima consultadas, na área estudada a geologia é representada basicamente pelas rochas do Pré-Cambriano do Grupo Gurupi, constituído de filitos vermelhos, xistos e micaxistos cortados por veios de quartzo, auríferos, e pela sedimentação cenozóica representada pelos litotipos que constituem a Formação Barreiras e o Quaternário Subatual e Recente. Há a presença de rochas do Complexo Maracaçumé, que constituem as pedreiras da região Bragantina; aparecendo, também, nas proximidades da sede municipal, denominados como "Arenito Guamá", provavelmente da Era Cenozóica, do período Cretáceo. A Formação Itapecuru proveniente do Cretáceo aparece em Garrafão do Norte. Morfoestruturalmente, a área investigada insere-se no Planalto Rebaixado da Amazônia (da zona Bragantina). e) Relevo O relevo nesta região apresenta-se pouco movimentado, verificando-se a presença de colinas baixas dissecadas em áreas do cristalino e de superfícies aplainadas em áreas sedimentares, representadas por um relevo tabuliforme, terraços e várzeas. As altitudes encontradas entre 20 e 100 metros, mostram, por esse intervalo, que há compartimentos topográficos diferenciados. A topografia do município de Ourém é um pouco mais expressiva apenas nas áreas cristalinas, onde se apresenta levemente movimentada. Entretanto, apresenta altitudes bastante modestas, sendo que, na microrregião do Guamá apresenta-se moderadamente plana, com valores mínimos de 10 metros acima do nível do mar no município de São Miguel do Guamá e a cota máxima de 141 metros no sul do Município de Garrafão do Norte (SECTAM, 2006; SEPOF, 2006). f) Fisiografia A cobertura vegetal na região dos rios Capim e Guamá foi outrora dominada por uma vegetação arbórea com espécies emergentes, constituída principalmente de uma formação de floresta densa do tipo Floresta Ombrófila dos Platôs. Esta apresentava uma estrutura bastante uniforme, composta de árvores grossas e bem altas, sem palmeiras e com raras lianas. Nela não se observava um estrato florístico arbustivo, sendo as plantas de pequeno porte aí encontradas, em sua maioria, representadas por árvores jovens em crescimento. Atualmente, a vegetação foi bastante afetada em face aos constantes desmatamentos, havendo apenas florestas secundárias, com eventuais testemunhos de mata primária, cujos subtipos originais pertencem à Floresta Densa dos Baixos Platôs e Floresta Densa em Relevo Dissecado das áreas metassedimentares. Segundo os dados do Projeto RADAM (1974), a floresta ombrófila revestia grande área do Médio Capim e Guamá, alcançando cerca de 18.173 Km2, com pequenas manchas de campo, variando suas unidades fisionômicas em função de seu posicionamento topográfico. Nas áreas aluviais, sob influência do rio Guamá, a vegetação predominante é a FlorestaEquatorial Latifoliada, representada pelos subtipos Floresta Densa dos Platôs, Floresta Densa dos Terraços Aluviais ou Floresta de Várzea. Nas áreas marginais do rio Guamá e seus afluentes, caracterizadas pela influência de inundações, aparece a mata de várzea, com suas espécies ombrófilas, dicotiledôneas e palmáceas e as matas de galeria. Nas áreas flúvio-litorâneas do município de Ourém houve o domínio do mangue. Essa vegetação se assenta sobre solos do tipo Latossolo Amarelo Distrófico de textura argilosa e muito argilosa (SECTAM, 2006; SEPOF, 2006). Também se observa a influência de marés que promovem a oscilação diária do nível do rio, com ocorrência em locais próximos à sede municipal de Ourém. 1.3 DEFINIÇÃO DA ÁREA E HIPÓTESES A definição da área de estudo atendeu a alguns critérios a fim de investigar os níveis de impactos pela pesca ornamental e pelo desflorestamento dàs zonas ripárias, e suas conseqüências ao nível da biodiversidade íctica. Considerou-se inicialmente que: a) A ictiofauna deste sistema fluvial encontra-se pouco investigada cientificamente e, em certos trechos, ainda sem qualquer informação; b) O acesso relativamente fácil à área em questão, que também é quase totalmente navegável para pequenas embarcações, possibilita um bom apoio logístico para sua prospecção. c) A experiência pessoal acumulada após muitos anos de trabalho nesta mesma área. Tendo-se em vista as suas características hidrográficas e as atividades em desenvolvimento na região, algumas hipóteses foram levantadas acerca das temáticas de desmatamento, biodiversidade íctica e pesca ornamental: a) A variada fisiografia do rio Guamá em seu curso médio, com trechos de fluxo lento e rápido, afloramentos de rochas formando corredeiras esporádicas, substrato arenoso, lodoso ou pedregoso, etc, propicia variados nichos que favorecem uma alta biodiversidade; b) Ao longo de considerável extensão do seu curso médio, este rio e seus tributários são o cenário de ação de famílias de ribeirinhos e pescadores que se dedicam à pesca e ao extrativismo de peixes ornamentais como fonte de subsistência; c) A área em questão, apresentando um índice de pressão antrópica avaliado como alto a muito alto, sofre grande degradação ambiental pela perda da cobertura vegetal, especialmente nas zonas ripárias, devido ao desenvolvimento desordenado de atividades agrícolas, pecuária extensiva e outras, que alcançam as suas margens e tributários. O rio Guamá também se constitui um laboratório natural para avaliar o impacto dessas atividades sobre a biodiversidade íctica desta microbacia, com implicações sobre como melhor manejar essas espécies e também acerca de outras importantes questões ambientais que contribuem para a discussão sobre o manejo de recursos pesqueiros ornamentais na Amazônia, tais como: a) Quais os impactos às comunidades ícticas produzidos pelas modificações na paisagem, especificamente pela degradação das matas ciliares? b) Como os diferentes padrões de uso da terra influenciam na modificação da biodiversidade íctica local? Justificando-se, afinal, o paradigma de promover uma pesca ornamental economicamente rentável e ecologicamente sustentável implica um amplo entendimento dos ecossistemas naturais e dos sistemas socioculturais envolvidos, através de estudos sobre a diversidade de peixes e habitats, além dos processos socioeconômicos pertinentes à área. O conhecimento acerca do meio natural, os fenômenos sociais envolvidos e os impactos à ictiofauna causados pelas alterações na cobertura vegetal, notadamente pelo desflorestamento das zonas ripárias, também permitem melhor avaliar a necessidade de se investir na estratégia de preservação de espécies e/ou na conservação de áreas. Vale ainda ressaltar que este constitui um estudo pioneiro para a região, que pode subsidiar a formulação de políticas mais eficazes para o setor. 1.4 OBJETIVOS Com base nos antecedentes considerados acima, e tendo-se como hipótese geral que a diversidade de peixes tem sido influenciada pela perda de cobertura vegetal ripária no sistema límnico do rio Guamá em seu curso médio, a presente tese teve por objetivos: 1.4.1 Objetivo Principal a) Caracterizar de forma integrada a pesca ornamental realizada na bacia do rio Guamá, em seus contextos ecológico e sócio-econômico, frente aos impactos antrópicos através das alterações na cobertura florestal ciliar das zonas ripárias e pesca. 1.4.2 Objetivos Específicos a) Estudar os aspectos relativos à dinâmica socioeconômica da pesca ornamental realizada na referida área, além dos impactos do extrativismo de peixes ornamentais sobre estes recursos pesqueiros; b) Avaliar os impactos ecológicos decorrentes do desflorestamento da mata ciliar nas zonas ripárias e pesca ornamental, e suas conseqüências ao nível da biodiversidade íctica. 1.5 Estrutura da Tese No capítulo 2 apresenta-se o contexto histórico em que a pesca ornamental se desenvolveu na Amazônia e uma síntese sobre a realidade socioeconômica desta atividade na Pan-Amazônia. Também é apresentada uma análise da cadeia produtiva da pesca ornamental e um diagnóstico da produção no médio rio Guamá, analisando-se a composição das capturas em relação às áreas e aos meses do ano, além de descrever as pescarias, mapeando a atividade e revelando as espécies-alvos e as artes utilizadas localmente. Também foram analisados os aspectos pertinentes ao ordenamento da pesca ornamental, identificando-se os principais óbices que se apresentam ao crescimento desta atividade no Estado do Pará. O capítulo 3 apresenta um diagnóstico sócio-ambiental da área em questão utilizando o processamento de imagens digitais e também prospecções de campo por meio de uma pesquisa etnobiológica, avaliando-se como as mudanças na cobertura vegetal ciliar ocorridas ao nível das zonas ripárias afetaram a biota e as populações ribeirinhas do entorno do rio Guamá. São também discutidas as conseqüências do desflorestamento e os efeitos ecológicos sobre a biodiversidade íctica e a pesca ornamental. O capítulo 4 tendo como fio condutor a relação entre o extrativismo de peixes ornamentais, as atividades sócio-econômicas em desenvolvimento e as mudanças na cobertura vegetal ciliar ocorridas nas últimas duas décadas, apresenta um diagnóstico da biodiversidade íctica em que são demonstradas as alterações dos padrões ecológicos das comunidades de peixes em decorrência destes fenômenos. Nele é apresentada uma discussão acerca das questões pertinentes à conservação da biodiversidade íctica em relação às alterações da paisagem, com as conseqüências advindas deste evento sobre a atividade pesqueira. Em seu bojo as teorias e a análise empírica são reunidas a fim de apresentar uma explicação acerca dos processos humanos envolvidos com a mudança da paisagem na região de Ourém-PA que têm levado à perda de biodiversidade localmente. No capítulo final são sintetizadas as principais conclusões do trabalho, estruturadas sob uma base analítica que vislumbra a situação atual da pesca ornamental na região frente aos resultados apresentados e ao referencial teórico adotado. Então são revistas as hipóteses iniciais e oferecidas as devidas respostas, abrangendo a totalidade do estudo. 2 A PESCA ORNAMENTAL NA BACIA DO RIO GUAMÁ 2.1 INTRODUÇÃO A pesca é uma das mais antigas e tradicionais atividades extrativistas e de subsistência da Bacia Amazônica, além de ser uma atividade de fundamental importância econômica, social e cultural para a região (SMITH, 1979; FURTADO, 1981; LOUREIRO, 1985; PETRERE et al., 1992). Barthem et al. (1997) classificaram a atividade pesqueira na Amazôniacomo industrial e artesanal, e esta pode ser dividida em comercial ou difusa, dependendo de um conjunto de fatores como a dimensão dos barcos, tipos de aparelhos usados, tipos de pescadores e estoques explotados. De acordo com a destinação a que se presta o pescado, estes autores também tipificaram a pesca em cinco categorias: pesca de subsistência, pesca comercial, pesca industrial, pesca esportiva e pesca ornamental. A pesca ornamental é, pois, uma modalidade da pesca artesanal orientada para a captura de peixes vivos, a maioria destinada ao comércio aquariofilista nacional e internacional, além de museus, aquários de exposição pública e colecionadores (TORRES, 1994; SANTOS, G.; SANTOS, A., 2005). Ela representa apenas um segmento da indústria relativa aos peixes ornamentais que, segundo esclarece Prang (2004), representa a totalidade de produtores, agentes comerciais, cientistas, editores e entusiastas cujos interesses, se econômicos ou estéticos, dependem da manutenção de peixes vivos em cativeiro. Outra particularidade sobre a pesca ornamental é que as áreas de produção de peixes ornamentais e os aparelhos de pesca empregados são distintos daqueles utilizados pela pesca artesanal de consumo, não havendo por isso sobreposição dos esforços de pesca e nem das frotas (BARTHEM et al., 1995). Em geral, a pesca ornamental é praticada com o uso de canoas pequenas e puçás ou cacuris (SANTOS, G.; SANTOS, A., 2005). A indústria pet de organismos aquáticos ornamentais que inclui o comércio de peixes e outros vertebrados, invertebrados, algas e plantas, assim como a venda de equipamentos e acessórios para aquários evoluiu significativamente. Esta indústria como um todo movimentara US$ 4,0 bilhões em 1971, e depois alcançou US$ 7,2 bilhões em 1986 (ANDREWS, 1992). Entre 1985 a 1996 o crescimento ultrapassou 300% ao nível global, com pequena redução de 18% entre 1996 e 1999 (PRANG, 2004). Atualmente, de acordo com as estatísticas oficiais em todo o mundo o comércio de organismos aquáticos ornamentais incluindo, além de produtos especializados, gera receitas de até US$ 15 bilhões por ano (DAWES, 2001). O comércio de peixes ornamentais considerado isoladamente representa uma fração menor da indústria como um todo, estimada em menos de 1% do valor total de todas as transações com peixes no mundo. Ainda assim, o comércio de peixes para o mercado aquariofilista internacional movimenta uma indústria global de aproximadamente US$ 1,0 bilhão no atacado e US$3,0 bilhões com a venda no varejo (OLIVIER, 2001; FAO, 2005). Em termos globais, desde 1976 ao presente momento as exportações de peixes ornamentais demonstram um crescimento de 718,8%, com uma receita bruta de US$265 milhões em 2005 (Gráfico 1). De 1980 até meados da década de 2000 o incremento anual desta atividade foi de 14% (LIMA et al., 2000). Apesar disso, enquanto o valor médio das exportações de peixes ornamentais em nível mundial situou-se em US$197,4 milhões nos últimos dez anos, o Brasil contribuiu em média com irrisórios US$ 3,4 milhões ao ano (FAO, 2005). A maior parcela das receitas geradas nacionalmente é composta pela venda de peixes continentais (CHAO, 1992; CHAO; MARCON, 2000; ALBUQUERQUE- FILHO, 2003) embora as espécies marinhas também contribuam significativamente, considerando-se que o valor unitário dos espécimes comercializados é comparativamente maior ao das espécies dulcícolas (BARRETO, 2002). 0 1000 2000 3000 4000 5000 6000 7000 8000 9000 10000 19 76 19 78 19 80 19 82 19 84 19 86 19 88 19 90 19 92 19 94 19 96 19 98 20 00 20 02 20 04 U S $ 1. 00 0 Br as il 0 50,000 100,000 150,000 200,000 250,000 300,000 U S$ 1 00 0 TO TA L Brazil TOTAL Gráfico 1 - Evolução das exportações brasileiras em comparação ao comércio mundial de peixes para fins ornamentais. Fonte: FAO (2007). Quanto ao número de peixes comercializados globalmente, este é bastante impreciso, mas estimativas iniciais situavam-no entre 150 milhões a 350 milhões de peixes ornamentais (FITZGERALD, 1989; ANDREWS, 1990). No momento considera-se que este valor ultrapassa 1 bilhão de exemplares de aproximadamente 4.000 espécies de águas continentais e 1.500 marinhas provenientes de mais de 100 países (WOOD, 2001; WABNITZ et al., 2003; FAO, 2007). Deste montante 90% são oriundos de águas continentais e o restante é marinho (FAO, 2007). O mesmo se verifica em relação ao Brasil (NOTTINGHAM et al., 2005). Em termos mundiais a pesca ornamental no contexto das receitas geradas ao nível global é considerada de pouca importância. A maior parcela dos peixes comercializados é de espécies continentais oriundas de cultivos empresariais, alcançando em torno de 90% do total (WHITTINGTON et al., 2000; OFI, 2003). Estes organismos são reproduzidos em pisciculturas em Cingapura, Malásia, Japão, Israel, Tailândia, Hong Kong e Estados Unidos. Cingapura é o maior exportador de peixes ornamentais reproduzidos em cativeiro (FERNANDO; PHANG, 1994), com uma receita média de aproximadamente US$41,867 milhões no mesmo período, alcançando um considerável crescimento de US$ 54,162 milhões em 2005 (FAO, 2007). Também a República Tcheca destaca-se com uma receita média de US$12,635 milhões (8,23% do total global), seguida pelos Estados Unidos com US$ 11,485 milhões (7,48%), China (Hong Kong) com US$ 10,719 milhões (6,98%) e Filipinas com US$ 6,993 milhões (4,55%) (Gráfico 2). O Brasil ocupa a 18a colocação no ranking global, com uma participação pouco significante, com média de US$ 2,662 milhões no período de 1985–2005. Isto representa apenas 1,73% da média mundial. 0 10,000 20,000 30,000 40,000 50,000 60,000 70,000 19 76 19 78 19 80 19 82 19 84 19 86 19 88 19 90 19 92 19 94 19 96 19 98 20 00 20 02 20 04 U S$ 1 .0 00 Cingapura República Tcheca Estados Unidos China Filipinas Brasil Gráfico 2 – Demonstrativo das exportações brasileiras em relação aos cinco maiores produtores/exportadores mundiais de peixes para fins ornamentais Fonte: FAO (2007). Apesar da sua pouca importância no contexto global da indústria pet de organismos aquáticos, a pesca ornamental é muito significativa para a sobrevivência de milhares de pessoas ao redor do mundo, especialmente na América do Sul. Embora as receitas sejam inferiores às da Ásia, Europa e América do Norte (Tabela 1), ao contrário do que se observa nestas outras regiões, os peixes provenientes daquele continente são quase inteiramente originários do extrativismo. Trata-se de um mercado bastante diverso em número de espécies e, embora não existam dados precisos, centenas delas são exportadas anualmente de todas as grandes bacias, principalmente do Amazonas e do Orinoco. Tabela 1 - Valor médio das exportações de peixes ornamentais por continentes, no período de 1985 – 2005. Continentes Média Anual Total Mundial (US$ 1.000) % Ásia 96.746 63,0 Europa 30.480 19,9 América do Norte 12.637 8,2 América do Sul 8.743 5,7 África 2.827 1,8 Oceania 2.190 1,4 Média Mundial 153.517 100,0 Fonte: FAO (2007). Prang (2004) afirma que as principais fontes de peixes ornamentais capturados na natureza são: i) América do Sul, que tem a Colômbia como o maior fornecedor para o mercado global, seguido pelo Brasil e Peru; ii) África, representada pela Nigéria, Zaire e os Grandes Lagos Rift; iii) Ásia, cujos peixes selvagens provêm do Sri Lanka, Malásia, Indonésia e Filipinas; e iv) algumas dentre as ilhas do Caribe que também contribuem para este mercado.No Brasil a situação é que a pesca ornamental fornece a quase totalidade dos peixes vivos comercializados ao exterior, sendo que 99,67% das exportações provêm de peixes extraídos de águas interiores, principalmente da Amazônia brasileira. Segundo Barthem et al. (1995), na Pan-Amazônia a explotação de peixes ornamentais teve início por volta da década de 1950, na região de fronteiras entre Peru, Colômbia e Brasil. A atividade logo prosperou e a exportação de peixes ornamentais cresceu nas décadas seguintes, gerando receitas superiores a US$ 4 milhões ao ano e empregando mais de 20.000 pessoas. Somente estes países comercializam entre 3 e 16 milhões de peixes ornamentais. Os demais países amazônicos demonstram uma produção insignificante (Bolívia e Equador) ou não têm registros de dados estatísticos de desembarques (Venezuela). Segundo a FAO (2007) no contexto sul-americano a Colômbia representa 40,03% das exportações de peixes ornamentais, seguida pelo Brasil, com 28,89% das receitas, e Peru, com 26,75% (Tabela 2). Tabela 2 - Valor médio das exportações de peixes ornamentais pelos países sul-americanos, no período de 1985 – 2005. Países Média Anual Total Mundial América do Sul US$ 1.000 % % Colômbia 3.688 2,40 40,03 Brasil 2.662 1,73 28,89 Peru 2.465 1,61 26,75 Guiana 196 0,13 2,13 Venezuela 65 0,04 0,71 Bolívia 45 0,03 0,49 Equador 33 0,02 0,36 Paraguai 23 0,01 0,25 Argentina 18 0,01 0,20 Chile 7 0,00 0,08 Guiana Francesa 6 0,00 0,07 Uruguai 6 0,00 0,07 Média Anual Mundial 153.517 100,00 100,00 Fonte: FAO (2007). De acordo com relatório recente da Worldwide Fund for Nature (WWF, 2006) na Amazônia peruana 80% dentre as 776 espécies de peixes exportados provêm das bacias Ucaialy, Nanay e Tapiche e são coletados no verão. Existem 123 zonas de pesca em 13 rios, e as espécies mais capturadas em 2003 foram otocinclos - Otocinclus affinis (2,4 milhões de unidades com rendimentos de US$32.500), aruanã - Osteoglossum bicirrhosum (1,26 milhões de unidades e rendimentos de US$852.000) e corredora juli - Corydoras julii (649 mil unidades e US$20.900). Os principais mercados são a América do Norte (Miami e Los Angeles), Ásia (Tóquio e Hong Kong) e Europa (Frankfurt). Foram reportadas 35 empresas em Iquitos, as quais exportaram do país de 8 a 11 milhões de unidades entre 1999 e 2003. Quase toda a produção do país sai a partir de Iquitos. Hanek (1982) agrupou as espécies ornamentais capturadas na Amazônia peruana em quatro grupos: o primeiro é representado pelo neon tetra (Paracheirodon innesi), que no início da década de 1980 ocupava o primeiro lugar das exportações; o segundo, representado pelos bagres ou “catfishes”, com várias famílias como Callichthyidae, Loricariidae, Doradidae, Bunocephalidae e Pimelodidae; o terceiro, representado por várias espécies de peixes dotados de escamas e pertencentes às famílias Characidae, Anostomidae, Chilodontidae, Gasteropelecidae, Hemiodontidae e Cichlidae; e, finalmente, o grupo dos peixes de alta cotação, representado pelo acará disco (Symphysodon discus), acará bandeira (Pterophyllum scalare), pacus (Metynnis sp. e Myloplus sp.), aruanã e pirarara (Phractocephalus hemioliopterus), entre outras. Nesta região a pesca ornamental emprega direta ou indiretamente aproximadamente 3.000 pessoas (WWF, 2006). Na Colômbia, embora não existam dados detalhados sobre esta atividade comercial, estima-se que 30% das exportações de peixes ornamentais do país provenham da região amazônica. Em 1992 elas alcançaram 3 milhões de exemplares, com um valor próximo de 600 mil dólares. O comércio de peixes ornamentais na Colômbia é quase totalmente voltado à exportação, e das mais de cem espécies comercializadas as corredoras (Corydoras spp.), com pelo menos cinco espécies de grande valor, representavam no início da década de 1990 cerca de 33% do total, seguido pelo aruanã com 27% e pelo otocinclo (Otocinclus sp.) com 19% (BARTHEM et al., 1995). Os peixes também provêm em sua quase totalidade do meio natural, principalmente das bacias do Orinoco (88%) e Amazonas (10%), e as espécies mais exportadas são principalmente Siluriformes e ciclídeos (WWF, 2006). Segundo este relatório, atualmente os principais centros de armazenamento para os peixes ornamentais do Orinoco são Puerto Inirida e Villavicencio, enquanto para o Amazonas é a cidade de Letícia. As exportações em 2004 ultrapassaram 20 milhões de exemplares com um valor superior a 7 milhões de dólares, principalmente para a América do Norte (com 38%); Ásia (30%) – Japão; Europa (24%) – Alemanha e América Central (6%). São legalizadas cerca de 135 espécies para comercialização. Na Amazônia venezuelana os ciclídeos e peixes siluriformes são as espécies mais capturadas e exportadas, enquanto para o mercado interno são os caracídeos os mais demandados. Os Estados de Amazonas, Apure, Bolivar e Puerto Ayacucho são os principais centros de produção, especialmente no verão, enquanto Caracas, Carabobo, Miranda e Apure são os principais centros de desembarque e armazenamento. Os peixes são exportados para a Europa (60%) - Alemanha, Dinamarca, Bélgica, Inglaterra e Áustria; e América do Norte, mas o mercado não está regulamentado, operando o livre comércio pela lei de oferta e demanda. Existem 51 criadores de peixes ornamentais registrados que criam 75% das espécies, principalmente exóticas, provenientes dos Estados Unidos e Tailândia. Dentre os peixes importados cerca de 71% são marinhos, embora 90% de todas as exportações sejam representadas por espécies continentais (WWF, 2006). Na Amazônia brasileira o extrativismo de peixes ornamentais foi iniciado em Benjamin Constant em 1959, na fronteira com o Peru, estendendo-se posteriormente a todo o Estado do Amazonas (LEITE; ZUANON, 1991) e por último também no Pará. É realizado principalmente nas bacias dos rios Negro, Xingu, Araguaia, Tapajós, Tocantins, Guamá e região das ilhas, (CHAO, 1993; TORRES, 1994; 2006), mas também inclui a área estuarina (TORRES, 1994). De acordo com Barthem et al. (1995), as exportações em Manaus alcançaram um pico de 20 milhões de espécimes, em 1979. Após este período, o volume de peixes comercializados recrudesceu a menos de 13 milhões de exemplares, no biênio 1982-83 e, ao final da década de 1980, a exportação oscilava em torno de 17 milhões de peixes enquanto a receita gerada, que em 1982 foi de aproximadamente US$600.000 (SUDAM, 1985), alcançou ao redor de US$1,5 milhão em 1993 (CODEAMA, 1993). Atualmente, a pesca ornamental gera rendimentos em torno de 2 a 3 milhões de dólares ao ano para a economia do Estado do Amazonas e um excedente de 100 milhões de dólares no varejo mundial, através da exportação dos peixes selvagens capturados na natureza (CHAO et al., 2001). Dos 22.565.218 peixes de águas continentais comercializados em 2006 pelo Brasil, 82% eram provenientes do Amazonas e Pará, alcançando US$4,7 milhões. Os peixes marinhos, embora representem uma parcela menor do volume comercializado, atingem maiores valores unitários e são exclusivamente capturados na natureza (CHAO; MARCON, 2000; ALBUQUERQUE-FILHO, 2003), sendo os Estados do Ceará e Bahia os seus maiores exportadores (WWF, 2006; IBAMA, 2007). Os peixes que não são exportados ao estrangeiro são enviados ao mercado consumidor nacional, compreendendo o eixo Rio de Janeiro - São Paulo (FUJIYOSHI, 2002). Manaus é o principal centro de comercialização de peixes ornamentais de toda a Amazônia brasileira, de onde se exportam, anualmente, de 12 a 15 milhões de unidades, principalmente para a Alemanha, Japão e Estados Unidos (WWF, 2006), empregando cerca de 8.000 a 10.000 pessoas, conhecidos localmentecomo “piabeiros” (PRADA- PEDREROS, 1992; CHAO, 1993; CHAO; PRADA-PEDREROS, 1995). A região do rio Negro, onde a atividade se concentra é por isso chamada “o paraíso dos peixes ornamentais”, abrigando cerca de 450 espécies (MEIRELLES FILHO, 2004), das quais pelo menos 60 são, regularmente, comercializadas, tendo o cardinal tetra (Paracheirodon axelrodi) como item dominante (GEISLER; ANNIBAL, 1984; PRADA-PEDREROS, 1992). Tais números alimentam as demandas dos mercados internacionais impulsionando a descoberta de novas espécies, que despontam como as “novidades” do mercado e estimulam o aumento da pressão de pesca sobre os recursos ícticos literalmente em todos os pequenos e grandes cursos d’água das principais bacias hidrográficas da Amazônia. Isto é válido também para o Pará, que possui uma grande variedade de espécies dulcícolas, estuarinas e flúvio-estuarinas que desde a década de 1990 vêm sendo comercializadas ainda que ilegalmente (TORRES, 1994). Este é o segundo maior produtor de peixes ornamentais da região, sendo responsável por 10% das exportações totais (BARTHEM et al., 1995). Segundo Torres (1994), de Belém são comercializados regularmente entre 1,5 a 3 milhões de peixes de aproximadamente 150 espécies dulcícolas, estuarinas e flúvio-estuarinas, e a produção é oriunda de vários municípios, sendo a pesca realizada nas bacias de drenagem dos rios Amazonas, Tapajós, Xingu, Iriri, Tocantins, Araguaia e Guamá, além das áreas situadas na região do estuário, nos municípios do Nordeste paraense. Em território paraense a pesca ornamental pode ser verificada na Mesorregião das Ilhas, principalmente em Cachoeira do Arari, assim como Cametá, Belém, Santa Izabel do Pará, Castanhal, Inhangapi, Igarapé-Açu, São Caetano de Odivelas, Colares, Peixe-Boi, Bragança, Capanema, Primavera e adjacências. Outras importantes regiões produtoras incluem os municípios de Altamira, Itaituba, Santarém, Conceição do Araguaia, Marabá, Oeiras do Pará, Capitão Poço e Ourém. Embora não haja estatísticas oficiais, de acordo com a Associação de Criadores e Exportadores de Peixes Ornamentais do Estado do Pará – (ACEPOPA), esta atividade já empregou aproximadamente 1.000 pessoas com a captura dos peixes em todo o Estado, metade das quais somente na bacia do rio Xingu. Atualmente, há cerca de 40 a 60 trabalhadores formais e informais nas empresas sediadas nos centros urbanos e nas unidades de armazenamento situados nas áreas de produção, ocupando-se em atividades de manutenção, tratamento e vendas de peixes (informação verbal)1. Apesar do volume gerado pelas exportações de peixes ornamentais, a participação relativa do Brasil no cenário internacional demonstrou sinais de decréscimo a partir da década de 1980 em decorrência da competição com os países vizinhos, como o Peru, a Colômbia e a Venezuela (McGRATH, 1990). Mais provavelmente, entretanto, isto se deveu à concorrência com os países asiáticos, como o Japão, que desde 1977 passou a reproduzir e comercializar em larga escala algumas espécies amazônicas, como o neon tetra (Paracheirodon innesi), principalmente aos Estados Unidos, principal mercado consumidor dos peixes oriundos da Amazônia (ANDREWS, 1992). Andrews (1992) também ressalta outros fatores que também contribuem para a perda de competitividade das vendas de peixes ornamentais no Brasil, como a falta de uma infra-estrutura logística e de um manejo adequado dos peixes durante a armazenagem e o transporte. Além disso, a baixa qualidade dos serviços prestados por algumas empresas 1 Vítor Uliana. Palestra proferida na Secretaria de Estado de Pesca e Aqüicultura. Belém, abr. 2007. nacionais, como o não cumprimento de prazos acordados com os clientes e mesmo pela falta de qualidade em relação à boa saúde e condições físicas dos produtos comercializados representa importante obstáculo para muitas empresas de menor porte. Há que se considerar também questões mercadológicas que interferem na demanda, especialmente acerca da cotação das moedas estrangeiras. Os peixes selvagens são commodities vendidas nos mercados internacionais, e estão sujeitos às flutuações cambiais. Quando, por exemplo, há valorização do real sobre o dólar, há uma desaceleração na atividade pesqueira ornamental devido à perda de rentabilidade do comércio, levando a mesma a uma situação de crise. Neste caso, os empresários que exportam ao estrangeiro priorizam espécies de alto valor. As altas taxas de mortalidade nas fases intermediárias do processo concorrem para a ineficiência do empreendimento, resultando em danos ecológicos e perdas econômicas ao país. As estimativas sobre a mortalidade de peixes ornamentais são imprecisas, mas as informações disponíveis na literatura apresentam valores elevados para algumas espécies (LEITE; ZUANON, 1991). O desconhecimento acerca das espécies comercializadas também é outro óbice ao desenvolvimento do setor, com reflexos diretos sobre a atual legislação, principalmente no que concerne à listagem de peixes oficialmente liberados para comercialização. Pelas normas em vigor, permite-se a venda de 180 espécies de peixes, mas esta legislação não apresenta justificativa com base científica quanto às espécies que participam da lista oficial, existindo problemas que vão desde a incorreta identificação taxonômica de muitas destas espécies, até situações em que algumas espécies listadas sequer participam do estoque nativo da bacia amazônica. Acerca desta listagem, Torres (1994) verificou que, apesar de que se utiliza o nome científico para receber a licença de exportação, o nome comercial e/ou vernacular é usado com freqüência para identificar o produto. Assim, dentre os 252 nomes observados nas licenças de exportação emitidas pela Superintendência do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) em Belém, entre os anos de 1986 e 1987, havia 164 nomes vulgares que se referiam a uma única espécie, enquanto, por outro lado, um único nome comercial correspondia a 16 categorias taxonômicas distintas. Tal desconhecimento acerca da taxonomia dos peixes contribui para dificultar o trabalho realizado pelos técnicos das agências governamentais de fiscalização e controle como o IBAMA e o Ministério da Agricultura, o que favorece o contrabando de espécies. Como conseqüência, o patrimônio científico e cultural do país é lesado pela saída de espécimes raros, os quais são cientificamente descritos no exterior e cujos exemplares-tipo são apropriados pelos museus de pesquisa estrangeiros. Isto também representa perdas econômicas ao país, visto que estes peixes, antes mesmo de serem descritos cientificamente, são anunciados com exclusividade no mercado internacional e têm seus preços aviltados, porém sem favorecer as empresas nacionais, restando-lhes a menor parcela dos lucros. O contrabando tende a continuar, à medida que o comércio internacional de peixes ornamentais está em crescimento no mundo inteiro. Dentre as aproximadamente 350 espécies já exportadas pelas empresas paraenses, mais de 48,5% eram comercializadas ilegalmente, sendo contrabandeadas principalmente para países como o Japão e Alemanha (TORRES, 1994). Na atualidade, com as novas medidas adotadas pelos órgãos fiscalizadores, o contrabando de espécies sofreu forte redução, sendo esporádicas as ocorrências de apreensão noticiadas pelos meios de comunicação, as quais ocorrem geralmente nos portos ou aeroportos da capital, ou nas estradas que levam ao interior do Estado. Vale ressaltar ainda que, embora as informações acerca da biodiversidade íctica na região Neotropical sejam imprecisas, as águas amazônicas possuem a maior riqueza de espécies
Compartilhar