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Intervenções em Crises

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1 
 
INTERVENÇÕES EM CRISES 
 
INTRODUÇÃO 
 
Nas décadas de 1970 e 1980, as intervenções psicoterápicas em crise e as psicoterapias breves 
se disseminaram por várias partes do mundo. Hoje em dia dispomos de farta literatura especializada 
sobre este tema. Freqüentemente encontramos a citação do trabalho de Lindemann (1944) com os 
familiares que perderam parentes e sobreviventes do incêndio da Coconut Grove, como um marco 
referencial inicial para o estudo e o desenvolvimento sistemático de intervenções psicoterápicas rápidas, 
de curta duração e com o objetivo específico de ajudar pessoas num estado de crise emocional aguda. 
Para, continuarmos a desenvolver este tema, citaremos a seguir, resumidamente, alguns conceitos 
referentes às crises, seus predisponentes, seus desencadeantes, suas fases; seus desfechos e a 
importância do seu manejo adequado. 
 
CRISES 
 
Caplan (1964) definiu crise como um estado de perturbação, usualmente associado a sentimentos 
de desconforto, tais como angústia, medo, culpa ou vergonha, que ocorre quando o indivíduo é exposto a 
um problema insuperável pelos seus meios habituais de solução de problemas, durante um certo tempo, e 
outros métodos não lhe parecem disponíveis. Há uma sensação de ineficácia e impotência, que se 
associa a uma certa desorganização do funcionamento, que faz a pessoa aparentar ser menos eficiente 
do que usualmente o é. A pessoa pode praticar atividades relacionadas com o alívio da tensão interna 
e/ou com sucessivas tentativas de ensaio e erro para resolver o problema. 
 
Ainda, do mesmo autor, é a clássica divisão do processo de crise em quatro fases: 
 
1ª fase: elevação de tensão, pelo impacto do estímulo, o que aciona as respostas habituais na solução de 
problemas; 
 
2ª fase: a falta de êxito e a continuação do estímulo estão associadas à sensação de impotência e 
ineficácia já citadas; 
 
3ª fase: nova elevação de tensão e a continuidade de estímulo funcionam como maior motivação para 
resolver o problema: o individuo utiliza novos métodos e procura novas maneiras de definir o problema, 
para que este fique no âmbito de suas experiências anteriores. É possível que se resigne e renuncie às 
metas anteriores, permanecendo num nível mais regressivo de funcionamento. Também é possível que o 
estímulo perturbador diminua ou desapareça, aliviando a elevação de tensão. Ele poderá tentar por 
ensaio-e-erro resolver o problema. Estes esforços concentrados poderão resolver o problema ou diminuir 
a tensão. Caplan valoriza a interação do indivíduo com o grupo e considera que, qualquer que seja a 
solução, ela altera os papéis do indivíduo no seu grupo e vice-versa; 
 
4ª fase: continuado o estímulo e a falta de solução, seja pela satisfação da necessidade ou pela sua 
evitação pela renúncia ou distorção perceptual, a tensão continua se elevando e, dentro de certo tempo, 
conduz o indivíduo a ruptura, com desorganização grave e resultados drásticos. 
 
O desfecho de uma crise será determinado por opções ativas ou por outros aspectos da situação, 
até fortuitos. Desempenham algum papel relevante nesta resolução aspectos da personalidade do 
indivíduo (que representa a cristalização de experiências passadas), aspectos do estado físico neste 
momento, a disponibilidade de recursos externos e mesmo a facilidade de comunicação do meio. A 
família e membros-chave da comunidade encontram-se entre os fatores influentes no tipo de desfecho de 
uma crise também. 
 
Uma crise é um momento psicologicamente instável e tanto pode ser uma oportunidade de 
amadurecimento, com o indivíduo saindo mais fortalecido pela descoberta de novas maneiras de resolver 
um problema, como também pode ser um momento gerador de soluções mal-adaptativas e que o 
colocam num nível inferior de funcionamento, inclusive com o aparecimento de sintomas. 
 
Lemgruber (1990) considera que as três primeiras fases descritas por Caplan poderiam ser 
consideradas como um estágio “potencialmente crítico” e a última fase, sim, seria o estágio de ruptura ou 
de crise propriamente dita, que englobaria também a insatisfação e/ou a distorção-perceptiva. Esta autora 
propõe que este enfoque corrige melhor a impressão que o concerto de Caplan deixa, de que as fases do 
 
2 
 
desenvolvimento, tais como a adolescência, o nascimento de um filho, etc., sejam sinônimos de crise. 
Repetindo, sua proposta é a de que o termo crise seja aplicado somente numa situação de ruptura. 
 
Mesmo considerando interessante a proposta da autora, continuaremos a usar neste contexto o 
termo crise conforme definido por Erikson, Caplan e outros, porque já está tão consagrado que é uma 
linguagem praticamente universal e também porque pensamos que esta definição abrange todas aquelas 
possibilidades. 
 
Durante uma crise o indivíduo é mais suscetível de ser influenciado por outras pessoas ou 
circunstâncias, sendo um momento propício para intervenções saudáveis dos agentes de saúde, bem 
como para intervenções prejudiciais. 
 
Erikson (1959) chamou de crises do desenvolvimento as que ocorrem comumente entre as 
sucessivas etapas do desenvolvimento da personalidade, cada uma delas qualitativamente diferente da 
anterior, com novas exigências e obstáculos: são as crises vitais. Este conceito é muito importante em 
prevenção primária, pois são momentos de perturbação mais prováveis para um grande número de 
pessoas. O mesmo autor chamou de crises acidentais as perturbações que se seguem a fatores 
ocasionais. Também têm importância, pois podem ser previsíveis estatisticamente. 
 
Outros trabalhos de autores conhecidos podem ser lembrados, tais como Rapoport (1965), que se 
detivera, a estabelecer associações entre as crises e as situações de vida e as suas conseqüências na 
saúde e na doença. 
 
Nota-se que há uma concentração de pesquisas e publicações sobre crises e sua relação com 
etapas da vida e com eventos acidentais em torno de 1960, durante a década de 1950 e os primeiros 
anos da década de 1960. 
 
A partir desta época, houve grande impulso no desenvolvimento de técnicas que permitissem uma 
rápida abordagem das crises, e se multiplicaram as publicações que trouxeram à tona as intervenções em 
crise, as psicoterapias breves e as técnicas focais. 
 
Este movimento não demorou para chegar ao Brasil e em particular ao Rio Grande do Sul e Porto 
Alegre. A partir de 1971, o ensino de técnicas breves de psicoterapias passaram a fazer parte dos 
programas de graduação do Departamento de Psiquiatria e Medicina Legal, visando possibilitar ao futuro 
médico uma experiência psicoterápica que o habilitasse a trabalhar melhor os aspectos emocionais dos 
seus pacientes e mesmo se animasse a fazer breves intervenções psicoterápicas. Também passou a 
fazer parte do treinamento sistemático dos futuros psiquiatras, nos cursos de especialização do 
Departamento. Em Pelotas, em 1972, e em Gramado, em 1974, na VI e na VII Jornada Sul-Rio-
Grandense de Psiquiatria Dinâmica, respectivamente, os temas oficiais foram crises e psicoterapia breve 
(Zimmermann, 1972; Abreu, 1972; Busnello, 1974). Vários relatórios, trabalhos e temas-livres foram 
apresentados e houve muito estímulo para que estas técnicas se difundissem pelos nossos serviços. Até 
o presente momento, os programas do Departamento de Psiquiatria da UFRGS e da Residência em 
Psiquiatria do Hospital de Clinicas de Porto Alegre incluem o ensino de técnicas breves de psicoterapia, 
latu senso (abrangendo aqui as intervenções em crise). 
 
CONCEITO E CLASSIFICAÇÃO 
 
Bellak e Small (1980), em publicação originalmente de 1978 (Emergency psychotherapy and brief 
psychotherapy), defendem a tese de que não há diferenças significativas entre o que se chama de 
psicoterapia breve, de emergência ou de crises. Afirmam que todas são técnicas breves, oriundas 
teoricamente da psicanálise, com adaptações estratégicas parasituações de emergência ou de crises, e 
aceitando também a utilização de outras fontes de conhecimento, tais como comportamentais, a utilização 
de medicamentos e assim por diante. 
 
Sifneos (1967, 1972) propôs uma classificação, basicamente de utilidade clínica, que exporemos a 
seguir, pois teve grande aceitação e se mostrou útil. Para este autor, devemos distinguir dois tipos de 
intervenção em crise: 
 
a) intervenção em crise: o terapeuta examina com um paciente relativamente bem adaptado 
anteriormente, mas que entrou em crise, os passos que o conduziram até uma crise, examina as 
 
3 
 
possibilidades de superá-la e o confronta com a realidade de suas tentativas, usando técnicas 
mobilizadoras de ansiedade; termina este tipo de intervenção num prazo não superior a dois meses, 
tendo sempre como foco a superação da crise; 
 
b) apoio na crise: o terapeuta procura num prazo de até dois meses ajudar o paciente a superar o 
problema que o conduziu à crise com técnicas de apoio, tais como reasseguramento, sugestão, etc. 
 
Mais adiante voltaremos a esta proposta com mais detalhes, quando abordamos a técnica do 
tratamento. 
 
INDICAÇÕES 
 
É necessário identificar uma história de crise, com um fator desencadeante claro, possibilitando 
estabelecer um foco de tratamento. Caso isto ocorra num paciente com uma longa história de relações 
interpessoais confusas, de fragilidade psicológica, de poucos recursos para lidar com as vicissitudes do 
cotidiano, ou seja, que nunca atingiu um nível razoável de maturidade emocional para a faixa etária, o 
indicado será uma psicoterapia de apoio em crise. Esta técnica será provavelmente mais acessível para 
tal pessoa. 
 
Numa segunda possibilidade encontraremos um paciente que atingiu um razoável grau de 
adaptação emocional, que possui recursos psicológicos para enfrentar uma gama de situações, mas que, 
apesar disto, entrou em crise. Além disto, este paciente apresenta motivação para enfrentar e entender 
seus problemas psicologicamente. Neste caso poderemos indicar a intervenção em crise. 
 
TÉCNICA 
 
Em ambos os tipos de indicação, o foco será a superação da crise. 
 
Nas intervenções em crise, assim chamada por Sifneos, as técnicas utilizadas são as 
mobilizadoras de ansiedade. O terapeuta procura estabelecer uma rápida aliança terapêutica, utiliza a 
transferência positiva, mas de maneira menos explícita do que numa técnica mais longa, procura rever 
com o paciente os passos que o conduziram à crise, mantém o enquadramento terapêutico tentando 
evitar as atuações antiterapêuticas por parte do paciente e também estimula a que ele reconheça as 
situações nas quais o desencadeamento de crises é mais provável para ele. Isto é feito em uma ou duas 
sessões semanais de 45 ou 50 minutos num período de tempo de até dois meses. 
 
Numa intervenção do tipo de apoio em crise, também num tempo total que vai até dois meses, o 
terapeuta utiliza basicamente as técnicas que são supressivas de ansiedade, ou seja, reasseguramento, 
sugestão, manipulação do ambiente, psicotrópicos. A freqüência das sessões e mesmo a sua duração 
devem ser mais flexíveis, de acordo com a resposta do paciente. Por exemplo, podem haver sessões de 
quinze minutos ou meia hora, diariamente, ou até mais vezes por dia, e eventualmente se o paciente 
necessitar de uma internação breve. 
 
MacKenzie (1988) enfatiza que o terapeuta deve decidir inicialmente se ele vai assumir 
temporariamente o controle da situação pelo paciente (apoio), ou se ele vai trabalhar ativamente com o 
paciente na ldentificação e esclarecimento dos problemas (intervenção em crise). A intervenção em crise 
evolui para uma psicoterapia breve dinâmica (de duração mais prolongada – de dois a doze meses), ao 
redor da sexta sessão. Neste momento, o terapeuta deve decidir se o tratamento continua, junto com o 
paciente. Se continuar, é o momento de decidir se a técnica será de apoio ou mobilizadora de ansiedade, 
mais intrusiva. Este autor chama a atenção para o fato de que estas decisões são sucessivas. 
 
A variável tempo aqui é utilizada como um marco referencia apenas. A qualidade da abordagem 
psicodinâmica, o nível de profundidade dos conflitos intrapsíquicos e as mudanças psicológicas não são 
apenas produto do tempo de duração de um tratamento, mas se enfatiza a rapidez e a brevidade com que 
estes fenômenos ocorrem. Estas intervenções psicoterápicas, em tão curto espaço de tempo, não 
permitem o estabelecimento de uma relação transferencial catalisadora de modificações profundas da 
personalidade, e nem são o seu objetivo. Dirigem-se, isto sim, para certas situações em determinadas 
pessoas e naquele momento em que, uma intervenção psicoterápica tem de ser ágil, muitas vezes 
preventiva em primeiro lugar, num espaço de tempo relativamente curto. 
 
 
4 
 
EXEMPLOS CLÍNICOS 
 
Caso 1 
 
A., 22 anos, branco, solteiro, estudante, em tratamento há seis meses com um diagnóstico clínico de 
síndrome esquizofreniforme. O paciente tomava haloperidol, 2,5mg/dia, em associação com um 
acompanhamento psicoterápico de apoio de duração indeterminada. Neste momento, o terapeuta lhe 
comunicou que se mudaria para outro ambulatório. Embora pudesse continuar o tratamento com o 
mesmo terapeuta, sem mudanças no contrato, o paciente iniciou em seguida com um quadro de aumento 
de ansiedade, insônia, ideação paranóide e suicida, agressividade, despersonalização e desrealização. 
Referia um intenso medo de ser abandonado. Repetia antigos medos de abandono em relação a seus 
pais (mãe esquizofrênica e pai alcoolista), além de ser um paciente com provável vulnerabilidade 
constitucional, genética. A intervenção realizada então consistiu em: 
 
a) aumentar a medicação antipsicótico para haloperidol, 10mg/dia; 
 
b) aumentou a vigilância, pelo risco de suicídio, com o auxilio da família, que foi advertida, através das 
irmãs do paciente, estas sem patologia psiquiátrica grave; 
 
c) entrevistas diárias de curta duração (20 min), nas quais foram abordadas as fantasias de abandono em 
relação ao terapeuta, assim como também se sentia abandonado pelos pais. As intervenções foram feitas 
no sentido de reassegurar o paciente a respeito do tratamento, tentando diminuir a ansiedade paranóide 
que concorria para aumentar seu sentimento de solidão. Ao cabo de dez dias, melhorou a sintomatologia 
psicótica mais aguda, esbateu-se o risco maior de suicídio e o paciente pôde seguir seu tratamento 
ambulatorial, sem que tivesse ocorrido dano maior. 
 
Desde logo, observamos que este paciente se enquadra entre os grave e longamente 
comprometidos. Caracteriza-se a seguir uma crise, com elevação rápida da tensão e sinais da 
desorganização da estrutura mental do paciente, que no caso dele evolui para um quadro paranóide, e a 
presença clara de um fator desencadeante imediatamente anterior. O terapeuta utilizou uma técnica de 
reasseguramento mais ágil, com o auxilio da família e um reforço da vigilância; aumentou a medicação 
antipsicótica e abordou as fantasias de abandono por parte do paciente. Com o esbatimento dos sintomas 
mais agudos e perigosos, o tratamento tomou sua feição anterior, ou seja, de uma psicoterapia aliviadora 
de ansiedade, suportiva, de longa duração. 
 
Caso 2 
 
G., 24 anos, solteira, administradora de empresa, após não ser selecionada pela segunda vez 
consecutiva para um curso de pós-graduação, desenvolveu um quadro no qual se sentia muito infeliz, 
com opressão no peito, chorando freqüentemente e com o pensamento voltado imperiosamente para o 
mesmo fato: não conseguia pensar noutra coisa a não ser no seu fracasso e como isto poderia ter 
acontecido com ela. Deixou de comparecer ao trabalho, dizendo ser impossível para ela voltar lá. Sentia-
se envergonhada diante de todos. Tentava voltar ao trabalho, mas desistia. Pensava no que fazer, mas 
não achavasolução. Aconselhada pelo namorado, com quem se relacionava bem, resolveu procurar 
ajuda. Sua família era estruturada aparentemente, de maneira razoável. Sendo a mãe um pouco 
“nervosa” e o pai “um pouco deprimido”. Ambos trabalhavam normalmente. Considerava-se talvez um 
pouco “mimada”, tendo se acostumado a ter o que queria em casa. Valorizava enormemente o curso que 
pretendia fazer e não podia se conformar com a sua não-classificação. 
 
Foi proposta à paciente uma seqüência de entrevistas de 50 minutos de duração, nas primeiras 
duas semanas foram realizadas quatro entrevistas: depois passaram a uma por semana, na medida em 
que seus sintomas se esbateram. O foco estabelecido junto com a paciente foi a superação da crise. 
Foram examinados repetidamente os fatos e seus significados mais importantes. Sua reação foi 
relacionada com uma perda aguda da auto-estima, mas principalmente com uma reação raivosa frente a 
uma frustração, situação à qual não fora acostumada, sempre superprotegida. Surgiram vários momentos 
em sua vida, em suas recordações, em que reagiu raivosamente frente a contrariedades, embora não de 
maneira tão intensa. Foi-lhe dito que seria saudável se ela pudesse se submeter a um tratamento 
psicoterápico mais longo. A paciente se acalmou progressivamente e resolveu ingressar em outro curso, 
também bastante valorizado, o que conseguiu após breve seleção. Decidiu não continuar o tratamento 
naquele momento, pensando que talvez no futuro sim. Terminou o tratamento apos sete sessões, 
 
5 
 
voltando às atividades, sem os sintomas iniciais e considerando que havia conhecido um pouco mais de si 
mesma. 
 
Observamos neste segundo caso que a paciente é relativamente bem adaptada: terminou um 
curso superior, tem vários amigos, tem um namorado valorizado em seu meio social e cultural, é capaz de 
estudar e se divertir bem. Entretanto, tem seus pontos vulneráveis. E um deles foi ativado frente a sua 
desclassificação no concurso, e se instalou urna verdadeira crise: tem um fator desencadeante recente, 
aumento de ansiedade e outros sintomas, tentativas de solucionar infrutiferamente, sensação de 
impotência e diminuição de sua capacidade habitual de funcionar. A intervenção realizada foi do tipo 
intervenção em crise, mobilizadora de ansiedade, pois houve uma participação mais ativa por parte da 
própria paciente. Foram examinados os passos dados até se instalar a crise, ela saiu com melhor 
conhecimento intelectual de si própria e com uma experiência de tratamento em que foi dito e mostrado 
por que se beneficiaria de uma psicoterapia mais longa. A relação transferencial funcionou principalmente 
como continente das angústias da paciente, que resolveu seu caso reenquadrando seu enfoque inicial 
com novos valores. O tratamento não seguiu adiante e se encerrou como uma intervenção em crise. Caso 
esta paciente tivesse continuado o tratamento neste momento, ele poderia evoluir para uma psicoterapia 
de longa duração, de orientação psicanalítica, ou uma psicoterapia breve, ainda com objetivos mais 
focalizados, ou mesmo uma psicanálise. Teríamos assim a passagem de uma intervenção em crise para 
outro tipo de psicoterapia de maneira progressiva, no decorrer do mesmo tratamento. É necessário que o 
terapeuta avalie o setting que transcorreu durante a intervenção em crise que ele próprio continue o 
tratamento ou se está indicado que encaminhe o paciente para outro, isto ocorreria, por exemplo, se 
tivesse sido necessária muita manipulação do ambiente, contatos familiares, etc., que tornassem mais 
difícil ou muito improvável o estabelecimento da neutralidade necessária para um novo tipo de contrato 
terapêutico. 
 
COMENTARIOS FINAIS 
 
A utilização da teoria das crises, o estabelecimento de critérios mais práticos e clínicos para a 
seleção de pacientes e a definição clara de técnicas ou estratégias voltadas para a superação de crises 
se mostra de uma utilidade enorme, se considerarmos que viabiliza uma intervenção e um suporte num 
momento vulnerável e potencialmente perigoso ou saudável para as pessoas. Evidentemente estes 
esquemas propostos são marcos referenciais que se baseiam no que predomina em um determinado 
paciente. As técnicas se misturam e, dependendo da evolução, do caso, usaremos mais apoio ou 
confrontações em momentos diferentes. E necessário ser flexível para adaptarmos as técnicas ao 
paciente e não ao contrario. Entretanto, a flexibilização é mais efetiva quando dispomos do conhecimento 
dos parâmetros pelos quais nos guiamos. O conhecimento dos modelos nos ajuda a reconhecer a 
situação que predomina naquele paciente e naquele momento e automaticamente teremos em mente o 
que é mais urgente fazer ou não fazer. Estas técnicas têm muito em comum, às vezes com pequenas 
diferenças uma das outras e seus resultados têm sido animadores. 
 
O reconhecimento claro da existência de tais pacientes em situação de crise nos conduz a 
conseqüências automáticas, quais sejam: a de dispormos na comunidade de serviços que sejam de 
acesso rápido e fácil ao ingresso do paciente novo ou ao atendimento do paciente já em tratamento, mas 
que tem uma agudização de seus sintomas. Isto é de grande importância, pois ao intervirmos de maneira 
especializada neste momento, estaremos fazendo algo de notáveis conseqüências preventivas, 
impedindo a cristalização de sintomas mais graves ou mesmo atos hetero ou autodestrutivos mais 
danosos. É interessante relatarmos aqui a experiência vivenciada por Sifneos e por ele publicada 
(Sifneos. 1989) originalmente em 1987. Inicialmente, usava critérios estreitos para selecionar pacientes 
para suas psicoterapias de curta duração, mobilizadoras de ansiedade breve, ou seja, os pacientes 
tinham de estar numa situação de crise. Ao longo de quatro anos só selecionou cinqüenta pacientes. 
Atribui isto ao fato de que os pacientes em crise aguda procuram as salas de emergência e é mais difícil o 
psiquiatra estar lá no momento necessário. Abandonou estes critérios, tornando-os mais elásticos, 
partindo para definir aqueles critérios iniciais apenas para intervenções em crise e considerando que 
neste estado o urgente e a superação da crise. A flexibilização dos critérios aumenta o número de 
pacientes selecionados para as psicoterapias breves dinâmicas, que ele separa das intervenções em 
crise.

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