Buscar

Antropologia Jurídica

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 3, do total de 7 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 6, do total de 7 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Prévia do material em texto

Antropologia Jurídica
Etnocentrismo
	A antropologia do século XIX foi caracterizada pelo etnocentrismo e sofreu comprometimento da sua pretensa cientificidade. O etnocentrismo lida mal com as diferenças, projetando valores sobre as sociedades e, portanto, recaindo no subjetivismo e valorização – o que comprometeu a cientificidade.
	Por que, então, era tão recorrente? Por que não se percebeu o problema antropológico? A consciência do etnocentrismo foi se desenvolvendo ao longo do tempo, sendo criticado somente depois. Ou seja, os fundadores não eram conscientes. O problema decorreu de método.
	Pierre Clastres chama o etnocentrismo de “obstáculo epistemológico”. Étienne Le Roy reforça a mesma ideia. Maurice Godelier fala sobre “amarra ideológica”. O problema de método era o denominado “armchair antropology” (antropologia de gabinete). A antropologia era caracterizada pela observância de cidades não ocidentais feitas por outros que não fossem os antropólogos. A abordagem empírica (observação) não seria possível, portanto. Os dados utilizados eram provenientes de relatos de missionários, viajantes, militares e administradores coloniais. Logo, carregados de preconceito. Embora eles imaginassem que esses relatos fossem isentos de carga valorativa, ocorria o oposto. Assim, os antropólogos ficavam condicionados à essa visão. Caracterizou-se, então, uma falha de método.
	Toda história é uma análise do passado e todo documento é uma interpretação. “Cabe ao historiador descrever o passado tal como ele aconteceu”, assim, baseados em documentos oficiais. Mas esses documentos representam o pensamento de um grupo. Dessa forma, há uma visão hegemônica.
	O antropólogo do século XIX acreditava que o documento oficial (feito por missionários etc.) dava acesso à sociedade que ele não via/conhecia. Isso gerava, portanto, um problema, já que a suposta objetividade não existia. Principalmente porque o preconceito não era filtrado. Assim, o subjetivismo invadia a antropologia. Logo, a antropologia desse século foi altamente etnocêntrica. Deu-se a crise relativa ao estatuto da cientificidade pretendido pela antropologia.
	A partir do século XX, não se aceitou mais a antropologia de gabinete. Aceitar-se-á a observação de campo.
***A antropologia do século XIX foi etnocêntrica porque foi uma derivação da influência positivista, logo acreditava-se na neutralidade dos documentos oficiais, tendo um problema de método. Porém, isso era a regra (em autores como James Frazer). 
Saber vocacionado à gestão de populações
Saber = cognição
Gestão de populações = dominação
	Esse saber perverteu o saber antropológico, porque teve viés político, não científico – o que foi criticado pelos antropólogos da época. Esse saber com fim político gera a crise de delimitação entre os campos da ciência e da política (campo do saber e do poder).
Weber = sociedade tradicional, caracterizada pela "cosmovisão" de base metafísica/religiosa; nessas sociedades as esferas do agir e do saber (Direito, Política, Economia, Ciência, Arte e Amor e Erotismo) estão enquadradas pela cosmovisão de base metafísica/religiosa, o que limita a expansão da lógica antropológica.
Segundo Lucien Febvre, o homem comum não tinha aparelho mental para pensar em termos que não fossem de base religioso. 
Segundo Weber, o que conduz à sociedade moderna é o chamado processo de racionalização social, o qual gera a dessacralização do mundo (transformando em uma sociedade profana), com o pluralismo de visões de mundo. Para ele, a racionalidade dissolve a cosmovisão, ocasionando na separação das esferas culturais de valor. Ou seja, ao ocorrer a passagem pra modernidade, perde-se o substrato religioso. Cada esfera é conduzida por sua própria lógica, sem a limitação religiosa.
A antropologia se corrompe pois pertence ao campo da ciência, mas com finalidade política, havendo mercantilização do campo científico e do saber.
Progressivamente essas características se tornaram insustentáveis. O objeto "povo primitivo", ao entrar em crise, causa um problema de delimitação entre antropologia e sociologia. 
O etnocentrismo compromete o ideal de cientificidade que a antropologia pretendia. Além disso, o saber vocacionado à gestão de populações gerava um problema sério a antropologia porque se tratava de um saber com fim externo político.
O século XIX fornece as condições epistemológicas de constituição das ciências humanas, dentre elas a antropologia. Nesse século, há condições de florescimento de novos conhecimentos. Não é uma mera causalidade a antropologia ter se formado nesse século, anteriormente ela não era possível, não havia condições teóricas. A antropologia é tributária de uma condição epistemológica que somente se coloca no século XIX no ocidente.
Norbert Rouland - Anthropologie Juridique 
François Laplantine - Clefs pour l'Antropologie
Os dois autores analisam essa questão. Norbert Rouland lança o problema, mas não o resolve. Ele diz que no final do século XVIII, a antropologia enquanto saber se torna epistemologicamente viável. Mas apesar disso, apenas na segunda metade do século XIX, começam a surgir as primeiras obras. Por quê? 
François Laplantine procura explicar o porquê disso. O saber não quer mais especular acerca do homem, como fazia a filosofia, mas sim captar a essência do homem, e pensa nele como uma entidade concreta que habita o mundo. O homem deixa de ser pensado como abstrato, e sim como concreto e formado socialmente. Diz ainda que apenas a partir do século XVIII, entra-se na modernidade e se pode aprender as condições históricas, culturais e epistemológicas que possibilitarão a antropologia. A observação abstrata passa a ser concreta. As ciências humanas consideram o homem como uma entidade condicionada pelo mundo. Esses autores especulam (abstratamente) sobre a natureza humana, para a partir dessa, deduzirem as condições concretas existentes. Indutivamente, passa-se a focar nas condições reais de existência e chegar a conclusões gerais. Ele justifica a demora: trata-se de um processo de grande envergadura no quadro de pensamento ocidental, demandando grande processo de maturação. 
A antropologia efetivar-se-á no século XIX. O conhecimento é plurissecular, por isso a transição é demorada.
Os autores divergem em relação ao processo de condução/formação das ciências humanas e do relacionamento entre as ciências.
Desenvolvimento ou continuidade: Dan Sperber (Le Savoir des Anthropologues)
Ruptura ou descontinuidade: Michel Foucault (Les mots et les choses)
Anteriormente ao século XIX, o conhecimento acerca do homem, que poderia ser chamado de Antropologia filosófica, para enfatizar a dimensão especulativa desse saber. É o conhecimento reflexivo acerca do homem de caráter especulativo. Nascem, então, dois saberes: antropologia e psicologia. Ambas com pretensões empíricas. Essa antropologia que surge, surge ramificada em dois grandes ramos: Física e Cultural (ou Social). A física declina em face de ideias eugenistas/raciais. A Cultural cresce e constitui a Antropologia. Há um processo de desbiologização da antropologia. 
O conceito de episteme (épistémè) é a configuração discursa de uma certa época histórica e como a trama do pensamento é discursiva, a episteme condiciona o que é pensável em uma época histórica. Ele diz que não pensamos livremente, mas sim conforme a época. Já o condicionamento da episteme, logo não se pensa livremente. Entre um episteme e outra, não há uma relação de continuidade. O conhecimento não se desenvolve através da continuidade, mas sim com uma reconfiguração, partindo de uma ruptura.
Etnografia Jurídica: descritiva 
Etnologia Jurídica: interpretativa
Antropologia Jurídica: generalizadora 
Claude Lévi-Strauss defende que não são disciplinas distintas, mas etapas de uma única. Isso expressa a superação da antropologia de gabinete, nasce então o trabalho de campo (fieldwork).
Por Norbert Rouland: 
"A Etnografia Jurídica consiste na coleta e na descrição de dados qualificados como jurídicos nos níveisdos discursos, das práticas e das representações, no seio de uma determinada sociedade.”
“A Etnologia Jurídica procura interpretar as relações entre discursos, práticas e representações, no seio de uma determinada sociedade.”
"A Antropologia Jurídica procura realizar um ordenamento da cultura humana em sua generalidade, no que se refere ao domínio do Direito, mediante a comparação do Direito de todas as sociedades que se possa observar."
Características antropológicas
A primeira marca característica da Antropologia é que se trata de generalização. O que não quer dizer que ela menospreza a descrição e a interpretação. Apesar de vocacionar a generalização, se constrói também com descrição e interpretação, porém com caráter secundário.
Outra característica importante é dada ao considerar o que diz Théodor Viehweg, responsável pela demarcação da dogmática e da zetética. 
Dogmática: enfoque na decidibilidade dos conflitos, o jurista mobiliza o direito com determinado repertório normativo para chegar a uma decisão. O direito não será problematizado. Princípio da inegabilidade dos pontos de partida.
Zetética: fundamentalmente crítica, problematiza o direito, não importa a questão da decidibilidade dos conflitos. Eficácia, validade, critérios sociais etc. A Antropologia compõe o campo zetético (empírico), permitindo uma crítica ao fenômeno jurídico. 
A segunda característica então é a crítica. Niklas Luhmann mostra que o Direito possui dois enfoques diferentes:
Auto-descrição (selbstbeschreibung): perspectiva interna, feita pelo jurista
Hétero-descrição ou descrição externa (fremobeschreibung): perspectiva externa, feita pelo cientista social
Daí, extrai-se uma nova característica: a Antropologia tem um ponto de vista externo, proveniente das ciências sociais. 
Há, ademais, uma quarta característica: a Antropologia se caracteriza pelo descentramento, ou seja, tem a pretensão de se descentrar das categorias dos valores das instituições e das experiências ocidentais, mediante o exercício da alteridade. Essa característica permite questionar a universalidade das questões ocidentais. 
Boaventura de Sousa Santos fala em:
Localizamos globalizados: exportação de valores, instituições, padrões etc, feita pelos países dominantes.
Globalismos localizados: importação dos valores, instituições, padrões etc, feita pelos países dominados.
A Antropologia foi configurada por:
Evolucionismo: Lewis Morgan e Henry Summer Maine
Culturalismo: Franz Boas
Funcionalismo: Bronislaw Malinowski e Alfred Radcliffe-Brown
Estruturalismo: Claude Lévi-Strauss
Homeomorfismo
Uma das questões mais importantes para a antropologia é saber até onde vai esse conhecimento. Até onde se pode, a partir de um conhecimento ocidental, abranger experiências radicalmente diferentes da ocidental. Como lidar com o homeomorfismo cultural? O homeomorfismo cultural aponta para diferenças essenciais entre sistemas jurídicos. As sociedades diferentes entre si de maneira diferente, como sustenta Claude Lévi-Strauss. O modo pelo qual se constroem as experiências jurídicas são diferentes. A ideia de homeomorfismo cultural é muito trabalhada por Robert Vachon. Há situações em que não se consegue encontrar correlato exato de uma sociedade para outra. Dado esse problema, de diferenças abissais, surge um problema: seriam as categorias ocidentais habilitadas a descrever situações que ocorrem em outros lugares? Elas têm capacidade universal de expressão? Há, pelo menos, duas linhas antagônicas na antropologia em relação a essa problemática.
Esse problema tem a ver com os limites do saber antropológico, para que não distorça as realidades. Os dois posicionamentos são: uma considera que existe a universalidade - essas categorias conseguem expressar experiências diversas daquelas que o ocidente produziu; e outra considera que isso não é possível, elas não conseguem representar experiências não-ocidentais sem distorce-las, projetando experiências ocidentais nelas. 
Universalidade das categorias jurídicas universais
Max Gluckman e Paul Bohannan travam um enorme debate acerca dessa questão. Max era especialista na Zâmbia. E Bohannan na Nigéria. As formas jurídicas de cada país eram diferentes daquelas que eles conheciam de seus países. Max foca seu estudo nos barotse (uma comunidade) e Bohannan nos tiv (também uma comunidade). Max, ao comparar essa sociedade com outras, vai projetar sobre elas, as categorias jurídicas ocidentais, porque ele diz que não há outro método de fazer isso (comparar com um ponto de referência), Bohannan critica isso. Max queria explicar como as sociedades pré-capitalistas se organizavam juridicamente. Ele considera que existem traços comuns e para descreve-los, ele mobiliza instrumentos analíticos forjados no ocidente. Ao fazer isso, tende-se ao etnocentrismo, gerando distorção analítica, diz Bohannan, porque projeta-se sobre outras sociedades categorias exógenas, não vinculadas às experiências descritas, o que no limite compromete o conhecimento sobre aquela sociedade. Bohannan defende que seria necessária uma língua artificial para comparar os dados, de maneira a diminuir a distorção, uma vez que as palavras possuem carga semântica cultural. Seria possível também explicar os termos e deixar as relações para o leitor. Ainda assim, estaria usando uma língua com carga valorativa para explicar. Cabe, portanto, o trabalho de escolher a forma que menos valora. Não há neutralidade.
Pluralismo jurídico
Este é um debate de mais de meio século, em contextos como o europeu e americano. Essa discussão vem ganhando cada vez mais espaço no âmbito dogmático. A globalização, entre outros fatores, levou a uma progressiva mudança do centro de produção normativa. O pluralismo tem a pretensão de descrever a regulação jurídica com adequação a estrutura da sociedade no mundo contemporâneo. O pluralismo é uma perspectiva intencionalmente polêmica e contraintuitivo que rejeita a redução do fenômeno jurídico apenas a sua forma estatal de expressão. O pluralismo jurídico se opõe ao monismo jurídico. O Direito é mais amplo do que a sua forma estatal. O direito estatal não extingue em si a experiência jurídica.
Baseado em Rouland, o pluralismo jurídico enfatiza um fenômeno de escamoteamento do Direito que seria característico das sociedades ocidentais modernas para as quais só haveria o Direito oficial (Droit officiel) estabelecido pelo estado, postulado esse que se inspira em: Direito = lei (droit = loi). Oculta-se faces do Direito. A melhor forma seria: Direito > lei.

Outros materiais