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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE Curso: Letras – Italiano Disciplina: Linguística II Docente: Profº Drº Eduardo Kenedy Nunes Areas Aluno: Thamiris Ferreira Santos Fichamento sobre AQUISIÇÃO DA LINGUAGEM SCARPA, Ester Mirian: Aquisição da Linguagem. In.: MUSSALIM, Fernanda; BENTES, Anna Christina (Orgs.). Introdução à lingüística: domínios e fronteiras. São Paulo: Cortez, 2001. pág. 203-232. 1. AQUISIÇÃO DA LINGUAGEM: BREVÍSSIMO HISTÓRICO E ABRANGÊNCIA “Heródoto, por exemplo, narra que, no século VII a.C, o rei Psamético do Egito ordenou que duas crianças fossem confinadas desde o nascimento até a idade de dois anos, sem convívio com outros seres humanos, a fim de se observarem as manifestações "lingüísticas" produzidas em contexto de privação interativa. Sua hipótese era que, se uma criança fosse criada sem exposição à fala humana, a primeira palavra que emitisse espontaneamente pertenceria à língua mais antiga do mundo. Ao cabo de dois anos de total isolamento, as crianças emitiram uma seqüência fônica interpretada como "bekos", palavra frígia para "pão". Concluiu, então, que a língua que o povo frígio falava era mais antiga que a tios egípcios.” (p.1) “Algumas das amostras mais abrangentes da fala infantil foram registradas nas primeiras décadas deste século pelos chamados "diaristas", que eram lingüistas ou filólogos estudando seus próprios filhos.” (p.1) “São trabalhos descritivos e mais ou menos intuitivos, que, ao contrário das pesquisas aquisicionais das últimas décadas, não se voltam à procura, nos dados da criança, de evidência em prol de alguma teoria lingüística ou psicológica, embora se insiram nas teorias lingüísticas e psicológicas da época (como o de Lewis, com tendência behaviorista).” (p.2) “As anotações, em forma de diário, do que a criança diz, em situação naturalística (isto é, em ambiente natural, em atividades cotidianas), foram posteriormente substituídas por registros em fitas magnéticas, cm áudio ou vídeo. Assim, grava-se a fala de uma criança por um período de tempo preestabelecido (por exemplo: meia hora, 40 minutos, 1 hora etc), em intervalos regulares (sessões semanais, quinzenas, mensais etc), dependendo do tema a ser pesquisado. Esse material é posteriormente transcrito da maneira mais apropriada para a pesquisa em pauta (transcrição fonética, prosódica, cursiva, codificada segundo orientações sintáticas, semânticas etc).” (p.2) “A partir da metade dos anos 1980, bancos de dados da fala de várias crianças do mundo todo têm sido formados, seguindo codificações informatizadas.” (p.2) “Uma outra metodologia de pesquisa em aquisição da linguagem, a de tipo transversal, baseia-se no registro de um número relativamente grande de sujeitos, muitas vezes classificados por faixas etárias.” (p.2) “De qualquer maneira, deve-se sempre ter cuidado com a visão ingênua de que os dados aquisicionais "falam". A metodologia adotada e a própria seleção dos dados dependem da postura teórica que norteia a pesquisa.” (p.2) “A Aquisição da Linguagem é, pelas suas indagações, uma área híbrida, heterogênea ou multidisciplinar.” (p.2) “No entanto, na contramão, as questões suscitadas pela Aquisição da Linguagem, bem como os problemas metodológicos e teóricos colocados pelos próprios dados aquisicionais, têm, não raro, levado tanto a Psicologia (sobretudo a Cognitiva) como a própria Lingüística a se repensarem e a se renovarem.” (p.2) “Hoje em dia, a Aquisição da Linguagem alimenta os tópicos recobertos pela Psicolingüística, além de ser de interesse central nas ciências cognitivas e mesmo nas teorias linguísticas, sobretudo nas de inspiração gerativista, como veremos mais detidamente adiante. A área recobre muitas subáreas. Cada uma formando um campo próprio de estudos.” (...)” (p.2-3) “a) aquisição da língua materna, tanto normal quanto "com desvios", recobrindo os componentes "tradicionais" dos estudos da linguagem, como fonologia, semântica e pragmática, sintaxe e morfologia, aspectos comunicativos, interativos e discursivos da aquisição da língua materna. Sob a égide de "desvios", contam-se: aquisição da linguagem em surdos, desvios articulatórios, retardos mentais e específicos da linguagem etc; (p.3) b) aquisição de segunda língua, quer como bilingüismo infantil ou cultural, quer na verificação dos processos pelos quais se dá a aquisição de segunda língua entre adultos e crianças, seja em situação formal escolar, seja informal de imersão lingüística; (p.3) c) aquisição da escrita, letramento, processos de alfabetização, relação entre a fala e a escrita, entre o sujeito e a escrita nesse processo etc.” (p.3) 2. Temas e abordagens teóricas sobre a aquisição da linguagem 2.1. O velho debate pendular sobre nature (natureza) versus nurture (criação, ambiente). O inato e o adquirido. O biológico e o social “Os estudos sobre processos e mecanismos de aquisição da linguagem tomaram um grande impulso a partir dos trabalhos do lingüista Noam Chomsky, no fim da década de 1950, em reação ao behaviorismo vigente na época.(...) (...)A aprendizagem da linguagem seria fator de exposição ao meio e decorrente de mecanismos comportamentais como reforço, estímulo e resposta. (....) (...)Skinner (1957), psicólogo cujo trabalho foi o mais influente no behaviorismo, parte de pressupostos tanto metodológicos (como ênfase na observabilidade de manifestações comportamentais, externas, mensuráveis, da aprendizagem) quanto teóricoepistemológicos 'como a premissa da inacessibilidade à mente para se estudar o conhecimento, postura contrária à mentalista e idealista nas ciências humanas) e propõe, então, enquadrar a linguagem (ou "comportamento verbal") na sucessão e contingência de mecanismos de estímulo-resposta-reforço, que explicam o condicionamento e que estão na base da estrutura do comportamento.(...)” (p.4) “O argumento básico de Chomsky é: num tempo bastante curto (mais ou menos dos 18 aos 24 meses), a criança, que é exposta normalmente a uma fala precária, fragmentada, cheia de frases truncadas ou incompletas, é capaz de dominar um conjunto complexo de regras ou princípios básicos que constituem a gramática internalizada do falante. Esse argumento, constantemente reafirmado, é chamado de "pobreza do estímulo".” (p.4) “Um mecanismo ou dispositivo inato de aquisição da linguagem (em inglês, LAD, language acquisition'device), que elabora hipóteses lingüísticas sobre dados lingüísticos primários (isto é, a língua a que a criança está exposta), gera uma gramática específica, que é a gramática da língua nativa da criança, de maneira relativamente fácil e com um certo grau de instantaneidade. Isto é, esse mecanismo inato faz "desabrochar" o que "já está lá", através da projeção, nos dados do ambiente, de um conhecimento lingüístico prévio, sintático por natureza.” (p.4) “O problema de Platão coloca-se da seguinte maneira: como é que o ser humano pode saber tanto diante de evidências tão passageiras, enganosos e fragmentárias?” (p.4) “Esta visão, que coloca a linguagem num domínio cognitivo e biológico, admite que o ser humano vem equipado, no estágio inicial, com uma Gramática Universal (GU), dotada de princípios universais pertencentes à faculdade da linguagem, e de parâmetros "fixados pela experiência", isto é, parâmetros não-marcados que adquirem seu valor (+ ou -) por meio do contato com a língua materna.” (p.4) “Em suma, no processo de aquisição da linguagem, a criança c exposta a um input (conjunto de sentenças ouvidas no contexto), sendo o output um sistema de regras para a linguagem do adulto, a gramática de uma determinada língua.” (p.5) “A que tipo de dados ou a que quantidade de dados lingüísticos a criança deve ser exposta? Trabalhos recentes (Lightfoot, 1991) afirmam que a criança precisa ser expostaa uma quantidade relativamente pequena de linguagem, meramente a algum gatilho crucial, como pequenas cláusulas simples, a fim de descobrir que caminho sua língua materna tomou.” (p.5) “A aprendizibilidade é, assim, uma questão teórica central da teoria paramétrica de aquisição da linguagem. Como é a linguagem aprendível, se pode só contar com as migalhas de fala ouvidas pelas crianças, que não fornecem pistas suficientes para o estado final da língua a ser aprendida? Este é também chamado de "problema lógico da aquisição da linguagem": como, logicamente, as crianças adquirem uma língua se não têm informação suficiente para a tarefa? A resposta lógica ç que trazem uma enorme quantidade de informações a que Chomsky chama de Gramática Universal (GU), que é "uma caracterização destes princípios inatos, biologicamente determinados, que constituem o componente da mente humana — a faculdade da linguagem".” (p.5) “Uma outra decorrência do inatismo lingüístico é a modularidade cognitiva da aquisição da linguagem: o mecanismo de aquisição da linguagem é específico dela, não exibindo interface óbvia com outros componentes cognitivos ou comportamentais.” (p.5) “As colocações inatistas de Chomsky suscitaram uma série de estudos, a partir dos anos 1960, que se concentraram sobretudo na chamada fase sintática, onde a prioridade de análise pendeu para o estudo da aquisição da gramática da criança por volta do seu segundo ano de vida, quando a criança já começa a produzir enunciados de mais de uma palavra.” (p.6) 2.2. O cognitivismo construtivista: Piaget, Vygotsky “A abordagem chamada de cognitivismo construtivista ou epigenético foi desenvolvida com base nos estudos do epistemólogo suíço Jean Piaget, segundo o qual o aparecimento da linguagem se dá na superação do estágio sensório-motor, por volta dos 18 meses.” (p.6) “(...)usando as palavras do próprio Piaget (1979), dá-se o desenvolvimento da função simbólica, por meio da qual um significante (ou um sinal) pode representar um objeto significado, além do desenvolvimento da representação, pela qual a experiência pode ser armazenada e recuperada. Essas duas funções estão estreitamente ligadas a outros três processos que ocorrem concomitantemente e que colaboram para a superação do que Piaget chama de "egocentrismo radical", presente no período sensório-motor, segundo o qual existe "uma indiferenciação entre sujeito e objeto ao ponto que o primeiro não se conhece nem mesmo como fonte de suas ações".” (p.6) “Estes três processos são os relacionados a seguir: a) o da descentralização das ações em relação ao corpo próprio, isto é, entre sujeito e objeto (ou entre "eu" e "o outro" ou "eu" e "o mundo"); o sujeito começa a se conhecer como fonte ou senhor de seus movimentos; b) o da coordenação gradual das ações: "em lugar de continuar cada uma a formar um pequeno todo em si mesmo", elas passam a se, coordenar para constituir uma conexão entre meios e fins; c) o da permanência do objeto, segundo o qual o objeto permanece o mesmo e igual a si próprio mesmo quando não está presente no espaço perceptual da criança.” (p.6) “Quando essas conquistas cognitivas se unem, na superação da inteligência sensória e motora, a caminho da inteligência pré-operatória de fases posteriores, surge a possibilidade de a criança adotar os símbolos públicos da comunidade mais ampla em lugar de seus significantes pessoais: em outras palavras, a linguagem se torna possível (já que a linguagem é entendida, por Piaget, como um sistema simbólico de representações), assim como outros aspectos da função simbólica geral, como é o desenhar.” (p.7) “Assim também, a visão behaviorista é rechaçada, com a crença de que as crianças não esperam passivamente que o conhecimento de qualquer espécie lhes seja transmitido. As pesquisas de inspiração piagetiana floresceram nas décadas de 1970 e 80. As críticas ao modelo piagetiano, que criaram força também neste período, baseiam-se na interpretação de que Piaget avaliou mal e subestimou o papel do social e das outras pessoas no desenvolvimento da criança e que um modelo interativo social se fazia necessário para explicar o desenvolvimento nos primeiros dois anos, modelo esse que desse conta de como a criança e seu interlocutor exploram os fenômenos físicos e sociais.” (p.7) “Aí é que surgiram nas elaborações teóricas ocidentais, as propostas de Vygotsky para melhor dar conta do alcance social da aquisição da linguagem. (...)Sua grande influência nos estudos de aquisição da linguagem começa efetivamente nos anos 1970, no bojo dos questionamentos ao inatismo chomskiano e como uma alternativa ao cognitivismo construtivista piagetiano. De orientação construtivista como Piaget, explica, porém, o desenvolvimento da linguagem (e do pensamento) como tendo origens sociais, externas, nas trocas comunicativas entre a criança e o adulto. (p.7) Vygotsky (1984) parte do princípio de que os estudiosos separam o estudo da origem e desenvolvimento da fala do estudo da origem do pensamento prático na criança. Em outras palavras, o estudo do uso dos instrumentos tem sido isolado do uso dos signos.” (p.7) “O poderoso instrumento da linguagem é trazido pelo que chama de internalização da ação e do diálogo. Vygotsky entende o processo de internalização como uma reconstrução interna de uma operação externa, mas, diferentemente de Piaget, para a internalização de uma operação deve concorrer a atividade mediada pelo outro, já que o sucesso da internalização vai depender da reação de outras pessoas.” (p.7) “São as seguintes as transformações que ocorrem no processo de internalização: a) uma operação que, inicialmente, representa uma atividade externa é reconstruída e começa a ocorrer internamente, daí a importância da atividade simbólica através do uso de signos; b) um processo interpessoal é transformado num processo intrapessoal: as funções no desenvolvimento da criança aparecem primeiro no nível social e, depois, no individual. Em outras palavras, primeiro entre pessoas (de maneira interpsicológica) e, depois, no interior da criança (intrapsicológica). Assim, segundo Vygotsky, todas as funções superiores (memória lógica, formação de conceitos, entre outras) originam-se das relações reais entre as pessoas; c) a transformação de um processo interpessoal num processo intrapessoal é resultado de uma longa série de eventos ocorridos ao longo do desenvolvimento, isto é. a história das relações reais entre as pessoas são constitutivas dos processos de internalização.” (p.7-8) “Os trabalhos de inspiração vygotskiana entendem a aquisição da linguagem como um processo pelo qual a criança se firma como sujeito da linguagem (e não como aprendiz passivo) e pelo qual constrói ao mesmo tempo seu conhecimento do mundo, passando pelo outro.” (p.8) 2.3. O interacionismo social “Segundo esta postura, passam a ser levados em conta fatores sociais, comunicativos e culturais para a aquisição da linguagem. Assim, a interação social e a troca comunicativa entre a criança e seus interlocutores são vistas como pré-requisito básico no desenvolvimento linguístico.” (p.8) “As características da fala do adulto (ou das crianças mais velhas) são estudadas e consideradas fundamentais para o desenvolvimento da linguagem na criança.” (p.8) “Embora essa questão não tenha ainda tido uma resposta definitiva, as pesquisas têm apontado para a segunda alternativa: a criança é afetada pela fala dirigida a ela.” (p.8) “A afirmação inicial de Chomsky sobre o input degradado, composto de frases truncadas e agramaticais, foi desafiada por pesquisas subsequente (...) (...)Tais estudos apontam, isso sim. para modificações que a fala adulta sofre quando dirigida à criança, em contraposição à dirigida ao adulto e a crianças mais velhas, alémde características específicas de comunicação entre adultos e bebês que nada tinham de "agramatical" propriamente, como a hipótese de "pobreza do estímulo" sugere.” (p.8-9) “Trata-se de modificações fonológicas, morfológicas, sintáticas, semânticas e pragmáticas: a) entonação "exagerada", reduplicações de sílabas ("au-au", "papai", "dodói"), velocidade de fala reduzida, qualidades de voz diferenciadas, tendendo para o "falsetto": b) frases mais curtas e menos complexas: expansões sintáticas a partir de uma palavra dita pela criança ou "tradução" de gesto feito por ela; c) referência espacial e temporal voltada para o momento da enunciação; d) palavras de conteúdo lexical mais corriqueiro, mais familiares e freqüentes na rotina cotidiana da criança; e) paráfrases, repetições ou retomadas das emissões da criança.” (p.9) “O bebê é assim, visto como potencial parceiro comunicativo do adulto, que empreende uma "sintonia tina" com as manifestações potencialmente comunicativas e significativas da criança, qualquer que seja seu conteúdo expressivo (gesto, voz, balbucios, palavras ou frases). Há um ajuste mútuo nas conversações entre adulto e criança, de maneira que as vocalizações infantis não caem num vácuo comunicativo. (p.9) Essas características foram encontradas numa variedade bastante grande de comunidades culturais e lingüísticas, de tal modo que a conclusão imediata é que são características universais.” (p.9) “Assim é que propostas recentes têm visto a universalidade de modulações de voz da chamada entonação "afetiva" (negação, conforto, privação, atenção) como manifestações de comportamentos pré-adaptativos da criança, numa visão declaradamente neodarwinista.” (p.9) “Trabalhos de campo realizados com comunidades outras que não a branca, classe média, ocidental, mostram diferentes características na interação adulto-bebê que as até então reportadas na literatura.” (p.10) “Dentro ainda de uma postura oposta ao universalismo da fala dirigida à criança, a proposta neodarwinista [...] também contesta a universalidade de marcas vocais interacionais e chega à conclusão de que nem as situações de "afetividade" são sempre assim tão marcadas como a que Fernald encontrou em seus sujeitos interagindo com os respectivos adultos, nem as modulações de altura, consideradas foneticamente recortadas e universais por Fernald, dos sujeitos brasileiros analisados seguem o mesmo padrão de contorno entonacional mostrado pela autora americana.” (p.10) “A partir dos 6 meses de idade, a criança e o adulto engajam-se cm jogos (empilhar blocos, esconder o rosto atrás de um obstáculo e depois mostrar a face etc.) que patenteiam instâncias de atenção partilhada e ação conjunta.” (p.10) “Essas funções primárias tem, além disso, um papel na determinação das funções gramaticais de agente/ação/paciente, responsáveis, segundo modelos funcionalistas de gramática, pelos sistemas de transitividade nas línguas.” (p.10- 11) “O adulto, numa fase pré-verbal, focaliza um ponto de atenção qualquer, espera que a criança acompanhe seu foco de atenção e comenta sobre ele. Isto é, a criança participa de esquemas em que se focaliza ou topicaliza para depois se comentar ou predicar.” (p.11) “Propostas sociointeracionistas afirmam que a linguagem é atividade constitutiva do conhecimento do mundo pela criança. A linguagem é o espaço em que a criança se constrói como sujeito; o conhecimento do mundo e do outro é, na linguagem, segmentado e incorporado.” (p.11) 2.3.1. Facetas atuais do sociointeracionismo “Lemos [...] recusa-se a ver a aquisição da linguagem como a aquisição ou construção de conhecimento da língua, concepção consagrada pela expressão "desenvolvimento lingüístico".” (p.12) “A autora não mais assume que. num determinado momento, o conhecimento da língua permite ã criança passai de interpretado a intérprete, da incorporação da tala do outro à assunção da própria fala, tornando-se, assim, um falante em pleno controle de sua atividade lingüística.” (p.12) 3. A QUESTÃO DO "PERÍODO CRÍTICO" Lenneberg: “Entre dois e três anos de idade, a linguagem emerge através da interação entre maturação e aprendizado pré-programado. Entre os três anos de idade e a adolescência, a possibilidade de aquisição primária da linguagem continua a ser boa; [...] Depois da puberdade, a capacidade de auto-organização e ajuste às demandas psicológicas do comportamento verbal declinam rapidamente.” (p.13) “Pinker (1994) afirma que a aquisição de uma linguagem normal é garantida até a idade de 6 anos, é comprometida entre 6 até pouco depois da puberdade, e é rara daí para a frente.” (p.13) “Aitchinson [...] aponta para a insuficiência explicativa dos argumentos arrolados em favor desta hipótese. Pelo menos quatro deles têm sido citados: a) casos de estudos de indivíduos que foram isolados de qualquer convívio social ou troca lingüística e adquiriram a linguagem tardiamente; b) o desenvolvimento da fala de crianças com síndrome de Down; c) a suposta sincronia do período crítico com a lateralização hemisférica; d) dificuldades de aquisição de segunda língua depois da adolescência.” (p.13) “Argumentos interacionistas são levantados com relação às diferenças entre a aquisição da língua materna ou estrangeira na infância e depois da adolescência. Contemplam diferentes fatores interativos e socioculturais de aquisição nas duas situações, o que explicaria a extrema diferença individual tanto no processo de aquisição de L2 em idade adulta, quanto no alvo a ser atingido: o grau de domínio do alvo pretendido é muito variado.” (p.14) 4. ESTÁGIOS DE DESENVOLVIMENTO DA LINGUAGEM Perroni: “A autora afirma que a sucessão de estágios não se dá linearmente, e, para descrevê-la, a "metáfora da espiral (é) mais apropriada (...) que a dos degraus de uma longa escada. É um conceito intrinsecamente ligado ao de desenvolvimento; assim, os estágios "não são pedaços justapostos uns após os outros, mas cada um se enraiza no outro, precedente, e se prolonga no seguinte".” (p.15) “Aparentemente, os sons que a criança balbucia no começo são universais: os sons do balbucio inicial não são específicos de sua língua materna. As crianças surdas conseguem balbuciar nesta fase, embora, depois disso, não acompanhem o desenvolvimento normal da criança ouvinte.” (p.16) “as formas maduras aparecem, num primeiro momento, em contexto de especularidade imediata de algum item da fala adulta. Num momento posterior, ou a forma desaparece paia reaparecer adaptada ao sistema fonológico da criança muito tempo depois, ou sua forma "menos madura", variável, percorrerá vários meses de mudança até se tornar estável. “ (p.17) “Com as primeiras palavras aparece também a flexão ou a aparente flexão. Digo aparente porque em muitos casos não há ainda evidência de que realmente as flexões representam morfemas categoriais ou de classes gramaticais como na linguagem adulta.” (p.17) “as primeiras sentenças espontâneas da criança são justaposições de enunciados monovocabulares (de "umapalavra") que ela produz à maneira de fala telegráfica.” (p.18) “Os erros ou desvios da norma muitas vezes indicam, segundo alguns estudiosos, que um processo de análise e segmentação está se instaurando, pois revelam as hipóteses que a criança faz sobre o objeto lingüístico.” (p.18) “A colocação do morfema fora de seu lugar usual indica que um processo de análise está se efetuando e que a criança reorganiza seu sistema para passar para outros níveis de análise e aquisição.” (p.18) “A partir de 2 a 3 anos, a criança já começa a contar histórias. [...] A trajetória para a aquisição do discurso narrativo é longa: aparentemente, não é antes dos 5 anos que a criança se torna uma narradora proficiente.” (p.18) ”É preciso, porém, deixar claro que as polêmicas que envolvem as grandes questões da área estão ainda em aberto. Se, por um lado, é pouco afirmar que a aquisição da linguagem se restringe à internalização de regras fonológicas, morfológicas, sintáticas, semânticas e pragmáticas da língua materna do aprendiz, por outro lado é ainda pouco clara a natureza da passagem entre estruturas interativas pré-lingüísticas e a gramática adquirida, a natureza do conhecimento linguístico vinculado ou não ao conhecimento do mundo, a dificuldade metodológica causada pela falta de transparência da fala da criança (e da própria fala do interlocutor), entre tantos outros mistérios.” (p.19)
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