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INTERVENÇÃO DO ESTADO NA PROPRIEDADE Fundamentos: Estado possui a prerrogativa de impor restrições e condicionamentos razoáveis à propriedade alheia para atender o interesse público. O direito de propriedade não possui caráter absoluto ainda que atenda função social, é possível a intervenção estatal para restringi-la ou condicioná-la de modo a satisfazer o interesse público. a propriedade que atende a função social tem status de direito fundamental o descumprimento da função social acarreta a aplicação de sanções ao particular, admitindo-se, inclusive, a retirada forçada da propriedade por meio da desapropriação. Ex.: desapropriação de imóvel urbano não edificado (art. 182, § 4.°, III, CF); desapropriação do imóvel rural improdutivo (art. 184 da CF); expropriação de glebas de terras com cultivo de plantas psicotrópicas ilegais (art. 243 da CF). Pode-se afirmar que a intervenção estatal na propriedade é fruto do exercício do poder de polícia do Estado e é justificada por dois argumentos: a) cumprimento da função social da propriedade (arts. 5.°, XXIII, e 170, III, da CF); e b) satisfação do interesse público. MODALIDADES: INTERVENÇÕES RESTRITIVAS E SUPRESSIVAS As intervenções do Estado na propriedade alheia podem ser divididas em dois grupos: a) intervenções restritivas ou brandas: o Estado impõe restrições e condições à propriedade, sem retirá-la do seu titular espécies de intervenção restritiva: servidão, requisição, ocupação temporária, limitações e tombamento; b) intervenções supressivas ou drásticas: o Estado retira a propriedade do seu titular originário, transferindo-a para o seu patrimônio, com o objetivo de atender o interesse público. As intervenções supressivas são efetivadas por meio das diferentes espécies de desapropriações. SERVIDÃO ADMINISTRATIVA A servidão administrativa é o direito real público que permite a utilização da propriedade alheia pelo Estado ou por seus delegatários com o objetivo de atender o interesse público. Ex.: servidão de passagem instituída sobre imóvel particular para permitir a passagem de ambulâncias de determinado hospital público; servidão para passagem de oleodutos ou aquedutos; servidão para instalação de placas informativas (nomes de ruas etc.); passagem de fios elétricos por propriedade alheia. Os traços característicos essenciais da servidão administrativa são basicamente os mesmos encontrados nas servidões privadas reguladas pelo art. 1378 do CC. Nas servidões (administrativa ou privada), existem dois prédios pertencentes a donos diversos: prédio dominante (beneficiário da servidão) e prédio serviente (aquele que sofre a restrição). O prédio serviente deve se sujeitar à restrição estipulada em favor do prédio dominante Além da obrigação de tolerância ou de não fazer, o proprietário do prédio serviente tem, eventualmente, obrigações positivas (ex.: limpar o terreno, podar árvores etc.). em determinados casos, a servidão administrativa não depende necessariamente da existência do prédio dominante pois a restrição imposta ao prédio serviente pode ser justificada exclusivamente pela necessidade de prestação de serviços de utilidade pública (ex.: instalação de torres na propriedade privada para passagem de fios condutores de eletricidade) o essencial é que a servidão seja justificada pela necessidade de atendimento do interesse público. a servidão administrativa se distingue da servidão privada por duas razões: a) fundamentos: enquanto a servidão administrativa fundamenta-se no interesse público, a servidão privada atende interesses privados; e b) regime jurídico: as servidões administrativas são reguladas, primordialmente, por normas de direito público e as servidões privadas são regidas por normas de direito privado. A servidão administrativa pode ser instituída pelo Poder Público ou por seus delegatários os delegatários dependem de autorização legal ou negocial para promover os atos necessários à efetivação da servidão e serão responsáveis pelas respectivas e eventuais indenizações. Fontes normativas As servidões administrativas são citadas em diversos diplomas legais. Exemplos: art. 40 do Decreto-lei 3.365/1941 (fundamento genérico para as servidões administrativas); art. 151, "c", do Decreto 24.643/1934 - Código de Águas (servidões permanentes ou temporárias exigidas para as obras hidráulicas e para o transporte e distribuição da energia elétrica); arts. 117 a 138 do Decreto 24.643/1934 - Código de Águas (servidões de aquedutos); arts. 29, IX, e 31, VI da Lei 8.987/1995 (após a declaração de necessidade ou utilidade pública, as concessionárias podem instituir as servidões, desde que autorizadas pelo edital e pelo contrato de concessão, caso em que serão responsáveis pelas indenizações devidas); art. 10 da Lei 9.074/1995 (a ANEEL, agência reguladora, tem a prerrogativa de instituir servidão administrativa para implantação de instalações de concessionários, permissionários e autorizados de energia elétrica); art. 100 da Lei 9.472/1997 (instituição de servidões para prestação de serviços de telecomunicações, cabendo à concessionária a implementação da medida e o pagamento da indenização e das demais despesas envolvidas); art. 2.°, § 1.°, II, da Lei 11.107/2005 (os consórcios públicos podem instituir servidões), entre outros. Objeto As servidões administrativas incidem apenas sobre bens imóveis Os imóveis (prédio dominante e prédio serviente) devem ser vizinhos, mas não precisam ser contíguos. não há servidão sobre bens móveis ou direitos. Instituição As servidões administrativas podem ser instituídas por meio das seguintes formas: a) acordo: após declaração de utilidade pública, as partes concordam com a instituição da servidão o acordo, formalizado por escritura pública, será registrado no Registro de Imóveis Súmula 415 do STF reconhece o direito à proteção possessória às servidões de trânsito aparentes, mesmo inexistindo o respectivo título e registro; b) sentença judicial: quando não houver acordo entre as partes, o Poder Público deverá propor ação judicial para constituir a servidão procedimento utilizado deve ser análogo ao procedimento exigido para a desapropriação (art. 40 do Decreto-lei 3.365/1941); c) usucapião: a instituição da servidão por usucapião é prevista no art. 1.379 do CC. Há divergência doutrinária sobre a possibilidade de instituição de servidão por meio de lei. Primeira posição: a servidão somente pode ser instituída por acordo ou sentença judicial, precedida do decreto de utilidade pública, não sendo possível a instituição por meio de lei. Nesse sentido: José dos Santos Carvalho Filho e Marcai Justen Filho. Segunda posição: é possível a instituição de servidão por meio de lei. Exemplos: servidão sobre as margens dos rios navegáveis, servidão ao redor de aeroportos. Nesse sentido: Maria Sylvia Zanella Di Pietro e Hely Lopes Meirelles. A controvérsia doutrinária, nesse caso, passa pela distinção entre servidões e limitações administrativas os que não admitem a instituição de servidões diretamente pela lei, distinguem as servidões e as limitações a partir do critério de instituição dessas intervenções: enquanto as servidões são instituídas por atos que individualizam o seu objeto (acordo ou sentença judicial), as limitações administrativas, em virtude do seu caráter genérico, são instituídas por lei ou ato normativo. Os que admitem a utilização da lei para instituição de servidões e de limitações utilizam outro critério de distinção: a limitação é instituída para satisfazer o interesse público genérico e abstrato (ex.: proteção do meio ambiente), a servidão, por sua vez, pressupõe a existência de interesse público específico em favor do prédio dominante que deve ser satisfeito. Extinção As servidões são consideradas, em regra, perpétuas, não havendo prazo de duração estipulado pelas partes, pois as servidões são justificadas pelo interesse que deve ser satisfeito, e não pela qualidade das partes. significa que a servidão deve perdurar enquanto houver a necessidade de satisfação do interesse público que justificou a sua instituição. Desse modo, é possível apontar algumas hipóteses de extinção da servidão: a) desaparecimento do bem gravado (ex.: inundação permanente do imóvel objeto da servidão de trânsito); b) incorporação do bem serviente ao patrimônio público (a servidão pressupõe necessariamente dois prédios titularizados por pessoas diferentes); c) desafetação do bem dominante (ex.: desafetação do imóvel que era utilizado como hospital público). Indenização art. 40 do Decreto-lei 3.365/1941 o Poder Público pode instituir servidões, mediante indenização. Todavia, a indenização somente será devida se houver comprovação do dano pelo particular Não seria razoável impor dever de indenizar o proprietário que não comprova qualquer prejuízo, sob pena de se admitir o seu enriquecimento sem causa (ex.: colocação de placas com nomes de ruas na propriedade privada). O prazo prescricional para propositura da ação indenizatória é de cinco anos, na forma do art. 10, parágrafo único, do Decreto-lei 3.365/1941. REQUISIÇÃO ADMINSTRATIVA requisição administrativa é a intervenção autoexecutória na qual o Estado utiliza-se de bens imóveis, móveis e de serviços particulares no caso de iminente perigo público. Ex.: requisição de hospitais privados, serviços médicos e de ambulâncias, em razão de epidemia para tratamento dos doentes; requisição de barcos e de ginásios privados na hipótese de inundação para salvamento e alojamento dos desabrigados; Fontes normativas art. 5.°, XXV, da CF: "no caso de iminente perigo público, a autoridade competente poderá usar de propriedade particular, assegurada ao proprietário indenização ulterior, se houver dano". Atenção: Não se deve confundir a competência para implementar requisições com a competência para legislar sobre o instituto todos os Entes federados realizar requisições administrativas, mas a competência legislativa é exclusivamente reconhecida à União (art. 22, III, CF). Alguns diplomas legais que tratam das requisições administrativas: Decreto-lei 4.812/1942 (requisições civis e militares necessárias à defesa e à segurança nacional); Lei Delegada 4/1962 (intervenção no domínio econômico para assegurar a livre distribuição de produtos necessários ao consumo do povo); art. 15, III, da Lei 8.080/1990 (Lei do SUS). Objeto As requisições administrativas incidem sobre bens imóveis, móveis e serviços particulares. art. 5.°, XXV, da CF apenas a propriedade "particular" pode ser objeto da requisição administrativa. a requisição pode ser instituída sobre bens e serviços públicos? CF requisição de bens e serviços públicos durante o Estado de Defesa (art. 136, § 1.°, II, da CRFB) e o Estado de Sítio (art. 139, VI e VII). O STF, ao analisar a requisição federal de hospitais públicos municipais, entendeu que a requisição administrativa tem por objeto, em regra, os bens e os serviços privados (art. 5.°, XXV, da CF) a requisição de bens e serviços públicos possui caráter excepcional e somente pode ser efetivada após a observância do procedimento constitucional para declaração formal do Estado de Defesa e do Estado de Sítio. Então!! Não é possível a requisição de bens públicos em situação de normalidade institucional. Instituição e extinção Em razão do estado de necessidade pública, o Poder Público possui a prerrogativa de requisitar bens e serviços para afastar o iminente perigo público, independentemente de processo administrativo prévio. A emergência da situação justifica a autoexecutoriedade da medida. Enquanto perdurar o perigo iminente, a requisição permanecerá válida considera-se, portanto, extinta a requisição quando desaparecer a situação de perigo. Indenização O art. 5.°, XXV, da CF, ao tratar da requisição, assegura ao proprietário do bem requisitado "indenização ulterior, se houver dano”. a indenização apresenta duas características: a) é eventual: está condicionada à efetiva comprovação do dano; e b) somente será efetivada ulteriormente, ou seja, após a requisição do bem. Após a utilização do bem será possível averiguar a existência e a amplitude do prejuízo eventualmente causado, sendo certo que a indenização não poderá acarretar enriquecimento sem causa. O prazo prescricional para propositura da ação indenizatória é de cinco anos art. 10, parágrafo único, do Decreto-lei 3.365/1941. OCUPAÇÃO TEMPORÁRIA A ocupação temporária é a intervenção branda por meio da qual o Estado ocupa, por prazo determinado e em situação de normalidade, a propriedade privada para execução de obra pública ou a prestação de serviços públicos. Ex.: ocupação temporária de terreno privado para alojamento de operários e alocação de máquinas com o objetivo de realizar a pavimentação de estradas; utilização de escolas privadas para alocação de urnas de votação e de pessoal (mesários etc.) em época de eleições. Atenção: enquanto a requisição pressupõe perigo público iminente (estado de necessidade), a ocupação pode ser utilizada regularmente pelo Poder Público. Fontes normativas previsão: art. 36 do Decreto-lei 3.365/1941, que autoriza a "ocupação temporária, que será indenizada, afinal, por ação própria, de terrenos não edificados, vizinhos às obras e necessários à sua realização". Outras normas fazem referência à ocupação temporária, por exemplo: art. 13, parágrafo único, da Lei 3.924/1961 (ocupação temporária de propriedade particular para escavações e pesquisas no interesse da arqueologia e da pré-história); art. 58, V, da Lei 8.666/1993 (nos serviços essenciais, o Poder Público contratante pode ocupar provisoriamente bens móveis, imóveis, pessoal e serviços vinculados ao objeto do contrato, na hipótese da necessidade de acautelar apuração administrativa de faltas contratuais pelo contratado, bem como na hipótese de rescisão do contrato administrativo); art. 35, § 3.°, da Lei 8.987/1995 (ocupação das instalações e a utilização, pelo poder concedente, de todos os bens reversíveis, com o objetivo de garantir a continuidade do serviço público). Objeto A ocupação temporária tem por objeto, como regra, o bem imóvel do particular, necessário para execução de obra pública ou a prestação de serviços públicos. Existe controvérsia em relação à possibilidade de ocupação temporária de bens móveis e de serviços. Primeira posição: somente o bem imóvel pode ser ocupado temporariamente, tendo em vista que o art. 36 do Decreto-lei 3.365/1941 utilizou a expressão "terrenos não edificados". Nesse sentido: José dos Santos Carvalho Filho, Diógenes Gasparini. Segunda posição: a ocupação temporária tem por objeto bens imóveis, móveis e serviços. Nesse sentido: Marcal Justen Filho. Não obstante a regra seja a ocupação temporária de bens imóveis, se tem entendido que, a partir da interpretação sistemática do ordenamento jurídico vigente, o objeto da ocupação pode abranger os bens móveis e os serviços (ex.: art. 58, V, da Lei 8.666/1993). Instituição e extinção A legislação não estabeleceu regras específicas sobre a instituição da ocupação temporária, razão pela qual parte da doutrina afirma o seu caráter autoexecutável. Outros autores entendem que as formalidades para instituição da ocupação temporária dependem da modalidade de ocupação: a) ocupação temporária vinculada à desapropriação: é imprescindível ato formal de instituição (decreto), especialmente pela maior duração da ocupação e pelo dever de indenizar o proprietário; e b) ocupação temporária desvinculada da desapropriação: a ocupação é autoexecutória e dispensa ato formal. c) ocupação temporária, em qualquer caso, depende da edição prévia de decreto, bem como do acordo com o proprietário ou sentença judicial A autoexecutoriedade é justificada na requisição em razão do iminente perigo público, mas a ocupação temporária é efetivada em situação de normalidade institucional, então, caso não haja acordo, o Poder Público deverá propor ação judicial para formalização da ocupação. Indenização art. 36 do Decreto-lei 3.365/1941 dispõe que a ocupação temporária será indenizada por ação própria. Parcela da doutrina sustenta que a indenização será sempre devida se a ocupação temporária estiver vinculada ao processo de desapropriação, tendo em vista a norma acima citada. Todavia, em relação às ocupações temporárias desvinculadas da desapropriação, a indenização somente será devida se houver efetiva comprovação do prejuízo pelo particular. Outra parte sustenta que a indenização depende necessariamente da comprovação do dano pelo proprietário do bem ocupado, sob pena de se admitir o pagamento de indenização sem a ocorrência do efetivo prejuízo, o que acarretaria enriquecimento sem causa do proprietário do bem ocupado. O prazo prescricional para propositura da ação indenizatória é de cinco anos art. 10, parágrafo único, do Decreto-lei 3.365/1941. LIMITAÇÕES ADMINISTRATIVAS As limitações administrativas são restrições estatais impostas por atos normativos à propriedade, que acarretam obrigações negativas e positivas aos respectivos proprietários, com o objetivo de atender a função social da propriedade. Ex.: limites de altura para os prédios (gabarito de prédios); obrigação de permitir o ingresso de agentes da fiscalização tributária e da vigilância sanitária; obrigação de instalar extintores de incêndio nos prédios; parcelamento e edificação compulsórios de terrenos para atender a função social delimitada no Plano Diretor. As limitações delimitam o perfil do direito de propriedade, pois a propriedade somente será considerada direito fundamental se atender à função social (art. 5,°, XXII e XXIII, da CF), que será estabelecida por meio de atos normativos. Quando efetivada após a aquisição da propriedade, a limitação é considerada modalidade de intervenção branda. 19 Fontes normativas As limitações administrativas, assim como as demais modalidades de intervenção estatal na propriedade, fundamentam-se na necessidade de cumprimento da função social (arts. 5.°, XXIII, e 170, III, da CF) e na satisfação do interesse público. Trata-se do exercício regular do poder de polícia estatal, com a estipulação de restrições e condicionantes à propriedade alheia. Objeto As limitações administrativas, conforme já assinalado, impõem obrigações positivas e negativas aos proprietários. O objeto das limitações administrativas é amplo, englobando os bens (móveis e imóveis) e os serviços. as limitações decorrem do exercício do poder de polícia, razão pela qual as limitações incidem sobre as propriedades e as atividades privadas. Instituição e extinção As limitações administrativas são impostas, primariamente, por lei e, secundariamente, por atos administrativos normativos. A extinção das limitações ocorre com a revogação da legislação ou dos atos normativos. Indenização As limitações administrativas não geram, em regra, o dever de indenizar, pois as restrições à propriedade são fixadas de maneira genérica e abstrata. Os destinatários sofrem ônus e bônus proporcionais a mesma lógica da irresponsabilidade civil do Estado por atos normativos. as limitações administrativas serão, excepcionalmente, indenizáveis quando: a) acarretarem danos desproporcionais ao particular ou grupo de particulares: o fundamento da indenização é a teoria da repartição dos encargos sociais, segundo a qual a sociedade, que se beneficia com a atuação estatal, deve ter o ônus de compensar o particular que sofreu prejuízos desproporcionais (ex.: limitação que determina o fechamento de ruas para tráfego de veículos, causando prejuízo desproporcional ao proprietário de um posto de gasolina ou edifício-garagem); e b) configurarem verdadeira desapropriação indireta: as limitações podem, em certos casos, impor restrições tão fortes que retirarão as faculdades inerentes do direito de propriedade de alguns particulares (ex.: criação de reserva ambiental que, na prática, inviabiliza o direito de propriedade de determinados proprietários). É importante notar que, se as limitações administrativas precedem à aquisição da propriedade, não cabe indenização ao novo proprietário, pois, nessa hipótese, o imóvel já foi adquirido com a respectiva limitação legal. a desapropriação indireta pode ser verificada em toda e qualquer intervenção do Estado na propriedade (servidão, requisição, ocupação temporária, limitações ou tombamento) quando a restrição significar para um ou alguns particulares a retirada das prerrogativas substanciais da propriedade. O prazo prescricional para propositura da ação indenizatória fundada em limitações administrativas é de cinco anos, na forma do art. 10, parágrafo único, do Decreto-lei 3.365/1941. A Súmula 119 do STJ fixou o prazo da ação de desapropriação indireta em 20 anos (atualmente, o prazo seria de 15 anos, na forma do art. 1.238 do CC), pois a pretensão indenizatória apenas seria extinta com a aquisição da propriedade pelo Poder Público. TOMBAMENTO tombamento é a intervenção estatal restritiva que tem por objetivo proteger o patrimônio cultural brasileiro. Exemplos de bens tombados pelo IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional): Centro Histórico de Salvador; conjunto arquitetônico e paisagístico da Pampulha e de Ouro Preto (Minas Gerais); Casa de Gilberto Freyre (Recife); Estação da Luz (São Paulo); Corcovado, Estádio do Maracanã, Morro do Pão de Açúcar e conjunto arquitetônico e paisagístico de Parati (Rio de Janeiro). art. 216 da CF o patrimônio cultural brasileiro é constituído por "bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira". exemplos: as criações científicas, artísticas e tecnológicas; as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às manifestações artístico-culturais; os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico etc. art. 1° do Decreto-lei 25/1937, trata do tombamento dispõe que o patrimônio histórico e artístico nacional é constituído pelo conjunto dos bens móveis e imóveis considerados relevantes para o interesse público, seja por sua vinculação a fatos memoráveis da história do Brasil, seja por seu excepcional valor arqueológico ou etnográfico, bibliográfico ou artístico. O tombamento é instituído por meio de processo administrativo (alguns entendem como sendo um ato administrativo, como José dos S. C. Filho) com a oitiva do proprietário, e se consuma com a inscrição do bem no Livro do Tombo. art. 4º do Decreto-lei 25/1937 prevê quatro Livros: a) Livro do Tombo Arqueológico, Etnográfico e Paisagístico; b) Livro do Tombo Histórico; c) Livro do Tombo das Belas Artes; e d) Livro do Tombo das Artes Aplicadas. Bens imateriais de valor cultural (Decreto 3.551/2000 ) proteção realizada através de um procedimento denominado de Registro (o objetivo é o mesmo (proteção da cultura), a entidade responsável pela proteção é a mesma (em âmbito federal: IPHAN) e a proteção ocorre por meio de procedimentos semelhantes (inscrição do bem em Livro específico). Não há consenso a respeito da natureza do tombamento: Alguns autores sustentam que o tombamento é uma espécie de servidão administrativa (Celso Antônio Bandeira de Melo, Diógenes Gasparine) Outros entendem que o tombamento é espécie autônoma de intervenção estatal restritiva na propriedade (José dos Santos Carvalho Filho, Maria Silvia Zanella Di Pietro) Posição mais aceita. o tombamento incide sobre qualquer bem que tenha valor cultural, artístico, histórico arqueológico ou paisagístico. existem outras formas de proteção do patrimônio cultural, por exemplo, a desapropriação, o exercício regular do poder de polícia, a propositura de ações judiciais coletivas (ação popular, ação civil pública) etc. art. 216 § 1° da CF o Poder Público, com o auxílio da comunidade, "promoverá e protegerá o patrimônio cultural brasileiro, por meio de inventários, registros, vigilância, tombamento e desapropriação, e de outras formas de acautelamento e preservação". Fontes normativas art. 216 da CF Decreto-lei 25/1937 contém as regras básicas do tombamento (Lei do Tombamento). Todos os entes federados possuem competência para promover o tombamento. art. 23, III, da CF afirma que é da competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, a proteção dos documentos, das obras e de outros bens de valor histórico, artístico e cultural, dos monumentos, das paisagens naturais notáveis e dos sítios arqueológicos. competência legislativa art. 24, VII, CF prevê a competência concorrente da União, dos Estados e do Distrito Federal para legislarem sobre "proteção ao patrimônio histórico, cultural, artístico, turístico e paisagístico". A União, nesse caso, deve elaborar as normas gerais (art. 24, § 1.°, da CRFB). Questão controvertida refere-se à competência legislativa dos Municípios em matéria de tombamento. Primeira posição: os Municípios não possuem competência para legislarem sobre tombamento, pois a Constituição reconheceu apenas a competência legislativa concorrente aos demais Entes federados (art. 24, VII, da CF). Nesse sentido: Diógenes Gasparini e Maria Sylvia Zanella Di Pietro Segunda posição: há competência legislativa dos Municípios em matéria de tombamento, pois o art. 24, VII, deve ser interpretado em consonância com os arts. 23, III, e 30,I, II e IX, da CF. Os Municípios podem legislar sobre tombamento levando em consideração o interesse local ou, em caráter suplementar, a legislação federal e estadual. Nesse sentido: José dos Santos Carvalho Filho, Diogo de Figueiredo Moreira Neto, Tércio Sampaio Ferraz Júnior. Deve ser reconhecida a competência legislativa dos Municípios no tocante ao tombamento a partir da interpretação sistemática do texto constitucional (arts. 23, III, e 30,I, II e IX). Ao se reconhecer a competência municipal para legislar sobre assunto de interesse predominantemente local, admite-se a possibilidade de promulgação de leis locais que protegem o respectivo patrimônio cultural. Em âmbito federal, o IPHAN (Instituto do Património Histórico e Artístico Nacional), autarquia vinculada ao Ministério da Cultura, exerce as atribuições relacionadas ao tombamento. Objeto O objeto do tombamento é o mais amplo possível, incluindo os bens imóveis (ex.: igreja secular) e móveis (ex.: quadro histórico). O tombamento pode incidir, inclusive, em relação aos bens públicos. Trata-se do tombamento de ofício previsto no art. 5.° do Decreto-lei 25/1937. Há controvérsia, no entanto, em relação ao tombamento de bens públicos "de baixo para cima" (tombamento de bens federais por Estados e tombamento de bens federais e estaduais por Municípios). Primeira posição: impossibilidade do tombamento dos bens públicos dos Entes "maiores" pelos Entes menores. O tombamento deve seguir a lógica da supremacia do interesse: o interesse nacional (bens federais) prevalece sobre o interesse regional (bens estaduais) que, por sua vez, se sobrepõe ao interesse local (bens municipais). Aplica-se, por analogia, o art. 2.°, § 2.°, do Decreto-lei 3.365/1941, que consagra a hierarquia desses interesses na desapropriação. Nesse sentido: José dos Santos Carvalho Filho. Segunda posição: os Municípios podem tombar bens públicos estaduais e federais, assim como os Estados podem tombar bens públicos federais. Nesse sentido: STJ Existem bons argumentos para a admissão do tombamento de bens públicos federais pelos Estados e Municípios e de bens públicos estaduais, pelos Municípios: a) o art. 2.°, § 2.°, do Decreto-lei 3.365/1941, além de consagrar hierarquia de duvidosa constitucionalidade entre os interesses tutelados pelos Entes federados, deve ser interpretado restritivamente, pois se trata de norma excepcional (a desapropriação é uma exceção ao direito fundamental de propriedade); e b) deve ser realizado o processo de ponderação entre as normas constitucionais em conflito no caso: de um lado, o princípio federativo (art. 18 da CF) e, de outro lado, a proteção do patrimônio cultural (art. 216, § 1.°, da CF). a legislação veda o tombamento de determinados bens (vedações jurídicas de tombamento) art. 3.° do Decreto-lei 25/1937 exclui do patrimônio histórico e artístico nacional as obras de origem estrangeira das representações diplomáticas ou consulares acreditadas no País; que adornem quaisquer veículos de empresas estrangeiras, que façam carreira no País; que sejam trazidas para exposições comemorativas, educativas ou comerciais; que sejam importadas por empresas estrangeiras expressamente para adorno dos respectivos estabelecimentos, entre outras. Essas obras, ao serem excluídas do conceito de património histórico e artístico nacional, não são passíveis de tombamento. Classificações primeira classificação: leva em consideração o procedimento necessário para realização do tombamento. De acordo com essa classificação, o tombamento pode ser classificado em três espécies: a) tombamento de ofício (art. 5.° do Decreto-lei 25/1937): é o tombamento de bens públicos que se instrumentaliza de ofício pelo Ente federado que deve enviar notificação à entidade proprietária do bem; b) tombamento voluntário (art. 7.° do Decreto-lei 25/1937): é realizado mediante consentimento, expresso ou implícito, do proprietário. O tombamento voluntário pode ser efetivado: b.1) por requerimento do próprio proprietário, hipótese em que o órgão ou entidade técnica verificará se o bem tem relevância para o patrimônio histórico e cultural; ou b.2) por iniciativa do Poder Público, quando o particular, após a notificação para manifestação no prazo de 15 dias, deixa de impugnar ou concorda expressamente a intenção do tombamento; c) tombamento compulsório (arts. 8.° e 9.° do Decreto-lei 25/1937): é aquele realizado contra a vontade do proprietário. Após ser notificado, o proprietário apresenta impugnação, dentro do prazo de 15 dias, no processo de tombamento. Nessa hipótese, o órgão ou entidade técnica apresentará nova manifestação, devendo o Conselho Consultivo do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional proferir decisão. A decisão do IPHAN no sentido do tombamento depende de homologação do Ministro da Cultura, na forma do art. 1.° da Lei 6.292/1975. Em todos os casos (tombamento de ofício, voluntário e compulsório), o tombamento é consumado com a inscrição do bem no Livro do Tombo (art. 10 do Decreto-lei 2571937). segunda classificação: art. 10 do Decreto-lei 25/1937, fundamenta-se na produção de efeitos e divide o tombamento em duas modalidades: a) tombamento provisório: após a notificação do proprietário e antes de ultimado o processo com a inscrição do bem no Livro do Tombo, o bem considera-se provisoriamente tombado. Os efeitos do tombamento são antecipados para se proteger o bem durante o processo administrativo; b) tombamento definitivo: é aquele verificado após a conclusão do processo de tombamento, com a inscrição do bem no Livro do Tombo. terceira classificação: tem por fundamento a amplitude ou abrangência do tombamento: a) tombamento individual: refere-se a bem determinado. b) tombamento geral: tem por objeto todos os bens situados em um bairro ou cidade (ex.: tombamento de Brasília e da cidade de Tiradentes). quarta classificação: leva em conta o alcance do tombamento sobre determinado bem: a) tombamento total: quando a totalidade do bem é tombamento; b) tombamento parcial: quando apenas parte do bem é tombado (ex.: tombamento da fachada de uma casa histórica). Instituição e cancelamento o tombamento é instituído, após regular processo administrativo, com respeito aos princípios da ampla defesa e do contraditório, com a inscrição do bem no Livro do Tombo. a instituição depende de processo específico para cada bem que apresente valor cultural, artístico, histórico arqueológico ou paisagístico (O STJ, ao tratar do tombamento da cidade de Tiradentes (MG), afirmou que o tombamento geral não depende da individualização de todos os bens no ato do tombamento, bem como não exige a prévia notificação de cada proprietário. No caso específico, o IPHAN havia notificado o chefe da Administração Pública local (STJ, 2ª Turma, REsp 1.098.640/MG). O fato de ser instituído por atos do Poder Executivo não impede o tombamento geral de um bairro ou cidade, desde que seja dada publicidade suficiente ao processo de tombamento, oportunizando o conhecimento de todos os proprietários afetados. Exceção tombamento legal CF instituiu tombamento de "todos os documentos e os sítios detentores de reminiscências históricas dos antigos quilombos" (art. 216, § 5.°, da CF) ressalvada essa hipótese, o tombamento somente será instituído por meio de atos administrativos. o rito processual varia de acordo com o tipo de tombamento (de ofício, voluntário ou compulsório). em cada processo, o proprietário terá a oportunidade de apresentar a sua concordância ou discordância com a intenção do tombamento a discordância levará em consideração irregularidades do processo administrativo ou deverá ser necessariamente acompanhada de razões técnicas hábeis a refutar o parecer técnico do órgão ou entidade competente. O tombamento realizado pelo IPHAN pode ser cancelado ("destombamento"), de ofício ou mediante recurso, pelo Presidente da República, tendo em vista razões de interesse público (Decreto 3.866/1941). Isto não significa que o chefe do Executivo possa discordar da conclusão do IPHAN, inserindo-se na discricionariedade técnica atribuída àquela autarquia o Chefe do Executivo pode cancelar o tombamento com fundamento em outro interesse público que, mediante o processo de ponderação, deva prevalecer sobre a proteção do patrimônio cultural. Ex.: o Presidente poderia cancelar o tombamento e o Ministério da Cultura deixar de instituí-lo quando o bem estivesse localizado em área que seria inundada para instalação de usina hidrelétrica. Efeitos O tombamento produz efeitos para o proprietário do bem tombado, para o Poder Público e para terceiros (arts. 11 a 22 do Decreto-lei 25/1937) esses efeitos são provisoriamente observados desde a notificação do particular no curso do processo de tombamento. a) efeitos para o proprietário: a.1) dever de proteger o bem tombado, impedindo a sua destruição, demolição ou mutilação do bem; a.2) dever de conservação do bem, exigindo-se a autorização do órgão ou entidade competente para sua reparação, pintura ou restauração, sob pena de multa; a.3) caso não possua recursos para conservar o bem, o proprietário deve notificar o órgão ou entidade competente para realização das obras necessárias (nesse caso, a solução prática, seria a desapropriação do bem, com o intuito de transferir a propriedade ao Poder Público, que passaria a fazer a conservação regular do bem e o utilizaria para o atendimento do interesse público); a.4) o bem móvel tombado não pode deixar o País, salvo quando houver autorização expressa do órgão ou entidade responsável e por prazo determinado; a.5) notificação do Poder Público no caso de furto ou extravio do bem tombado, sob pena de multa; a.6) oportunizar o direito de preferência do Poder Público na hipótese de alienação onerosa do bem, sob pena de nulidade da transferência; b) efeitos para o Poder Público: b.1) vigilância permanente do bem tombado, podendo inspecioná-lo quando julgar conveniente; b.2) necessidade de manutenção do bem, quando o proprietário não tiver recursos para realização de obras; b.3) direito de preferência na aquisição do bem. c) efeitos para terceiros: os proprietários dos imóveis vizinhos ao bem tombado não poderão, sem prévia autorização do órgão ou entidade competente, realizar construções que impeçam ou reduzam a visibilidade do bem tombado, nem poderão afixar anúncios ou cartazes (art. 18). A dificuldade, no caso, é definir o âmbito de incidência dessa restrição ("vizinhança"). em âmbito federal, compete ao IPHAN delimitar de maneira objetiva a expressão vizinhança e informar ao respectivo Município, responsável pela concessão das licenças para construir. O particular de boa-fé, que executa obras apoiadas em licenças legítimas, não pode ser prejudicado, sendo certo que, em caso de ordem de demolição da construção, deverá ser reconhecido direito à indenização perante o IPHAN, em caso de ausência de comunicação do Poder Público Municipal, ou perante o Município, quando, ciente da abrangência da vizinhança do bem tombado, concedeu a licença para construir, criando expectativa legítima no particular. Indenização A indenização ao proprietário do bem tombado depende, necessariamente, da comprovação do respectivo prejuízo, sob pena de enriquecimento sem causa do proprietário do bem ocupado. O prazo prescricional para propositura da ação indenizatória é de cinco anos, na forma do art. 10, parágrafo único, do Decreto-lei 3.365/1941.
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