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Resumo de Psicologia Psicologia cientifica e senso comum Entende-se por Psicologia do senso comum ou Psicologia ingênua, o conjunto de ideias, crenças e convicções transmitidas culturalmente e que cada indivíduo possui a respeito de como as pessoas funcionam, se comportam, sentem e pensam. Essas crenças e convicções que estão profundamente arraigadas no ser humano carecem de fundamentação e estudo experimental, pois se sustentam nas observações do dia a dia e servem de base para as decisões que as pessoas tomam no cotidiano. Do ponto de vista da Psicologia ingênua, conhecer alguma coisa é estar consciente dela. Nesse sentido, a teoria ingênua não se refere a ideias, percepções, motivos ou sentimentos inconscientes. Em contraponto à teoria do senso comum, a teoria científica se dedica à descrição, à explicação, à previsão e ao controle do desenvolvimento do seu objeto de estudo. A ciência psicológica, para ratificar as exigências naturalistas, buscou no ser humano aquilo que respondesse às indagações quantitativas e empíricas, tendo como ferramenta central o comportamento humano. Ao se firmar apenas neste solo naturalista, acabou negando o próprio homem em sua humanidade, reduzindo-o àquilo que pudesse ser visto e medido. Objeto de estudo da Psicologia Como já vimos rapidamente, no item anterior, o objeto de estudo da Psicologia é indiscutivelmente o Homem em sua integralidade/humanidade. Homem, enquanto ser simbólico, capaz de perceber, de refletir, de sentir e de significar e resignificar o mundo constantemente. Sua capacidade de linguagem e raciocínio o possibilita transformar suas relações com o mundo e com os outros homens. Enquanto ser histórico, é capaz de criar história, de perceber passado, presente e futuro, de ter planos, projetos, medos, sonhos, expectativas e desejos. Dois grandes vetores estabelecem os caminhos para o fazer psicológico: -A concepção do ser humano Nesse instante, tentando entender os objetos da Psicologia, cabe uma indagação: Quem é, então, o Homem na Psicologia? • Há os que atribuem as características humanas a nossa herança genética, e o seu desenvolvimento a um processo de maturação. Para esses, os fenômenos psicológicos são basicamente fenômenos orgânicos (neuropsicológicos) como: a percepção, a memória, as emoções, a atenção, dentre outros. •. Outros pontuam o meio ambiente como o responsável pelo desenvolvimento de habilidades e de competências. - Modo de abordar, intervir e escutar o homem O segundo vetor refere-se ao modo de abordar, intervir e escutar o Homem. No processo de escuta se expressa tanto o que se deseja escutar, o que se pede para falar e o que é falado, o que se oferta e o que se demanda. Nesse sentido, o que é privilegiado no processo de escuta, o que é desprezado, silenciado ou acolhido, diz respeito às implicações e aos encontros que se efetuam entre os sujeitos em questão. Nessa ótica, dentre milhares de possibilidades de construção de uma entrevista, de uma escuta, duas delas nos interessam particularmente: a escuta-surda e a escuta-experimentação. Teorias da Psicologia - Psicanalise O método básico da Psicanálise é a interpretação da transferência e da resistência com a análise da livre associação. O analisado, numa postura relaxada, é solicitado a dizer tudo o que lhe vem à mente. Sonhos, esperanças, desejos e fantasias são de interesse, como também as experiências vividas nos primeiros anos de vida em família. Escutando o analisado, o analista tenta manter uma atitude empática de neutralidade. Uma postura de não julgamento, visando a criar um ambiente seguro. Desde Freud, a Psicanálise se desenvolveu de muitas maneiras e, atualmente, há diversas escolas que mesmo discordando em alguns pontos da teoria freudiana não refutaram a ideia de inconsciente, pedra basilar da Psicanálise, e criaram suas próprias linhas de pesquisa. - Behaviorismo O termo behaviorismo vem do inglês behavior, comportamento. Em português, podemos dizer tanto behaviorismo como comportamentalismo. Skinner, fazendo uso de experimentos com animais, desenvolveu o conceito de condicionamento operante tomando como base as noções de punição, reforço positivo e reforço negativo. Em outras palavras, um comportamento vai ser controlado pelo que aconteceu antes e pelo que pode acontecer depois. Para o psicólogo, a Psicologia não poderia utilizar elementos não observáveis para explicar a conduta humana. Por exemplo, um aluno ao ser demandado a falar e apresentar em sala de aula seu ponto de vista, o faz com argumentos claros, transparentes, e por isso é valorizado e reconhecido pelo professor e colegas, tende a assumir esse comportamento como aceito e adequado e consequentemente repeti-lo. - Humanista A Psicologia Humanista não tem como propósito fazer uma revisão ou adaptação de conceitos psicológicos já existentes, mas de ser uma nova contribuição na área da Psicologia. Seus principais teóricos foram Carl Rogers e Abraham Maslow. Na esfera organizacional, Maslow, em 1962, desenvolveu o conceito de motivação atrelado ao modelo de hierarquia de necessidades construída com base numa pirâmide, na qual as necessidades são assim firmadas. Na base na pirâmide estão as necessidades fisiológicas, em seguida, as necessidades de segurança, necessidades sociais, de estima, e no topo da pirâmide, as de auto realização. Em outras palavras, primeiro buscamos satisfazer: A -Necessidades fisiológicas — como fome e sono; B -Segurança — emprego, família, saúde; C -Amizade, relacionamentos amorosos; D -Necessidades de estima; E -Realização pessoal. - Gestalismo O gestaltismo, influenciado pelo fisiologismo, é uma corrente que deu uma importante contribuição na construção da Psicologia como ciência. O princípio básico da Teoria Gestalt é que a organização dos dados que nos cercam é parte do processo perceptivo. Para os psicólogos dessa linha teórica, toda percepção é uma gestalt, um todo que não pode ser compreendido pela separação em partes. Acreditam que uma pessoa percebe uma situação inteira em vez de seus elementos individuais. Assim, o todo é mais do que meramente a soma dos elementos, porque as pessoas tendem a organizar os elementos de uma situação e depois acrescentam os elementos da experiência passada. Isto é, o todo é mais que a soma das partes. Assim, de acordo com os pressupostos da Gestalt, para aprender um assunto, você deve, em primeiro lugar, ter uma visão de conjunto do texto, do fato, do livro e depois estudar as partes. Finalmente, ao juntar as partes, numa síntese, vai verificar que a totalidade (Gestalt), a compreensão, o entendimento do texto não são apenas a soma das partes que você estudou. Segundo esses teóricos, as informações do meio externo são processadas em dois níveis: sensação e percepção. Apesar de ser possível diferenciá-los, sentir e perceber é, na realidade, um processo único, que é o da recepção e interpretação de informações. Entretanto, percepção não deve ser confundida com sensação. Sensação é o dado não processado recebido por um indivíduo através dos sentidos, é como uma simples consciência dos componentes sensoriais e das dimensões da realidade (mecanismo de recepção de informações). Percepção supõe as sensações acompanhadas dos significados que lhes atribuímos como resultado da nossa experiência anterior. Pode-se dizer que percepção é atribuição de significado à informação recebida pelos sentidos. Desenvolvimento humano Desenvolvimento é um processo que tem início na concepção e só termina com a morte. O estudo do desenvolvimento humano é o conhecimento da história do homem desde o seu nascimento (mesmo antes dele), até a sua morte. Na verdade, é compreender o que ocorre em cada idade, cada fase da vida. Os psicólogos do desenvolvimento estudam a interação entre os padrões biologicamentepré-determinados e um ambiente dinâmico, em constante mudança. Mas, quais seriam os fatores importantes para o desenvolvimento humano? Os fatores básicos são dois: a hereditariedade e o ambiente. A hereditariedade é formada pela composição genética do indivíduo que influencia o crescimento e o desenvolvimento ao longo da vida. O ambiente pode ser constituído das influências dos familiares, das amizades, a educação, a nutrição e todas as experiências as quais as pessoas estão expostas. Sem a presunção de esgotar o tema, e muito menos de afirmar que esta ou aquela teoria é a melhor ou a mais completa para explicar o desenvolvimento humano, apresentaremos algumas abordagens que nos parecem ser interessantes para a utilização em análises jurídicas, nesta área. Freud (já apresentado no capítulo anterior), no início do século XX, realizou estudos sobre o desenvolvimento humano, que geraram polêmica no meio científico. Para esse autor, os primeiros anos de vida são fundamentais na formação da personalidade. De acordo com Freud, é a partir da infância que se estrutura a vida adulta, tanto para a saúde mental e adaptação como para o comportamento patológico. Para ele, o ser humano passa por diferentes estágios, no seu desenvolvimento, que são marcados pela evolução da sua psicossexualidade. Um dos seguidores da Escola criada por Freud (Psicanálise), Erik Erikson destacou a importância da sociedade para o desenvolvimento humano. Para Freud, como já vimos, as primeiras experiências na infância moldam o indivíduo; para Erikson, o desenvolvimento continuaria por toda a vida e seria influenciado pela sociedade. Sendo assim, o desenvolvimento para Erikson tem um aspecto psicossocial e está dividido em oito estágios durante o ciclo vital. Cada estágio envolve uma crise que surge de acordo com a maturação do indivíduo e que deve ser resolvida de forma satisfatória para um desenvolvimento saudável. Alguns autores da Psicologia Geral e do Desenvolvimento, como Holmes (1977), Bee (1997) e Tyson (1993), citados por Trindade (2007), dividiram os estágios do desenvolvimento e descreveram as características de cada etapa, segundo aspectos físicos, intelectuais, sociais e emocionais. Acreditamos que seja um material importante para o seu aprendizado, nesta área, e vamos apresentá-lo a seguir: Personalidade Todos nós ouvimos, lemos e usamos, muitas vezes, a palavra personalidade. Geralmente, falamos: “Fulano tem uma personalidade forte. ” E “Fulana, coitada, não tem personalidade”. Mas será que empregamos esse termo como o psicólogo estuda e entende? Existem vários significados para a palavra personalidade, dependendo do campo de estudo em que ela esteja sendo usada, por exemplo, no Direito, na Filosofia, na Teologia, na Sociologia, na Psicologia etc. Vamos, então, entender o que o psicólogo considera personalidade e como ele a avalia. Primeiro, vejamos a origem da palavra. A palavra personalidade parece ter se originado de persona. Este era o nome dado à máscara que os atores do antigo teatro romano usavam para representar seus papéis. Você deve estar percebendo que, pela origem da palavra, estamos falando de aparência externa da pessoa, assim como falamos no início do Fulano e da Fulana. Para os psicólogos, de uma forma geral, a personalidade pode ser definida como um padrão de características duradouras que produzem consistência nas atitudes, comportamentos e individualidade. Explicando melhor, nossa personalidade é única e nos diferencia dos outros. Para o profissional da área do Direito, é importante um conhecimento geral destes estudos, para que, em um trabalho interdisciplinar, este profissional possa entender o que o psicólogo está interpretando e, desta forma, possa utilizar melhor esse conhecimento em suas argumentações. Abordagens psicodinâmicas da personalidade Essas abordagens se baseiam na ideia de que a personalidade é formada por forças e conflitos internos sobre as quais as pessoas têm pouco conhecimento e, consequentemente, sobre os quais têm pouco controle. Freud descreveu a estrutura da personalidade em três componentes que são apresentados, de forma didática, em separado, mas são interativos e relacionados a aspectos conscientes e inconscientes. São eles: Id, Ego e Superego. Eles são conceitos abstratos que descrevem uma interação que motiva o nosso comportamento. Em linhas gerais, e para não nos estendermos em apenas uma teoria, o Id é a parte mais primitiva da personalidade, buscando o máximo de satisfação. O Ego busca equilibrar os desejos do Id e a realidade do mundo objetivo externo, mantendo o indivíduo em segurança e integrado à sociedade. E o Superego representa o que é certo e errado em uma sociedade, conforme o que foi apresentado pelo ambiente, que no início do desenvolvimento está representado pela família, professores e pessoas significativas para o indivíduo. Abordagens sóciocognitivas Estas abordagens enfatizam a influência da cognição — pensamentos, sentimentos, expectativas e valores — e da observação do comportamento de outras pessoas na determinação da personalidade. Por exemplo, uma criança que vê uma pessoa importante na sua vida se comportando de forma agressiva, tenderá a se comportar de forma semelhante. Nessas teorias são desenvolvidos estudos, principalmente, sobre a autoeficácia e a autoestima. Abordagens Humanistas Os teóricos desta abordagem acreditam que a base da personalidade está na habilidade humana consciente e automotivada de mudar e se aprimorar. A bondade é inerente às pessoas, assim como a tendência humana de buscar propósitos mais elevados. As pessoas têm uma necessidade fundamental de buscar a autorrealização. Esse processo pode ser vitalício para alguns, e outros podem nunca alcançar. Outra necessidade básica, nessas teorias, é o desejo de ser amado e respeitado. Um aspecto importante, nessas abordagens, diz respeito à consideração positiva incondicional em relação ao outro. Abordagens biológicas e evolucionistas Essas abordagens sugerem que os componentes da personalidade são herdados. A personalidade é determinada, em parte, pelos nossos genes. Complementando, as características da personalidade que tiveram sucesso entre os nossos ancestrais apresentam mais chances de serem preservadas e passadas para as próximas gerações. Abordagem dos traços da personalidade Você deve estar se perguntando, o que seriam traços e o que eles têm a ver com a nossa personalidade. Traços, para os teóricos dessa abordagem, seriam características do comportamento consistentes, que aparecem em diferentes situações. Estes estudos buscam identificar os traços básicos que formam a personalidade das pessoas. O grau em que os traços se apresentam nas pessoas variam. O principal desafio, para esses teóricos é identificar os principais traços predominantes em nossa personalidade. Estes estudos explicam a personalidade em termos de traços, mas diferem em termos de quais e quantos traços são considerados mais flexíveis. Uma das abordagens mais conhecidas nesta área de estudo é a dos cinco traços ou fatores. Estes traços são: socialização/amabilidade, extroversão, realização/conscenciosidade, abertura para experiências, e neuroticismo. Os testes psicológicos são medidas criadas para avaliar o comportamento e a personalidade utilizadas pelos psicólogos. Eles devem ter fidedignidade e validade. Mas, será que podemos medir tudo o que somos? É lógico que não. No entanto, algumas características podem ser avaliadas. Vejamos, resumidamente, com quais instrumentos o psicólogo pode avaliar estas características: Psicologia social No Capítulo 1, você teve contato com a Psicologia Social pelo viés da matriz sócio-histórica. Podemos entender, também, a Psicologia Social como um estudo das condutas humanas que são influenciadaspor outras pessoas. Isto é, o seu objeto de estudo, somos nós mesmos, participando das mais variadas interações sociais. Como bem esclarece o psicólogo social Helmut Krüger. Um dos principais temas de pesquisa da Psicologia Social é o das atitudes sociais, que veremos a seguir. Definição de atitudes sociais Para o senso comum, atitude é sinônimo de comportamento. Por exemplo: Fulana tomou uma atitude com relação ao seu chefe. Em geral, a atitude de tornar a situação clara é coerente com o comportamento, por exemplo, de Fulana ir conversar com seu chefe. Você já deve ter percebido que atitude é uma predisposição mental e comportamento é a ação. Para ficar mais claro, podemos entender atitude como uma organização duradoura de pensamentos e crenças (cognições), dotada de uma carga afetiva pró ou contra um objeto social que predispõe o indivíduo para a ação. Os componentes das atitudes então serão: a cognição, o afeto e o comportamento. Retornando ao nosso exemplo anterior, a atitude de Fulana de gostar das situações esclarecidas tem origem nas suas experiências subjetivas, que incluíram uma avaliação da situação, influenciando o seu comportamento, que é ir conversar com seu chefe. As atitudes são construídas ao longo da história de vida do sujeito. São aprendidas por meio da vivência da pessoa, da imitação e da observação. Neste momento, torna-se necessário apresentar o seguinte esclarecimento: conhecer, poder explicar e prever são acontecimentos ligados a variáveis ideológicas, políticas e morais, que fazem parte de nossas atitudes. Agora, já podemos explicar preconceito, estereótipo e discriminação. Preconceito, estereótipo e discriminação Considera-se preconceito uma atitude que apresenta duas características específicas: se forma sempre em torno de um núcleo afetivamente negativo; e é dirigido contra um grupo de pessoas. Estamos falando de preconceitos étnicos, religiosos, políticos, culturais, ideológicos e profissionais. Pela sua amplitude e gravidade, é de interesse social investigar as suas causas e construir técnicas psicológicas como forma de prevenção, controle ou extinção. Temos também os estereótipos que são colocações de certas características a pessoas pertencentes a determinados grupos sociais. Os estereótipos podem ser definidos por atitudes positivas ou negativas, em relação a estas pessoas. Comece a pensar em alguns estereótipos positivos e negativos. E, por fim, a discriminação, que é o comportamento que deriva do preconceito e do estereótipo. Geralmente, a discriminação é negativa e pode intensificar-se em situações de crise (política, econômica, social e emocional). Mas por que razão existem estereótipos, preconceitos e discriminações? Para a Psicologia, os estereótipos nos permitem simplificar a realidade social. Por meio deles, reconhecemo-nos em determinado grupo e nos diferenciamos de outros grupos. Sempre que nos sentimos pertencentes a um grupo, desenvolvemos sentimentos de proteção com quem nos identificamos, e de hostilidade e rejeição em relação aos diferentes de nós. Como já vimos, a discriminação é o resultado dos dois fatores descritos, preconceito e estereótipo. Em cada cultura, em cada época, existem diferentes formas de discriminação e diferentes grupos-vítimas desta atitude. E o estigma? Qual a sua relação com todos estes conceitos? Estigma A sociedade estabelece um modelo de categorias e tenta catalogar as pessoas de acordo com os atributos considerados naturais e comuns para ela. Alguém que demonstra pertencer a uma categoria com atributos incomuns ou diferentes e pouco aceitos pelo grupo social, ou em casos extremos, é considerado mal e perigoso. Dessa forma, essa pessoa estigmatizada é anulada quanto à sua produção técnica, científica e humana. A sociedade limita e delimita a ação do sujeito estigmatizado, marcando-o como desacreditado e determinando os malefícios que pode causar. Quanto mais visível for a “marca”, menor será a possibilidade de reverter esta situação. E agora, chegamos aos conceitos de normalidade e anormalidade ou comportamento patológico. História da família O ser humano ao nascer é completamente dependente. Para se manter vivo, ele necessita de outro ser humano que o alimente, o mantenha aquecido, cuide dele física e emocionalmente. A família é, em princípio, o primeiro grupo ao qual o ser humano pertence. A família, enquanto instituição, pode ser entendida como uma construção social que varia ao longo da história da humanidade, portanto, vem sofrendo algumas importantes modificações no decorrer dos tempos. Na civilização romana antiga, a consanguinidade (o parentesco biológico) não era necessária para o pertencimento à família. Se partirmos da família patriarcal, observaremos que esta não era composta apenas de marido, mulher e filhos. Ela se caracterizava como família extensa e poderia incluir parentes, criados, escravos, e todos aqueles que vivessem sob o comando do patriarca. O sentimento de família, como nós o conhecemos, começou a ser desenvolvido a partir do século XVI. Antes disso, a família não era entendida como um espaço privado. As relações sociais não permitiam a intimidade da vida familiar, e a casa da família era considerada, socialmente, um lugar público. A família se firmou como base de sustentação da sociedade. A família patriarcal evoluiu e deu lugar à família caracterizada como um grupo vinculado pelo afeto. A família moderna passou a ser compreendida como uma entidade socioafetiva que tem o dever de afeto entre os seus membros. É no seio familiar que são transmitidos os valores morais e sociais que servirão de base para o processo de socialização da criança, bem como as tradições e os costumes perpetuados através de gerações. Hoje não mais se espera que os sujeitos permaneçam presos a um casamento infeliz, e muitos casais optam pela ruptura do vínculo em caso de insatisfação mesmo que transitória. Não mais se aceita o casamento sem desejo e sem amor, e as exigências atuais do individualismo pressionam os parceiros no sentido da ruptura de uma relação que não se encaixe nos moldes considerados ideais. Em princípio, o laço conjugal só se mantém se for capaz de proporcionar satisfações a ambos os parceiros. Novas formas de amar e de se relacionar vão sendo construídas para responder às exigências de uma sociedade onde os valores estão em constante mutação. A contemporaneidade produz a crença de que a conjugalidade não deve interferir na individualidade e, cada vez mais, os indivíduos parecem acreditar que não se deve abrir mão do prazer em nome da estabilidade da relação conjugal. Tipos de famílias Família nucelar Quando pensamos na família padrão, dita tradicional, referimo-nos à família nuclear, tal como estabelecida entre os séculos XIX e XX. Na segunda metade do século XX, novas formas de família começam a ser construídas, causando estranheza. O aumento do número de casais separados provocou diversos arranjos familiares que, inicialmente, confrontados ao modelo tradicional, geravam preconceito. Vale lembrar que, em época não tão distante, eram comuns as profecias sobre o destino dos filhos de pais separados e os problemas emocionais que os atingiriam. A tendência da sociedade, em seu processo de transformação, foi tornar-se cada vez mais flexível para acolher novas configurações das relações conjugais e familiares. O casamento formal, heterossexual com fins de constituição da família, continua sendo uma referência e um valor importante, mas convive com outras formas de relacionamento conjugal como as uniões consensuais, os casamentos sem filhos ou sem coabitação, e também as uniões homoafetivas. Também a família nuclear ou tradicional, ou seja, pais casados morando junto com seus filhos biológicos, convive com novas configurações familiares não mais definidas pelo biológico e pelo conjugal. Os novosarranjos familiares são formas de ligação afetiva que fogem aos padrões considerados tradicionais como as famílias monoparentais, reconstituídas, adotivas, homoafetivas com filhos adotivos ou nascidos por inseminação artificial. Encontramos, cada vez mais, recomposições familiares e recasamentos sucessivos de um ou de ambos os pais, tendo ocorrido as separações quando os filhos ainda eram bebês. A família monoparental É aquela em que apenas um dos pais de uma criança arca com as responsabilidades de criar o filho. Isto ocorre, por exemplo, quando o pai não reconhece o filho e abandona a mãe, quando um dos pais morre ou quando dissolvem a família pela separação ou divórcio. Observa-se, na atualidade, um número cada vez maior de famílias monoparentais. Na realidade brasileira, com frequência encontramos famílias chefiadas por mulheres, arcando com o sustento e a educação dos filhos sem a participação paterna. Famílias monoparentais podem ser beneficiadas por uma rede de apoio social e afetiva, ou seja, pela presença de pessoas significativas, sejam da família extensa, amigos ou membros da comunidade, com os quais possam manter relações afetivas. As redes funcionam suprindo, em parte, as funções da figura parental ausente, impedindo o isolamento e ajudando na socialização das crianças. Famílias recompostas O crescente número de divórcios vem sendo acompanhado de um número igualmente crescente de famílias recompostas: aquelas em que ao menos um dos membros do casal possui filhos de relações anteriores. A família reconstituída define-se pela presença, no lar, de filhos provenientes de uniões anteriores de um ou de outro cônjuge, ou seja, uma pessoa que já tem uma família leva seus filhos, oriundos desta família, para conviverem com a sua nova relação, que pode também já ter filhos. Não existe uma família recomposta típica, pois cada um dos parceiros pode já ter tido um ou mais casamentos, um ou mais filhos das relações anteriores, residindo ou não com eles, e filho (s) gerado (s) no casamento atual. Famílias homoafetivas As famílias homoafetivas colocam em questão o modelo tradicional fundado na reprodução biológica e a heterossexualidade do casal, pois as crianças não nasceram de sua união sexual. O desejo de filho e de formar família não é mais privativo dos casais heterossexuais, visto que sujeitos vivendo uma relação homoafetiva recorrem cada vez mais à adoção ou a procedimentos advindos da Biotecnologia. A homoparentalidade levantou questões sobre se o exercício das funções parentais deveria estar vinculado ao gênero dos pais ou se qualquer sujeito, em uma relação homoafetiva, poderia exercê-las. Pesquisas atuais têm encontrado resultados que confirmam esta última hipótese. Verifica-se que a saúde psíquica dos pais e as motivações inconscientes implicadas no desejo de ter um filho, e não o seu sexo, são aspectos a serem privilegiados quando se trata de pensar a parentalidade. A opção por não constituir família Existe, ainda, outra situação que vem sendo observada com alguma regularidade e nos leva a desconstruir o conceito de casamento referido à formação de uma família. Isso porque o casamento contemporâneo não necessariamente envolve um projeto de filiação e descendência e vem crescendo o número de casais que optam por não ter filhos. Existe, porém, ainda uma estigmatização e uma pressão social sofrida por casais que optam por não ter filhos. Muitas mulheres relatam que sentem o preconceito, principalmente, quando são rotuladas de egoístas. Família extensa Entende-se por família extensa ou ampliada aquela que se estende para além da unidade pais e filhos ou da unidade do casal, formada por parentes próximos com os quais a criança ou adolescente convive e mantém vínculos de afinidade e afetividade. A construção da parentalidade: relações afetivas Historicamente, a tarefa de cuidar tem sido associada ao gênero feminino, e o papel de mãe ainda é idealizado culturalmente, sendo o amor materno ainda cobrado como incondicional. Entretanto, uma mulher pode ser “normal” sem ser mãe, e nem toda mãe tem um impulso irresistível de se ocupar do filho. Observam-se diferentes circunstâncias nas quais não existem condições propícias ao apego, e o sentimento de amor por um filho simplesmente não ocorre. O amor materno, portanto, não é uma norma, mas é adquirido ao longo dos dias passados ao lado do filho, e por ocasião dos cuidados que lhe são dispensados. Da mesma forma, não se pode falar de uma essência masculina, de caráter abstrato e universal, mas, sim, de um homem e de um pai multifacetados, situados temporal e relacionalmente. Assim, masculino e feminino são categorias inscritas no social que ganham significados diversos em função do contexto. Partindo dessas considerações, é possível afirmar que a parentalidade não se estabelece automaticamente a partir da chegada de um filho, mas é um complexo e lento processo. Não basta ser genitor ou genitora, há um trabalho psíquico a ser feito para alguém tornar-se pai ou mãe e investir afetivamente a criança, reconhecendo-a como filho. Assim sendo, costuma-se dizer que qualquer criança, não importando em que tipo de família esteja inserida, precisa ser adotada. Se a filiação não está apoiada apenas na realidade genética, mas deve ser fundada no desejo e na disponibilidade de assumir a função parental, a expressão “laços do coração”, utilizada para caracterizar a filiação adotiva, poderia ser referida a qualquer filiação, seja ela adotiva ou não. São laços fundados no desejo dos pais e em sua disponibilidade de assumir a função parental. Entretanto, não é apenas o fato de ter o sobrenome daqueles que se intitulam pais que irá inscrever o sujeito em uma família. É necessário também que tenha sido tratado, educado e mantido por aqueles como filho e, portanto, reconhecido como tal pela sociedade e pela família. São fatos que constituem uma “verdade socioafetiva” e atribuem o estatuto de pais àqueles que amam e educam. A filiação afetiva ganha cada vez mais espaço e diferentes adultos podem assumir funções parentais, mesmo não sendo os pais legais nem os genitores. No caso de uma adoção não existe gestação, mas os pais adotivos vão falar de uma “gestação psicológica”, que indica seu desejo de receber a criança adotada como filho. Qualquer processo de construção da parentalidade se inicia com uma criança imaginária, sonhada pela mãe durante a gravidez. Também no período de espera pela chegada do filho adotivo, seus pais vão construir, em seu imaginário, as características da criança que aguardam, e fantasiar os pais que irão ser. Este processo faz parte do investimento afetivo que precede a chegada de um filho. Caso isso não ocorra, as crianças adoecem na medida em que não encontram resposta às suas necessidades de amor e reconhecimento. Ao segurar a criança, olhá-la, investir nela seu afeto, a mãe, adotiva ou não, fornece ao filho a experiência de ser contido e possibilita-lhe construir uma identidade. Ela lhe transmite seu desejo e as expectativas que fabricou sobre o lugar que o filho iria ocupar em sua vida. Não é difícil perceber o quanto uma criança parece reviver tão logo uma adoção é feita por pais investidos e determinados. Conjugalidade X Parentalidade: separações e recasamentos A vida em casal é ainda hoje sentida como um dos principais espaços psíquicos de satisfação, neste sentido, o laço conjugal tem um valor organizador que justificaria a troca de uma parcela das possibilidades de felicidade por uma parcela de segurança. Um dos grandes desafios dos casais da atualidade é redefinir expectativas e idealizações sobre o casamento. Isso significa ultrapassar a dificuldade de lidar com frustações e com os limites do parceiro. Dois sujeitos, com suas diferentes histórias de vida, se unem e estabelecem uma relação, uma conjugalidade. A criançaé o elemento que inaugura a família e são os laços afetivos que organizam o grupo familiar. O casal conjugal funda-se nas relações sexuais e no afeto recíproco entre os cônjuges, enquanto o casal parental, responde pela necessidade de levar bem a criação de seus filhos. Embora o divórcio possa ser, às vezes, a melhor solução para um casal cujos membros não se consideram capazes de continuar tentando ultrapassar suas dificuldades, ele é sempre vivenciado como uma situação extremamente dolorosa e estressante. A separação provoca, nos cônjuges, sentimentos de fracasso, impotência e perda, havendo um luto a ser elaborado. O fracasso conjugal dos pais não impede que se continue a assegurar conjuntamente as funções parentais. Os laços conjugais se rompem, mas há necessidade de cuidar dos laços parentais. Portanto, mesmo que o laço matrimonial se desfaça, espera-se que o laço parental se fortaleça e, idealmente, os ex-cônjuges devem permanecer pais em conjunto e de comum acordo. O número crescente de separações parentais tem exigido que o valor dos vínculos de filiação seja reforçado a fim de que estes se tornem pontos de apoio suficientemente sólidos e permitam à criança definir-se socialmente e diferenciar-se psiquicamente. Quando pai/mãe e filho deixam de viver juntos, espera-se que a relação entre eles permaneça sólida, e que a relação entre pai e mãe esteja suficientemente elaborada para que todos possam sustentar com clareza os lugares que ocupam. Ou seja, espera-se que os filhos não precisem ocupar o lugar de um dos pais nem que disputem o lugar do ex-cônjuge. Um aspecto importante ainda a ser considerado é o justo desejo de ambos ex- cônjuges de terem suas vidas afetivas refeitas. Após a separação, a criança é levada, por vezes, a integrar uma ou duas novas famílias em decorrência da trajetória da vida de seus pais. Com isto, a criança irá se defrontar com a multiplicação dos papéis parentais e a distribuição da função de pai e mãe para outros homens e mulheres, na medida em que padrastos e madrastas passam a conviver com ela. Os cônjuges dos pais, sem substituir os pais biológicos, são relevantes na nova dinâmica familiar que se estabelece. É bem verdade que não existe um estatuto que dê legitimidade a sua participação na vida dos enteados, ou seja, não existe uma lei que reconheça o vínculo entre enteado e padrasto ou madrasta ou que estabeleça direitos e deveres para regular esta relação. Tantas são as configurações possíveis que não se conseguiria definir antecipadamente que lugar irá ocupar a madrasta ou o padrasto na vida de uma criança. Eles podem ser chamados a exercer algumas prerrogativas em relação à criança, mas, por exemplo, é comum observar-se que o padrasto exerce apenas a função que a genitora de seus enteados lhe conceder. O papel social de padrastos e madrastas precisa ser inventado no cotidiano vivenciado por eles. A construção desta relação não necessariamente reproduzirá os estereótipos das madrastas dos contos de fada. Vale lembrar como muitos enteados vêm substituindo a palavra “madrasta” por “boadrasta”. Entretanto, pode ocorrer que o vínculo do pai com quem não se convive seja tão intenso, que a criança se recuse a investir no novo companheiro da mãe com quem passa a conviver. O sucesso dessas construções dependerá do tipo de relação estabelecida entre os pais, entre estes e os novos cônjuges e do lugar que a criança ocupará em cada uma das suas novas famílias. Famílias que introduzirão em suas vidas novos personagens, na medida em que passam a conviver com um número maior de “avós”, “tios” e “primos”. Como vimos até agora, é fundamental que a figura parental que estiver provisoriamente ausente do cotidiano do filho, em decorrência da separação, deva poder continuar convivendo com ele sem que se faça um movimento de tentar substituí-lo pelo novo parceiro do pai ou da mãe. O princípio constitucional do melhor interesse da criança Com a promulgação da Constituição Federal de 1988, a convivência familiar foi entendida como um direito fundamental da infância, e a filiação socioafetiva foi valorizada. Isso porque a ordem de prioridade de interesses foi invertida, visto que antigamente, se houvesse algum conflito decorrente da posse do estado de filho, entre a filiação biológica e a filiação sócioafetiva, os interesses dos pais biológicos se sobrepunham aos interesses do filho. Dentre os princípios norteadores que são estabelecidos para a família está o princípio do Melhor Interesse da Criança, previsto em seu artigo 227, mas também no Estatuto da Criança e do Adolescente em seus artigos 4º e 5º. Isso significa que, ao tratar da filiação, os operadores do Direito devem observar o que realmente é o melhor para a criança e/ou adolescente, de modo a favorecer sua realização pessoal, independentemente da relação biológica que tenha com seus pais. A Constituição consagra a Doutrina da Proteção integral. A criança passa a ser sujeito de direitos, nas diversas esferas sociais e jurídicas, e a ela devem ser concedidos cuidados essenciais para viver com saúde, incluindo a física, a emocional e a intelectual. O artigo 227 já citado estipula ser dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. A guarda compartilhada No processo de dissolução do vínculo conjugal por separação judicial ou pelo divórcio consensual, espera-se que os pais possam entrar em acordo sobre a guarda dos filhos. Até recentemente, o mais comum era a adoção do modelo de guarda unilateral, geralmente concedida à mãe, por se acreditar que ela teria melhores condições para exercê-la. Esse modelo baseava-se em preconceitos e teorias hoje questionadas de que apenas a mulher teria condição, inerente ao seu gênero, de cuidar dos filhos menores. A crença de que os filhos não podiam ficar sem os cuidados da mãe fazia com que o cuidado masculino fosse considerado dispensável, provocando certa desresponsabilização paterna frente aos cuidados e envolvimento com os filhos. Com base nesse modelo de guarda, cabia ao pai visitas quinzenais aos fins de semana, um rodízio em datas especiais e metade das férias dos filhos. Muitos desses pais se descreviam como “pais de fins de semana” ou pais “Mac Donald’s”, sofrendo com o afastamento do convívio dos filhos. Alguns deles, durante o tempo em que estiveram casados, não se encarregavam de tarefas domésticas nem dos cuidados básicos prestados aos filhos, mas descobrem, após a separação, que são bem mais competentes do que supunham nas atividades até então ditas femininas. Por outro lado, algumas mães que haviam obtido a guarda unilateral sentiam-se sobrecarregadas, sem condições de se desenvolver afetiva, profissional e economicamente, quando o ex-companheiro se limitava a ser “pai Mac Donald’s”, reservando apenas ao lazer de fim de semana a convivência com os filhos. Observa-se ser comum, nestas situações, que as crianças construam uma imagem da mãe como impositiva e “chata”, enquanto o pai é percebido como divertido e liberal. As mulheres foram conquistando, em nossa sociedade, igualdade de direitos e oportunidades, mas também os homens têm buscado ocupar um maior espaço no cotidiano familiar e igualdade de direitos na participação da educação dos filhos. Com as transformações sociais, com as alterações na dinâmica familiar, começa a ficar evidente o quanto a manutenção da presença contínua de ambos os genitores é importante para a criança. Pai e mãe são modelos de identificação para seus filhos e não se justificaria que qualquer um deles perdessea possibilidade de um convívio em decorrência da separação parental. Os pais passam a questionar, inclusive na Justiça, seu direito de participar mais ativamente na vida dos filhos. Alienação parental Dificuldades no exercício da parentalidade e divergências entre os pais quanto às decisões relativas à educação e ao cotidiano dos filhos podem dar margem a demandas feitas à Justiça. A alienação parental tem sido cada vez mais alegada pelas partes em litígio nos processos inerentes às Varas de Família. Veremos como a Alienação Parental fere o melhor interesse da criança, pois o interesse dos pais prevalece sobre os interesses dos filhos, provocando danos em seu desenvolvimento. O termo alienação parental foi utilizado em meados dos anos 1980 por Richard Gardner, indicando a existência de um distúrbio psíquico. Por este motivo, o autor denominou de Síndrome de Alienação Parental (SAP) o que seria um distúrbio infantil provocado em menores de idade expostos às disputas judiciais entre seus pais. A criança demonstraria uma intensa rejeição a um dos genitores (o genitor alienado) como resultado de manipulação psicológica realizada pelo outro genitor (o genitor alienador), sem que houvesse uma justificativa para isso. Atualmente, questiona-se a classificação de tal comportamento como uma síndrome, pois se entende que existem muitos fatores que podem contribuir para sua ocorrência e não apenas a patologia dos genitores. Devemos considerar fatores como idade, sexo, características individuais das crianças e adolescentes além de outros presentes, no contexto familiar, que possam contribuir para minimizar os efeitos da separação e para auxiliar a criança a superar os efeitos do litígio entre os pais. Na lei nº 12.318/2010, que dispõe sobre a alienação parental, ela é descrita como sendo a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou o adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com ele. Existem 7 itens elencados, no parágrafo único do Art. 2, da referida lei, em que são exemplificadas formas de alienação parental, que correspondem a uma série de situações criadas para dificultar ou para impedir a visitação daquele que não tem a guarda do filho. Definição de violência e agressividade O Dicionário Houaiss define violência como a “ação ou efeito de violentar, de empregar força física (contra alguém ou algo) ou intimidação moral contra (alguém); ato violento, crueldade, força”. No aspecto jurídico, o mesmo dicionário define o termo como o “constrangimento físico ou moral exercido sobre alguém, para obrigá-lo a submeter-se à vontade de outrem; coação”. Algumas teorias sobre a agressividade Neste item, você recordará algumas teorias da Psicologia, no que tange suas abordagens sobre a agressividade. Você deve estar lembrado que cada teoria escolhia um objeto de estudo para desenvolver suas ideias sobre o comportamento e os fenômenos psicológicos. Agora, você terá a oportunidade de perceber a predominância desses objetos nas explicações teóricas sobre a agressividade. Este item não tem a pretensão de esgotar nem as teorias psicológicas nem o tema agressividade, que é amplo, e (porque não dizer?) inesgotável. Formas de violência Muitas vezes, em nosso cotidiano, lidamos e vivenciamos com situações em que a violência não é “perceptível”. Ou melhor, nem sempre a violência é física. Violência estrutural Começaremos com a violência estrutural. Nesse grupo de classificação da violência se enquadram aquelas violências que negam a cidadania para alguns indivíduos ou determinados grupos de pessoas, pautados principalmente na discriminação social contra os “diferentes”. Violência urbana. As formas de violência, tipificadas como violação da lei penal, como: 1) assassinatos, 2) sequestros, 3) roubos e, 4) outros tipos de crime contra a pessoa ou contra o patrimônio formam um conjunto que se convencionou chamar de violência urbana, porque se manifesta principalmente no espaço das grandes cidades. A violência urbana, no entanto, não compreende apenas os crimes, mas todo o efeito que provocam sobre as pessoas e as regras de convívio na cidade. A violência urbana prejudica a qualidade das relações sociais, destrói a qualidade de vida das pessoas. Gangues urbanas, depredação do espaço público, o trânsito caótico, as praças malcuidadas, sujeira em período eleitoral compõem o quadro da perda da qualidade de vida. Certamente, o tráfico de drogas, talvez a ramificação mais visível do crime organizado, acentua esse quadro, sobretudo nas grandes e problemáticas periferias. Um dos principais fatores que gera a violência urbana é o crescimento acelerado e desordenado das cidades. Como consequência, surgem graves problemas sociais como fome, miséria, desemprego e marginalização, que associados à ineficiência das políticas de segurança pública contribuem para o aumento dos atos de violência. Quando se trata de direitos humanos, a violência abrange todos os atos de violação dos direitos: civis (liberdade, privacidade, proteção igualitária); sociais (saúde, educação, segurança, habitação); econômicos (emprego e salário); culturais (manifestação da própria cultura) e políticos (participação política, voto). Violência institucional A violência institucional é aquela praticada nas instituições prestadoras de serviços públicos como hospitais, postos de saúde, escolas, delegacias, judiciário. É perpetrada por agentes que deveriam proteger as vítimas de violência garantindo-lhes uma atenção humanizada, preventiva e também reparadora de danos. Violência simbólica. Já a violência simbólica é um tipo de atentado, desvalorização ou restrição do patrimônio material ou imaterial de determinado grupo identificado culturalmente. Ou, em outras palavras, são relações estabelecidas entre grupos dominantes e dominados que aparecem de forma “naturalizada”. É importante ressaltar, assim como no caso da violência psicológica, que a violência simbólica é sutil e permeia nosso cotidiano de forma implícita. Ela se expressa como uma forma “legítima” de relação entre dominantes e dominados. É possível exemplificar a violência simbólica com a frequente associação feita pela mídia entre o terrorismo e os povos árabes, a presença majoritária de pessoas de cor de pele branca em comerciais de TV, ou mesmo a difusão da ideia de que homens são mais fortes que mulheres o que “justifica” serem “violentos”. Violência doméstica A violência doméstica é o tipo de violência que ocorre no lar, compreendido como o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas. Abusos sexuais a crianças e maus tratos a idosos também constituem violência doméstica. Existem cinco tipos de violência doméstica: física, psicológica, sexual, patrimonial e moral. A negligência é o ato de omissão do responsável pela criança/idoso/ outra (pessoa dependente de outrem) em proporcionar as necessidades básicas, necessárias para a sua sobrevivência, para o seu desenvolvimento. Os danos causados pela negligência podem ser permanentes e graves. Violência psicológica Violência psicológica é um tipo de violência que geralmente ocorre de forma “indireta”, como humilhações, ameaças, palavrões, privação de liberdade, entre outras. Diferente da forma “direta” e explícita da violência física é importante ressaltar o caráter implícito da violência psicológica. A agressão não ocorre necessariamente em seu corpo, mas a violência gera transtornos de natureza psicológica, constrangendo a vítima a adotar comportamentos contra sua vontade ou tirando-lhe a liberdade. Neste caso, a pessoa agredida pode se sentir culpada pelos transtornosque lhe ocorrem, o que dificulta a posterior responsabilização dos autores dessa violência. Violência sexual Encontramos também a violência sexual na qual o agressor abusa do poder que tem sobre a vítima para obter gratificação sexual, sem o seu consentimento, sendo induzida ou obrigada a práticas sexuais com ou sem violência física. A violência sexual acaba por englobar o medo, a vergonha e a culpa sentidos pela vítima, mesmo naquelas que acabam por denunciar o agressor, por essa razão, a ocorrência desses crimes tende a ser ocultada. Violência verbal Muitas pessoas confundem a violência verbal. Ela pode ocorrer através do silêncio, que muitas vezes é muito mais violento do que os métodos utilizados habitualmente, como as ofensas morais (insultos), depreciações e os interrogatórios infindáveis. Violência física E para terminar nossa exposição sobre as formas de violência, temos a violência física, que é o uso da força com o objetivo de ferir, deixando ou não marcas evidentes. São comuns, murros, tapas e agressões com diversos objetos e queimaduras. Sem maiores aprofundamentos, estudiosos afirmam que além da investigação dos comportamentos violentos, deve-se buscar estratégias de implantação de comportamentos de paz, por uma cultura de não violência (no Capítulo 5, item 5.4, você tomará contato com alguns aspectos ligados à Comunicação não violenta). Comportamentos antissociais Neste item, vamos explicar as relações, às vezes, mal interpretadas entre problemas emocionais e violência, gerando comportamentos antissociais. As “doenças” mais frequentemente relacionadas com violência são os distúrbios da personalidade, as dependências de álcool e drogas e a deficiência mental. Existe alguma evidência de associação entre violência e psicose (este termo será desenvolvido mais tarde), especialmente, nos casos de ideação paranoide, mas somente uma pequena minoria de todos os doentes que praticam atos violentos são psicóticos e uma vasta maioria de pessoas mentalmente doentes não são mais perigosas do que os membros da população geral. Os quadros psiquiátricos onde mais comumente podemos encontrar comportamentos antissociais são: distúrbio explosivo da personalidade; distúrbio antissocial da personalidade (veremos separadamente, mais adiante); distúrbio borderline da personalidade; psicose; e episódio maníaco. Distúrbio explosivo da personalidade. No distúrbio explosivo da personalidade, encontramos, como característica mais marcante, a tendência a agir impulsivamente, desprezando as eventuais consequências do ato impulsivo, acompanhada de instabilidade afetiva. Os frequentes acessos de raiva podem levar à violência ou a explosões comportamentais. Essas situações podem ser desencadeadas mais facilmente quando as suas atitudes são criticadas ou impedidas pelos outros. Este distúrbio é caracterizado pela instabilidade do estado de ânimo com possibilidades de explosões de raiva, ódio, violência ou afeição. A violência pode ser física ou verbal e as explosões de raiva fogem ao controle destas pessoas. Entretanto, estes indivíduos não têm problemas de socialização, ao contrário, são simpáticos, bem-falantes, sociáveis e educados quando fora das crises. Há uma extrema sensibilidade aos aborrecimentos causados por pequenas situações ambientais que irão produzir, nos explosivos, respostas de súbita violência e agressividade sem controle. Normalmente, chamamos essas pessoas de “pavio-curto” ou de “cinco-segundos”. Distúrbio borderline da personalidade O distúrbio borderline da personalidade é um distúrbio mental com um padrão característico de instabilidade na regulação do afeto, no controle de impulsos, nos relacionamentos interpessoais e na imagem de si mesmo. O termo borderline, que na língua inglesa significa “fronteiriço” não se refere ao limite entre um estado normal e um psicótico, mas a uma instabilidade constante de humor. São indivíduos sujeitos a acessos de ira e verdadeiros ataques de fúria ou de mau gênio, em completa inadequação ao estímulo desencadeante. Essas crises de fúria e agressividade acontecem de forma inesperada, intempestivamente e costumam ter por alvo pessoas do convívio mais íntimo, como os pais, irmãos, familiares, amigos, namoradas, cônjuges etc. Embora o borderline mantenha condutas até bastante adequadas em bom número de situações, ele tropeça em outras simples. O limiar de tolerância às frustrações é extremamente sensível nessas pessoas. Esse tipo de distúrbio da personalidade está sujeito a grandes manifestações de instabilidade afetiva, oscilando bruscamente entre emoções como o amor e ódio, entre a indiferença ou apatia e o entusiasmo exagerado, alegria efusiva e tristeza profunda. A vida conjugal com essas pessoas pode ser muito problemática, pois, ao mesmo tempo em que se apegam ao outro e se confessam dependentes e carentes desse outro, de repente, são capazes de maltratá-lo cruelmente. Eles vivem exigindo apoio, afeto e amor continuadamente. Sem isso, aparece o medo à solidão ou a incapacidade de ficar só, em presença de si mesmo. Psicose A psicose é um quadro psicopatológico clássico, reconhecido pela Psiquiatria, pela Psicologia Clínica e pela Psicanálise como um estado psíquico no qual se verifica certa “perda de contato com a realidade”. Nos períodos de crises mais intensas podem ocorrer (variando de caso a caso) alucinações (é a percepção real de um objeto inexistente), delírios (é um juízo falso da realidade), desorganização psíquica que inclui pensamento desorganizado, acentuada inquietude psicomotora (é caracterizada por um estado de excitação mental e atividade motora aumentadas), sensações de angústia intensa (estado psicológico de inquietação, de medo difuso, sem objeto aparentemente determinado e que pode ser acompanhado de manifestações orgânicas) e opressão e insônia severa (se caracteriza pela incapacidade de conciliar o sono e pode manifestar-se em seu período inicial, intermediário ou final). Tal situação mental é frequentemente acompanhada por uma falta de “crítica” ou de “insight”, que se traduz numa incapacidade de reconhecer o caráter estranho ou bizarro do seu comportamento. Desta forma surgem também, nos momentos de crise, dificuldades de interação social e em cumprir normalmente as atividades de vida diária, podendo gerar comportamentos violentos, muitas vezes, defensivos e em função das alucinações ou delírios decorrentes de seu estado. Episódio maníaco O episódio maníaco é caracterizado por uma excitação eufórica do humor, por uma intensa agitação motora, distraibilidade, logorreia e por uma reduzida necessidade de sono. O sujeito pode supervalorizar-se e fazer coisas que normalmente não faria, pois distorce a realidade de modo a não enxergar os perigos envolvidos em suas ações. A agitação predominante do humor pode ser a irritabilidade quando os desejos da pessoa são frustrados. Além disso, devido à elevação da autoconfiança, ideias grandiosas podem chegar a evoluir para delírios grandiosos ou religiosos de identidade ou papéis. Os indivíduos com um episódio maníaco com frequência não reconhecem que estão doentes e resistem às tentativas de tratamento. Eles podem viajar impulsivamente para outras cidades, perdendo contato com parentes e responsáveis. Também podem envolver-se em atividades desorganizadas ou estranhas como distribuir doces, dinheiro ou conselhos a estranhos que passam na rua. As preocupações éticas podem ser desconsideradas, mesmo por indivíduos bastante conscienciosos. Por exemplo, um corretor da bolsa de valores pode comprar e vender ações ilegalmente, sem conhecimento ou permissão do seu cliente; um cientista pode apoderar-se de descobertas alheias. Além disso, o indivíduo, com esse tipo de distúrbio, pode mostrar-se hostil e fisicamente ameaçador para com outros. O psicólogo e a violência Vamos chamara atenção para o fato de que a violência se manifesta em diferentes contextos — urbano, familiar, trabalho, entre outros. Assim, de acordo com a compreensão de violência anteriormente descrita, o agente que causa maiores danos dentro de uma situação de violência é aquele que detém maior poder em cada um desses contextos, e, por isso, é identificado como autor da violência. A violência causa muitos danos àqueles que são submetidos a ela, tais como: danos físicos, danos emocionais e, em última instância, a morte. Assim, estudos e programas voltados à promoção da saúde de pessoas envolvidas em situações de violência (autores e vítimas) são de muita importância na busca da eliminação e prevenção de violências, bem como na promoção de cuidados àqueles já expostos a elas. Justiça Restaurativa X Justiça Retributiva ou Tradicional Caracterização do conflito Como você viu no item anterior, a Justiça Restaurativa trabalha com uma nova compreensão do conflito que chega até o Judiciário. Mas de que forma é analisado esse conflito? O conflito faz parte de nossa vida. Ele se estabelece a partir de expectativas, valores e interesses que são contrariados. Nessas situações, costumamos tratar os outros como inimigos ou adversários. Cada uma das partes envolvidas no conflito busca encontrar argumentos para reforçar suas posições e, desta forma, enfraquecer e destruir os argumentos da outra parte. É por causa deste estado emocional gerado pela disputa, que as pessoas não conseguem perceber que, mesmo nesta situação, têm interesses comuns. Numa proposta restaurativa, vamos perceber o conflito como parte das relações humanas e resultado de percepções e posições divergentes que envolvem, também, expectativas, valores e interesses comuns, como já foi dito. O conflito não deve ser considerado negativo. É quando compreendemos que o conflito é inevitável que vamos ser capazes de desenvolver soluções autocompositivas. Quando não encaramos o conflito com responsabilidade, a nossa tendência é convertê-lo em confronto ou disputa. Quando consideramos o outro como adversário, não escutamos a sua fala porque já estamos nos preparando para uma nova argumentação. Isso pode ocorrer, também, com a outra pessoa e, desta forma, se todos não se sentem escutados e entendidos, a tendência é que a situação se agrave ainda mais, com as pessoas mantendo suas posições irreversíveis em relação à mudança. O conflito interpessoal compreende três aspectos: o relacional — valores, crenças e expectativas; o objetivo — interesse envolvido; e a trama — o conjunto de valores, crenças e expectativas, ligadas ao interesse envolvido. Por exemplo: um ex-casal está em conflito por causa da guarda de seus filhos (objetivo). Cada um tem uma forma de ser diferente em relação às expectativas, valores e crenças (relacional). Dessa forma, os dois acreditam que seriam merecedores da guarda das crianças, porque se julgam, com base em suas diferenças, os mais aptos para esta função (trama). Além disso, os conflitos são divididos em quatro espécies que podem aparecer conjugadas em algumas situações. São elas: conflitos de valores — diferenças em relação a moral, ideologia e religião, por exemplo, conflito entre israelenses e árabes; conflitos de informação — informação distorcida ou com um significado negativo, por exemplo, conflitos em relação a um contrato de compra de um produto; conflitos estruturais — diferenças políticas e econômicas entre os envolvidos, por exemplo, conflito entre empregador e empregado; e, conflitos de interesses — contradições em questões ligadas a bens e direitos comuns, por exemplo, conflitos entre herdeiros sobre os direitos a uma herança. Mecanismos de autocomposição dos conflitos Negociação, mediação, conciliação e arbitragem são, em geral, chamados de meios alternativos ou extrajudiciais de resolução de disputas (Alternative Dispute Resolutions — ADRs). Eles são também conhecidos como meios alternativos de resolução de controvérsias (MASCs) ou meios extrajudiciais de resolução de controvérsias (MESCs). Vamos começar definindo o que é a Negociação. Chamamos de negociação quando pessoas com problemas e/ou processos entre elas lidam diretamente para a transformação e restauração de relações, buscando a solução para as suas disputas ou trocas de interesses. A negociação está baseada em princípios, sendo o mais importante a cooperação, buscando um acordo com ganhos mútuos. No entanto, nem sempre se consegue negociar diretamente com o outro e, nesses casos, na busca de uma retomada da comunicação, contamos com a ajuda de uma terceira pessoa. Neste caso, podemos falar da Mediação. A mediação é um meio de solução de conflitos em que duas ou mais pessoas, com a colaboração de um terceiro, que é o mediador, expõem o problema. O mediador a escuta, questiona e vai trabalhando com elas a comunicação, de forma construtiva, para chegar, eventualmente, a um acordo. Esse profissional deve ser capacitado, imparcial, independente e escolhido ou aceito pelas partes. Falamos da mediação como um método interdisciplinar com conhecimentos científicos oriundos da Psicologia, Sociologia, Antropologia, Direito e Teoria dos Sistemas. Os mediandos, na mediação, não são tratados nem devem se comportar como adversários, mas como coautores da solução daquele conflito, auxiliados pelo mediador. Daí podermos falar que a mediação, assim como a conciliação que será descrita a seguir, são procedimentos não adversarias de solução de conflitos, diferente dos métodos adversarias como processos judiciais e arbitrais. Mais adiante, estaremos desenvolvendo os procedimentos necessários para realizar a mediação. Outra situação que envolve um terceiro, na tentativa de ajudar a solucionar o conflito, é a conciliação. De acordo com o Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, “a conciliação é um meio alternativo de resolução de conflitos em que as partes confiam a uma terceira pessoa (neutra), o conciliador, a função de aproximá-las e orientá-las na construção de um acordo”. O conciliador é uma pessoa da sociedade que atua, de forma voluntária e após treinamento específico, como facilitador do acordo entre os envolvidos, criando um contexto propício ao entendimento mútuo, à aproximação de interesses e à harmonização das relações. A conciliação é judicial quando se dá em conflitos já ajuizados, nos quais atua como conciliador o próprio juiz do processo ou conciliador treinado e nomeado. O conciliador, em relação às partes, toma iniciativas, faz recomendações, advertências e apresenta sugestões, com a finalidade de obter o acordo entre as partes. Podemos compreender que o conciliador exerce uma autoridade hierárquica em relação às partes, visando uma conciliação entre elas. Para os mediadores e conciliadores no Judiciário, o Conselho Nacional de Justiça, na Resolução 125/2010, desenvolveu um conteúdo programático mínimo e ações voltadas à capacitação em métodos consensuais de solução de conflitos, para magistrados da Justiça Estadual e da Justiça Federal, servidores, mediadores, conciliadores e demais facilitadores da solução consensual de controvérsias. Técnicas para obter uma comunicação construtiva levando à solução de conflitos 1. Conotação positiva A comunicação construtiva tem início com o acolhimento do outro por meio de uma linguagem estimulante e apreciativa sobre aquilo que a pessoa está relatando. Respeitar e acolher aquilo que o outro está comunicando é reconhecer o outro enquanto ser humano, independente de seus valores, direitos e obrigações. Por outro lado, uma comunicação dominadora estimula um julgamento antecipado e a ideia de uma verdade única. Ter uma conotação positiva em relação ao que o outro comunica expressa uma atitude de reconhecimento do outro, não obrigatoriamente concordância com o outro, mas que leva a uma atitudede empatia, fundamental para o processo de comunicação e de interação entre as pessoas. Os mediadores e negociadores utilizam a conotação positiva para desenvolver o processo comunicativo e aumentar as possibilidades de uma comunicação construtiva. 2. Escuta ativa Escutar é, antes de tudo, reconhecer, e esta é uma necessidade básica de todo ser humano: ser reconhecido. A escuta ativa é uma escuta atenta daquilo que está sendo falado e sentido pelo outro. Por isso, deve ser levada em conta, também, a expressão corporal. Mas escutar ativamente não é apenas ouvir, é identificar-se com o outro, sem julgamentos e aceitar as suas contradições. As pessoas que se sentem escutadas também estarão dispostas a escutar. As pessoas precisam dizer o que sentem e é importante reconhecer a necessidade que o outro tem de expressar. Escutar sem aconselhar. Aquele que aconselha coloca-se numa posição de superioridade com suas supostas verdades. Além disso, o conselho não permite que a pessoa se expresse, crie suas próprias soluções e cresça a partir do conflito que está vivenciando. Permitir a escuta é uma forma de dar continuidade à comunicação. 3. Perguntas sem julgamento As perguntas apropriadas acompanham o processo de escutar e reconhecer as pessoas. É por meio da pergunta que a pessoa continua narrando o que aconteceu e pode chegar a interpretar a forma como está se comportando. As perguntas ajudam a esclarecer, contextualizaras situações e capacitar a pessoa a pensar sobre o que está ocorrendo. Com base nas perguntas sem julgamento é dada a responsabilidade e o poder de reelaboração de posições para as pessoas. A pergunta é uma forma de substituir o julgamento em relação ao outro e o hábito de dar conselhos. O conselho, como já vimos, desequilibra a relação e não deve ser usado para que o outro possa ter a possibilidade de repensar sobre as situações em que se vê envolvido. 4. Reciprocidade discursiva Deve ser estabelecido em uma relação, o direito de todos a falar. O equilíbrio no direito de expressão corresponde a um equilíbrio de poder na relação. A comunicação é “uma via de mão dupla”, e as pessoas que não deixam o outro falar se comunicam negativamente. A comunicação construtiva é uma co-construção, ou seja, é construída por cada um no processo de comunicação. O diálogo para que seja produtivo deve ser sempre circular entre as pessoas e não deve haver interferência na fala do outro. 5. Mensagem como opinião pessoal É importante, na comunicação, quando falamos sobre alguém, usemos a primeira pessoa. Desta forma, estamos evitando que se fale pelo outro. É o que Vasconcelos (2008), chama de “linguagem do eu”. Uma expressão como: “Você não devia ter dito isso” se transforma em “Eu penso que isto poderia ter sido dito de outra forma”. Em uma comunicação construtiva devem ser evitadas as acusações e devem ser valorizadas as percepções e sentimentos de cada um sobre o problema. 6. Assertividade Ser assertivo não é ser agressivo. Ser assertivo é ter clareza e segurança nas suas respostas e posições. A pessoa assertiva costuma ser confiável porque se baseia em princípios e busca valorizá-los. É uma habilidade social de fazer afirmação dos próprios direitos e expressar pensamentos, sentimentos e crenças de maneira direta, clara, honesta e apropriada ao contexto, de modo a não violar o direito das outras pessoas. O comportamento assertivo pode ser considerado uma virtude, pois se mantém no entre dois extremos Inadequados, um por excesso (agressão), outro por falta (submissão). Ser assertivo é dizer “sim” e “não” quando for necessário. 7. Priorizar a relação É sempre importante separar o problema pessoal do problema material. Quando houver um problema pessoal e material, o principal é restaurar a relação pessoal. Devem ser reelaborados sentimentos e percepções, para que se estabeleça uma comunicação construtiva, voltada para os interesses comuns e opções de soluções. 8. Reconhecimento da diferença Como seres humanos, vivendo em um contexto cultural e social, tendemos a hierarquizar nossos valores que são construídos com base em nossas necessidades de autoafirmação. Quando se consegue sair de sua posição, com seus valores e sua forma de pensar, e se imaginar no lugar do outro (situação empática, já tratada anteriormente), a pessoa compreende as razões, as necessidades e os valores do outro. Quando reconhecemos as diferenças, somos capazes de superar os estereótipos que criamos sobre pessoas, lugares e situações. 9. Não reação A não reação quer dizer reformulação de uma acusação injusta, por exemplo. A reformulação é uma prática transformadora de uma interação agressiva, em que é rompido o ciclo ofensa- reação. A reformulação pode ser feita por meio de uma pergunta. Ao perguntar, estamos dando oportunidade ao outro de reformular. Esta atitude é fundamental para uma cultura de paz. Por exemplo: uma pessoa ao ser acusada de ser desonesta, no lugar de reagir a esta acusação, perguntaria: Por que você acha que sou desonesta? 10. Não ameaça Ameaçar o outro é levar o outro a provar que é mais forte e reduzir a relação a um jogo de ganha-perde. A ameaça, em geral, conduz à violência. Para evitar a ameaça é importante ter uma atitude de escuta ativa, reciprocidade discursiva e mensagem como opinião pessoal. Praticas psicológicas e suas aplicações no judiciário A prática do psicólogo na área Cível e de Família De acordo com França (2004), o psicólogo jurídico atua na área cível nos casos de interdição, sucessões e indenizações, entre outras ocorrências cíveis. No entanto, é na área do Direito de Família que vamos encontrar maior expressão na atuação do psicólogo. Em geral, o psicólogo na área do Direito de Família trabalha assessorando o juiz, principalmente, nos casos de guarda e regulamentação de convivência nas separações que ocorrem de forma litigiosa. A separação implica no fim da conjugalidade (como já vimos no Capítulo 3), mas não da parentalidade. Nas separações e divórcios não consensuais, em geral, podemos observar uma longa “batalha” por direitos que cada uma das partes supõe ter ou luta para manter, usando a Justiça para dar uma solução aos conflitos emocionais originários desta relação. Na maior parte das situações que envolvem uma separação conjugal litigiosa, as partes disputam entre si seus filhos, não reconhecendo a importância do papel do pai e da mãe. As necessidades das crianças e adolescentes, por sua vez, também não são consideradas. Nos casos de disputa de guarda e regulamentação de convivência, torna-se necessário um trabalho interdisciplinar que conjugue os aspectos jurídicos e psicossociais. Aparece, com frequência, uma disputa de poder entre as partes, que se configura na disputa de guarda pelos filhos. O psicólogo que trabalha nas Varas de Família, ao receber esse tipo de situação encaminhada pelo juiz para avaliação, deve realizar uma compreensão abrangente da situação, buscando soluções com base no próprio grupo familiar. Os fatos e as necessidades deste grupo devem ser analisados a partir do momento atual. Quando possível, o importante é que todos os filhos possam partilhar, sem discriminações, de companhia, afeto, atenção e cuidados do pai e da mãe. O papel dos genitores é fundamental como referência e formação da personalidade dos filhos. Não se deve esquecer também a importância do relacionamento com o grupo familiar extenso (avós, tios, primos). A guarda compartilhada, já vista no Capítulo 3, propõe a participação conjunta dos pais nas decisões importantes na vida dos filhos, confirmando o fato de que a parentalidade permanece após a separação. Na verdade, podemos afirmar que não existe ex-pai ou ex-mãe, não é mesmo? É neste cenário de disputa pela guarda e regulamentação de convivência que pode ocorrer a alienação parental. A prática do psicólogo e as questões da infância, juventudee do idoso Os direitos fundamentais de crianças e adolescentes são assegurados pela Constituição Federal (1988) e pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA 1990). O ECA é identificado como a lei federal nº 8.069/1990, cujo pilar é a doutrina de proteção integral. O ECA tratou de direitos das crianças e adolescentes porque seus direitos estavam sendo violados e necessitavam ser revistos, organizados e divulgados. Com base nesse documento, crianças e adolescentes passaram a ser considerados cidadãos detentores de direitos. Na formulação das políticas e no controle das ações ligadas às crianças e adolescentes, não apenas o Estado, mas a sociedade e a família são convocadas para uma participação ativa e responsável. Na defesa dos direitos de crianças e adolescentes, o ECA afirma que elas devem ser protegidas de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. Como pessoas em condição peculiar de desenvolvimento, as crianças e os adolescentes precisam ser tratados com dignidade e respeito. Muitos críticos desta Doutrina afirmam que a partir deste documento, as crianças passaram a ter só direitos. No entanto, ser tratado com respeito e dignidade não quer dizer que “tudo é livre” e não há limites. Nas áreas da infância e juventude, no estabelecimento de medidas protetivas, o psicólogo trabalhará com questões ligadas à violência contra crianças e adolescentes em consonância com o Conselho Tutelar no atendimento destes, de seus responsáveis e nas situações de abrigamento de crianças e adolescentes, quando é impossível a convivência e segurança em seus lares. Nestes casos, o psicólogo irá elaborar relatório que possa fundamentar a decisão da autoridade judiciária competente pela possibilidade de reintegração familiar ou colocação em família substituta destas crianças e adolescentes. O adolescente e o conflito com a lei Para entendermos as questões ligadas ao adolescente e o ato infracional, precisamos entender um pouco da história sobre o enfrentamento do adolescente em conflito com a lei, a partir da evolução histórico-doutrinária da legislação da infância e juventude. Em 1927, surgiu o Código Mello Mattos (Decreto nº 17.943-A, de 12 de outubro de 1927). Havia o que se chamava de Juízo Privativo de Menores na década de 1920, e o primeiro Juiz de Menores do Brasil foi o Dr. José Cândido Albuquerque Mello Mattos. Ele foi o primeiro expoente do pensamento da legislação da infância e juventude no Brasil, criou vários estabelecimentos de assistência e proteção à infância abandonada e delinquente, assim como organizou o primeiro código, que ganhou o seu nome. A prática do Código de Menores era recolher os menores em desacordo com a lei, objetivando selecioná-los para destinos diversos, sendo a prática de internação uma das mais comuns para o efeito de civilizar o incivilizado. Para aperfeiçoar essa prática nacionalmente, surgiu, em 1941, o SAM — Serviço de Assistência aos Menores, “funcionando como um equivalente do sistema penitenciário para a população infanto juvenil”. Em 1964, o regime militar criou a PNBEM — Política Nacional do Bem-Estar do Menor para o lugar do SAM, reconhecendo o fracasso até então de se assistir os chamados menores abandonados e corrigir os chamados menores infratores. O governo federal criaria o novo Código de Menores, em 1979, que reconhecia os menores abandonados e os menores infratores como estando em situação irregular pela sua condição de marginalizados. No Capítulo 3, você estudou que entre os princípios norteadores que são estabelecidos para a família está o princípio do Melhor Interesse da Criança, previsto no artigo 227, da Constituição da República Federativa do Brasil — CRFB (1988). Com base nesta Carta Magna (1988), surgiu a demanda pela criação de uma nova legislação, com um olhar humanizado e multidisciplinar sobre crianças e adolescentes. O Estatuto da Criança e do Adolescente, sancionado por meio da lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990, contemplou em seus artigos 4º e 5º, o previsto no artigo 227 da CRFB (1988). Esse Estatuto (BRASIL, 1990) compreende o adolescente como sujeito de direitos e em condição peculiar de desenvolvimento. Não utiliza o termo menor, uma vez que este nos remete a noção de inferioridade. Além disso, proíbe o cumprimento de penas para os adolescentes em conflito com a lei, e estabelece o cumprimento de medidas socioeducativas. São elas: advertência, obrigação de reparar o dano, prestação de serviços à comunidade, liberdade assistida, inserção em regime de semiliberdade, internação em estabelecimento educacional, além de medidas protetivas que visem ao acompanhamento do adolescente na família, escola, comunidade, serviços de saúde etc. As medidas socioeducativas fundamentam suas ações com caráter tanto sancionatório quanto educativo, responsabilizando o adolescente pelas consequências lesivas do ato cometido, incentivando a reparação dos danos causados e garantindo — sempre que possível — a integração familiar, comunitária e social. Sendo assim, a proposta do psicólogo é a de promover intervenções críticas no programa de atendimento para a execução de medidas socioeducativas que incentivem os adolescentes a (re) pensarem seus desejos, seus valores, seus ideais e os modos possíveis de transformar a realidade vivida, além da realização de relatórios fornecendo subsídios à decisão judicial sobre a aplicação das medidas. Dentre as ações técnicas dos psicólogos, definidas em legislação federal e normas profissionais, acrescidas das ações institucionais determinadas aos psicólogos e demais técnicos pela gestão socioeducativa, nos casos de internação estão: O atendimento ao adolescente, prioritariamente individual e semanal; O atendimento familiar (entrevista, contatos telefônicos e apoio psicológico); Estudo de caso, individualmente ou em reunião; Levantamento de dados sobre o adolescente, rede sociofamiliar e o comportamento na instituição, a fim de elaborar propostas de intervenção e encaminhá-las ao poder judiciário ou rede externa; Relatório técnico, por meio da avaliação psicológica obtida com entrevistas, observações e, eventualmente, outros recursos psicológicos, acrescida pelo estudo de caso, o psicólogo organiza e redige o relatório técnico multiprofissional; Visita domiciliar, conforme tempo hábil e necessidade de acompanhamento, entre outras atuações. Idoso No que diz respeito ao idoso, também com base na Constituição Federal de 1988, visando a uma maior proteção a esta parcela da população, foi criado o Estatuto do Idoso, por meio da lei federal nº 10.741, de 1º de outubro de 2003. É uma legislação apta a proteger e a tutelar os direitos do idoso, combatendo a violência por meio da análise de seus principais aspectos penais e processuais penais. Em qualquer pesquisa feita sobre a violência contra o idoso, infelizmente a constatação a que chegamos é de que, além das omissões do Estado, são os familiares os maiores agressores, e a violência ocorre mesmo dentro de suas casas. Essa violência contra os idosos pode acontecer de várias formas, desde a violência psicológica, que se manifesta pela negligência e pelo descaso, até as agressões físicas. São comuns os casos de filhos que batem nos pais, tomam seu dinheiro, dopam-nos, deixam passar fome ou não dão os remédios na hora marcada, é o chamado abandono material. Ainda que a responsabilidade imediata pelo trato dos idosos seja delegada prioritariamente à família, o Estado não está desobrigado de um conjunto de atribuições que lhe são destinadas tanto pela Política quanto pelo Estatuto do Idoso. A notificação da violência contra o idoso, exigida pela lei, tem um papel fundamental no combate à violência contra o idoso. No entanto, esse papel não deve se limitar apenas a punir o culpado. A notificação pode ser um instrumento de proteção aos direitos do idoso, e
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