Buscar

módulo II aula 2 1

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você viu 3, do total de 11 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você viu 6, do total de 11 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você viu 9, do total de 11 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Prévia do material em texto

Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro – UNIRIO 
FundaçãoCECIERJ/Consórcio Cederj 
Curso de Pedagogia para as Séries Iniciais do Ensino Fundamental 2014/1º 
Disciplina optativa EDUCAÇÃO PARA A DIVERSIDADE 
Coordenação: Professora Doutora Maria Amelia de Souza Reis 
 
MÓDULO II – AULA 2 
 
Este texto ajudará você a compreender os conceitos do texto:O reconhecimento 
dadiversidade étnico-racial. 
 
1. João de Páscoa: um índio Pankararu 
João de Páscoa é índio Pankararu, morador da aldeia do Brejo dos Padres, 
localizada no sertão de Pernambuco. Mas não foi sempre assim. Ele nasceu em 
meados da década de 1920, em um período de grande seca, por isso, a população 
migrou em busca de melhores condições. Como ele conta: 
 
Fui batizado na igrejinha de Geripancó, e já tinha lá índio daqui, que os índios ia trabalhar e 
ficava por ali, constituía família e, então, formou outra tribo. É onde deu origem à tribo dos 
Geripancó. 
 
Depois, quando ele já era menino, a família de João de Páscoa migrou 
novamente: 
 
Nós descemos de Palmeira dos Índios e fomos ajudar a erguer a aldeia dos Xucurus, isso foi 
na época de 1932. Eu fiquei lá e me criei com os índios de lá, no ritual deles. A gente dançava, 
fumava, todo mundo tinha que levar uma lembrança lá toda semana; um comprava fumo, outro 
comprava rapadura, tudo assim, pra pedir pros Encantos virem a terra. A meninada toda saía 
pra feira da cidade pra ganhar frete daquelas mulheres que faziam feira. Iam com o balaio na 
cabeça e ganhavam 200 réis, 300 réis. 
 
Foi só quando o seu povo teve o território tradicional reconhecido pelo Estado 
brasileiro como área indígena Pankararu, na década de 1940, que a sua família 
retornou à terra de origem: “Eu já tava com 14 anos, aí vim para aqui e a terra já tava 
demarcada”. Na verdade, os Pankararu ocupam o mesmo território desde pelo menos 
o século XVIII, quando foram aldeados por padres Capuchinhos, mas no final do 
século XIX eles foram declarados extintos e as terras do seu aldeamento foram 
loteadas. Nessa mesma época, os últimos aldeamentos do Nordeste tinham sido 
considerados extintos porque os seus índios já estavam muito misturados, segundo a 
opinião dos governos provinciais. 
 
No caso Pankararu, houve um segundo propósito: as terras do seu aldeamento 
foram distribuídas entre algumas famílias indígenas e outras tantas famílias de 
escravos, que estavam sendo libertadas um pouco antes da abolição da escravatura, 
em troca de indenizações, pelos fazendeiros da região. Era um bom negócio, pois ao 
manterem os escravos por perto, nas terras do aldeamento, junto com os índios 
declarados não mais índios, os fazendeiros lucravam com a abolição sem perderem o 
controle sobre a sua mão-de-obra. Na década de 1940, porém, quase sessenta anos 
depois de serem declarados extintos, os Pankararu, que tinham absorvido as famílias 
negras em sua sociedade por meio dos casamentos, continuavam realizando seus 
rituais, suas festas e mantendo a religião. Conseguiram, assim, ser reconhecidos 
novamente como indígenas, recuperando também, em parte, o direito sobre suas 
terras. 
Mas a história de João de Páscoa continua por outros caminhos: 
 
Aí depois eu fiquei adulto, trabalhei e depois que já tinha duas filhas, aí eu fui agenciado prair 
pra São Paulo cortar lenha no machado. E eu fui pra lá e ela [aponta para a esposa] ficouaí. 
Passei um ano, depois era pra vim e não vim. Passei outro ano lá mesmo, aí quando eu vimjá 
trouxe um bocado de coisa, era relógio, era aquelas cobertas berrantes, aquela vitrolinha 
demão, aí melhorou. Depois o dinheiro acabou e escrevi para São Paulo de novo. Aí os 
portuguesesda Light me mandaram que eu fosse, aí eu fui e dessa vez passei 17 anos... [riso]. 
 
João de Páscoa, como muitos outros nordestinos, foi trabalhar em São Paulo, 
levado peloschamados “gatos”, que recrutavam trabalhadores em áreas pobres do 
Nordeste e os levavampara outras regiões, transportados em caminhões “pau-de-
arara”. Lá realizavam serviços cujopagamento também era intermediado pelos “gatos”, 
que ficavam com a maior parte dele: 
 
Eles vinham buscáa gente, era comum, vinham aqui para entregá pra empreiteiro. Aí o paude-
arara rodava direto. Cêvê, o homem nordestino, toda a vida ele migrou para o sul, 
principalmentepra São Paulo, para a lavoura, pro Paraná, para aquele meio de mundo ali. 
 
João explica que durante os longos períodos em que ele e seus companheiros 
passavam emSão Paulo não deixavam de respeitar o ritual tribal: 
 
Eu vivia no mato mais esse povo daqui, que tava comigo, era tudo índio. Eu lá não 
trabalheicom civilizado. Eu recebia dinheiro do civilizado, mas o pessoal meu era tudo índio. 
[...] Aítodo mundo fazia o ritual. A gente tinha de tudo lá dentro do mato. Tinha cachorro pra 
caçar e fazia comida de caça. Lá eu achei bonito. Uma tribo podia viver lá na serra de Santos, 
viu? Eu só não gostei do borrachudo [risos], que me ferrô o sangue. Mas lá a gente mantinha a 
tradição. Tinha horas que tinha 20, tinha horas que tinha 30 [pessoas], se reunia, e tinha 
respeito. 
 
Ainda assim, fosse na cidade, fosse junto aos outros trabalhadores, João de 
Páscoa e seus companheiros de aldeia eram questionados quanto à sua identidade de 
índios. Diziam: “Você não é índio, você não é nada, você não sabe de nada”, conta. E 
isso acontecia ainda mais com o próprio João devido à cor clara dos seus olhos de 
mestiço. Falavam: “Oh, seu João, o senhornão é índio não, que o senhor tem olho de 
gato...”, ao que João Natal respondia: “Eu não sounão? Agora, o meu povo era índio e 
eu mantenho a tradição e conservo ela até hoje”. Por isso,esses homens e as suas 
famílias, que aos poucos os acompanhavam nas viagens para São Paulo, não 
revelavam sua origem indígena: “Não, nós não ia dizer pra ninguém que era índio, a 
não ser alguém que perguntasse ou qualquer coisa por um acaso, mas nós nunca foi 
falar que era índio”. O grande dilema era saber que eram índios, apesar de estar fora 
de suas terras e não ter a aparência que todos esperam que um índio tenha, conforme 
se aprendeu no cinema, na televisão e mesmo nos livros de escola: 
 
Eu não acho que sô índio porque eu fui violado. Agora, eu mantenho minha tradição, porque 
[...] eu fui, eu me criei como índio. Agora, eu não tenho é a fisionomia de índio, mas talvez um 
índio [com aparência de índio] não tenha a fé que eu tenho na minha tradição. 
 
Depois de dezessete anos, João de Páscoa, sua esposa e parte dos filhos 
voltaram para a suaterra indígena de origem: “E se eu não venho de lá, tinha ficado 
meus filhos todinhos lá... Aí casou dois que ficaram”. João voltou e transformou-se em 
importante liderança na luta pela demarcação definitiva das suas terras, passou um 
período como cacique, mas novamente foi desrespeitado pelos funcionários da Funai 
(Fundação Nacional do Índio) em função dos seus “olhos de gato”. Hoje ele vive com a 
esposa em uma casinha da aldeia, cercado pelas casas de seus filhos que voltaram 
com o casal e já criaram suas próprias famílias. Mas uma de suas filhas continuou em 
São Paulo, morando na favela do Real Parque, bairro do Morumbi, junto com mais 
cerca de 1.200 índios Pankararu. 
Desde a década de 1950, quando da viagem de João de Páscoa, várias outras 
famílias Pankararu migraram para São Paulo, mas sempre procurando morar umas 
perto das outras, já que a identidade de parentesco e o fato de serem índios da 
mesma aldeia formavam uma rede de solidariedade entre eles. Desde então, o grupo 
vive no Real Parque, mas sempre voltando, de tempos em tempos, para a aldeia 
original, onde passam férias ou vão trabalhar na terra, alternando períodos na aldeia e 
na favela. 
Em São Paulo, como disseJoão de Páscoa, eles sempre realizavam seus 
rituais apenas em ambientes familiares, sem revelar serem índios. Mas isto mudou na 
década de 1980, depois que a morte de um jovem Pankararu1 chegou aos jornais e ao 
conhecimento da Funai. Como forma de se protegerem da crescente violência urbana 
que atingia a sua favela, os Pankararu resolveram dar a conhecer que eram um grupo 
indígena em plena metrópole, e passaram a se organizar em associações e a receber 
amparo da Igreja Católica, da Funai e de outras entidades de apoio ao índio e aos 
Direitos Humanos. Deixaram de realizar seus rituais apenas em ambientes familiares e 
retomaram as danças do Toré em terreiros abertos, voltando a usar trajes tradicionais 
em dias de festa. Com isso também conseguiram realizar uma parceria com a 
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e tiveram acesso a uma cota de bolsas 
de estudos para os seus jovens, assim como para os jovens de outros grupos 
indígenas que atualmente também moram em São Paulo. Atualmente existe um outro 
programa semelhante também na USP. 
A filha de João de Páscoa, moradora da favela Real Parque, que poucas vezes 
tinha voltado à aldeia dos seus pais e que tantas vezes fora chamada de negra, hoje é 
bolsista do curso de literatura da PUC-SP e freqüenta reuniões quinzenais, aos 
sábados, para discutir questões relacionadas à identidade dos indígenas que moram 
na cidade. 
 
2. Os discursos da história 
A questão indígena confunde-se com a própria história denosso país. Mas os 
relatos sobre a presença dosnativos americanos no continente foram 
predominantementeescritos pelos europeus, uma vezque a cultura indígena estava 
baseada na tradiçãooral. Apesar disso, há muitos registros da arte dosnativos 
americanos em produtos de cerâmica artesanale nas pinturas rupestres, encontradas 
pelotrabalho de sítios arqueológicos espalhados porvárias regiões do país. 
 
1
O índio Pankararu Jair Celestino de Barros, 20 anos, que tinha saído de seu povo, para trabalhar em São Paulo, pois 
entre os seis filhos, do Senhor Celestino Abílio e Dona Maria do Carmo Barros, ele era o mais velho, e por sua família 
não possuir nenhuma renda financeira, e o seu pai estar muito doente, a única solução encontrada no momento foi 
dele, ir para São Paulo. 
Mesmo contra a vontade de sua mãe, Jair foi assim mesmo, com um sonho de resolver seus problemas financeiros de 
sua família, e realmente quando chegou, ao seu destino ele logo começou a trabalhar, e a ajudar sua família que 
deixou em Pankararu. 
E quando ele achava que tudo estava indo bem, aconteceu uma tragédia, ao retornar do seu trabalho para sua casa, 
no Real Parque, zona sul de São Paulo, no dia 25 de julho de 1994, por volta das 20:00hs, ele foi assassinado com 
vários tiros, em frente a sua casa. Segundo testemunha, ele foi confundido com outra pessoa. 
E nesse dia 25 de julho de 2006, faz doze anos de seu assassinato, e nada foi esclarecido, e nem os culpados foram 
punidos. 
Então fica uma pergunta no ar, de quem é a responsabilidade pela segurança de um índio, que sai de seu povo para 
procurar um meio de sustentabilidade, em outro local sem ser o de origem. Pois o órgão governamental, que de fato é 
de proteção ao índio FUNAI, nada fez perante a esse caso, e pelo o contrario o administrador da FUNAI Recife, na 
época o Senhor Petrônio, tentou criminalizar a vitima na época, dizendo então que Jair, tinha ido para São Paulo 
fugido, por ter cometido algum crime em seu povo. 
Então até hoje, a família de Jair não cansa em busca de justiça, mas se a FUNAI não se responsabiliza pelos índios, 
então quem é de fato responsável. No site: <http://www.indiosonline.net/assassinato/> acesso em 07/11/2012. 
No entanto, apesar de povoarem o continente há milhares de anos, a presença 
dos nativos americanosfoi intensamente difundida depois das primeiras expedições 
oficiais dos séculos XV e XVI. Assim, a descriçãoque nos foi herdada sobre os povos 
nativos americanos partiu da perspectiva do ponto de vista europeu.As descrições 
sobre a terra e os povos que nela habitavam tinham como referência a experiência de 
mundoadquirida na Europa. O nativo americano, ou simplesmente o índio, com foi 
comumente chamado, foicaracterizado pelo exotismo que o diferenciava de uma 
cultura dita civilizada. 
No caso brasileiro, o primeiro documento oficial que marcou este encontro, 
considerado pela historiografiaocidental, foi a carta de Pero Vaz de Caminha, 
atenuando as diferenças culturais entre os doiscontinentes. Em cada documento 
escrito, os historiadores consideraram as possibilidades de circunstânciascontextuais 
de quem o escreveu. No caso das primeiras navegações portuguesas, o projeto de 
colonizaçãoainda não estava claro, o que caracterizou, em certa medida, os primeiros 
contatos interculturais comoamistosos. Esta relação foi escrita pelo europeu da 
seguinte forma: 
 
E além do rio andavam muitos deles dançando e folgando, uns diante os 
outros, sem se tomarem pelas mãos. E faziam-no bem. Passou-se então para 
a outra banda do rio Diogo Dias, que fora almoxarife de Sacavém, o qual é 
homem gracioso e de prazer. E levou consigo um gaiteiro nosso com sua gaita. 
E meteu-se a dançar com eles, tomando-os pelas mãos; e eles folgavam e riam 
e andavam com ele muito bem ao som da gaita. Depois de dançarem fez ali 
muitas voltas ligeiras, andando no chão, e salto real, de que se eles 
espantavam e riam e folgavam muito. E conquanto com aquilo os segurou e 
afagou muito, tomavam logo uma esquiveza como de animais monteses, e 
foram-se para cima. (CAMINHA, online, acessado em 22/01/2010) 
 
Apesar das relações de contatos terem forte proximidade física, o autor do 
documento deixa bem claroo seu distanciamento quanto à cultura do “outro”. Realiza 
inclusive uma comparação grosseira dos nativosamericanos com animais. Com os 
interesses político-econômicos dos estados absolutistas europeus emprimeiro plano, 
dado o desenvolvimento e expansão das práticas mercantilistas na Europa, a timidez 
dosprimeiros contatos foi substituída por uma relação de imposição marcada por 
intensa violência. 
As primeiras impressões edênicas (de éden) sobre os ativos foram 
gradativamente desaparecendo medianteo confronto que impunha a usurpação da 
terra e a imposição dos nativos a trabalhos forçados deextração vegetal e, quando 
possível, mineral. A antropofagia foi divulgada como uma prática demoníaca 
quedeveria ser exterminada, sendo a conversão ao catolicismo a solução para a 
salvação dos habitantes queestavam no continente americano. 
As diferenças étnicas entre os índios, caracterizadas por sua multiplicidade ao 
longo do território, foram consideradas pelos europeus apenas para o estabelecimento 
de alianças visando ao embate físico, algo que foi astuciosamente aproveitado para 
defender os interesses daqueles que vinham de solo além-mar. As variações dos 
discursos que foram construídos sobre os povos indígenas brasileiros oscilavam 
conforme o seu autor. Poderiam ser eles franceses, como os relatos decorrentes da 
invasão desses no Rio de Janeiro, entre 1555 e 1567, ou religiosos em missão 
catequética, como os discursos produzidos, também no século XVI, pelo padre 
espanhol José de Anchieta. 
Já no século XIX, as missões artísticas estrangeiras contribuíram para a 
construção desta formação do olhar eurocêntrico sobre o “outro”, caracterizando uma 
representação distanciada do índio brasileiro. Além do recurso verbal, o poder da 
imagem contribui significativamente para a construção desse discurso. Tiveram grande 
valorização, presente até os dias de hoje em nossa iconosfera – conjunto de imagens 
recorrentes em nosso cotidiano –, as missões artísticasfrancesas. Dentre os artistas 
de maior destaque, está o pintor Jean Baptiste Debret, que criou imagens do exotismo 
e da submissão indígena diante do homem branco. 
Ao longo dos anos, o discurso predominante sobre os povos indígenas foi 
aquele baseado nos moldes da perspectiva europeia. Consolidou-se a visão de um 
índio genérico, sem uma distinção séria de sua diversidade étnica e linguística, da 
importância de seus papéis sociais e da dignidade que se buscava através dos 
muitos movimentos de luta e resistência visando à preservação da cultura contra a 
dominação. 
Durante o período imperial brasileiro, no século XIX, vale ainda lembrar a 
má contribuição de José Bonifácio para a construção de uma imagem do índio 
integrada ao contexto nacional. A incitação de Bonifácio baseou-se na prevalência 
da chamada civilidade branca sobre os povos indígenas. Constatava-se ainda a 
necessidade de catequizar e aldear o “outro” para que este pudesse se integrar à 
sociedade, visando à construção deelementos que originassem um sentimento 
comum e de unidade à nação. 
Nosso patriarca da independência, como ficou conhecido José Bonifácio, 
escreveu em 1823 umaobra discriminatória, que ao pensamento da época julgava 
coerente, denominada “Apontamentos para acivilização dos índios bravos do Império 
do Brasil”, na qual, entre outras reflexões que não consideravamminimamente a 
preservação da diversidade cultural brasileira, escreveu: 
 
Provém primeiro de serem os índios povos vagabundos e dados a contínuas 
guerras e roubos; segundo de não terem algum freio religioso e civil que coíba 
e dirija suas paixões, donde nasce ser-lhes insuportável rejeitarem-se às leis e 
costumes regulares; terceiro de serem entregues à preguiça fogem dos 
trabalhos aturados e diários de cavar, plantar e mondar as sementeiras, que 
pelo nimio viço da terra se cobrem logo de mato e de ervas ruins; quarto 
porque temem, largando sua vida conhecida e habitual de caçadores, sofrer 
fomes faltando-lhes alimento à sua gula desregrada. (BONIFÁCIO, José, 
online, acessado em 22/01/2010) 
 
O projeto dito civilizatório que impunha novos valores culturais aos povos 
indígenas adentrou-se com o início da República no Brasil e o decorrer do século XX. 
Com o apoio financeiro dos Estados Unidos, realizouse em 1913, em parte da Bacia 
Amazônica, a expedição científica Rondon-Roosevelt, que tinha por intençãorealizar 
um levantamento étnico, botânico e zoológico da região. A expedição que contou com 
a participação do Marechal Cândido Rondon influenciou muitas outras nos anos 
seguintes, marcando, no que diz respeito aos povos indígenas, a aplicação dos 
primeiros métodos antropológicos no país, a serviço do Estado. Como se pode 
perceber,foram muitos os subsídios que construíram um discurso sobre os povos 
indígenas ao longo da história, que se consolidaram como integrantes indissociáveis 
da memória brasileira.No entanto, um discurso próprio e efetivo, representativo das 
muitas sociedades indígenas, foi praticamente ignorado no decorrer dos anos. Um 
discurso oficial se criou em relação aos povos indígenas, sem que a eles próprios 
fosse dada a autonomia e a aceitação de tomar o curso de sua própria história. 
Porém, as conquistas oriundas da aceitação de muitas diversidades 
culturais no Brasil, concretizadas especialmente no plano legislativo, buscam 
corrigir estas falhas consolidadas no discurso da nossa história. Mas vamos 
continuar adentro neste universo de representações? Cabe ainda vermos mais 
algumas apropriações sobre a identidade os povos indígenas brasileiros que foram 
criadas, por exemplo, nos campos do pensamento filosófico, literário, musical e 
cinematográfico. 
 
3. O mito do “bom selvagem” 
Vamos ver, de forma breve, um pouco sobre a criação do denominado mito do 
“bom selvagem”, atestando aos povos indígenas uma determinada passividade no que 
concerne a sua relação de resistência cultural. No início da Idade Moderna, 
encontraremos alguns autores que defendiam uma visão edênica e pacificadora dos 
nativos americanos. 
O frei dominicano Bartolomé de las Casas, por exemplo, denunciava no início 
do século XVI as atrocidades cometidas pelos conquistadores espanhóis contra os 
povos indígenas nas regiões da América Centrale México. Defendia o religioso que 
Deus havia criado todas as espécies desprovidas de malícia, muito obedientes, sem 
ira, ódio ou desejos de vingança. Desta forma, condenava-se a imposição agressiva 
de espanhóis contra os nativos americanos, mas por outro se defendia uma quase 
infantilidade indígena, assimcomo sua predisposição para a conversão ao cristianismo. 
O escritor francês Michel de Montaigne também contribuiu, no final do século 
XVI, para com a literatura que caracterizava, dessa mesma forma, os povos indígenas. 
Utilizava, por sua vez, um tom discursivo irônico para criticar a sociedade 
contemporânea à sua época. Podemos considerar que não defendia propriamentea 
diversidade, mas se valia dela para fins outros. 
 
É Montaigne quem, apreciando os chamados canibais, num dos seus ensaios 
mais cheios de malícia, põe em destaque as qualidades do índio, louvando 
sempre o “bom selvagem”, que não se entregava às guerras de conquista, que 
se caracterizava pela ausência de bens pessoais, que se conduzia sempre com 
bravura, criatura assim plena de virtudes, numa sociedade também digna de 
elogios a que os civilizados deviam invejar. (SODRÉ, 1964, pp. 261-262) 
 
Sob a égide iluminista do século XVIII, o filosofo francês Jean Jacques 
Rousseau também contribui em parte com a tese do “bom selvagem”, uma vez que 
defendia a existência de um estado deonsciência selvagem, no qual os homens não 
distinguiam o bem do al. Caracterizava, em linhas gerais, um indivíduo afastado do 
regramento dito civilizado pela sua inocência, cujas ações eram regidas pelos seus 
instintos naturais. Também complementavam o pensamento de Rousseau os filósofos 
iluministas franceses, seus conterrâneos, Denis Diderot e Charles de Montesquieu. 
Nessa tipologia social, portanto, que se encontravam os povos indígenas. As 
influências do pensamento filosófico europeu transpuseram-se para o campo da 
criação literária. Em busca de uma identidade literária nacional, alguns autores 
brasileiros, especialmente os românticos e os modernistas, absorveram o pensamento 
eurocêntrico para buscar as representações, sob a forma da criação em nas letras, 
para caracterizar um estereótipo que, por sua vez, sobrepunha a diversidade étnica 
indígena. 
 
4. Pensando na sala de aula 
Os antropólogos Aracy Lopes da Silva e Luís DoniseteGrupioni, na obra “A 
temática indígena na escola”, lembram-nos sobre a importância do estudo da 
diversidade nos ambientes escolares e nos demais espaços de aprendizagem 
disponíveis em nosso convívio social. O processo de educação deve superar a 
simples acumulação de conhecimento e ser posto em práticas sociais efetivas, que 
busquem resultados concretos para o bom relacionamento ente os membros de uma 
mesma e de diferentes sociedades. 
O convívio da diferença: a afirmação da possibilidade e a análise das 
condições necessárias para o convívio construtivo entre segmentos 
diferenciados da população brasileira, visto como processo marcado pelo 
conhecimento mútuo, pela aceitação das diferenças, pelo diálogo. Nestes 
tempos de violência generalizada no país, a reflexão sobre os povos indígenas 
e sobre as lições de sua história e suas concepções de mundo e de vida social 
podem trazer, aliada ao exame dos modos de relacionamento que a sociedade 
e o Estado nacionais oferecem às sociedades indígenas constituem um campo 
fértil para pensarmos o país e o futuro que queremos. (SILVA e GRUPIONI, 
1998, pp. 15-16).No decorrer de suas atividades docentes, pense em como você pode contribuir 
para a difusão de um pensamento em prol da diversidade para a educação. Algo que 
supere a comemoração cívica do Dia do Índio, por exemplo, assim como a construção 
canônica de discurso usurpado acerco de um indivíduo estereotipado pelo olhar 
eurocêntrico. Como o exemplo da diversidade indígena pode nos auxiliar na 
construção de um mundo melhor através da educação? Encaminhamos o fim da 
unidade propondo esta questão para reflexão. 
 
5. Povos Indígenas, nossos contemporâneos 
Devemos reconhecer o passado dos povos indígenas, ao invés de aceitá-los 
acriticamente como povos do passado? Pois são eles também membros de nossa 
sociedade e compartilhamos juntos o mesmo tempo. No caso de nossa federação, 
podemos afirmar que a sociedade brasileira está composta também pelas suas 
diferenças, sejam elas religiosas, étnicas ou políticas, de uma maneira geral. 
Há importância em conservar as tradições indígenas, mas não é por isso que 
devemos negar os mecanismos legais para que isso ocorra, ou que seja feito seu 
aprimoramento, conforme o interesse de cada comunidade. A educadora Maria 
Aparecida Bergamaschi lembra alguns dos focos de interesse contemporâneos 
indígenas, entre os quais estão as universidades. 
O ensino superior também vem sendo foco de interesse dos povos indígenas, 
sendo que em sete universidades públicas brasileiras funcionam as 
“licenciaturas interculturais”, responsáveis pela formação de mais de mil 
professores. Políticas afirmativas para ingresso de indígenas têm sido uma 
prática crescente nas universidades brasileiras, sendo pioneira a Universidade 
de Brasília (UnB). A [Universidade Federal do Rio Grande do Sul] UFRGS e a 
Universidade de Santa Maria (UFSM) adotaram o sistema de cotas a partir do 
ano de 2008, iniciando com dez e cinco vagas, respectivamente. 
(BERGAMASCHI, 2008, p. 11) 
 
Devemos considerar também a existência de um considerável crescimento da 
população indígena no Brasil. Por mais que governos, autoridades, instituições e 
estudiosos digam ou ainda anunciam um fim inexorável dos povos indígenas, vemos 
através de dados estatísticos um crescimento populacional. Alguns censosjá estimam 
o registro de aproximadamente 700 mil indígenas no Brasil. 
 
ATIVIDADE 
 
Este Texto conta a instigante história de João de Páscoa, um índio Pankararu, cuja trajetória 
mostra os processos vividos pela diversidade étnico-racial no Brasil. Mostra ainda, uma forma 
de ser indígena pouco comum no imaginário social. 
Com base nisso, pense em como podemos unir o conhecimento desta leitura com a prática 
desenvolvida dentro de uma sala de aula? Faça um levantamento sobre a forma de abordagem 
das concepções acerca da temática indígena no seu cotidiano. O que se pensa sobre os índios? 
Como os imaginamos? De que forma conhecemos sua cultura e nos aproximamos ou 
distanciamos dela? Como a temática está presente nos livros didáticos? Após este 
levantamento, verifique se há reprodução de alguns estereótipos: 1) índio é exótico ou 
bárbaro. 2) Índio romântico, apresentado sempre como uma figura ambígua, de herói e 
perdedor. 3) Índio sempre anda sem roupas. 
 
Referência Bibliográfica 
 
AZANHA, Gilberto e VALADÃO, Virgínia Marcos. Senhores destas terras: os povos 
indígenas no Brasil – da colônia aos nossos dias. São Paulo: Atual, 1991. 
 
BERGAMASCHI, Maria Aparecida (org.). Povos indígenas & educação. Porto Alegre: 
Mediação, 2008. 
 
BONIFÁCIO, José. Apontamentos para a civilização dos índios bravos do Império do 
Brasil. Disponível em http://www.obrabonifacio.com.br/ 
colecao/obra/1072/digitalizacao. Acessado em 22/01/2010. 
 
CAMINHA, Pero Vaz de. Carta a El Rei D. Manuel. Disponível em 
http://www.cce.ufsc.br/~nupill/literatura/carta.html. Acessado em 22/01/2010. 
 
BRASIL, Ministério da Educação e do Desporto. Curso de Aperfeiçoamento em 
Educação Para a Diversidade. Porto Alegre, 2010. 
 
DIAS, Gonçalves Dias. I - Juca Pirama. Disponível em http://www.cce.ufsc.br/~nupill/ 
literatura/i-jucapirama.html. Acessado em 22/10/2010. 
JECUPÉ, KakaWerá. A terra dos mil povos: história indígena do Brasil contada por um 
índio. 4.ª edição. São Paulo: Peirópolis,1998. 
 
Gênero e diversidade na escola: formação de professoras/es em Gênero, Orientação 
Sexual e Relações Étnico-Raciais. Livro de conteúdo. Versão 2009. – Rio de Janeiro: 
CEPESC; Brasília: SPM, 2009. 
 
SILVA, Aracy Lopes da e GRUPIONI, Luís Donisete Benzi (orgs.). A temática indígena 
na escola: novos subsídios para professores de 1.º e 2.º graus. São Paulo: Global; 
Brasília: MEC/MARI/UNESCO, 1998. 
 
SODRÉ, Nelson Wernek. História da literatura brasileira. Rio de Janeiro: Civilização 
Brasileira, 1964. 
 
TODOROV, Tzvetan. A conquista da América: a questão do outro. São Paulo: Martins 
Fontes, 1993. 
 
YANOMANI, Davi Kopenawa e ALBERT, Bruce. Descobrindo os brancos. In: 
NOVAES, Adauto (org.). A outra margem do ocidente. São Paulo: Companhia das 
Letras, 1999. Pp. 15-21.

Outros materiais

Materiais relacionados

Perguntas relacionadas

Perguntas Recentes