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Aula 3 ORIENTAL

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Aula 3: Bizâncio e Justiniano
	
		Ao final desta aula, o aluno será capaz de:
1. Identificar as principais características do governo de Justiniano; 
2. compreender a concepção de reconstrução do Império Romano defendida por Justiniano; 
3. analisar as contribuições de seu governo para o âmbito do Direito; 
4. reconhecer os problemas internos e externos enfrentados pelo Império Bizantino ao longo dos séculos VI e VII; 
5. analisar as querelas religiosas ocorridas ao longo dos século VI e VII.
Como vimos na aula passada, em 518 inicia-se a Dinastia Justiniana, com a subida ao trono do soldado Justino. Segundo a historiografia, o governo era exercido de fato por seu sobrinho, Pedro Sabático. O jovem viria a sucedê-lo sob o nome de Justiniano.
Ao longo das primeiras dinastias, o Império Romano do Oriente preservou a essência dos elementos romanos, mantendo, inclusive, o latim como idioma oficial. Em termos de estruturas político-administrativas, essa lógica se repetiu.  A partir do século VII, as contribuições gregas e asiáticas passam a prevalecer, o que alguns entendem como uma “orientalização” ou “helenização” do Império.
Justiniano (527-565) era casado com uma mulher de origem humilde chamada Teodora. Ao contrário da maioria das mulheres de seu tempo, relegadas a um papel secundário pelos narradores, ela foi diversas vezes citada por seu papel significativo no governo do esposo. Teria influenciado decisivamente em questões de foro político e religioso.  
Logo no início de seu governo de fato, o imperador Justiniano tentou solucionar uma questão que se arrastava por décadas, o Primeiro Cisma da Igreja Católica. Mas o que foi esse Cisma? Em primeiro lugar, a palavra Cisma é empregada em vários contextos históricos, com o sentido de separação.  
Você deve se lembrar do Cisma ocorrido entre as 12 tribos hebraicas que originou a formação de dois reinos: o Reino de Israel e o Reino de Judá, conteúdo estudado em Antiguidade Oriental.  
Em 478, o Patriarca de Roma tomou uma atitude extrema ao excomungar o líder religioso Oriental, o Patriarca de Constantinopla.
Desde o Concílio de Niceia, em 325, a Igreja estava subdividida em cinco domínios: o de Roma, o de Constantinopla, o de Jerusalém, o de Alexandria e o de Antioquia. Havia, no entanto, uma maior ascendência do Patriarca romano.
Isso ocorreu porque ele não tomara atitudes para coibir uma heresia, o Monofisismo, cujo número de adeptos era significativo no Egito, Síria e na Terra Santa. Os monofisistas defendiam que a natureza de Cristo era una, ou seja, era apenas espiritual.
Após a excomunhão, o imperador bizantino apoiou o Patriarca, enquanto os poderes então estabelecidos em Roma ficaram ao lado do Papa, levando à desvinculação momentânea das Igrejas Ocidental e Oriental.  Com o projeto de reunir novamente Ocidente e Oriente, Justiniano se comprometeu a proteger a ortodoxia da Igreja e passou a perseguir as heresias, a despeito de sua esposa, que seria adepta do Monofisismo.
A administração do Império Bizantino foi aos poucos se baseando na lógica do Cesaropapismo, ou seja, o imperador assumiu o poder secular e o poder religioso. Na prática, ele poderia ingerir sobre a doutrina e a sociedade cristã, o que seria, teoricamente um atributo dos membros do clero.
A Igreja passou a ser subordinada ao Estado enquanto o imperador era considerado um representante de Deus na terra. Essa premissa não era uma novidade, visto que desde o governo de Constantino a prática já ocorria. O imperador bizantino deveria, no entanto, respeitar e preservar os privilégios do clero.   Baseado em uma autocracia, esse líder era assessorado por uma complexa rede de funcionários.
A economia do Império Bizantino acompanhava a tendência natural da região. Sempre utilizada como entreposto comercial, manteve essa característica, conectando-se ao Oriente e Ocidente por terra e mar.   
Foi desenvolvido também um significativo setor artesanal, organizado em corporações comandadas e organizadas pelo Estado. As propriedades rurais estavam concentradas nas mãos de poucos indivíduos, sendo a agricultura fundamental para o abastecimento interno.
A política externa de Justiniano apresentou duas posturas: em alguns momentos conciliatória e em outros belicista. Um exemplo da primeira conduta foi a assinatura do tratado de paz com o rei persa em 532. O objetivo era apaziguar as fronteiras orientais do Império. Para tanto, Justiniano se comprometeu a pagar anualmente tributos à dinastia reinante, os sassânidas.
Em relação ao Ocidente, sua postura foi diferenciada. Com objetivo de “reconstruir” o Império Romano, empreendeu batalhas em várias frentes, começando pelo norte da África. Essa região estava sob domínio dos vândalos, um dos povos que ocuparam os domínios romanos após a desagregação do Império. A empreitada foi bem sucedida e o domínio sacramentado em 548.  
A POLÍTICA EXTERNA DE JUSTINIANO:
Continuando seu expansionismo, sob a tutela de seu general de confiança, Belisário, Justiniano retomou dos godos a Sicília, Ravena, Nápoles e Roma e, dos visigodos, partes da Península Ibérica conforme observamos no mapa:
Apesar de seu governo ser conhecido como a época de ouro do Império Bizantino, suas conquistas mostraram-se efêmeras. Mantê-las representava um ônus muito significativo para as receitas imperiais, pois demandavam exércitos para preservá-las sob jugo.
Além disso, essas áreas, em sua maioria, apresentavam-se financeiramente inviáveis. Em suma, redundavam em prejuízo e acabaram precipitando problemas internos como veremos a seguir.  
POLÍTICAS INTERNAS DE JUSTINIANO:
Justiniano, para fazer frente a tantos gastos com os exércitos expansionistas, empreendeu uma reforma de cunho fiscal que representou um acréscimo significativo na tributação interna. Esse foi um dos motivos para o início da Revolta de Nika (ou Nike), ocorrida em 532, e que terminou com a morte de milhares de manifestantes. O fim do conflito representou a consolidação do poder de Justiniano.
Outro motivo alegado para o início do movimento, que durou aproximadamente uma semana e chegou a investir outro imperador no cargo, foi a opressão de Justiniano sobre o monofisismo.
O palco da revolta foi um lugar muito apreciado pela população: o hipódromo. Esse local era um centro de lazer, mas também palco da vida social e de disputas religiosas e políticas.  Lá, reuniam-se as facções desportivas divididas por cores e também por ideias.
ERAM QUATRO EQUIPES: os azuis, os verdes, os vermelhos e os brancos. Os mais beligerantes eram os primeiros grupos, sendo que a equipe Azul refletia os interesses dos grandes proprietários e da tradição religiosa. Já os Verdes representavam artesãos, comerciantes, altos funcionários provinciais, além de adeptos do monofisismo.
A situação foi precipitada por uma divergência acerca do cavalo vitorioso em um páreo. Justiniano, contrariando a lógica de apoiar uma facção para enfraquecer outra, recusou-se a fazê-lo, o que gerou um efeito rebote: Azuis e Verdes uniram-se contra ele.
Como vimos, não foi um motivo bobo como o resultado de uma corrida, que desembocou no movimento e sim um acúmulo de questões.
Política interna de Justiniano
Os sediciosos tomaram quase toda a capital. Segundo o historiador Procópio de Cesareia, Justiniano cogitou a fuga e foi contido por sua esposa Teodora, que teria dito: "Ainda mesmo que a fuga seja a única salvação, não fugirei, pois aqueles que usam a coroa não devem sobreviver à sua perda. Se queres fugir, César, foge; eu ficarei, pois a púrpura é uma bela mortalha."
A partir de então os revoltosos foram visceralmente retaliados pelo general de confiança de Justiniano, Belisário, e a situação contornada com a utilização dos impostos para a reconstrução dos monumentos depredados durante o movimento.
A CULTURA NO IMPÉRIO DE JUSTINIANO:
Falando da arte bizantina propriamente dita, observamos que a multiplicidade de influências , ou seja, romana, grega e oriental gerou um produto novo, rico no que tange a cores, estilose formas.
Foi uma arte extremamente ligada à funcionalidade, visto que servia essencialmente à religião. 
Em relação à arquitetura, quase nada temos de construções mundanas, no entanto, muitos templos ainda testemunham essa arte. 
Era a tônica das igrejas bizantinas, a aplicação de abóbodas e cúpulas.
Durante os anos de seu governo, Justiniano implementou uma série de grandes construções, das mais diferentes naturezas: desde de fortalezas até suntuosas igrejas, sendo a mais conhecida, a Basílica de Santa Sofia.
Essa obra arquitetônica, também conhecida como Hagia Sofia, foi transformada em mesquita por volta de 1453, quando os turcos otomanos seljúcidas dominaram o Império. No século XX, tornou-se um museu. Na decoração interior, era largamente empregado o mosaico. O mosaico bizantino tinha como objetivo ornamentar os templos, mas também o lado proselitista, ou seja, de divulgação dos valores cristãos entre os fiéis. Dessa forma, eram retratados episódios da vida de Cristo e de seus seguidores. Em termos de técnicas, o dourado era muito utilizado dado o seu simbolismo e os personagens sempre retratados frontalmente, sem nenhuma preocupação com os planos ou a perspectiva.  
A pintura seguia a rigidez dos mosaicos e era manifestada através de afrescos com imagens de anjos, apóstolos e santos. Nos séculos seguintes, a questão da representação de seres humanos ou de Deus redundaria em uma polêmica conhecida como Questão Iconoclasta. Assunto que trataremos nas próximas aulas.
A produção literária em Bizâncio foi igualmente profícua. Com o passar dos séculos, o latim foi sendo totalmente substituído pelo grego nas composições. Era muito comum os manuscritos serem decorados com as chamadas iluminuras.
Em termos de gêneros, temos uma maior quantidade de material ligado à religião, ou seja, hinos, hagiografias e tratados de Teologia. Conhecemos também obras ligadas a assuntos mundanos, como poesia, tratados de guerra, romances épicos e relatos históricos.     
O CORPUS IURIS CIVILIS:
Ao longo do governo de Justiniano, foram implementadas várias modificações no âmbito legal. A primeira delas, no ano de 529, foi uma revisão do até então utilizado Código legal romano. Para tal tarefa foram designados dez homens proeminentes. Alguns anos mais tarde, essa obra foi revista e complementada materializando do Corpus Iuris Civilis. Essa foi a base legislativa do Império Bizantino até sua desagregação.
A preocupação de Justiniano com a reformulação do Direito é facilmente compreensível; seria uma maneira de legitimar e consolidar o poder imperial e estabelecer um sistema jurídico eficaz para o Estado.
Esse documento foi subdividido em quatro livros: Codex, Digesto (também conhecido como Pandectas) Institutas e Novelae, cada um deles com características particulares. Segundo a historiadora do Direito Flavia L. Castro: “O Codex foi completado em 529 e reúne a coleção completa das Constituições Imperiais, o Digesto é a seleção das obras dos jurisconsultos, as Institutas são um manual de Direito para estudantes e as Novelae são a publicação das leis do próprio Justiniano”. (CASTRO, F.L. História do Direito Geral e do Brasil. Rio de Janeiro: Lumen Iuris, 2007, p. 86)
Um dos elementos dignos de menção no Código Justiniano foi sua percepção acerca dos judeus. Foram criadas várias normas que hoje qualificaríamos como anti-semitas, mas que adequavam à lógica de aproximação com a Igreja adotada pelo imperador. 
Dentre essas medidas podemos citar: proibição de relações sexuais entre judeus e cristãos, os judeus estavam proibidos de exercer qualquer cargo público, jamais poderiam testemunhar contra cristãos e, tampouco, ler a Bíblia em hebraico.
Alguns historiadores do Direito, como L. Genicot, identificam nesse documento a base para a tradição jurídica ocidental, visto que muitos de seus fundamentos se aplicam nos dias atuais. Princípios tais como: não há crime sem lei anterior que o defina e em caso de dúvida o réu deve ser beneficiado já estavam esboçados nesse compêndio.
Simultaneamente, os lombardos ocuparam a Península Itálica, o que provocou a perda de significativos territórios na região. Como é fácil concluir, o projeto expansionista de Justiniano não sobreviveu a seu realizador. O Império passou a viver uma crise acentuada que demandou reformas empreendidas pela dinastia seguinte, a Heráclida (610-717).
Apesar das tentativas, os problemas religiosos, as pendências econômicas, a corrupção e a falência militar se acentuaram. O Império Bizantino passou então a administrar conflitos de maior ou menor expressão. Já no século VII, enfrentou um vivaz adversário, a expansão islâmica, assunto da próxima aula. 
Os gassânidas e a organização da Península Arábica. 
O povo dos livros: organização de judeus e cristãos no Oriente. 
Maomé e a o início do Islamismo. 
 
 
Nessa aula você:
Compreendeu as mudanças introduzidas por Justiniano na estrutura política e econômica de Bizâncio; 
aprendeu que o Império Bizantino passou por momentos de instabilidade interna e externa ao longo dos séculos VI e VII; 
analisou algumas querelas religiosas surgidas no seio da Igreja Católica.

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