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0 FACULDADE DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS APLICADAS DO ARAGUAIA – FACISA COORDENAÇÃO DO CURSO DE DIREITO TRÁFICO DE MULHERES E CRIANÇAS NO BRASIL HÉRICA CHRISTIANA MARTINS CARDOSO BARRA DO GARÇAS, 2008 1 FACULDADE DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS APLICADAS DO ARAGUAIA – FACISA COORDENAÇÃO DO CURSO DE DIREITO TRÁFICO DE MULHERES E CRIANÇAS NO BRASIL Monografia elaborada pela acadêmica Hérica Christiana Martins Cardoso como exigência do Curso de Graduação em Direito, da Faculdade de Ciências Jurídicas e Sociais Aplicadas do Araguaia – FACISA, sob a orientação do Professor de Conteúdo Esp. Leonardo André da Mata e da professora Ms. de Metodologia Poliana Ferreira Assunção, na linha de pesquisa de Direitos Humanos. BARRA DO GARÇAS, 2008 2 HÉRICA CHRISTIANA MARTINS CARDOSO TRÁFICO DE MULHERES E CRIANÇAS NO BRASIL Nota: ...................... Esta monografia foi julgada adequada para a obtenção do título de bacharel em Direito e aprovada em sua forma final pela Coordenação do Curso de Direito da Faculdade de Ciências Jurídicas e Sociais Aplicadas do Araguaia. Banca Examinadora: ___________________________________________________________________________ Presidente: Professor (a)............................................................................................................... ___________________________________________________________________________ Membro: Professor (a)................................................................................................................ ___________________________________________________________________________ Membro: Professor (a)................................................................................................................ ___________________________________________________________________________ Coordenador do Curso: Prof. Esp. Ronny César Camilo Mota Barra do Garças, ................de...............................2008 3 Ao meu filho José Rildo Jr. com todo amor. Ao meu esposo José Rildo pelo incentivo e cuidados. A minha amiga, mãe de coração Ana da Mata pelas lições de vida, dirigidas a mim. Aos meus pais e irmãos com todo carinho. 4 AGRADECIMENTOS Agradeço ao meu filho, por ser minha eterna fonte de inspiração e amor, meu verdadeiro amor. “Filhos são presentes de Deus” (autor desconhecido). Ao meu esposo pela compreensão dos dias ausentes, e pelos cuidados com o nosso filho durante todo o período do curso, pois só assim foi possível concluí-lo com tranqüilidade. Ao meu orientador Advogado e Professor Especialista Leonardo André da Mata, pela dedicação, e transmissão dos seus conhecimentos em prol dos meus, que serão de grande valor na minha vida jurídica futura. Agradeço vivamente pela oportunidade de ter vivido cinco anos com companheiros tão significativos, que de uma forma e outra contribuíram para o aumento do meu conhecimento. “Sem um amigo não se alcança um objetivo, sem um ombro amigo não superamos as dificuldades, e, sobretudo, que sem a amizade não somos capazes de promover a justiça.” (Marcelo Barbosa Arantes) A Deus por todas as graças concedidas, e por tantas misericórdias no decorrer de nossas vidas. Obrigada. 5 “A igualdade pode ser um direito, mas não há poder sobre a Terra capaz de a tornar um fato”. (Honoré de Balzac) 6 RESUMO Na época da descoberta do Brasil, o País estava condicionado a ser destinado a recepção de pessoas traficadas, assim como relata a história, os navios negreiros carregados de negros desembarcavam em nossos portos, e as pessoas que ali se encontravam não tinham destino nem objetivos, e comandadas pelos seus senhores. Com a crescente globalização o Brasil passou da condição de País de destino, para a condição de fornecedor de pessoas, mas especificamente de mulheres e crianças onde o número deste tipo de tráfico é maior, o comércio de pessoas é bastante lucrativo e só perde para o tráfico de drogas e armas. As vítimas deste tipo de tráfico na maioria das vezes são de baixa renda e com o nível de informação bem a quem do racional, ligando ainda esta problemática com a exploração sexual, estendendo ainda para o trabalho forçado e adoção ilegal nacional e internacional, nos casos das crianças e turismo sexual infantil. As formas de combate ao tráfico de mulheres e crianças literalmente estão ligadas aos Tratados, Acordos e Convenções mundiais realizadas pelos Direitos Humanos e as Leis internas com dispositivos específicos para punir os responsáveis por crimes deste nível. PALAVRAS-CHAVE: Tráfico. Mulheres. Crianças. Brasil. 7 SUMÁRIO INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 12 1. TRÁFICO DE MULHERES E CRIANÇAS NO BRASIL ............................................. 14 1.1 HISTÓRICO DO TRÁFICO DE PESSOAS ................................................................. 14 1.2 O BRASIL HOJE ........................................................................................................... 15 2. ROTA DO TRÁFICO E AS PRINCIPAIS CAUSAS DO TRÁFICO DE MULHERES E CRIANÇAS NO BRASIL ..................................................................... 21 2.1 CAUSAS DO AUMENTO DO TRÁFICO DE MULHERES E CRIANÇAS NO BRASIL ........................................................................................................................... 26 2.2 ROTA DO TRÁFICO DE MULHERES E CRIANÇAS ................................................ 31 3. ACORDOS, CONVENÇÕES, PROTOCOLOS E DECLARAÇÕES INTERNACIONAIS ......................................................................................................... 36 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................. 48 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................................. 50 8 LISTA DE ABREVIATURAS CECRIA – Centro de Referência, Estudos e Ações sobre a Criança e Adolescentes. IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. LACRI – Laboratório de Estudo da Criança da USP. OIT – Organização Internacional do Trabalho. PESTRAF – Pesquisa sobre Tráfico de Mulheres, Crianças e Adolescentes para fins de Exploração Sexual Comercial. PIB – Produto Interno Bruto. SEADE – Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados. UNICEF – Fundo Internacional de Emergência das Nações Unidas para a Infância. USP – Universidade do Estado de São Paulo. 9LISTA TABELAS Tabela 1 – Estrutura do Sistema Educacional Após a Lei n.º 394/96 ..................................... 18 Tabela 2 - Acordos, Convenções, Protocolos, Pactos e Declarações Internacionais ............... 37 10 LISTA DE FIGURAS Figura 1 - Configuração do Tráfico de Mulheres, Crianças e Adolescentes para Fins de Exploração Sexual Comercial ................................................................................ 33 11 LISTA DE GRÁFICOS Gráfico 1 - Distribuição por Idade das Pessoas Traficadas ...................................................... 28 12 INTRODUÇÃO O presente estudo monográfico tem como título “O Tráfico de Mulheres e Crianças no Brasil” a delimitação do tema faz necessária para produção de conhecimentos e melhor desenvoltura dos textos. Desta forma pretende-se apresentar à sociedade a gravidade, as causas mais comuns que ensejam o tráfico de mulheres e crianças no Brasil. Os métodos e técnicas utilizados para o desenvolvimento deste trabalho monográfico é o método qualitativo por explicar e descrever, sem a preocupação de medir ou qualificar os dados a serem coletados no decorrer das pesquisas. Para a composição do corpo monográfico a pesquisa bibliográfica, aliadas as técnicas de pesquisas mais comuns são os levantamentos documentais, esta opção dar-se-á pela relevância de conhecimentos certificados e atualizados. Assim o objetivo geral desta monografia é revelar o tráfico de mulheres e crianças e as causas que dão ensejo a este tipo de crime. A justificativa para escolha do tema em tela se dá principalmente pelo aumento do tráfico de mulheres e crianças nos últimos anos. Este trabalho monográfico será dividido em (03) três capítulos, que tentarão fazer com que as propostas, pretendidas no projeto de pesquisa sejam alcançadas com resignação durante o desenvolvimento de cada um. O primeiro capítulo tem o propósito de expor o quadro histórico do tráfico de pessoas desde a história negreira até a atualidade, mais de forma suscita para entendermos a realidade do Brasil de hoje e a formação das sociedades, neste mesmo capítulo abordaremos sobre a estrutura educacional e as diferenças socioeconômicas que existe entre homens e mulheres. O segundo capítulo será dedicado ao objetivo específico do projeto que são os motivos, as causas pelas quais ocorre o tráfico de mulheres e crianças no Brasil, neste mesmo 13 momento trarão à luz do conhecimento a distinção entre tráfico, rufianismo, contrabando de pessoas, migração e imigração. Outro dado importante que será abordado dentro deste mesmo capitulo são rotas internas tráfico de mulheres e crianças e os circuitos internacionais onde o tráfico de mulheres e crianças passa a ser transnacional, estenderemos as pesquisas aos figurantes os sujeitos ativo e passivo deste tipo de tráfico. O terceiro e último capítulo terá o foco voltado para as formas de coibição do tráfico de mulheres e crianças, a legislação interna Código Penal, Estatuto da Criança e do Adolescente, e no nível internacional os Acordos, Tratados, Convenções, Protocolos e Declarações que o governo brasileiro mantém com outros Países com o objetivo de exaurir o tráfico não só o de mulheres e crianças, mas de pessoas. Ao final do terceiro capítulo, esperamos ter alcançado o objetivo pretendido que o estudo se refere no âmbito social, econômico, jurídico, pessoal e cultural do tema abordado, e ter esclarecido o desejo do projeto de pesquisa. 14 1 TRÁFICO DE MULHERES E CRIANÇAS NO BRASIL “Equiparamos a escravidão quase à morte” (Ulpiano) 1.1 HISTÓRICO DO TRÁFICO DE PESSOAS A história do Brasil é marcada por alguns fatos, que hoje seriam crimes de grandes comentários entre os juristas e doutrinadores com penas a serem cumpridas e questionamentos sociais intermináveis. Nesta época a colonização da nova terra descoberta em torno do ano de 1500 por Pedro Álvares Cabral, teve marcos importantes como à colonização, a posse da terra, descobertas de novas riquezas a exemplo podemos citar o pau brasil e ouro e mais tarde a produção do café e a pecuária. Em resumo quando o Brasil foi descoberto por Pedro Álvares Cabral ele já era habitado por indígenas, os quais não admitiam o domínio dos novos senhores. Brancos e índios por sua vez entraram em conflito. (DREGUER; TOLEDO, 2006, p.132 - 137). Mas, o dilema ainda continuava a nova terra precisava ser explorada, as riquezas naturais eram focos de ambição entre os colonizadores e para dar contornos a esta exploração era necessário mão de obra forte e sem gastos. Na busca de solução para a servidão e trabalho forçado os colonizadores, resolveram transportar do Continente Africano os negros que na forma colocada não eram pessoas, (homens, mulheres e crianças) eram somente negros. Os negros eram transportados em navios em condições subhumanas, com percurso que levava meses até chegarem ao destino, os portos brasileiros. Já no desembarque eram entregues para seus donos como mercadorias para a servidão escrava. (DREGUER; TOLEDO, 2006, p.132- 137). 15 Usando a coação os senhores ajustavam os negros para serví-los de todas as formas escrava, a exemplo podemos citar privação de liberdade, essa sem dúvida era a pior delas, mão de obra, exploração sexual das jovens negras, elas eram usadas até mesmo na amamentação dos filhos dos senhores e senhoras, como não havia limites os abusos eram ostentadores, a repressão e a distância dos locais vindouros dificultavam ainda mais a liberdade dos negros e a permanência no cativeiro se tornava eterna. (DREGUER; TOLEDO, 2006, p.132-137). A partir da historia negreira começamos a analisar o surgimento do tráfico de pessoas, mas a situação atual e totalmente inversa da que relatamos anteriormente naquela época o Brasil era um receptador de pessoas, hoje passou a ser um fornecedor de pessoas independente de cor ou raça. Nos últimos 100 anos o Brasil passou da condição de País de destino para a de fornecedor de pessoas mais especificamente de mulheres e crianças, onde o numero deste tipo de tráfico é maior, assim como diz Damásio de Jesus (2003, p. 24) “o comércio de pessoas é bastante lucrativo e só perde para o tráfico de drogas e armas”. As vitimas deste tipo de tráfico são de baixa renda e com o nível de informação bem a quem do racional, ligando ainda esta problemática com a exploração sexual, estendendo ainda para o trabalho forçado e adoção ilegal internacional nos casos das crianças e turismo sexual infantil. 1.2 O BRASIL HOJE O Brasil (oficialmente República Federativa do Brasil) é uma república federativa formada pela união de 26 estados federados e pelo Distrito Federal. O país conta 5.564 municípios, bem como uma área de 8.514.876,599 km², equivalente a 47% do território sul- americano. Em comparação com os demais países do globo, dispõe do quinto maior contingente populacional e da quinta maior área. Nona maior economia do planeta e maior economia latino-americana, o Brasil tem hoje forte influência internacional, seja em âmbito regional ou global. O País possui entre 15 e 20% da biodiversidade mundial, sendo exemplo desta riqueza a Floresta Amazônica, com 3,6 milhões de quilômetros quadrados (IBGE, 2008). População atual: 186.690.583 habitantes Cidades mais populosas: São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador, Brasília, Fortaleza, Belo Horizonte, Curitiba,Manaus, Recife, Porto Alegre, Belém, Goiânia, Guarulhos, Campinas e São Gonçalo. (IBGE, 2008) 16 Expectativa de Vida – A expectativa de vida do brasileiro hoje, ao nascer era 72,3 anos. Em relação à de 1960 (54,6 anos), este número é maior em 32,4% (ou 17 anos, 8 meses e 1 dia). Em média, anualmente, nesse período, houve um aumento de quatro meses e 18 dias, sendo de quatro meses para os homens e de cinco meses e 7 dias para as mulheres. Em 2005, a esperança de vida era de 71, 9 anos, sendo a masculina 68, 2, e a feminina, 75,8. Nesses 46 anos, a esperança de vida das mulheres teve a maior alta (35,7%), chegando 76,1 anos, contra 68,5 anos para os homens (28,9%). Em relação a 1960, elas estão vivendo a mais, em média, 20 anos e 34 dias, e eles, 15 anos, 10 meses e 14 dias. Alguns dos fatores que contribuíram para esta mudança foram à melhoria no acesso da população aos serviços de saúde, as campanhas de vacinação, o aumento da escolaridade, a prevenção de doenças e os avanços da medicina. Numero de Mulheres em relação aos Homens - As mulheres representam mais da metade da população brasileira. De acordo com a Síntese de Indicadores Sociais -2008, a população brasileira em 2006 era de 187,2 milhões de habitantes. Desse total, 96 milhões eram mulheres. O aumento da proporção de mulheres em relação a homens é uma tendência demográfica no Brasil, ou seja: a cada nova pesquisa, os resultados mostram que a população feminina tem aumentado cada vez mais em relação à masculina. O indicador demográfico que expressa essa proporção se chama razão de sexo; ele mostra o número de pessoas do sexo masculino para cada grupo de 100 pessoas do sexo feminino (IBGE, 2008). O Brasil do século XX é vasto em números de habitantes, o século das transformações, uma das mais evidentes delas sem dúvida é o crescimento acelerado das grandes aglomerações urbanas, a urbanização extensiva, onde o tecido urbano avança sobre o antigo espaço rural materializando a complexidade sócio espacial que envolve os processos de produção e reprodução da vida capitalista/industrial. O Brasil é marcado como um país que se urbanizou de maneira acelerada, a metropolização agora é fato e estende por todo o País. Simultaneamente ao aumento da importância demográfica desses grandes espaços metropolitanos vimos crescer constantemente os problemas de ordem social, cujos principais exemplos são pobreza e a violência. O Brasil não tem uma metodologia oficial para o cálculo da linha de pobreza. A mais usada atualmente é a do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), que calcula em 33,64% a proporção de pobres no conjunto da população, cerca de 57 milhões de pessoas. São considerados pobres, para o Ipea, os que não conseguem renda suficiente para suprir suas necessidades calóricas e satisfazer necessidades de saúde, educação e transportes, por exemplo. (IPEA, 2008) Os apontamentos das pesquisas feitas pelo renomado professor Damásio de Jesus, (2003, p. 61-62) revelam que violência é a segunda principal causa de mortalidade global em 17 nosso país e só fica atrás das mortes por doenças do aparelho circulatório. Os jovens são os mais atingidos, além deles, a violência atinge ainda em grau muito elevado as crianças e as mulheres. Para esta situação contribuem diversos fatores, entre eles a má distribuição de renda, a baixa escolaridade e o desemprego. A criminalidade é um problema social, político e econômico que tem se agravado dia após dia no Brasil e que, crescentemente afeta a vida de seus cidadãos, por impor fortes restrições econômicas e sociais, bem como uma generalizada sensação de medo e insegurança. Os registros mais comuns de violência urbana são: violência doméstica (mulheres e crianças), ameaça lesão corporal, difamação, calúnia, dano, atentado violento ao pudor, tentativa de estupro, vias de fato e tentativa de homicídio. Ao fazermos estes apanhados de registros dos crimes mais comuns observamos que são restritas as informações referentes aos crimes de rufianismo e os crimes de tráfico de mulheres e crianças, parece-nos que o assunto gera desconforto e constrangimento social, observamos que existem outras relevâncias em torno das denúncias que envolvem estes tipos de crime. O assunto será abordado com mais afinco no decorrer do trabalho. A violência contra mulheres e crianças não está adstrito a um certo meio. A professora Maria Berenice afirma que a violência contra mulheres atinge números alarmantes, com conseqüências avassaladoras, no que se refere às crianças o LACRI Laboratório de Estudos da Criança da USP, revela em pesquisas que a violência contra crianças é uma agravante no índice de mortalidade e foram contabilizadas 532 mortes de crianças e adolescentes em conseqüência da violência doméstica. Conforme dados apresentados pelo IBGE: Embora as Pesquisas, tenham nos mostrado avanços nos índices de escolaridade nos últimos anos, o Brasil ainda tem 14 milhões de crianças e adolescentes com até 17 anos sem freqüentar a escola. O dado representa 24,2% do total. Segundo levantamento feito pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2004, o índice era de 26,2%. Desse total, 82,4% tinham até seis anos de idade. O percentual da faixa de 7 a 14 anos era de 4,6% enquanto 13% tinham de 15 a 17 anos. Outro dado observado mostra que a taxa de escolarização feminina superou a masculina nas três faixas etárias em que as crianças e adolescentes deveriam estar cursando o pré-escolar e os ensinos fundamental e médio. Para crianças de 0 a 3 anos, no entanto, a taxa de freqüência é maior entre os meninos (16,1%) do que entre as meninas (14,8%). De acordo com o levantamento do IBGE, quanto maior o rendimento médio per capita domiciliar, maior é a taxa de freqüência escolar. E a rede pública é a mais usada com 83,6% dos que freqüentam a escola. O índice de freqüência na rede pública é de 57,7% na creche, 73,5%, na pré-escola, 87,8% no ensino fundamental e 80,4% no ensino médio. O percentual vai aumentando de nível até o ensino médio, quando há uma queda. Na rede particular, o comportamento é diferente e o 18 índice de freqüência é menor do que na rede pública. Freqüentavam a creche 42,3%, a pré-escola 26,5%, o ensino fundamental 12,2% e o médio 19,6% e isso ocorre pela desigualdade econômica do País. (IBGE, 2008) Conforme citamos e no ensino médio começam acender as chamas das dificuldades para uma educação superior, e momento da queda ou interrupção dos estudos, nesta fase o aluno fica divido entre trabalhar e estudar, e diante da atual circunstância brasileira a renda pesa mais que o conhecimento, com isso o abandono escolar se torna mais propício. Tabela 1 – Estrutura do Sistema Educacional Após a Lei n.º 394/96 Níveis e subdivisões Duração Faixa etária Educação básica Educação infantil Creche 4 anos De 0 a 3 anos 3 anos De 4 a 6 anos Ensino fundamental (obrigatório) 8 anos De 7 a 14 anos Ensino médio 3 anos De 15 a 17 anos Educação superior Cursos por área Variável Acima de 17 anos Fonte: OEI – Ministério da Educação do Brasil O gráfico nos mostra a estrutura do sistema educacional após a Lei 9.394/96, a escala educacional proposta pela Lei oferece educação do 0 aos 17 anos que é a base da educação infantil do Brasil. Segundo a Organização das Nações Unidas, o Brasil está longe da igualdade racial na educação, mais não é somente na educação, economicamente e socialmente esta variável é bastante representativa, o racismo ainda hoje é bem concentrado, entrea população, a cor imposta como padrão social e a branca. E se o negro for do sexo feminino as dificuldades se agravam ainda mais, estas desclassificações segundo a cor são heranças que guardamos do passado sujo que envolveu a escravidão dos povos negros, ficou entre nós o estigma que o negro seja só um negro dificultando ainda mais o envolvimento nos parâmetros sociais. As variáveis da desigualdade são mais visíveis nas escolas, dados nos revelam as diferenças em números, a população negra de 15 a 17 anos que cursava o ensino médio 19 (37,94%) distanciava-se 20,9 pontos percentuais da dos brancos (58,3%). No ensino superior, a proporção da população negra com escolarização na idade correta foi de 6,1% - 12,7 pontos percentuais menores que a população branca (IBGE, 2008). Os pesquisadores relacionam o índice de desemprego com o PIB (Produto Interno Bruto) dividindo a pesquisa em pontos, ou seja, para cada ponto de PIB existe uma baixa de 0,5 por ponto percentual de desemprego no País (IBGE, 2008) Em relação a taxa de desemprego entre as mulheres nas regiões metropolitanas, apuradas em pesquisas da Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados (Seade), caiu para 17,8% no ano passado. No ano de 2006, a taxa de desemprego feminino estava em 18,6%. A pesquisa mostra que a participação das mulheres no mercado de trabalho em 2007 - entre trabalhadores ocupados e desempregados - caiu para 55,1%. É o primeiro recuo desde 1995. No ano passado, o nível de ocupação entre as mulheres cresceu apenas 1,5%. O desempenho foi positivo somente no setor de comércio e serviços. Devido ao crescimento menor, a participação das mulheres no total de trabalhadores ocupados da região metropolitana de São Paulo diminuiu de 45%, em 2006, para 44,7% no ano seguinte. O levantamento da Seade (Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados) aponta que o rendimento médio real por hora permaneceu praticamente estável em 2007 em relação ao ano anterior, de R$ 5,42. De acordo com a Seade, esse valor e equivale a 77,9% atribuído aos homens (R$ 6,96). Em 2007, o rendimento médio mensal das mulheres ocupadas na região metropolitana de São Paulo equivalia a R$ 905,00. A título de comparação, o salário médio mensal dos homens chegou a R$ 1.340,00 (Seade, 2008). Apesar dos dados estatísticos mostrarem que as mulheres são em maior número nas escolas e faculdades, o desemprego ainda continua sendo o grande vilão da desigualdade entre homens e mulheres. As imposições para a mão de obra feminina são bem maiores em relação à masculina. O desemprego figura em maior dimensão se a mulher for negra, embora esta discrepância esteja presente nas comparações feitas entre os homens observamos, que o racismo impera até mesmo no mercado de trabalho. Já o trabalho infantil é um dos principais problemas sociais encontrados no País desde a revolução industrial. Segundo estimativas globais da Organização Internacional do Trabalho, 165 milhões de crianças, de 5 a 14 anos de idade, são vítimas do trabalho infantil. Fonte: OIT (Organização Internacional do Trabalho). Muitas crianças trabalham longas horas em condições perigosas. O trabalho infantil é comum em países subdesenvolvidos. Exemplo destes países é o Brasil, onde observamos que, quanto mais pobre e a região mais comum é a mão de obra desenvolvida por 20 crianças, pois na maioria das vezes ocorrem pela necessidade de ajudar financeiramente a família pobre com grande número de filhos que enseja a exploração da mão de obra infantil. No Brasil existe uma Legislação especifica para tratar da proteção da criança, Lei nº 8.069/90 Estatuto da Criança e do Adolescente. Os três pontos mais importantes para a estrutura de uma pessoa estão nas relações de trabalho, educação e igualdade, estes são os conceitos basilares de uma vida digna e ícone da Constituição Federal/88 dignidade da pessoa humana. Verificamos que as mulheres padecem na busca da estrutura social em relação às crianças, estas são as maiores vítima das desigualdades sociais muitas vezes são abandonadas pelos próprios pais ou entregues à própria sorte. Estas dificuldades dão ensejo para os aliciadores que se oportunam da falta de informação e miséria para garantir o tráfico de mulheres e crianças. Este breve contexto histórico da formação da sociedade brasileira se faz necessária para entendermos de onde se esmeram as diferenças sociais e econômicas entre homens e mulheres, dados atuais nos revelam um Brasil condicionado a dificuldades relacionadas ao passado de exploração humana. A desigualdade socioeconômica conforme menciona o professor Damásio Jesus é um dos motivos que enseja a exploração de mulheres e crianças, levadas aos países afastados de forma ilegal, favorecendo o turismo sexual, a adoção irregular, o trabalho forçado entre outros exemplos de subordinação injusta, e o resultado de todos esses fatores é denominado pelo Professor Damásio de Jesus (2003, p. 35) de “feminilização da pobreza”. A formação e a estrutura de um País revelam as condutas da sociedade. No próximo capítulo dissertaremos sobre as causas e trajetórias do tráfico de mulheres e crianças no Brasil. 21 2 ROTA DO TRÁFICO E AS PRINCIPAIS CAUSAS DO TRÁFICO DE MULHERES E CRIANÇAS NO BRASIL. “A prostituição não é mais do que a escravidão.” (Alfred Musset) No capítulo anterior abordamos de forma sucinta o quadro da população brasileira na atualidade, relatamos trechos do Brasil Colônia mais precisamente o quadro histórico da escravidão, pois este quadro está relacionado ao tráfico de pessoas, enfocamos as diferenças sociais entre homens e mulheres, para podermos analisar com coerência os motivos pelos quais ocorrem o tráfico de mulheres e crianças no Brasil. De início é necessário compreendermos o que é este tipo de tráfico. No meu entendimento é um dos vários tipos de crime organizado, só que o material traficado é o humano, tendo como características, a exploração, a agressão moral e física das vitimas. Para o professor Damásio de Jesus (2003, p. 06), tráfico de pessoas “[...]é um fenômeno complexo que compreende uma série de atos à primeira vista isolados. Nem sempre são ilegais, embora pareçam sempre imorais. É a combinação entre a movimentação e a exploração que caracteriza o tráfico.” O significado aceito internacionalmente para tráfico de pessoas ressaltado no Protocolo para Preveni e Punir o Tráfico de Pessoas, especialmente mulheres e crianças é um protocolo adicional à Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional referente à Prevenção, Repressão e Punição do Tráfico de Pessoas em especial de Mulheres e Crianças (2000), Protocolo já aprovado pelo governo brasileiro. Segundo o referido Protocolo a expressão tráfico de pessoas significa: 22 Artigo – 3º O recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento ou o acolhimento de pessoas, recorrendo à ameaça ou uso da força ou a outras formas de coação, ao rapto, à fraude, ao engano, ao abuso de autoridade ou à situação de vulnerabilidade ou à entrega ou aceitação de pagamentos ou benefícios para obter o consentimento de uma pessoa que tenha autoridade sobre outra para fins de exploração (PROTOCOLO, 2004, p. 01). O Protocolo de Damási Contre l’Esclavage Moderne, 2003 também faz definições com as mesmas acepções acima citadas , mas aborda de forma geral usando a expressão “seres humanos” no seu artigo 4º alínea a), lê-se: Tráfico de seres humanos significa o recrutamento, transporte, abrigo e recolha de pessoas através da ameaça, uso da força ou de outras formas de coerção, fraudee decepção, pelo abuso do poder e à custa da vulnerabilidade da própria pessoa, devido ao pagamento de remuneração e/ou de outros benefícios para obter o seu consentimento com a finalidade da exploração sexual. A exploração inclui, no mínimo, a exploração advinda da prostituição de alguém e/ou de outras formas de exploração sexual, trabalho e/ou serviços forçado, escravatura ou práticas semelhantes à escravatura, servidão e tráfico de órgãos humanos (PROTOCOLO ADICONAL, 2003 p. 01). Para o Unicef o tráfico do “sujeito social”, combina a exploração, com o transporte seguido de falsas promessas, vejamos: [...] é a combinação de mobilidade e de exploração que caracteriza o tráfico que poderia ocorrer, por exemplo, no início do processo, quando um sujeito social (mulher, menino, menina, família ou comunidade) crê nas promessas de uma vida melhor em outro local, em melhores oportunidades de trabalho, em recompensas ou na promessa de estar protegido contra a discriminação ou de conflitos. Pode ocorrer, também, se esses sujeitos receberem documentos falsos que colocam a mulher ou o/a menor de idade, em situação de submissão por causa de uma dívida, assim como em uma situação juridicamente vulnerável (CECRIA apud UNICEF, 2001, p.26). Para ampliarmos o conceito de tráfico de mulheres e crianças conforme nos ensina Maria Lucia Pinto Leal e Maria de Fátima Pinto Leal, é necessário definir a exploração sexual como comercial ou forma mercantil. [...] uma violência sexual que se realiza nas relações de produção e mercado (consumo, oferta e excedente) através da venda dos serviços sexuais de crianças e adolescentes pelas redes de comercialização do sexo, pelos pais ou similares, ou pela via de trabalho autônomo. Esta prática é determinada 23 não apenas pela violência estrutural (pano de fundo) como pela violência social e interpessoal. É resultado, também, das transformações ocorridas nos sistemas de valores arbitrados nas relações sociais, especialmente o patriarcalismo, o racismo, e a apartação social, antítese da idéia de emancipação das liberdades econômicas/culturais e das sexualidades humanas. (LEAL apud CECRIA, 2001, p. 04). Como os lucros são altos e os riscos são relativamente baixos em relação aos demais tipos de tráfico este tipo de atividade vem aumentando muito nos últimos anos. Segundo Damásio de Jesus (2003, p. 73) “Este aumento é resultado da falta de comprometimento do governo brasileiro em relação ao preenchimento das exigências para a prevenção e repressão contra o tráfico de pessoas”. O professor Damásio de Jesus (2003, p. 73), nos alerta ainda para o fato deste tipo de crime ser a “terceira maior fonte de renda do crime organizado transnacional, atrás apenas do comércio ilegal de armas e drogas”. Para entendermos o tráfico de pessoas faz-se necessário diferenciá-lo de migração, de contrabando de pessoas, de imigração e de rufianismo, pois as semelhanças são sutis, porém, dentro do Direito Penal as penas são em apartadas para cada um destes delitos. Os historiadores Dreguer & Toledo (2006, 135 - 137), entendem por migração o deslocamento de pessoas de uma região, para outra por livre espontânea vontade. Observamos aqui existe a vontade da pessoa migrada. As migrações humanas são variadas dentro da historia da humanidade, possuí caráter de aventura, de necessidade ou por meio de força, esta tem sido um meio de controle social nos regimes políticos autoritários. As mais freguêntes causas de migração são: políticas, econômicas e sociais. A imigração e o inverso da migração, é a entrada ou saída de pessoas, dentro da história brasileira este fenômeno acontece desde a abertura dos portos em (1808). O tráfico de pessoas é sutilmente semelhante ao contrabando de pessoas, porém existem adornos que os diferenciam conforme define o Protocolo contra o Contrabando de Migrantes por Terra, Mar e Ar (2000) este Protocolo e um complemento da Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional. O artigo 3º a, b define o contrabando da seguinte forma: Art. 3º a, intermediação da entrada ilegal de uma pessoa em um Estado do qual não tem nacionalidade nem status de residência permanente, com o objetivo de obter, direta ou indiretamente, benefícios financeiros ou materiais de outro tipo. 24 b) atravessar fronteiras sem cumprir as exigências necessárias para a entrada legal no Estado receptor. As diferenças estão na forma de entrar em cada País ou Estado, com se refere o artigo 3º a, b do Protocolo, nestes casos o cumprimento das legalidades. O Código Penal em seu art. 230 específica o rufianismo como crime que consiste em explorar o tráfico de mulheres ou de quem participa, diretamente ou não, dos seus proventos na prática de prostituição, ou é sustentado por quem a exerça. “Art. 230 – “Tirar proveito da prostituição alheia, participando diretamente de seus lucros ou fazendo-se sustentar, no todo ou em parte, por quem a exerça: [...]”. Após analise dos tópicos acima, podemos observar que as diferenças se fazem presentes no verbo e na ação, com exceção da migração e imigração. Outro ponto de grande relevância para a pesquisa e a definição dos sujeitos do delito, pois são os figurantes das ações em estudo. O sujeito ativo do tráfico de mulheres vem descrito no código penal artigo 231, caput, e artigo 231-A como sujeito indeterminado, podendo ser qualquer pessoa. Art. 231. Promover, intermediar ou facilitar a entrada, no território nacional, de pessoa que venha exercer a prostituição ou a saída de pessoa para exercê- la no estrangeiro: (...) Art. 231-A. Promover, intermediar ou facilitar, no território nacional, o recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento ou o acolhimento da pessoa que venha exercer a prostituição: (...) A Pestraf (2001-2002) caracterizou este tipo de sujeito ativo como sendo homens e mulheres com idade na faixa de 25 a 59 anos, com poder aquisitivo auto, não residentes no Brasil, no caso de tráfico com rota internacional são pessoas influentes, possuem um grande potencial de persuasão. Já o sujeito passivo é somente a mulher e para que se configure tráfico deve haver dolo nas condutas previstas no artigo em estudo. O sujeito ativo tem como fim maior a exploração da mulher em rede de prostituição. Damásio de Jesus (2003 p. 87) faz ressalva em relação ao sujeito passivo, assim como ele mesmo coloca que vários autores também se dividem, alguns colocam como sujeito passivo direto a sociedade e sujeito passivo indireto a mulher, ou de forma contraria, mais a grande maioria a mulher é o sujeito passivo. 25 Para Noronha e Nucci apud Damásio de Jesus: O tráfico de mulheres não atenta somente contra um bem próprio do sujeito passivo, mas alcança a coletividade [...] Faz-se necessário compreender que para se chegar ao sujeito passivo é necessário verificar qual bem jurídico esta sendo tutelado pela norma. Um é dependente do outro. Por isso, parece estranho que se possa eleger como bem jurídico a tutela da moral sexual pública e como sujeito passivo a mulher. Ou o seu contrário: eleger a tutela da mulher como sendo bem jurídico e, ao mesmo tempo, entender que o sujeito passivo do delito venha ser a sociedade (NORONHA; NUCCI apud JESUS, 2003 p.87). Para colocar fim a tal mazela Damásio conclui que: [...] depender das circunstâncias em que o tráfico ocorreu, pode-se ter diferentes sujeitos passivos. Assim havendo conhecimento e anuência por parte da mulher acerca da prostituição, o bem jurídico é a moral e os bons costumes,figurando a sociedade como sujeito passivo. Inexistindo aqueles, a mulher passa a ser a vitima do delito, e de forma indireta, a sociedade, pois de qualquer forma permanecem sendo ofendido a moral e os bons costumes. (JESUS, 2003, p. 87-88). Outro ponto pertinente da pesquisa está relacionado ao consentimento da pessoa, pois se houver consentimento para os fins ensejados deixaria de ser tráfico, portanto não seriam vítimas. Esse consentimento não tem validade jurídica nos casos das crianças e adolescentes, pois são incapazes. Pestraf apud Bassiouni consentimento, atualmente é objeto de polêmica e assim nos diz: Essa questão abrange o debate sobre se uma mulher pode consentir na prostituição. Alguns dizem que não, mas os defensores dos direitos humanos afirmam que os trabalhadores do sexo têm direitos como quaisquer outros trabalhadores. Alguns baseiam seus argumentos na irrefutável presunção de nulidade de qualquer concordância com a prática da prostituição e outras formas de trabalho sexual que se fundamentem na natureza lucrativa dessa atividade. Outros apóiam esse ponto de vista porque consideram esse tipo de consentimento para se prostituir como resultado da coação econômica ou abuso de vulnerabilidade econômica da pessoa em questão. Aqueles que se posicionam no lado contrário do debate sustentam que as mulheres podem admitir livremente em se tornarem trabalhadores sexuais e que essa escolha deve ser respeitada. Existe consenso quanto à incapacidade de um menor de idade dar consentimento válido a esse tipo de exploração, mas, ainda assim, discute-se qual a idade para o consentimento à luz da diversidade cultural no mundo. (PAESTRAF apud BASSIOUNI, 2002, p. 03) 26 Damásio é catedrático ao afirmar que para a mulher ser considerada sujeito passivo, ela tem que desconhecer a real motivação de seu deslocamento. Ao contrário da criança, que sempre figura como sujeito passivo direto, o que se deve colocar em análise e o significado de criança. Para a doutrina majoritária o significado de criança está descrito no artigo 2º da Lei 8069/90 Estatuto da Criança e do Adolescente. De acordo com a Lei 8069/90, o Estatuto da Criança e do Adolescente, art. 2º “Considera-se criança, para efeitos desta Lei, a pessoa até 12 (doze) anos de idade incompletos, e adolescentes aquela entre 12 (doze) e 18 (dezoito) anos de idade”. O Protocolo adicional (2004, p. 01), para Preveni e Punir o Tráfico de Pessoas, especialmente mulheres e crianças, à Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional referente à Prevenção, Repressão e Punição do Tráfico de Pessoas, em especial de Mulheres e Crianças (2000) define a criança em seu artigo 3º “d” como sendo “O termo "criança" significa qualquer pessoa com idade inferior a dezoito anos”. 2.1 CAUSAS DO AUMENTO DO TRÁFICO DE MULHERES E CRIANÇAS NO BRASIL Para Damásio de Jesus (2003, p. 13-15), o tráfico de mulheres e crianças tem aumentado muito nos últimos anos, acredita-se que este tipo de crime esteja relacionado com outras formas de crime, mais a preferência por traficar pessoas é realmente pela lucratividade e facilidade do uso do material humano, sem contar que é renovável, ou seja, podem ser usadas repetidas vezes além do baixo investimento. Varias são as causas que ensejam o tráfico de mulheres e crianças, levantamos causas de maior relevância e que estão diretamente ligadas ao tráfico de mulheres e crianças, conforme menciona Damásio de Jesus (2003, p. 18-20) e observamos que são mais comuns do que poderíamos imaginar, a exemplo podemos citar: a informação mesmo com o aumento crescente de mulheres e crianças nas escolas e faculdades, os índices de informações ainda não conseguiram atingir o nível mediano necessário. A pobreza é uma das principais causas para que muitas mulheres aceitem promessas de trabalho e ganho vultuoso, e ao chegarem no local se deparam com uma realidade totalmente adversa, onde tem seus documentos retidos e os seus movimentos passam a ser restritos e vigiados pelos traficantes, ou como são chamados de forma clássicas agenciadores de trabalho. 27 Outra causa que apesar dos avanços sociais ocorre com muita discrepância e a discriminação em relação ao sexo feminino, é visível aos olhos, e gera polêmica quando colocada em debate. A desigualdade de oportunidade também é uma causa relevante, uma vez que as oportunidades de emprego para as mulheres são inferiores a dos homens apesar das mulheres superar os homens nas escolas e faculdades. E por último podemos citar a violência, observando que o maior índice de violência contra mulheres e crianças é a doméstica, no âmbito geral a criminalidade feminina e bem menor que a masculina. A PESTRAF - Pesquisa Sobre Tráfico de Mulheres, Crianças e Adolescentes para Fins de Exploração sexual comercial, relaciona as questões do tráfico de mulheres e crianças da seguinte forma: De acordo com as normativas nacionais e internacionais, o tráfico de mulheres, crianças e adolescentes para fins de exploração sexual, comercial é crime, e uma violação dos direito humanos; O fenômeno é multidimensional, multifacetado e complexo. Seus fatores determinantes são de ordem política, socioeconômica, cultural, jurídica e psicológica; O tráfico de mulheres, crianças e adolescentes e transnacional. As pessoas são exploradas não somente nas atividades sexuais comerciais (prostituição, turismo sexual, pornografia e tráfico para fins sexuais), mas também de outras formas: no trabalho forçado e escravo, na agricultura, nas casas de entretenimento, na pesca, nos serviços domésticos e outros; Dificuldade em dar visibilidade ao fenômeno por se tratar de uma questão relativa ao crime organizado e que envolve corrupção e pela fragilidade das redes de notificações existentes nas estruturas de poder governamentais; Cada País adota uma legislação especifica para o assunto e, quando se trata de tráfico internacional, este quadro legal torna-se muitas vezes uma barreira para o seu enfretamento. Há também a ausência de uma legislação para regular o tráfico interno, no Brasil e em alguns países; Necessidade de ampliação do debate sobre a questão do consentimento da vitima ser ou não objeto de tráfico para fins de exploração sexual comercial; Impacto da globalização no acirramento e na expansão do tráfico para fins sexuais, bem como na fragilização dos Estados-Nações e, conseqüentemente, no enfrentamento do fenômeno (PESTRAF, 2001-2002). Estas causas acima citadas são incisivas para que as mulheres incertas da jornada de trabalho aceitem as propostas dos traficantes, já no caso das crianças, estas ainda não têm a escolha de ir ou não, sendo muitas vezes vendidas pelos próprios pais, ou entregue a terceiros com a falsa promessa de que terão um futuro melhor. O professor Damásio de Jesus, (2003, p. 23-25), afirma que existem diferenças bastante distintas entre o tráfico de mulheres e o tráfico de crianças, notada diferença, se faz principalmente pela fragilidade e vulnerabilidade das crianças, o que torna mais fácil a 28 conclusão do ato, as mulheres geralmente são dotadas de vontade própria, podendo ou não aceitar o aliciamento, no caso das crianças não, muitas são seqüestrada, ou são entregue a própria sorte, vendidas, ou foge de casa para não serem agredidas, e consegue abrigo em lugares errados, além destes fatores os aliciadores observam o nível de ingenuidade da criança para serem facilmente iludidas. O professor Damásio (2003, p. 20) acentua ainda que a preferência por mulheres e crianças principalmente as crianças do sexo feminino, está relacionadadiretamente com a exploração sexual, no caso das crianças (meninas) os traficantes acentuam ainda mais preferência, pelas que não tiveram experiência sexual anterior. Outra regra imposta pelos aliciadores é a idade, conforme demonstra o gráfico a idade das mulheres e crianças variam entre 13 e 38 anos. Gráfico 1 - Distribuição por Idade das Pessoas Traficadas 5 3 6 15 15 2 2 3 2 9 9 6 4 4 3 4 3 2 1 13 anos 14 anos 15 anos 16 anos 17 anos 18 anos 19 anos 20 anos 21 anos 22 anos 23 anos 24 anos 25 anos 26 anos 27 anos 28 anos 30 anos 35 anos 38 anos Id ad e d as P es so as T ra fic ad as Fonte: PESTRAF – Banco de Matérias Jornalísticos - 2002 O perfil das mulheres e crianças segundo a Pestraf, não foge da linha de pesquisa de outros estudiosos do trafico de pessoas. Perfil das Mulheres: 29 Composição ética: a maioria é de afro-descendentes (negras e morenas); classes populares; baixa escolaridade; habitam, moram com em espaços urbanos periféricos; algum familiar; a maioria tem filhos; exercem atividades laborais de baixa remuneração e geralmente de baixo prestígio e subalternas (arrumadeiras, empregada doméstica, cozinheira, zeladora) e do comércio (auxiliar de serviços gerais, garçonete, balconista, atendente, vendedora, etc.); sem carteira assinada e garantia de direitos; que envolvem uma prolongada e desgastante jornada diária, estabelecendo uma rotina desmotivadora e desprovida de possibilidade de ascensão e melhora; já sofreram algum tipo de violência intra-familiar (abuso sexual, estupro, sedução, atentado violento ao pudor, abandono, negligência, maus tratos, dentro outros) e extra-familiar (os mesmos e outros tipos de violência em escolas, abrigos, em redes de exploração sexual e em outros tipos de relações); as famílias também apresentam quadros situacionais difíceis (violência social, inter-pessoal e estrutural) vulneráveis frente à fragilidade das redes protetoras (família/estado/sociedade); grande parte das mulheres, antes de serem traficadas, são profissionais do sexo, enquanto as adolescentes nem sempre estão em situação de prostituição (PESTRAF, 2001-2002). Em relação às crianças o perfil não é muito diferente: Perfil das crianças e ou adolescentes: Composição ética: a maioria é de afro-descendentes (negras e morenas); classes populares; baixa escolaridade; habitam em espaços urbanos periféricos; moram com algum familiar; provém de municípios de baixo desenvolvimento sócio-econômico; adolescentes e crianças geralmente já sofreram algum tipo de violência: intra-familiar (abuso sexual, estupro, sedução, atentado violento ao pudor, abandono, negligência, maus tratos, dentro outros) e extra-familiar (os mesmos e outros tipos de violência em escolas, abrigos, em redes de exploração sexual e em outros tipos de relações); as famílias apresentam quadros situacionais difíceis (violência social, inter-pessoal e estrutural) vulneráveis frente à fragilidade das redes protetoras (família/estado/sociedade); algumas estão em situação de prostituição (PESTRAF, 2001-2002). Os estudos apontam dois antagônicos para a mulher e a criança aliciada, entende Damásio de Jesus (2003, p 127-129), “O da pessoa ingênua, humilde, que passa por grandes dificuldades financeiras, e por isso é iludida com certa facilidade; O da mulher que tem o domínio da situação, avalia com toda clareza os riscos e dispõe-se a corrê-los para ganhar dinheiro”. Muitas pesquisas relacionam o aumento do tráfico de mulheres e crianças com a globalização, pois os meios de comunicação e tecnologia contribuem para uma melhor organização, precisão nas informações, agilidade e segurança nas negociações das pessoas envolvidas. 30 Para a Pestraf apud Damásio de Jesus (2003, p. 20), o processo da globalização econômica tem gerado um agravamento da desigualdade econômico-social, que apesar dos avanços as mulheres e as crianças continuam na desigualdade econômico-social. O professor acima citado “considera este fenômeno de “feminilização da pobreza” onde a pobreza afeta em primazia as mulheres sendo este é um dos pontos negativos da globalização”. Segundo análise feita pelo professor Damásio de Jesus (2003, p. 19-21) “de cada 100 pessoas traficadas 99 são mulheres”, isso mostra a fragilidade das mulheres em relação aos homens, outra informação importante dentro desta mesma análise é que esta fragilidade está relacionada com o subdesenvolvimento do País, pois nos Países de primeiro mundo as mulheres e as crianças fazem valer os direitos que lhes são garantidos pela legislação e em países como o Brasil tais direitos não se perpetram e por este motivo se tornam desprotegidas pelo sistema legal. Dentro desta mesma análise Damásio de Jesus (2003 p. 4-5) revelou as dificuldades de adquirir informações sobre o tráfico de mulheres e crianças as quais podemos citar, a omissão dos fatos e o medo, como fatores relevantes para tais dificuldades, pois as pessoas envolvidas são ameaçadas de várias formas, e estas vicissitudes acabam por comprometer a integridade dos estudos. Damásio de Jesus (2003, p. 137), salienta que “no caso específico de tráfico de crianças as dificuldades são maiores, além dos dois fatores ditos acima, o tráfico de crianças tem o pólo mundial, o problema não se restringi a alguns países, e o Brasil é mais um na rota internacional da rede”. Segundo ainda Damásio de Jesus (2003, p. 136), “estimativa intencionais apontam que mais de 1 (um) milhão de mulheres são traficadas e exploradas sexualmente no mundo inteiro. Pelo menos 35% desse total são meninas com idade abaixo dos 18 (dezoito) anos [....]”. Para termos uma idéia da extensão do tráfico de crianças e adolescentes citamos o ensaio feito pelas jornalistas e pesquisadoras Helena Pires e Tamara Amoroso Gonçalves, que assim nos diz: Na internet, a cada dia, são abertas mais de 100 paginas web de pornografia infantil. Cinco milhões de meninos, meninas e adolescentes são vítimas de exploração sexual comercial. Estes dados foram revelados no Segundo Congresso Mundial sobre o tema realizado em Yokohama (Japão), em 2001. Somente na Colômbia, o número de meninas prostituídas multiplicou- se por cinco nos últimos anos. A República Dominicana, o México, a 31 Guatemala e o Brasil estão entre os principais fornecedores de “mão de obra sexual infantil”. Existem redes internacionais que lucram com os corpos das meninas e dos meninos. Podem apontar-se sinais, agências de turismo, de publicidade, agências matrimoniais, de adoção e de emprego, autoridades e até pais e mães que se presta a este repulsivo “negócio”. Não somente as meninas são exploradas sexualmente. Um grande número de meninos tem sido incorporado a este tráfico. Em Sri Lanka, sabe-se de 30 mil meninos dedicados à prostituição. Na República Dominicana, outro tanto. Em Senegal, na Costa de Marfim e nos países da África Ocidental também se contam aos milhares. Nas cidades da Europa do Leste, a prostituição masculina infantil está cada vez mais estendida. A exploração sexual infantil é um sintoma gravíssimo de um problema ainda maior: a pobreza, a miséria extrema, o desemprego e a discriminação, que se fortalecem com as guerras e com a migração forçada [...] (PIRES; GONÇALVES, 2007, p. 01). De acordo com Damásio de Jesus (2003 p. 138-139), as crianças por serem mais frágeis e dependentes facilitam o tráfico e o deslocamento se torna mais fácil, para a configuração do tráfico, devem ser observadosos atos que submergem os diversos acontecimentos, pois conforme dito anteriormente o tráfico é um fenômeno complexo, que deve ser analisado pelos atos, ou seja, a cominação do deslocamento com as diversas formas de exploração, como por exemplo, a ilegalidade nas adoções a venda de crianças e formas de pornografia infantil. Observa-se que no tráfico de pessoas, a violação não é somente física e moral, há violação em primazia à Constituição Federal de 1988. Pois, os artigos que compõem a Constituição Federal representam o povo e asseguram os direitos individuais e sociais, garante a liberdade, o bem estar, igualdade, desenvolvimento, justiça, segurança e na extensão da Constituição Federal também estão relacionados deveres de cada cidadão, e os deveres do Estado em relação ao povo. 2.2 ROTA DO TRÁFICO DE MULHERES E CRIANÇAS O tráfico de mulheres e crianças apresentam características acentuadas de acordo com cada região do País. Assim como as modalidades de violência sexual contra crianças. A estudiosa Julián Fuks divulgou no site do Repórter Brasil as modalidades de exploração sexual que as mulheres e crianças são submetidas de acordo com cada região do país. Vejamos: 32 Na região norte do país, há exploração sexual (garimpos, prostíbulos, portuária, cárcere privado em fazendas e garimpos); prostituição em estradas e nas ruas; leilões de virgens; exploração nas redes de narcotráfico (Rondônia/Acre/Amazonas/Pará); aliciamento de meninas nas áreas rurais. No centro oeste há exploração sexual comercial em prostíbulos; exploração sexual comercial nas fronteiras/redes de narcotráfico (Paraguai, Bolívia, Brasília, Cuiabá e municípios do Mato Grosso); Prostituição de meninas e meninos de rua; rede de exploração sexual (hotéis, agências de viagem, taxistas, etc.); prostituição através de anúncios de jornais; prostituição através de falsas agências de modelo; turismo sexual náutico e ecológico; tráfico de meninas para exploração sexual na Espanha (Goiânia). A região nordeste do país acentua o turismo sexual; exploração sexual comercial em prostíbulos; pornoturismo; prostituição de meninas e meninos de rua; prostituição em estradas; aliciamento de meninas nas áreas rurais. O sudeste também se envolve com o pornoturismo; exploração sexual comercial em prostíbulos/cárcere privado; exploração sexual comercial de meninas e meninos de rua; prostituição em estradas; pornografia infanto-juvenil através de falsas agências de modelos. E por fim a região sul onde há exploração sexual comercial de meninas e meninos de rua/redes de narcotráfico; Denúncia de tráfico de crianças; prostituição em estradas; aliciamento de meninas nas áreas rurais” (FUKS, 2003, p. 1-2). Um relatório do CECRIA - Centro de Referência, Estudos e Ações sobre Crianças e Adolescentes em pesquisa divulgada pela Oficina Globalização e exploração sexual comercial de mulheres, crianças e adolescentes, realizou um Fórum Social em 20 estados, abrangendo todas as regiões do país. Esta pesquisa teve como pauta a rota e as regiões do tráfico de mulheres e crianças. Segundo Julián Fuks (2003, p. 1-2), “a região Norte foi a que mostrou maior número de rotas, 76, o que representa 31% do total, seguida do Nordeste, com 69, o Sudeste, com 25, o Centro-Oeste, com 33, e o Sul, com 28 rotas”. O mapa a seguir mostra as rotas do tráfico de mulheres e crianças, e observamos que as demais regiões foram desbancadas pela região Norte do país, por todo mapa existe um ponto de tráfico, o Estado de Goiás já há alguns anos foi considerado o Estado de origem deste tipo de tráfico e hoje é um dos Estados que apresenta uma margem menor, em relação aos Estados do Ceará e Minas Gerais, a pesquisa mostrou que a acentuação do tráfico são maiores nas regiões mais pobres. Do total mostrado no mapa 131 das vítimas têm o destino internacional, 78 são traficadas entre os próprios Estados, e 32 se fazem vitimas intermunicipais. 33 Figura 1 - Configuração do Tráfico de Mulheres, Crianças e Adolescentes para Fins de Exploração Sexual Comercial. Fonte: (PESTRAF, 2001/2002). Outra estudiosa indicada pelo Cecria, sobre tráfico de pessoas é Maria Lucia Leal afirma que: O tráfico de mulheres não apenas é maléfico por promover a exploração sexual comercial, mas também por desterritorializar famílias. Nesse sentido, ela chama a atenção ao fato de, nas rotas nacionais, predominarem o tráfico de adolescentes e crianças, enquanto nas internacionais a maior parte é de adultas. Não se pode esquecer que, se existe essa oferta, é porque há uma demanda. Então não podemos esquecer a responsabilidade dos que fazem uso desse comércio sexual infantil (LEAL apud CECRIA, 2001, p 01). A Fundação Helsinque para os Direitos Humanos relata em pesquisa que existem 75.000,00 (setenta e cinco mil) brasileiras no mercado sexual da União Européia, os principais países envolvidos neste mercado são: Espanha, Itália, Portugal, Alemanha, Suíça e Inglaterra. Damásio de Jesus (2003 p. 72) assevera ainda que, fora desta rota ainda existem mulheres em condições subumanas em países como: Israel, Japão, Hong Kong, Estados Unidos e Paraguai. 34 No universo infantil esta rota ainda é bem maior, pois movimenta o mercado mundial, não é só a União Européia ou alguns países. Damásio de Jesus, (2003 p. 72), preleciona que “O que nos intriga no desenvolver desta pesquisa são os números de casos sob investigação são 85 em 2001, e 172 de inquéritos policiais instaurados em 14 Estados, observando que temos dados que o assolo do tráfico abrange mais de 20 (vinte) Estados brasileiros”. Se colocarmos os números acima citados em relação às pessoas traficadas, se tornam insignificantes. Isso se dá pela forma mais imprudente de se acobertar crimes desta natureza, a omissão muitas vezes das vítimas e dos familiares e isso ocorre por preconceito, medo ou até falta de informação, nestes casos o que se coloca em relevância é que vítima estaria se prostituindo, e de vítima passaria a ser delinqüente. O Instituto Internacional de Leis e Direitos Humanos da DePaul University/OEA (2000), de acordo com as pesquisas do Cecria entende que: [...] as vítimas encontram-se entre os segmentos sociais mais vulneráveis e com maior necessidade de assistência. De um modo geral, as pessoas que sofrem esta violência são consideradas delinqüentes em vez de sujeitos violados e, portanto, recebem uma menor proteção legal quando as autoridades investigam a natureza comercial do problema (OEA apud CECRIA, 2000). Nos casos das crianças a omissão tem requinte de crueldade pela vulnerabilidade conforme citamos anteriormente, isso ocorre principalmente se os pais tiverem envolvimento com o fato. Quando as vítimas são aliciadas ficam iludidas em relação ao trabalho a ser executado, e o valor da recompensa geralmente tem como primeira orientação que o trabalho é doméstico como; companhia para idosos, babás, faxineiras, mas o absurdo é que, ao chegarem ao destino se deparam com uma situação lastimável, são obrigadas a se prostituírem por redes de favorecimento. A Pestraf divulgou algumas das rendes que mais usam mulheres e crianças (adolescentes) traficadas para a prostituição. Rede de entretenimento, shoppigns center, boates, bares, restaurantes, motéis, barracas de praia, lanchonetes, danceterias, casa de shows, quadra de escolas de samba, prostíbulos, casa de massagens [...] Rede do mercado de modas fashion; agências de modelo fotográfico, vídeo, filmes; Rede de agência de emprego, empregadas domesticas, babas, acompanhante para viagens,cantoras go go girls, trabalho artísticos e dançarinas; Rede de tele – sexo, anúncios nos jornais, tvs, internet, circuito interno; Rede da 35 indústria do turismo – agencias de viagens, hotéis, spar, taxista, transporte de turistas; Rede para Projetos de desenvolvimento e infra – estrutura, recrutamento para frentes de assentados agrícolas, construção de hidrovias, ferrovias, mineração e garimpo (PESTRAF, 2001-2002). Damásio de Jesus (2003, p. 73), transcreve segundo as informações, que “obteve do Departamento da Policia Federal, que as mulheres traficadas são exploradas concomitantemente no mercado sexual e tráfico de drogas, o que neste caso torna a situação da mulher traficada ainda mais ofensiva, pois se envolvem no mundo do crime mesmo sendo contra sua vontade”. O crime organizado submerge os Estados e enfraquecem os Governos, tornando as políticas de prevenção e proteção frágeis e com esta notoriedade, os fatos ganham mais espaço dentro das sociedades mais pobres. Os vários textos analisados para o desenvolvimento deste estudo, reafirmam que as causas do tráfico de mulheres e crianças, são de ordem econômica, social e cultural. Pois dentro da esfera brasileira este tipo de crime não é novo, os procedimentos é que ganham novos adornos para a caracterização do crime em pauta. Neste capítulo abordamos as causas do tráfico de mulheres e crianças no Brasil, descrevemos as principais rotas do tráfico interno, e os caminhos do crime transnacional onde este tráfico passa a ser caracterizado como crime organizado, procuramos de forma direta diferenciar o tráfico de pessoas, de migração, imigração e o rufianismo para que não houvessem dúvidas quanto ao tema abordado, outro aspecto relevante para a elaboração do capítulo foi a distinção dos sujeitos do delito ativo e passivo, pois são os figurantes do crime em pauta. No capítulo seguinte serão abordadas os meio para coibir o tráfico de mulheres e crianças no Brasil e no mundo. O acordo que o Governo brasileiro, se alia com demais países para extirpar o tráfico de seres humanos. 36 3 ACORDOS, CONVENÇÕES, PROTOCOLOS E DECLARAÇÕES INTERNACIONAIS “A responsabilidade de todos é o único caminho para a sobrevivência humana.” (Dalai Lama) Neste capítulo abordaremos sobre os principais Acordos, Convenções, Protocolos, Pactos e Declarações Internacionais, que visam coibir o tráfico de mulheres e crianças no Brasil e no mundo. Os estudos alcançam ainda os antecedentes legislativos e as formas de repressão no Brasil. O Professor Damásio de Jesus (2003, p. 27-28), leciona sobre o histórico das Convenções, Protocolos, Pactos e Declarações Internacionais, que contribuem para coibir o tráfico de mulheres e crianças, o primeiro documento no ano de 1904, era um Acordo Internacional para a Supressão do Tráfico de Escravas Brancas, este acordo não teve uma eficácia esperada, pois, não era de cunho universal, o enfoque era a Europa. Em 1910 para rematar o acordo de 1904, surgiu o segundo documento, a Convenção Internacional para Supressão do Tráfico de Escravas Brancas, este continha 13 ratificações para punir os aliciadores. As Convenções elaboradas entre 1921 e 1933 fazem parte do Contexto da Liga das Nações: Convenção Internacional para Supressão do Tráfico de Mulheres e Crianças/1921, Convenção sobre a Escravidão/1927, Convenção OIT nº 29 relativa ao Trabalho Forçado, e a Convenção Internacional para a Supressão do Tráfico de Mulheres Adultas/1933. Estas Convenções compreendiam o tráfico, independentemente do consentimento da mulher. 37 Em 1949 com o objetivo de estabilizar e integrar as Convenções já mencionadas surgiu a Convenção e Protocolo para Supressão do Tráfico de Pessoas e do Lenocínio/1949. A característica principal era a proibição da prostituição, e diante disso procurava punir os atos que direta ou indiretamente estariam associados a prática da prostituição. A Convenção de 1949 foi o segundo documento voltado para a questão do tráfico de pessoas, só que diferente da Convenção e 1904 está se estendeu de forma universal. Vários outros documentos surgiram após a Convenção de 1949, agregando novas formas de proteção e meios para coibir as variadas formas de exploração contra as mulheres e crianças. A esse respeito Damásio de Jesus, diz: Observamos para os fatos que os documentos não direcionavam para o tráfico, a não ser a Convenção de 1949, e somente 2000 com a Convenção de Palermo, a Convenção mais conhecida das Nações Unidas, é que o tráfico de pessoas, em especial de mulheres e crianças ganhou novas formas de prevenção, combate, repressão e punição para os aliciadores (JESUS, 2003. p. 27-29). O Professor também faz uma relação destes principais documentos, em um quadro sinóptico constando o nome, ano da publicação, e o ano em que foram aceitos pelo Governo Brasileiro. Tabela 2 - Acordos, Convenções, Protocolos, Pactos e Declarações Internacionais Ano Documento Brasil* 1904 Acordo Internacional para Supressão do Tráfico de Escravas Brancas 1910 Convenção Internacional para Supressão do Tráfico de Escravas Brancas 1921 Convenção Internacional para Supressão do Tráfico de Mulheres e Crianças 1927 Convenção sobre Escravidão 1930 Convenção OIT n° 29 relativa ao Trabalho Forçado 1957 1933 Convenção Internacional para Supressão do Tráfico de Mulheres Adultas 1947 Protocolo e Emenda de Convenção Internacional para Supressão do Tráfico de Mulheres e Crianças e Convenção Internacional para Supressão do Tráfico de Mulheres adultas 1948 1949 Convenção e Protocolo Final para Supressão do Tráfico de Pessoas e do Lenocínio 1958 1951 Convenção OIT n° 100 sobre Igualdade de Remuneração 1957 1951 Convenção relativa ao Estatuto dos Refugiados de Genebra 1961 1953 Protocolo de Emenda à Convenção da Escravidão de 1926 38 1956 Convenção Suplementar sobre a Abolição da Escravidão, o Comércio de Escravos e de Instituições e Práticas Similares à Escravidão 1966 1957 Convenção OIT n° 105 sobre a Abolição de Trabalho Forçado 1965 1958 Convenção OIT n° 111 contra Discriminação na Ocupação e Emprego 1965 1959 Declaração dos Direitos da Criança 1966 Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos 1992 1966 Pacto Internacional sobre os Direitos Econômicos, Sociais e Culturais 1992 1967 Protocolo relativo ao Estatuto dos Refugiados (Protocolo à Convenção de Genebra) 1972 1967 Declaração sobre a Eliminação da Discriminação contra Mulheres 1969 Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de San José) 1992 1973 Convenção OIT n° 138 relativa à Idade Mínima no Trabalho 2001 1979 Convenção sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação contra a Mulher 1984 1984 Convenção contra Tortura e outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes 1989 1985 Convenção Internacional para Prevenir e Punir a Tortura 1989 1988 Protocolo à Convenção Americana em Matéria de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (Protocolo de San Salvador) 1996 1989 Convenção sobre os Direitos da Criança 1990 1990 Convenção Internacional sobre Proteção dos Direitos de todos os Trabalhadores Imigrantes e Membros de suas Famílias (não vigente) 1994 Convenção Internacional para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher (Convenção de Belém do Pará) 1995 1996 Programa de Ação de Comissão de Direitos Humanos da ONU para a Prevenção do Tráfico de Pessoas e a Exploração da Prostituição 1999 Convenção OIT n° 182 contra as Piores Formas de Trabalho Infantil 20001999 Protocolo Opcional de Convenção sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação contra a Mulher 2001** 2000 Protocolo Opcional de Convenção sobre os Direitos da Criança, sobre a Venda de Crianças, a Prostituição e Pornografia Infantis 2001** 2000 Protocolo Opcional de Convenção sobre os Direitos da Criança, sobre o Envolvimento de Crianças em Conflitos Armados 2001** 2000 Convenção da ONU contra o Crime Organizado Transnacional 2000** 2000 Protocolo para Prevenir, Suprimir e Punir o Tráfego de Pessoas, Especialmente Mulheres e Crianças, suplementando a Convenção da ONU contra o Crime Organizado Transnacional 2000** 2000 Protocolo contra o Contrabando de Imigrantes por Terra, Mar ou Ar, suplementando a Convenção da ONU contra o Crime Organizado Transnacional 2000** Fonte: Damásio de Jesus (2003, p. 28-30) O quadro elaborado pelo professor Damásio de Jesus faz menção a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Contra as Mulheres 1979, a 39 discriminação é uma das causas que ensejam o tráfico de mulheres e crianças (adolescentes) no Brasil conforme citado no capitulo II do presente estudo, esta Convenção discorre nos seus 30 artigos a proteção contra todas as formas de discriminação contra a mulher, até mesmo a descriminalização das vítimas de exploração sexual. Os Direitos Humanos realizam Conferências Mundiais com o objetivo de prevenir e punir o tráfico de mulheres e crianças no mundo. Dentre as principais Conferências realizadas podemos citar em especial: Conferência Internacional sobre Direitos Humanos – junho, 1993, Viena, Áustria; Quarta Conferência Mundial sobre a Mulher – setembro, 1995, Pequim, China; Cúpula Mundial sobre a Criança – setembro, 1990, Nações Unidas, Nova York. A Conferência Internacional sobre Direitos Humanos – junho 1993, Viena, Áustria, esta conferência tem parágrafos que se referem particularmente aos Direitos Humanos das Mulheres. Inteligentemente a Conferência Mundial realizada em Viena observou a necessidade de proteger as crianças especificando no rol dos seus parágrafos, um parágrafo incisivo das formas de proteção. Vejamos: § 1.21 A Conferência Mundial sobre Direitos Humanos, acolhendo positivamente a pronta ratificação da Convenção sobre os Direitos da Criança por parte de um grande número de Estados e observando o reconhecimento dos direitos humanos das crianças na Declaração Mundial sobre a Sobrevivência, Proteção e Desenvolvimento das Crianças e no Plano de Ação adotado na Cúpula Mundial sobre a Criança, insta à ratificação universal da Convenção até 1995 e a sua efetiva implementação por todos os Estados membros mediante a adoção de todas as medidas legislativas, administrativas e de outra natureza que se façam necessárias, bem como mediante a alocação do máximo possível de recursos disponíveis. A não-discriminação e o interesse superior das crianças devem ser considerações fundamentais em todas as atividades dirigidas à infância, levando em consideração a opinião dos próprios interessados. Os mecanismos e programas nacionais e internacionais de defesa e proteção da infância devem ser fortalecidos, particularmente em prol de uma maior defesa e proteção das meninas, das crianças abandonadas, das crianças de rua, das crianças econômica e sexualmente exploradas, inclusive as que são vítimas da pornografia e prostituição infantis e da venda de órgãos, das crianças acometidas por doenças, entre as quais a síndrome da imuno- deficiência-adquirida, das crianças refugiadas e deslocadas, das crianças detidas, das crianças em situações de conflito armado, bem como das crianças que são vítimas da fome, da seca e de outras emergências. Deve-se promover a cooperação e solidariedade internacional com vistas a apoiar a implementação da Convenção e os direitos da criança devem ser prioritários em todas as atividades das Nações Unidas na área dos direitos humanos. (VIENA, 1993). 40 A segunda das mais importantes conferências é a Quarta Conferência Mundial sobre a Mulher – setembro 1995, Pequim, China. Foi nesta conferência que diversos países tomaram consciência de promoverem os objetivos de igualdade para todas as mulheres do globo e levaram questionamentos sobre os obstáculos que incidem sobre as mulheres para o alcance da igualdade social: Vejamos alguns comentários feitos pelo professor Damásio de Jesus. A primeira conferência para tratar da situação da mulher aconteceu em 1975, na Cidade do México, onde foi promulgada a Década da Mulher 1975-1985. Em 1979, foi assinada a Convenção para Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher, que em 1999 contava com a assinatura de 163 países. A segunda foi em Copenhagem, em 1980, onde foi estabelecido o plano de ação para a metade final da década. Nairóbi, no Quênia, abrigou a de 1985, onde se estabeleceu uma estratégia para o empoderamento da mulher até 2000. A Conferência de Pequim tinha como objetivos alcançar maior igualdade no acesso a educação, emprego, políticas, saúde e nutrição, além de promover o acesso de mais mulheres a postos de decisão dos governos e de outras instituições. Também reviu e avaliou os progressos feitos de 1985 e adotou uma plataforma de ação para remover os obstáculos ainda existentes para mulher atingir total e igualitária participação no desenvolvimento de todas as esferas de sua vida (JESUS, 2003, p. 31). Entre as grandes Convenções organizadas pelos Direitos Humanos a Cúpula Mundial sobre a Criança – setembro, 1990, Nações Unidas, Nova York foi a que mais repercutiu a nível mundial, foi unânime as assinaturas dos membros participantes para sancionar o direito humano da criança. O professor Damásio de Jesus (2003, p. 138, 139), faz referência aos Direitos Humanos que estatui instrumentos exclusivos de proteção à criança com a Convenção sobre os Direitos da Criança/1990, observando que o Brasil ratificou a Convenção no mesmo ano através do decreto nº 99.710/90. Nos seus 54 artigos são erigidas todas as formas de proteção, desenvolvimento e participação necessários para que uma criança cresça com dignidade. A Convenção faz menção direta à questão do tráfico, abuso sexual, pornografia infantil e exploração sexual de crianças, conforme veremos nos artigos abaixo citados. Vejamos: Artigo 34 – Os Estados Partes se comprometem a proteger a criança contra todas as formas de exploração e abuso sexual. Nesse sentido, os Estados Partes tomarão, em especial, todas as medidas de caráter nacional, bilateral e multilateral que sejam necessárias para impedir; o incentivo ou a coação para que uma criança se dedique a qualquer atividade sexual ilegal; a 41 exploração da criança na prostituição ou outras práticas sexuais ilegais; a exploração da criança em espetáculos ou materiais pornográficos. Artigo 35 – Os Estados Partes tomarão todas as medidas de caráter nacional, bilateral e multilateral que sejam necessárias para impedir o seqüestro, a venda ou o tráfico de crianças para qualquer fim ou sob qualquer forma. Artigo 36 – Os Estado Parte protegerão a criança contra todas as demais formas de exploração que sejam prejudiciais para qualquer aspecto de seu bem-estar. (CONVENÇÃO, 1990, Brasil). Estes artigos, assim como Legislação interna brasileira e o Estatuto da Criança e do Adolescente são formas proteção contra todas as formas de exploração sexual da criança ou adolescentes. A Convenção referencia também sobre a recuperação das crianças vítimas de todas as formas de exploração, abusos ou qualquer outra forma degradante e desumana que a
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