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- História da Arte II - 
 - 1 - 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
História Geral da Arte II 
 
 
 
 
 
 
Apontamentos de: António Guedes 
E-mail: postmanlisbon@yahoo.com 
Data: 13-11-2006 
 
Livro: 
 
Nota: 
 
 
 
 
- História da Arte II - 
 - 2 - 
TERCEIRA 
PARTE 
 
 
 
 
O 
RENASCIMENTO 
- História da Arte II - 
 - 3 - 
- História da Arte II - 
 - 4 - 
1 
A PINTURA, ESCULTURA 
E AS ARTES GRÁFICAS DO 
“GÓTICO FINAL” 
 
 
- História da Arte II - 
 - 5 - 
- História da Arte II - 
 - 6 - 
O RENASCIMENTO 
PERANTE O GÓTICO FINAL 
 
Sabemos que a consciência de um Renascimento teve 
origem italiana e não há dúvida que a Itália desempenhou 
um papel directivo no desenvolvimento da arte 
renascentista, pelo menos até começos do século XVI. 
Pelo que toca à escultura e à arquitectura, o Renascimento 
começou pouco depois de 1400. Quanto à pintura, porém, a 
nova era principiou com Giotto que (nas palavras de 
Boccaccio, de 1350) trouxe à luz esta arte que estivera 
sepultada por muitos séculos. Não podemos desprezar um 
testemunho destes; todavia hesitamos em aceitá-lo sem 
reservas, porque deveríamos então admitir que o 
Renascimento alvoreceu no campo da pintura em 1300, 
uma geração antes de Petrarca. 
BOCCACCIO. É preciso compreender que este, ardente 
discípulo de Petrarca, se interessava sobretudo pelo 
progresso do humanismo na literatura. Na sua defesa da 
poesia, achou útil estabelecer analogias com a pintura e 
atribuir a Giotto o papel de “Petrarca da pintura”. A opinião 
de Boccaccio, ao considerar Giotto como um artista do 
Renascimento, é um acto de estratégia intelectual. Contudo, 
a sua opinião tem interesse porque foi o primeiro a aplicar o 
conceito petrarquiano de “renascimento depois da idade das 
trevas” a uma das artes plásticas. Assim dá a subentender 
que o ressurgimento da Antiguidade representa para os 
pintores um realismo sem compromissos. E isso iria ser um 
tema constante do pensamento renascentista. 
 
A Pintura Flamenga 
Para ir além do realismo da pintura gótica tornou-se 
necessária uma segunda revolução, que começou 
simultânea e independentemente em Florença e nos Países 
Baixos, em 1420. A revolução florentina foi a mais 
sistemática e a de carácter fundamental, pois abarcou a 
escultura e a arquitectura, além da pintura: é designada por 
Proto-Renascimento, termo que não se aplica geralmente ao 
novo estilo que surgiu na Flandres. 
O GÓTICO FINAL, A denominação de Gótico Final, não 
corresponde ao carácter próprio desta pintura flamenga do 
século XV. Indica que os pioneiros desta nova arte, bem ao 
contrário dos seus contemporâneos da Itália, não puseram à 
margem o Estilo Internacional, antes o utilizaram como 
ponto de partida, de modo que a ruptura com o passado foi 
menos brusca no Norte que no Sul. A expressão “Tardo-
Gótico” também nos faz lembrar que, fora da Itália, a 
arquitectura do século XV permaneceu firmemente 
enraízada na tradição gótica. 
O ambiente artístico em que viveram foi nitidamente o de 
um Gótico Final. Os grandes mestres flamengos exerceram 
uma influência que se alargou muito além da sua pátria. Na 
Itália foram tão admirados como os maiores artistas locais 
dessa época, e o seu intenso realismo influi notoriamente na 
pintura do Proto-Renascimento. Ao invés, a arte 
renascentista italiana pouca impressão causou nas regiões 
ao Norte dos Alpes durante aquele século. 
O MESTRE DE FLÊMALLE. A primeira fase da revolução 
pictural na Flandres está representada pelo Mestre de 
Flémalle (Robert Campin), o principal pintor de Tournai, 
cuja carreira podemos seguir desde 1406 até à sua morte, 
em 1444. Entre as suas melhores obras avulta o Retábulo de 
Mérode. 
Pela primeira vez o contemplador tinha a sensação de estar 
a ver, através da superfície do painel, um mundo espacial 
com todas as qualidades essenciais da realidade quotidiana: 
profundidade ilimitada, estabilidade, continuidade e 
plenitude. Os pintores do Estilo Internacional nunca tinham 
aspirado a uma tal coerência: o seu empenho em reproduzir 
a realidade estava longe de ser absoluto. Os quadros que 
eles criaram têm a encantadora qualidade de contos de 
fadas, onde a escala e a relação das coisas podem ser 
alteradas à vontade, onde o mundo real e as fantasias de 
imaginação se misturam sem conflito. O Mestre de 
Flémalle, pelo contrário, resolveu contar a verdade. Com 
uma determinação quase obsessiva, dá a cada mínimo 
pormenor a máxima realidade concreta definindo-o em 
todos os aspectos: forma e tamanho próprios; cor, matéria e 
textura da superfície e modo peculiar de reflectir a 
iluminação. 
O Retábulo de Mérode leva-nos do mundo aristocrático do 
Estilo Internacional ao lar de um burguês flamengo. O 
Mestre de Flémalle não era um pintor da corte, mas um 
burguês servindo os gostos dos concidadãos abastados 
como os doadores piedosamente ajoelhados à porta da casa 
da Virgem. Este é o primeiro painel da Anunciação que tem 
por cenário um interior doméstico completamente 
mobilado. 
Este audaz abandono da tradição levantou ao artista um 
problema que ninguém afrontara antes: o de transpor 
acontecimentos sobrenaturais de um cenário simbólico para 
um ambiente vulgar sem os fazer parecer triviais ou 
incongruentes. 
Somos levados a pensar que o Retábulo de Mérode e outros 
quadros semelhantes constituem uma espécie de charada 
para o contemplador actual, embora este os possa apreciar 
sem lhes conhecer o conteúdo simbólico. É de crer que 
fosse o Mestre de Flémalle quem introduziu estes símbolos 
nas artes plásticas, mas apesar da sua grande influência 
pouquíssimos artistas os adoptaram. 
O Mestre de Flémalle ou era um homem de invulgar cultura 
ou estava em contacto com teólogos e outros eruditos que 
podiam informá-lo acerca da significação simbólica dos 
objectos. O artista não se limitou a continuar a tradição 
simbólica da arte medieval, dentro do contexto do novo 
estilo realista, mas enriqueceu-a e alargou-a. 
Nos painéis de Mérode, até os pormenores ínfimos são 
reproduzidos com a mesma aplicação que as figuras 
sagradas. A pintura do Mestre de Flémalle distingue-se de 
todas as outras pelo colorido peculiar. 
AS TÉCNICAS DA TÊMPERA E DO ÓLEO. Na idade 
Média, a técnica da pintura em madeira tinha sido 
fundamentalmente a têmpera, na qual os pigmentos 
- História da Arte II - 
 - 7 - 
finamente moídos eram diluídos (temperados) em água, a 
que se adicionava uma substância aglutinante, gema de ovo, 
etc. Obtinha-se uma camada de pintura fina que endurecia 
depressa e podia ser retocada a seco, satisfazendo 
admiravelmente o gosto medieval pelas superfícies de cores 
lisas e tons vivos. Contudo, não era possível realizar uma 
fusão ou transição suave das cores; além disso os escuros 
tendiam a ganhar um aspecto baço e a confundir-se. O 
Mestre de Flémalle dominou estes sérios inconvenientes, 
empregando o óleo como diluente, em vez da mistura de 
água e gema de ovo. Foram o Mestre de Flémalle e os seus 
contemporâneos que descobriram as possibilidades 
artísticas do óleo. Substância viscosa e lenta a secar, 
permitia obter uma larga variedade de efeitos. Sem o óleo, a 
conquista da realidade visível pelos mestres flamengos 
ficaria assaz limitada. Sob o aspecto técnico, também 
merecem ser chamados os pais da pintura moderna, porque 
desde então o óleo seria o meio basilar da pintura. 
JAN (E HUBERT) VAN EYCK. O Mestre de Flémalle não 
foi tão longe como Jan van Eyck, um artista de menos idade 
e maior fama, a quem se atribuiu durante longo tempo a 
invenção da pintura a óleo propriamente dita. Foi, ao 
mesmo tempo, um pintor burguês e um pintor da corte. 
Podemos seguir a sua obra desde 1432, através denumerosos quadros assinados e datados. A legenda do 
Retábulo de Gand – ou Retábulo do Cordeiro Místico – diz-
nos que ele terminara nesse ano o trabalho começado pelo 
seu irmão mais velho, Hubert, que morreu em 1426. 
A evolução anterior de Jan é ainda discutida: há vários 
quadros “eyckianos”, manifestamente anteriores ao 
Retábulo do Cordeiro Místico e que podem ter sido 
pintados por qualquer dos irmãos. Os mais impressionantes 
são os painéis do Calvário e do Juízo Final. Os eruditos 
estão de acordo em situa-los entre 1420 e 1425, quer o autor 
fosse um ou outro dos irmãos. 
O estilo dos dois painéis tem muitas qualidades comuns ao 
Retábulo de Mérode: o fundo interesse pelo mundo visível, 
a profundidade espacial ilimitada, as pregas angulosas dos 
panejamentos. Ao mesmo tempo as formas individuais 
parecem menos isoladas, menos esculturais; o vigoroso 
sentido do espaço deve-se às subtis gradações de luz e de 
cor. Uma análise atenta do painel do Calvário, desde as 
figuras do primeiro plano até à distante Jerusalém, e aos 
cumes nevados do fundo, mostra-nos um decrescimento 
gradual na intensidade das cores locais e no contraste do 
claro-escuro. 
Este fenómeno óptico que os Van Eyck foram os primeiros 
a utilizar plena e sistematicamente é o da perspectiva 
atmosférica devida à limitada transparência da atmosfera. A 
perspectiva atmosférica é fundamental para a percepção da 
profundidade do espaço. Não há dúvida que utilizaram o 
óleo com extraordinário requinte. Alternando as camadas 
opacas e translúcidas de tinta conseguiram uma tonalidade 
de brilho suave e ardente que nunca foi igualada. 
Em conjunto, o Calvário parece singularmente desprovido 
de dramatismo, como se uma doce serenidade o envolvesse 
magicamente. Só quando nos concentramos nos 
pormenores, notamos as violentas emoções reflectidas nos 
rostos da gente apinhada sob a cruz e na dor, contida mas 
profundamente impressionante, da Virgem Maria e dos seus 
companheiros. No painel do Juízo Final, este duplo aspecto 
do estilo “eyckiano” revela-se nos dois extremos: acima do 
horizonte, tudo é ordem, simetria e calma, enquanto abaixo 
dele – na terra e no reino subterrâneo de Satanás – 
prevalece a condição oposta. As duas situações 
correspondem assim ao Céu e ao Inferno. 
O Retábulo do Cordeiro Místico, o monumento supremo da 
pintura flamenga primitiva, suscita problemas complexos. 
A obra, iniciada por Hubert, fora acabada por Jan em 1432. 
Como o primeiro falecera em 1426, o retábulo foi 
provavelmente executado entre 1425 e 1432. Embora tenha 
essencialmente a configuração de um trípico, cada um dos 
três elementos é composto por quatro painéis separados. 
Reconstruir esta sequência de acontecimentos e determinar 
a parte respectiva de cada irmão é um jogo fascinante mas 
eriçado de incertezas. 
Apenas as duas tábuas, longas e estreitas, com as figuras de 
Adão e Eva se poderiam atribuir a Jan. São decerto as mais 
audaciosas do conjunto e os primeiros nus monumentais da 
pintura setentrional em madeira. 
Os retratos dos doadores, de esplêndida individualidade, 
têm um lugar importante em qualquer dos retábulos. Só 
com o Mestre de Flémalle, o primeiro artista desde a 
Antiguidade capaz de reproduzir um rosto humano em 
primeiro plano e a três quartos, começou o retrato a 
desempenhar um papel preponderante na pintura 
setentrional. 
Além dos retratos dos doadores, aparecem agora outros, 
independentes e mais pequenos, cujo carácter de intimidade 
faz supor que fossem estimadas lembranças, imagem 
presente da pessoa ausente. Um dos mais fascinantes é o 
Homem do Turbante Vermelho, de Jan van Eyck, pintado 
em 1433, que pode muito bem ser um auto-retrato. 
As cidades flamengas onde floresceu o novo estilo de 
pintura – Tournai, Gand, Bruges – rivalizavam com as da 
Itália como centros da banca e do comércio internacionais. 
Entre os seus residentes estrangeiros contavam-se muitos 
negociantes italianos. Para um deles, Jan van Eyck 
executou uma das maiores obras-primas dessa época, o 
Retrato de Casamento. O jovem casal foi representado no 
momento de fazer a troca solene dos votos matrimoniais, na 
intimidade da câmara nupcial. 
ROGIER VAN DER WEYDEN. Rogier van der Weyden 
(1400-1464), o terceiro grande mestre da pintura flamenga 
deste período, dedicou-se a uma tarefa importante: 
reencontrar, dentro do quadro do novo estilo criado pelos 
seus antecessores, o drama emocional do Gótico. Sentimo-
lo imediatamente na mais antiga das suas obras-primas, A 
Descida (1435). Aqui o modelado é de uma precisão 
escultural. Os acontecimentos exteriores (neste caso o 
desprendimento do corpo de Cristo) importam-lhe menos 
que o mundo dos sentimentos humanos. 
Nada espanta que a arte de Rogier, que foi definida como 
sendo ao mesmo tempo, fisicamente mais nua e 
espiritualmente mais rica que a de Jan van Eyck, tenha 
servido de exemplo a tantos artistas. Quando morreu, em 
1464, a sua influência já era decisiva na pintura europeia ao 
- História da Arte II - 
 - 8 - 
Norte dos Alpes. Tal foi a autoridade de um estilo cujos 
ecos se fizeram sentir em quase toda a Europa, com 
excepção da Itália, até ao fim do século XV. 
O que é verdade nas obras religiosas de Rogier também se 
aplica aos seus retratos. O de Francesco d’Este, um nobre 
italiano residente na corte de Borgonha, talvez nos pareça 
menos vivo que os de Jan van Eyck. Em vez de buscar a 
serenidade psicologicamente neutra dos retratos de Jan, 
Rogier interpreta a personalidade humana, suprimindo 
alguns traços e acentuando outros. Por consequência, diz-
nos mais da vida íntima e menos da aparência exterior. 
HUGO VAN DER GOES. Entre os pintores seguintes, 
raros escaparam à sombra do grande mestre. O mais 
dinâmico de todos eles foi Hugo van der Goes (1440-1482), 
um génio infeliz cujo trágico fim nos evoca uma 
personalidade instável. 
A sua obra mais ambiciosa, o imenso retábulo que terminou 
em 1476 é uma realização impressionante. Nos volantes, 
por exemplo, os membros ajoelhados da família Portinari 
parecem anões, ao pé dos santos patronos, cuja estatura 
gigantesca os caracteriza como seres de ordem superior. 
Esta variação de escala, embora seja clara a sua intenção 
simbólica e expressiva, afasta-se da lógica de experiência 
quotidiana. 
GEERTGEN TOT SINT JANS. Durante o último quartel 
do século XV não houve na Flandres pintores comparáveis 
a Hugo van der Goes e os artistas mais originais apareceram 
mais ao Norte, na Holanda. A um deles, Geertgen Tot Sint 
Jans, de Haarlem, que morreu em 1495, devemos o 
encantador Nascimento. A ideia de um Nascimento 
nocturno, iluminado apenas pelo clarão que irradia do 
Menino, remonta ao Estilo Internacional, mas Geertgen Tot 
Sint Jans, aplicando as descobertas picturais de Jan van 
Eyck, deu nova e intensa realidade ao tema. 
BOSCH. Hieronymus Bosch, solicita o nosso interesse pelo 
mundo dos sonhos. A sua obra, plena de imagens 
fantásticas e aparentemente irracionais, mostrou-se tão 
difícil de interpretar que grande parte dela se mantém 
indecifrável. 
Podemos constatá-lo se analisarmos o trípico conhecido por 
Jardim das Delícias, a mais rica e a mais enigmática das 
pinturas de Bosch. Dos três painéis, apenas o da esquerda 
representa um tema claramente identificável: o Jardim do 
Paraíso. No postigo da direita, uma cena de pesadelo, com 
ruínas em chamas e fantásticos instrumentos de tortura, 
representa com certeza o Inferno. 
No painel central vê-se uma paisagem muito parecida à do 
Paraíso, povoada de uma multidão de homens e mulheres 
nuas, em variadíssimas atitudes. Raros se entregam 
abertamente a actividades eróticas, mas não há dúvida de 
que as delícias neste jardim são as do desejo carnal. As 
aves, frutos, etc., são símbolos ou metáforas que Bosch 
emprega para descrever a vida na terra como uma 
interminávelrepetição do pecado original de Adão e Eva. 
Bosch foi um severo moralista que concebia as suas 
pinturas como sermões visuais em que cada pormenor 
estava encarregado de significação instrutiva. 
A Pintura na França, Suíça e Alemanha 
Devemos agora passar os olhos pela arte do século XV no 
resto da Europa do Norte. Depois de 1430, o novo realismo 
dos mestres flamengos começou a alastrar pela França e 
pela Alemanha até que, em meados do século, a sua 
influência se tornou suprema, desde a Espanha até ao 
Báltico. Entre os numerosos artistas a quem se devem 
adaptações locais da pintura flamenga, apenas alguns 
possuíram talento bastante para se nos imporem pela 
vincada personalidade. 
WITZ. Um dos mais antigos e originais foi Conrad Witz de 
Basileia (1400-1446), a cujo retábulo para a catedral de 
Genebra, pintado em 1444, pertence um notável painel. 
Witz não se limitou, porém, a seguir as pisadas desses 
grandes percursores: conseguiu traduzir os efeitos ópticos 
aquáticos como nenhum outro pintor do seu tempo. 
FOUQUET. Na França, o pintor Jean Fouquet (1420-1481), 
logo pouco depois de aprender o ofício teve a rara fortuna 
de realizar uma longa visita à Itália, em 1445. Daí que a sua 
obra represente uma combinação única de elementos 
flamengos e do Proto-Renascimento, sem deixar de 
permanecer tipicamente setentrional. No painel esquerdo de 
um díptico, pintado em 1450, em que representou Étienne 
Chevalier e Santo Estêvão, revela superior mestria como 
retratista; a influência italiana pode ver-se no estilo da 
arquitectura e na solidez e no peso estatuários das duas 
figuras. 
A PIETÀ DE AVINHÃO. Um estilo flamengo, 
influenciado pela arte italiana, caracteriza também a mais 
famosa de todas as pinturas do século XV, a Pietà de 
Avinhão. Como o seu título indica, o painel vem do extremo 
sul de França, executado provavelmente por um artista da 
região, que deve ter conhecido a arte de Rogier van der 
Weyden, porque o tipo das figuras e o conteúdo expressivo 
desta Pietà não podiam derivar de outra fonte. Ao mesmo 
tempo, o traçado, magnificamente simples e estável, é mais 
italiano que flamengo. 
 
A Escultura do Gótico Final 
Se tivéssemos que definir a arte ao Norte dos Alpes numa 
só frase, poderíamos chamá-la o primeiro século da pintura 
de painel, pois esta exerceu tão acentuado domínio no 
período de 1420 a 1500 que os seus cânones se aplicaram à 
iluminura, ao vitral e até à escultura. Lembremos que no 
fim do século XIII a escultura arquitectónica cedera a vez a 
obras de uma escala mais familiar: imagens de devoção, 
sepulcros, púlpitos, etc. 
O que pôs termo ao Estilo Internacional na escultura da 
Europa foi a influência do Mestre de Flémalle e de Rogier 
van der Weyden, evidente nas obras de numerosos 
escultores, até 1500. Os objectivos da escultura do Gótico 
Final identificaram-se com os da pintura. O Anjo Voando de 
um quadro do Mestre de Flémalle, (1420), contém já todos 
os traços principais de um anjo talhado por um excelente 
escultor alemão quase cem anos depois. 
MICHAEL PACHER. As obras mais características do 
Gótico Final são os retábulos de altar, por vezes de enorme 
- História da Arte II - 
 - 9 - 
tamanho e de pormenores incrivelmente complicados, peças 
especialmente apreciadas nos países germânicos. Um dos 
mais belos é o da Coroação da Virgem, devido ao escultor e 
pintor tirolês Michael Pacher (1435-1498). As suas formas 
profusamente douradas e coloridas oferecem um 
espectáculo deslumbrante, surgindo da profundidade 
sombria do fundo. As figuras e o cenário parecem fundir-se 
numa configuração de linhas agitadas e retorcidas onde 
apenas as cabeças sobressaem com autonomia. 
 
 
O RENASCIMENTO 
PERANTE O GÓTICO FINAL 
 
A Tipografia 
Neste ponto, devemos tomar nota de um outro facto 
importante ao Norte dos Alpes: o desenvolvimento das 
técnicas de impressão, tanto de imagens como de livros. A 
nova técnica espalhou-se por toda a Europa e converteu-se 
numa indústria do mais profundo alcance na civilização 
ocidental. As imagens impressas tiveram quase a mesma 
importância: sem elas, o livro impresso não poderia 
substituir a obra do copista e do iluminador medievais tão 
rápida e completamente. 
A IMPRENSA E O OCIDENTE: O papel e o processo de 
imprimir com blocos de madeira foram conhecidos no 
Ocidente durante a Baixa Idade Média, mas o papel, como 
sucedâneo barato do pergaminho, foi ganhando terreno 
muito devagar, enquanto a impressão só era empregada na 
estampagem de padrões ornamentais em tecidos. Espantoso 
foi o desenvolvimento desde 1400 de uma técnica de 
impressão superior à do Extremo Oriente e de uma 
importância cultural imensamente maior. Técnica que se 
manteve desde 1500 até à Revolução Industrial sem 
modificações essenciais. 
 
A Gravura em Madeira 
A ideia de imprimir ilustrações em papel, mediante 
pranchas de madeira gravadas, parece ter surgido na Europa 
setentrional já no fim do século XIV. Muitos dos exemplos 
mais antigos destes desenhos impressos – chamados 
gravuras em madeira ou xilografias – são alemães, outros 
flamengos e alguns franceses; todos apresentam as 
características do Estilo Internacional. É provável que os 
desenhos fossem devidos a pintores ou escultores, mas as 
pranchas de madeira eram talhadas pelos artífices 
especializados. Por consequência, as primeiras gravuras de 
madeira, como a Santa Doroteia, têm um traçado plano e 
ornamental; as formas são definidas por linhas simples e 
grossas, com pouca preocupação pelos efeitos 
tridimensionais. Como as formas contornadas deviam ser 
coloridas, essas estampas lembram muitas vezes os vitrais. 
As gravuras em madeira do século XV foram trabalhos da 
arte popular, de um nível que não atraía mestres de grande 
talento até 1500. Uma só prancha fornecia milhares de 
cópias, vendidas por alguns centavos cada, o que, pela 
primeira vez na nossa história, punha ao alcance de toda a 
gente a posse de imagens. 
 
A Gravura 
Quem teve a ideia de fazer tipos metálicos buscou 
certamente a colaboração de algum ourives para resolver os 
problemas técnicos do fabrico. As pranchas de metal são 
gravadas com um instrumento de aço. A técnica de 
embelezar superfícies de metal com imagens gravadas já 
era conhecida na Antiguidade e continuo a ser praticada 
durante a Idade Média. Assim, nem foi preciso inventar 
qualquer processo novo para gravar as placas que serviam 
de matrizes na impressão em papel. Depois de dar tinta nos 
traços abertos na placa, limpava-se a superfície desta, 
colocava-se-lhe em cima uma folha de papel humedecido e 
metia-se na prensa. 
A ideia de gravar em cobre nasceu aparentemente do desejo 
de se encontrar um processo mais requintado e flexível que 
o da xilogravura (numa prancha de madeira, as linhas são 
protuberantes: quanto mais finas, mais difíceis de talhar). 
As gravuras em metal logo gozaram do favor de um público 
escolhido e de maior requinte. As primeiras que 
conhecemos datam de 1430, e revelam já a influência dos 
grandes pintores flamengos. Quase logo de início circulam 
estampas datadas e assinadas. Por isso conhecemos os 
nomes da maioria dos gravadores importantes do último 
terço do século XV. Especialmente na região do Alto Reno 
há uma tradição contínua de bons gravadores. 
 
- História da Arte II - 
 - 10 - 
2 
O PROTO-RENASCIMENTO 
EM ITÁLIA 
 
- História da Arte II - 
 - 11 - 
- História da Arte II - 
 - 12 - 
Por volta de 1400, o Estado florentino enfrentava uma séria 
ameaça à sua independência. O poderoso duque de Milão 
tentava dominar toda a Itália e já tinha subjugado a maior 
parte das cidades-estados da zona central. Florença 
constituía o único obstáculo sério à sua ambição: a cidade 
opôs-lhe uma rigorosa e bem sucedida resistência em três 
frentes, militar, diplomáticae intelectual. Florença 
conseguiu ter por si a opinião pública, ao proclamar-se 
defensora da liberdade contra a tirania. 
Esta guerra de propaganda era chefiada, de ambos os lados, 
por humanistas, mas os florentinos deram melhor conta de 
si. Os seus escritos, tais como o “Louvor da cidade de 
Florença” (1402), de Leonardo Bruni, vieram pôr de novo 
em foco o ideal petrarquiano dum renascimento dos 
Clássicos. 
O orgulho patriótico e o apelo à grandeza implícitos nesta 
imagem de Florença como a Nova Atenas devem ter 
despertado um profundo entusiasmo na cidade, porque os 
Florentinos lançaram-se numa ambiciosa campanha para 
levar a termo os grandes empreendimentos artísticos 
começados um século antes, na época de Giotto. Um 
extenso programa de decoração escultórica foi prosseguido 
em diversas igrejas, enquanto se dava andamento aos 
planos para a construção da cúpula da Catedral, o maior e 
mais difícil de todos os projectos. 
Desde logo, as artes plásticas foram tidas por essenciais 
para o ressurgimento da alma florentina. Não foi por acaso 
que a primeira declaração explícita a reclamar para elas a 
honra de serem incluídas entre as artes liberais se deveu a 
um cronista florentino, em 1400. Um século mais tarde, já 
esta promoção dos artistas se tornara corrente em toda a 
Europa Ocidental. Que importância tinha esta valorização 
social? Desde Platão, as artes liberais compreendiam 
tradicionalmente as disciplinas julgadas necessárias à 
educação do homem culto, como a Matemática (incluindo a 
Teoria da Música), a Dialéctica, a Gramática, a Retórica e a 
Filosofia: as Belas-Artes ficavam excluídas do grupo 
porque eram trabalho manual, a que faltava uma base 
teórica. Em breve, tudo o que saísse das mãos de um grande 
mestre seria avidamente coleccionado. 
 
 
FLORENÇA: 1400-1450 
 
A Escultura 
A primeira metade do século XV (o Quattrocento) foi a 
idade heróica do Proto-Renascimento. A campanha artística 
a que dera início o concurso para as portas do Baptistério 
ficou limitada por algum tempo, aos projectos escultóricos. 
O baixo-relevo apresentado por Ghiberti não se afasta 
significativamente do Gótico Internacional, e o mesmo 
sucede com as portas do Baptistério. 
NANNI DI BANCO. Uma dezena de anos após o concurso, 
este classicismo medieval e limitado foi transposto por um 
artista mais novo, Nanni di Banco (1384-1421). Os quatro 
santos, chamados os Quattro Coronati que ele executou em 
1410-14 devem ser comparados à Visitação de Reims. As 
figuras de ambos os grupos são quase de tamanho natural, 
mas as de Nanni parecem maiores que as de Reims; pela 
massa e pela monumentalidade revelam-se fora do alcance 
da escultura medieval. Apenas o segundo e o terceiro 
Coronati fazem lembrar obras características da escultura 
romana. 
Morreu em 1421, deixando quase acabado o enorme relevo 
da Assunção da Virgem que encima o segundo portal Norte 
da Catedral de Florença. O estilo desta figura está tão longe 
do classicismo dos Coronati como do Gótico Internacional. 
Antes faz lembrar os anjos alados do Gótico Final, como os 
do Mestre de Flémalle. Ambos tinham descoberto como 
representar, de maneira convincente, figuras em voo: 
envolvendo-as em roupagens leves e soltas, cujo desenho e 
formas demonstram a força sustentadora do vento. O anjo 
de Nanni preenche as roupagens com o seu vigoroso 
movimento. Esta figura parece impelir-se a si própria, 
enquanto o seu equivalente setentrional, imóvel, apenas fica 
pairando no espaço. 
O PRIMEIRO PERÍODO DE DONATELLO. Se 
compararmos os dois anjos, notamos que a arte do Proto-
Renascimento, em contraste com o Gótico-Final, procura 
encarar o corpo humano de um modo semelhante ao da 
Antiguidade Clássica. O homem que mais contribuiu para 
reafirmar esta atitude foi Donatello, o maior escultor do seu 
tempo. Nascido em 1386, foi, entre os fundadores do novo 
estilo, o único que ultrapassou os meados do século XV. 
Juntamente com Nanni, Donatello passou a primeira parte 
da sua carreira trabalhando em encomendas para a Catedral 
e para Or San Michele. 
São Marcos de Donatello é a primeira estátua, desde a 
Antiguidade, que consegue captar de novo o pleno 
significado do contraposto clássico. Nesta obra que marca 
verdadeiramente uma época, o jovem Donatello dominou o 
que constitui a realização principal da escultura antiga. 
Poucos anos mais tarde (1415-17), Donatello esculpiu outra 
estátua para Or San Michele, o famoso S. Jorge. É o 
Soldado Cristão, tal como o viu o Proto-Renascimento. 
Donatello produziu aqui outra obra revolucionária, ao criar 
um novo tipo de baixo-relevo pouco saliente (daí ser 
chamado schiacciato, “achatado”), mas que dá uma ilusão 
de infinita profundidade pictórica. A impressionante 
paisagem, atrás das figuras, compõe-se inteiramente de 
brandas modulações da superfície do mármore onde a luz é 
captada sob muitos ângulos diferentes. 
No campanário da Catedral de Florença, construído de 1334 
a 1357, erguia-se uma fila de altos nichos góticos 
destinados a albergar estátuas. Só metade estavam 
preenchidos quando, entre 1416 e 1435, Donatello executou 
cinco estátuas para os outros. A obra mais notável desta 
série é a imagem do profeta não identificado que recebeu a 
alcunha de Zuccone, e que goza de fama especial como 
exemplo marcante do realismo do Mestre. 
PERSPECTIVA: DONATELLO E GHIBERTI. Donatello 
aprendera a técnica de esculpir em bronze quando, ainda 
jovem, trabalhara sob a direcção de Ghiberti nas portas do 
- História da Arte II - 
 - 13 - 
Baptistério. Mas em 1420 já rivalizava nessa arte com o 
antigo mestre. 
Embora os métodos empíricos também pudessem dar 
resultados impressionantes, a perspectiva matemática 
tornou possível a representação de um espaço 
tridimensional numa superfície plana. 
Donatello executava o Festim de Herodes quando Ghiberti 
foi encarregado de fazer outras duas portas de bronze para o 
Baptistério de Florença. Estas mostram bem como o artista, 
sob a influência de Donatello e dos outros pioneiros do 
novo estilo, se converteu às concepções do Proto-
Renascimento. 
O NU CLÁSSICO: JACOPO DELLA QUERCIA E 
DONATELLO. Fora de Florença, o único grande escultor 
deste período foi Jacopo della Quercia, de Siena (1374-
1438). Como Ghiberti, também mudou de estilo, do Gótico 
para o Proto-Renascimento, a meio da sua carreira, em 
especial por influência de Donatello. Não teve qualquer 
influência na arte florentina até ao final do século, altura em 
que fascinou o jovem Miguel Ângelo, cuja admiração foi 
suscitada pelas cenas do Génesis que enquadravam a porta 
principal da igreja de S. Petrónio em Bolonha, entre elas a 
Criação de Adão. 
O estilo destes relevos é conservador mas as figuras são 
arrojadas e profundamente impressionantes. Aqui, o corpo 
nu exprime outra vez a dignidade e o poder do homem, 
como na Antiguidade Clássica. 
Vale a pena compará-lo à obra que muito provavelmente o 
inspirou, um Adão no Paraíso, de um díptico de marfim, 
dos primeiros séculos do Cristianismo. E foi nesta condição 
ressequida que o nu clássico entrou na tradição medieval. 
Sempre que nos aparece o corpo despido entre 800 e 1400, 
podemos ter a certeza de que ele deriva, directa ou 
indirectamente, de uma fonte clássica. Para a mentalidade 
medieval, a beleza física dos ídolos antigos, em especial a 
das estátuas nuas, incarnava a atracção insidiosa do 
paganismo que era preciso evitar. 
O século XV redescobriu a beleza sensual do corpo nu, mas 
por duas vias diferentes. O Adão e Eva de Jan van Eyck ou 
os nus de Bosch não têm precedentes quer na arte antiga, 
quer na medieval. Na verdade, não estão nus mas despidos 
– são pessoas que normalmente andam vestidas e que por 
quaisquer razões aparecem despojadas das suas roupas. Por 
outro lado, o Adão de Jacopo della Quercia está claramente 
nu,no pleno sentido clássico, tal como o David de 
Donatello, uma realização ainda mais revolucionária da 
escultura proto-renascentista – a primeira estátua nua de 
tamanho natural, desde a Antiguidade, dotada de verdadeira 
autonomia. A Idade Média não vacilaria em condená-la 
como um ídolo, e os contemporâneos de Donatello também 
não deviam ter-se sentido à vontade diante dela. Durante 
muitos anos, foi única no seu género. 
Assim, a estátua deve ser entendida como um monumento 
público cívico-patriótico, que identifica David com 
Florença, e Golias com Milão. 
DONATELLO: PÁDUA E DEPOIS. Donatello foi 
chamado a Pádua em 1443 para fazer o monumento 
equestre de Gattamelata, comandante dos exércitos 
venezianos, que morrera havia pouco. 
Quando Donatello voltou a Florença, depois de dez anos de 
ausência, deve ter-se sentido como um estranho. O clima, 
político e espiritual tinha mudado, o gosto dos artistas e do 
público também. As suas obras seguintes, entre 1453 e 
1466, não se integram na tendência predominante. O 
individualismo extremo do seu último estilo confirma a 
reputação de Donatello como o primeiro génio solitário 
entre os artistas renascentistas. 
 
A Arquitectura 
BRUNELLESCHI. Donatello não criou sozinho o estilo 
escultórico do Proto-Renascimento. Pelo contrário, a nova 
arquitectura ficou a dever a sua existência a um só homem, 
Filippo Brunelleschi (1377-1446), que começou a sua 
carreira como escultor. Esteve em Roma com Donatello. Aí 
estudou monumentos da arquitectura antiga e parece que foi 
o primeiro a medi-los com rigor. Em 1417-19 encontramo-
lo de novo a competir com Ghiberti, desta vez para a 
construção da cúpula da Catedral. 
A grande realização de Brunelleschi foi ter construído a 
cúpula em dois grandes cascos separados (um dentro do 
outro), engenhosamente ligados de forma a reforçarem-se 
mutuamente. 
San Lorenzo. Em 1419, quando estava a trabalhar nos 
planos finais para a cúpula, Brunelleschi teve a primeira 
oportunidade de criar edifícios integralmente concebidos 
por ele, graças ao chefe da família Médici, um dos 
principais mercadores e banqueiros de Florença, que lhe 
encomendou uma sacristia nova para a Igreja românica de 
San Lorenzo. Os planos que traçou impressionaram de tal 
maneira o seu cliente que este lhe pediu um projecto para 
refazer a igreja toda. 
À primeira vista, a planta chega a parecer pouco original. A 
originalidade reside na acentuação da simetria e da 
regularidade. O traçado é inteiramente composto de 
unidades quadradas. 
Brunelleschi concebeu San Lorenzo como um agrupamento 
de blocos espaciais abstractos, sendo os maiores simples 
múltiplos da unidade padrão. Compreendido isto, já 
faremos uma ideia de quanto ele foi revolucionário, pois 
tais compartimentos claramente definidos e separados 
representam um afastamento total relativamente às 
concepções dos arquitectos do Gótico. 
O interior confirma a nossa expectativa. Uma ordem fria e 
estática substituiu agora o calor emocional e o contínuo 
movimento espacial dos interiores das igrejas góticas. 
Proporções Arquitecturais. Brunelleschi estava convencido 
de que o segredo da boa arquitectura residia em dar as 
proporções exactas a todas as medidas principais de um 
edifício. Acreditava que os Antigos conheciam este segredo 
e tentou redescobri-lo. 
Podemos dizer que a razão principal que nos impõe San 
Lorenzo como produto de um espírito superior único é o 
- História da Arte II - 
 - 14 - 
sentido das proporções de Brunelleschi, afirmado em cada 
pormenor. 
No ressurgimento das formas clássicas, a arquitectura do 
Renascimento encontrou um vocabulário padrão. A teoria 
das proporções harmónicas deu-lhe uma espécie de sintaxe, 
quase sempre ausente da arquitectura medieval. O 
ressurgimento das formas e proporções clássicas deu azo a 
que Brunelleschi transformasse o vernáculo arquitectónico 
da sua região num sistema estável, preciso e articulado. A 
nova racionalidade das suas concepções difundiu-se logo 
pela Itália e a pouco e pouco por todo o Norte da Europa. 
A Capela dos Pazzi. Entre os edifícios de Brunelleschi que 
perduraram, nem uma única fachada conserva o seu traçado 
original, sem alterações posteriores de outras mãos. A 
própria fachada da capela dos Pazzi já não pode ser 
considerada uma excepção. A capela foi começada em 
1430, mas Brunelleschi (que morreu em 1446) não pode ter 
planeado a fachada actual, que data de 1460. Não obstante, 
é uma criação assaz original, em tudo diferente de qualquer 
frontaria de Idade Média. 
S. Spirito e Sta. Maria degli Angeli. Ao principiar a década 
de 1430, quando a cúpula da Catedral estava quase pronta, a 
evolução de Brunelleschi como arquitecto entrou em nova e 
decisiva fase. O traçado da igreja de S. Spirito pode ser tido 
por uma versão aperfeiçoada de San Lorenzo: os quatro 
braços do cruzeiro são iguais, a nave principal distingue-se 
das colaterais apenas pelo seu maior comprimento e toda a 
estrutura parece envolvida pela sequência ininterrupta de 
naves e capelas. Estas constituem o traço mais 
surpreendente de S. Spirito. 
Na Igreja de Sta. Maria degli Angeli, a que Brunelleschi 
deu início quase na mesma data da obra de S. Spirito, esta 
nova tendência atinge o ponto culminante: uma igreja de 
cúpula e planta centradas – a primeira do Renascimento – 
inspirada nas estruturas circulares e poligonais dos tempos 
romanos e do primeiro período do Cristianismo. 
MICHELOZZO. O maciço estilo de Sta. Maria degli Angeli 
permite explicar a grande desilusão dos últimos anos de 
Brunelleschi, quando o projecto para o palácio dos seus 
patronos, os Medici, foi rejeitado. Esta família ascendera a 
tal poderio que desde 1420 lhe pertencia o governo de 
Florença. Por esse motivo era de boa prudência evitar 
qualquer ostentação que, por excessiva, caísse mal na 
opinião pública. Se o projecto de Brunelleschi seguisse o 
estilo de Sta. Maria degli Angeli, ficaria provavelmente 
com tal magnificência, inspirada na arte imperial romana, 
que os Medici não poderiam arriscar-se a um 
empreendimento tão grandioso. A encomenda foi dada a 
um arquitecto mais novo e menos notável, Michelozzo 
(1396-1472). O traçado recorda os velhos palácios-
fortalezas florentinos, com modificações que seguem os 
princípios de Brunelleschi. 
 
A Pintura 
MASACCIO. A pintura do Proto-Renascimento apenas se 
manifestou a partir de 1420. Este novo estilo foi lançado 
por um jovem génio chamado Masaccio, que tinha então 
apenas vinte e um anos (nasceu em 1401) e que morreu aos 
vinte sete. 
A mais antiga das suas obras que pode ser datada com certa 
segurança é um fresco de 1425 em Sta. Maria Novella, 
representando a Santíssima Trindade com Nossa Senhora e 
S. João Evangelista com os donatários. O mundo de 
Masaccio é um reino de grandeza monumental e não a 
realidade concreta de cada dia do Mestre de Flémalle. O 
que o fresco da Trindade traz à mente não é o estilo do 
passado imediato, mas a arte de Giotto, no sentido de 
grande escala, na severidade da composição, no volume 
escultural. Para Giotto, o corpo e as roupagens formam um 
todo único, como se fossem ambos da mesma substância; as 
figuras de Masaccio, como as de Donatello, são “nus 
vestidos”, pois as roupas pendem como verdadeiro tecido. 
O cenário, igualmente moderno, revela um perfeito domínio 
da nova arquitectura de Brunelleschi e da perspectiva 
científica. 
O maior conjunto de obras de Masaccio que chegou até nós 
é constituído pelos frescos da Capela Brancacci em Sta. 
Maria del Carmine. O Pagamento do Tributo é o mais 
famoso dentre eles. Ilustra, pelo velho método conhecido 
como narrativa contínua, a história do Evangelho Segundo 
S. Mateus. Masaccio utiliza aqui os mesmos processos 
empregados pelo Mestre de Flémalle e pelos van Eyck – 
regula o afluxo da luz e usa a perspectivaatmosférica nos 
tons subtilmente cambiantes da paisagem. 
As figuras em O Pagamento do Tributo patenteiam, ainda 
mais do que as do fresco da Trindade, a capacidade de 
Masaccio para combinar o peso e o volume das figuras de 
Giotto com a nova visão funcional do corpo e das 
roupagens. A narrativa é-nos transmitida mais pelos olhares 
intensos do que pelo movimento físico. Mas num outro 
fresco da Capela Brancacci, A Expulsão do Paraíso, 
Masaccio prova decisivamente a sua capacidade de 
representar o corpo humano em movimento. 
Embora possuísse um temperamento de pintor mural, 
Masaccio era igualmente versado na pintura de painel. O 
seu grande políptico, feito em 1426 para a Igreja das 
Carmelitas de Pisa, veio a dispersar-se por várias colecções. 
Não constitui surpresa, depois do fresco da Trindade, que 
Masaccio substitua o trono gótico ornamentado mas frágil 
de Giotto por um sólido e austero assento de pedra, no 
estilo de Brunelleschi. 
FRA FILIPPO LIPPI. A morte prematura de Masaccio 
deixou um vazio que não foi preenchido durante bastante 
tempo. Entre os seus contemporâneos mais jovens, apenas 
Fra Filippo Lippi (1406-69) parece ter tido um contacto 
mais chegado com ele. O primeiro trabalho datado de Fra 
Filippo, a Nossa Senhora no Trono de 1437, evoca, em 
vários aspectos importantes, a Virgem de Masaccio – a luz, 
o trono pesado, as maciças figuras tridimensionais, as 
pregas tombantes do manto. Mas faltam-lhe a 
monumentalidade e a austeridade de Masaccio. 
Temos de salientar um aspecto novo desta Virgem: o 
interesse do pintor pelo movimento, evidente nas figuras e 
no drapeado do manto. Estes efeitos já se encontravam nos 
baixos-relevos de Donatello e de Ghiberti. Não é de 
- História da Arte II - 
 - 15 - 
estranhar que estes dois artistas tenham exercido uma 
influência tão forte na pintura florentina na década a seguir 
à morte de Masaccio. A idade, a experiência e o prestígio 
deram-lhes uma autoridade que nenhum outro pintor 
florentino de então conseguiu igualar. 
FRA ANGELICO. Se Fra Filippo dependeu mais de 
Donatello que de Ghiberti, sucedeu o contrário ao seu 
contemporâneo, um pouco mais velho, Fra Angelico (1400-
1455). Quando o Mosteiro de São Marcos em Florença foi 
reconstruído (1437-1452), Fra Angelico embelezou-o com 
numerosos frescos. À grande Anunciação deste ciclo tem 
sido atribuída a data de 1440. Fra Angelico conserva 
aqueles aspectos de Masaccio – a sua dignidade, franqueza 
e ordem espacial – que Fra Filippo tinha rejeitado. Mas as 
suas figuras jamais alcançaram a segurança física e 
psicológica que caracterizava a imagem do homem no 
Proto- Renascimento. 
DOMENICO VENEZIANO. Em 1439, instalou-se em 
Florença um talentoso pintor de Veneza, Domenico 
Veneziano. Deve ter simpatizado com o espírito da arte 
proto-renascentista, porque cedo se tornou um Florentino de 
adopção e um mestre de grande importância na sua nova 
pátria. A Virgem com o Menino e Santos, é um dos 
primeiros exemplos de um novo tipo de painel de altar que 
veio a ser popularíssimo a partir dos meados do século – a 
chamada Sacra Conversazione (“Conversa Sagrada”). O 
esquema inclui uma Virgem no Trono, enquadrada por 
elementos arquitectónicos e ladeada por santos que parecem 
conversar com ela, com o contemplador ou entre si. A 
Sacra Conversazione é notável tanto pelo esquema de cores 
como pela composição. 
PIERO DELLA FRANCESCA. Quando Domenico 
Veneziano se estabeleceu em Florença teve como ajudante 
um rapaz do Sudoeste da Toscana, chamado Piero della 
Francesca (1420-1492), depois o seu discípulo mais 
importante e um dos artistas verdadeiramente grandes do 
Proto-Renascimento. O estilo de Piero reflectia, ainda mais 
fortemente que o de Domenico, os objectivos de Masaccio. 
Durante uma longa carreira manteve-se na mesma senda do 
fundador da pintura do Renascimento italiano, enquanto o 
gosto florentino evoluía, após 1450, num sentido diferente. 
A obra mais importante de Piero é o ciclo de frescos na 
capela-mor da igreja de S. Francisco, em Arezzo, que ele 
pintou entre 1452 e 1459. Os numerosos episódios 
representam a Lenda da Vera Cruz (a origem e história da 
cruz em que Cristo foi pregado). 
Os laços de Piero com Domenico Veneziano estão bem 
patentes nas cores que usa. A tonalidade deste fresco, 
embora menos luminosa que na Sacra Conversazione, é 
igualmente dourada, evocando, de forma muito semelhante, 
a luz do Sol pela manhã. Mas as figuras de Piero têm uma 
grandeza austera que faz recordar Masaccio ou até Giotto, 
mais que Domenico. 
UCELLO. Na Florença dos meados do século XV havia 
apenas um pintor que partilhava a devoção de Piero pela 
perspectiva: Paolo Ucello (1397-1475). A sua Batalha de 
San Romano, pintada aproximadamente ao mesmo tempo 
que os frescos de Piero em Arezzo, revela uma extrema 
preocupação com as formas estereométricas. Nas mãos de 
Ucello, a perspectiva produz efeitos estranhamente 
perturbadores e fantásticos. O que dá unidade à sua pintura 
não é a construção espacial, mas os efeitos de superfícies, 
decorativamente reforçados por manchas de cor brilhante e 
pelo uso abundante do ouro. 
Nascido em 1397, Ucello tinha sido formado no estilo 
gótico da pintura, e só nos anos de 1430 se deixou 
converter, pela nova ciência da perspectiva, às concepções 
proto-renascentistas. 
CASTAGNO. A terceira dimensão não apresentava 
qualquer dificuldade para Andrea del Castagno (1423-
1457), o mais dotado pintor florentino da geração de Piero 
della Francesca. Menos subtil mas mais vigoroso que 
Domenico, Castagno consegue captar um pouco da 
monumentalidade de Masaccio, na sua Última Ceia, um dos 
frescos que pintou no refeitório do Convento de Sta. 
Apollonia. Uns cinco anos depois da Última Ceia, entre 
1450 e 1457, Castagno executou o admirável David. 
 
 
O CENTRO E O NORTE 
DA ITÁLIA: 1450-1500 
 
À medida que os fundadores do Proto-Renascimento e seus 
sucessores imediatos, foram desaparecendo, começou a 
afirmar-se nos meados do século uma geração mais jovem. 
Ao mesmo tempo, as sementes lançadas pelos mestres 
florentinos noutras regiões da Itália começaram a dar fruto. 
Quando algumas destas regiões, especialmente o Nordeste, 
produziram versões distintas do novo estilo, a Toscana 
perdeu a posição privilegiada de que gozara até então. 
 
A Arquitectura 
ALBERTI. A morte de Brunelleschi, em 1446, trouxe ao 
primeiro plano da arquitectura Leone Battista Albert (1404-
72), que tal como Brunelleschi só muito tarde começou a 
exercer a sua actividade como arquitecto. Até perfazer 
quarenta anos, Alberti parece ter estado interessado nas 
Belas-Artes unicamente como arqueólogo e teorizador. 
Estudou os monumentos da antiga Roma, compôs os 
primeiros tratados do Renascimento sobre escultura e 
pintura. 
O Palácio Rucellai. O projecto para o Palácio Rucellai 
parece uma crítica de Alberti ao Palácio Medici. Alberti 
resolveu aqui um problema que se tornou fundamental na 
arquitectura do Renascimento: como aplicar um sistema 
clássico de articulação ao exterior duma estrutura não-
clássica. 
S. Francesco, Rimini. Para o seu primeiro exterior de igreja, 
Alberti tentou uma alternativa radicalmente diversa. O 
senhor de Rimini contratou-o em 1450, para transformar a 
igreja gótica de S. Francesco num Templo da Fama. Alberti 
revestiu o velho edifício com um invólucro renascentista. 
- História da Arte II - 
 - 16 - 
O sistema clássico de S. Francesco conserva em demasia o 
seu carácter romano antigo para se adaptar à forma de uma 
fachada de basílica. 
Sto. André, Mântua. Só para o fim da sua carreira, Alberti 
encontrou a solução adequada. Na majestosa fachada de 
Sto. André de Mântua, desenhada em 1470, sobrepôs uma 
frontaria de templo clássico no motivo do arco triunfal, 
agora com um enorme nicho ao centro. Tão empenhadoestava Alberti em sublinhar a coesão interior da fachada 
que lhe deu largura igual à altura. 
A IGREJA DE PLANTA CENTRADA. O Tratado de 
arquitectura de Alberti explica que a planta das igrejas 
deveria ser circular, ou de forma derivada do círculo, 
porque o círculo é a forma mais perfeita e a mais natural, e 
por isso uma imagem directa da razão divina. 
Este argumento assenta na crença de Alberti na validade 
divina das proporções matematicamente determinadas; mas 
como podia ele concilia-la com a evidência histórica? Com 
efeito, a planta típica dos templos antigos e das primitivas 
igrejas cristãs era longitudinal. 
A igreja de Alberti requer um traçado harmonioso como 
uma revelação divina e que suscite a piedosa contemplação 
dos fiéis. Erguendo-se isolada, acima do mundo quotidiano 
que a envolve, deveria ser iluminada por aberturas situadas 
na parte superior, para que, através dela, apenas se pudesse 
ver o céu. 
Quando Alberti formulou estas ideias no seu Tratado de 
1450, apenas poderia ter citado a revolucionária Sta. Maria 
degli Angeli, de Brunelleschi, como exemplo moderno de 
uma igreja de planta centrada. Mas, para o fim do século 
XV, depois de o seu Tratado se tornar largamente 
conhecido, esta planta ganhou aceitação geral. Enter 1500 e 
1525 esteve em voga na arquitectura do Renascimento 
Pleno. 
GIULIANO DA SANGALLO. Santa Maria delle Carceri, 
em Prato, um dos primeiros e mais distintos exemplos desta 
tendência, foi começada em 1485. O seu arquitecto, 
Giuliano da Sangallo (1443-1516), deve ter sido um 
admirador de Brunelleschi mas a configuração essencial do 
edifício aproxima-se muito do ideal de Alberti. 
Exceptuando a cúpula, toda a igreja poderia encaixar-se 
dentro de um cubo, já que a altura é igual à largura e ao 
comprimento. Giuliano formou uma cruz grega. Não pode 
haver dúvidas de que Giuliano a desenhou conforme a 
velha tradição da Cúpula do Céu. A abertura central ao alto 
e as doze no perímetro referem-se claramente a Cristo e aos 
Apóstolos. Brunelleschi já tinha encontrado esta solução na 
Capela Pazzi, mas a cúpula de Giuliano, a coroar uma 
estrutura perfeitamente simétrica, transmite de um modo 
bem mais impressionante o seu valor simbólico. 
 
A Escultura 
Donatello trocara Florença por Pádua em 1443. Nenhum 
jovem escultor foi capaz de preencher a vaga deixada por 
Donatello. Em resultado da sua ausência subiram ao 
primeiro plano os outros escultores que permaneciam na 
cidade. 
LUCA DELLA ROBBIA. À parte Ghiberti, o único 
escultor de nota em Florença depois da partida de Donatello 
foi Luca della Robbia (1400-82). Ganhara reputação desde 
os anos de 1430, com os relevos de mármore da Cantoria 
ou “púlpito dos cantores”, na Catedral. 
Até ao fim da sua longa carreira, dedicou-se quase 
exclusivamente à escultura de terracota – um material mais 
barato e menos exigente que o mármore – que revestia de 
vidrados, semelhantes a esmalte, para esconder a superfície 
do barro e lhe aumentar a resistência. Os seus melhores 
trabalhos nesta técnica têm o encanto dos painéis da 
Cantoria. O vidrado branco das figuras e da moldura dá a 
impressão de mármore, destacado sobre o azul forte do 
fundo. Mais tarde, a qualidade do modelado deteriorou-se e 
à simples harmonia de branco e azul sucedeu uma 
variedade de tons mais vivos. Ao findar o século, a oficina 
de della Robbia tornara-se numa fábrica, produzindo às 
dúzias pequenos painéis da Virgem e retábulos de cores 
berrantes para igrejas de aldeia. 
Porque Luca abandonou quase totalmente o trabalho do 
mármore, houve uma notória falta de bons escultores neste 
material na Florença em 1440 e anos seguintes. Quando 
Donatello regressou a carência já fora suprimida por um 
grupo de artistas, quase todos com pouco mais de vinte 
anos, oriundos das povoações dos montes de Norte e Leste 
da cidade. 
BERNARDO ROSSELLINO. O mais velho de todos eles, 
Bernardo Rossellino (1409-64), parece ter começado a 
carreira como escultor e arquitecto em Arezzo. Estabeleceu-
se em Florença em 1436 mas só oito anos mais tarde 
receberia encomendas de importância, quando lhe 
confiaram a execução do túmulo de Leonardo Bruni. Este 
grande humanista e homem de Estado havia desempenhado 
um papel vital na cidade desde o começo do século. Por sua 
morte, em 1444, fizeram-lhe um solene funeral à maneira 
dos Antigos e o seu monumento funerário deve ter sido 
encomendado pelas autoridades. 
O estilo escultórico do túmulo de Bruni não se define com 
facilidade, porque é composto de partes de qualidade muito 
variada. De maneira geral, reflecte o classicismo de 
Ghiberti e de Luca della Robbia. Os ecos de Donatello são 
poucos e indirectos. 
O BUSTO-RETRATO. A grande tradição romana de 
escultura realista de retratos tinha desaparecido no final da 
Antiguidade. O seu ressurgimento foi durante muito tempo 
atribuído a Donatello, mas os primeiros exemplos que 
conhecemos pertencem aos anos de 1450 e nenhum deles é 
de Donatello. Parece mais provável que o retrato-busto do 
Renascimento deva as suas origens aos jovens escultores do 
círculo de Bernardo Rossellino. 
Um belo exemplo foi esculpido em 1456 por António 
Rossellino (1427-1479). Representa um médico florentino 
muito considerado, cujo carácter está definido com 
extraordinária precisão. 
POLLAIUOLO. A popularidade dos bustos-retratos, depois 
de 1450, corresponde a uma procura de obras para 
colecções particulares. Humanistas e artistas foram os 
primeiros a juntar estátuas, bustos e baixos-relevos. Não 
- História da Arte II - 
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tardaria que muitos escultores prestassem atenção a esta 
voga crescente, e se dedicassem a executar bustos e 
estatuetas de bronze, à maneira dos Antigos, solicitados 
pelos amadores. 
Uma peça excepcional deste género é da autoria de António 
Pollaiuolo (1431-98). Representa um estilo escultórico 
muito diferente do que então se manifesta na escultura de 
mármore. Formado como ourives, recebeu funda influência 
do último estilo de Donatello e de Castagno, bem como da 
Arte Antiga. A partir daí, desenvolveu um estilo muito 
pessoal, como se pode ver no Hércules e Anteu. 
NICCOLO DELL’ARCA. A importância desta integração 
de movimentos e acção é flagrante: a Lamentação, de 
Niccolo dell’Arca, de 1485-90. Não conhecemos qualquer 
ligação directa entre esta obra e Pollaiuolo, mas não é de 
crer que fosse criada sem a influência dele. 
VERROCCHIO. Palliauolo nunca teve oportunidade de 
fazer uma estátua de grande tamanho. Para obras de tal 
vulto, temos de nos voltar para um seu contemporâneo, 
Andrea del Verrochio (1435-88), o maior escultor desse 
tempo e o único que, de algum modo, podemos comparar a 
Donatello pela versatilidade e ambição. Modelador e 
cinzelador, combinou elementos de António Rossellino e 
António del Pollaiuolo numa síntese única. 
A sua obra mais popular em Florença é o Cupido ou Putto 
com Golfinho. Foi desenhada para o centro de uma fonte 
para uma das vilas dos Medici, próximo de Florença. O 
termo putti designa os meninos alados e nus que 
frequentemente aparecem representados na Arte Antiga. 
Foram reintroduzidos na arte do Proto-Renascimento, com 
o seu carácter original ou na qualidade de anjos-meninos. 
Por estranha coincidência, a realização suprema da carreira 
de Verrochio, tal como sucedera a Donatello, foi um 
monumento equestre de bronze, desta vez em honra do 
comandante dos exércitos venezianos. Verrochio deve ter 
considerado a obra de Donatello como um protótipo, não se 
contentando todavia em imitar simplesmente o ilustre 
modelo. O cavalo, gracioso e vivo, em vez de robusto e 
plácido, foi modelado com o mesmo sentido da anatomia 
em movimento que vimos nos nus de Pollaiuolo. 
 
A Pintura 
Antes de considerarmos de novo a pintura florentina, é 
preciso analisar o desenvolvimento da arte do Proto-
Renascimentodo Norte da Itália. O Estilo Internacional 
prolongou-se na pintura e na escultura até meados do 
século, e a arquitectura manteve um forte sabor gótico 
muito depois de adoptado um vocabulário clássico. Nesta 
região, entre 1450 e 1500, só a pintura sobressai, porque 
faltaram realizações de monta em qualquer dos outros dois 
campos. Mas em Veneza e nos seus territórios, durante 
esses mesmos anos, nasceu uma tradição que iria florescer 
nos três séculos seguintes. Não é por isso de estranhar que 
lhe coubesse tornar-se o principal centro artístico da Itália 
setentrional no Proto-Renascimento. 
PÁDUA: MANTEGNA. Com os mestres florentinos o 
novo estilo penetrava em Veneza e na vizinha cidade de 
Pádua logo após 1420. Pouco antes de 1450, o jovem 
Andrea Mantegna (1431-1506) surgiu como mestre 
independente. Iniciou a sua aprendizagem com um pintor 
menor de Pádua, mas logo na primeira fase da sua criação 
se nota a influência decisiva das obras florentinas que 
pudera ver, impressões reforçadas talvez por um contacto 
pessoal com Donatello. A seguir a Masaccio, Mantegna foi 
o pintor mais importante do Proto-Renascimento. 
A sua maior realização dessa época (nos anos de 1450) 
foram os frescos da Igreja dos Eremitani em Pádua. 
A veneração de Mantegna pelos restos visíveis da 
Antiguidade mostra a sua estreita relação com os sábios 
humanistas da Universidade de Pádua. O desejo de 
autenticidade arqueológica pode ver-se nos trajes dos 
soldados romanos. Mas as figuras tensas, delgadas e 
firmemente construídas, e especialmente a sua dramática 
interacção, derivam claramente de Donatello. 
VENEZA: BELLINI. Na pintura de Giovanni Bellini (c. 
1431-1516) podemos seguir o desenvolvimento da tradição 
flamenga. Os seus melhores quadros, tais como S. 
Francisco em Êxtase, datam das últimas décadas do século. 
A figura do santo é tão pequena, em relação ao cenário, que 
ele parece estar ali por acaso. Os contornos de Bellini são 
menos secos que os de Mantegna, as cores mais suaves e a 
luz mais brilhante. E, como os grandes flamengos, encara 
com ternura cada pormenor da Natureza. 
Considerado então o mais excelente pintor da cidade de 
Veneza, Bellini produziu vários retábulos de altar do tipo da 
Sacra Conversazione. A sua construção não é a de uma 
verdadeira igreja, porque os lados são abertos e toda a cena 
é inundada pela luz suave do Sol. 
O que de imediato diferencia o seu altar dos seus 
antecessores florentinos é não só a amplitude do desenho 
mas a sua atmosfera calma e meditativa. É uma qualidade 
que encontraremos vezes sem fim na pintura veneziana. É 
neste momento mágico que Giovanni Bellini se torna 
verdadeiramente no herdeiro dos dois grandes pintores do 
século XV, unindo a grandiosidade florentina de Masaccio 
com a intimidade poética do setentrional Jan van Eyck. 
FLORENÇA: BOTTICELLI. A tendência anunciada pelo 
David de Castagno substitui a monumentalidade estática de 
Masaccio por um movimento enérgico e gracioso. Atinge o 
ponto culminante no último quartel do século, com a arte de 
Sandro Botticelli (1444-1510). Aluno de Fra Filippo Lippi e 
fortemente influenciado por Pollauiuolo, Botticelli em 
breve se tornou o pintor preferido do chamado círculo 
Medici. 
Foi para um membro deste grupo que Botticelli pintou o 
Nascimento de Vénus, talvez o mais famoso dos seus 
quadros, cujo parentesco com o Combate dos Dez Homens 
Nus de Pollaiuolo é inconfundível. Manifestamente 
Botticelli não participa da paixão de Pollaiuolo pela 
anatomia. Os seus corpos são mais esguios e desprovidos de 
peso e força muscular, como se flutuassem, mesmo quando 
tocam o chão. Tudo isto parece negar os valores 
fundamentais da arte do Proto-Renascimento e, no entanto, 
o quadro nada tem de medieval. 
- História da Arte II - 
 - 18 - 
O NEO-PLATONISMO. Durante a Idade Média, as formas 
clássicas tinham-se divorciado dos temas clássicos. Os 
artistas utilizavam o repertório antigo de atitudes, gestos, 
expressões, etc., mas trocaram a identidade das figuras: os 
filósofos transformaram-se em Apóstolos. Quando havia 
oportunidade de representar deuses pagãos, os artistas 
baseavam-se nas fontes literárias em vez de se inspirarem 
nas obras de arte antigas. Esta foi, de um modo geral, a 
situação até meados do século XV. Só com Pollaiuolo – e 
Mantegna no Norte da Itália – a forma e o conteúdo 
clássico começaram a associar-se de novo. As pinturas 
perdidas dos Trabalhos de Hércules de Pollaiuolo (1465) 
assinalam o primeiro caso de assuntos da mitologia clássica 
tratados em ponto grande num estilo inspirado nos antigos 
monumentos. E o Nascimento de Vénus contém a primeira 
imagem monumental, desde os tempos romanos, da deusa 
nua, numa atitude derivada das suas estátuas clássicas. 
Como se podiam justificar tais imagens numa civilização 
cristã, sem expor o artista e o seu patrono à acusação de 
neo-paganismo? Na Idade Média, os mitos clássicos foram 
por vezes interpretados didacticamente. Fundir a fé cristã 
com a mitologia antiga exigia uma argumentação 
sofisticada, que ficaria a dever-se aos filósofos neo-
platónicos, cujo representante principal, Marsílio Ficino, 
gozou de formidável prestígio a partir dos últimos anos do 
século XV. O pensamento de Ficino representava a antítese 
do sistema escolástico medieval. Para Ficino, a vida do 
Universo, incluindo a do homem, estava ligada a Deus por 
um circuito espiritual, de modo que toda a revelação, quer 
da Bíblia, quer de Platão, quer ainda dos mitos clássicos, 
era só uma. 
A filosofia neo-Platónica e a sua manifestação na arte eram, 
evidentemente, demasiado complexas para se tornarem 
populares fora do círculo restrito e intelectualmente 
superior dos seus admiradores. 
FLORENÇA: PIERO DI COSIMO. Um painel de Piero di 
Cosimo (1462-1521), contemporâneo de Botticelli, ilustra 
uma visão da mitologia pagã que é oposta à dos neo-
platónicos. Em vez de espiritualizar os deuses pagãos, faz 
que desçam à terra, como seres de carne e osso. Segundo 
esta teoria, o homem teria ascendido lentamente do 
primitivo estado selvagem, mediante as descobertas e 
invenções de alguns indivíduos excepcionalmente dotados; 
a estes homens acabara por ser reconhecida a condição de 
deuses. 
FLORENÇA: GHIRLANDAIO. Como Piero, também foi 
sensível ao realismo dos Flamengos o pintor Domenico 
Ghirlandaio (1449-1494), outro contemporâneo de 
Botticelli. Os ciclos de frescos de Ghirlandaio encontram-se 
tão cheios de retratos que mais parecem crónicas de família 
dos ricos patrícios que lhos encomendaram. Um dos seus 
painéis mais comovedores é o do velho com o neto. 
Nenhum pintor do Norte poderia transmitir, como 
Ghirlandaio, a terna relação humana entre o rapazinho e o 
seu avô. Sob o aspecto psicológico, o painel revela uma 
clara origem italiana. 
URBINO: PERUGINO. Roma, muito tempo posta à 
margem, durante o exílio papal em Avinhão, tornou-se de 
novo um importante centro de arte nos finais do século XV. 
À medida que o Papado foi retomando o seu poder político 
na Itália, os ocupantes do trono de S. Pedro começaram a 
embelezar tanto o Vaticano como a cidade, na convicção de 
que os monumentos da Roma Cristã deviam ofuscar os do 
passado pagão. O projecto pictural mais ambicioso desse 
período foi a decoração das paredes da Capela Sistina, em 
1482. Entre os artistas que executaram este grande ciclo de 
cenas do Antigo e do Novo Testamento, encontramos a 
maioria dos pintores importantes da Itália central, incluindo 
Botticelli e Ghirlandaio. 
A Entrega das Chaves, de Pietro Perugino (1450-1523), 
sem dúvida pode ser tida pela melhor das suas obras. 
Nascido na Umbria, Perugino manteve estreitos laços com 
Florença. Logo na primeira fase da sua vida artística sofreu 
a influência decisiva de Verrocchio. 
CORTONA: SIGNORELLI. Luca Signorelli (1445-1523) 
anda associado a Peruginopor um passado semelhante, se 
bem que a sua personalidade seja infinitamente mais 
dramática. De origem toscana, foi discípulo de Piero della 
Francesca antes de ir para Florença nos anos de 1470. 
Como Perugino, Signorelli não escapou à funda influência 
de Verrocchio, mas admirava também a energia, 
expressividade e precisão anatómica dos nus de Pollaiuolo. 
Atingiu o apogeu da sua carreira, um pouco antes de 1500, 
nos quatro frescos monumentais que representam o fim do 
mundo, das paredes da Capela de S. Brizio, na Catedral de 
Orvieto. O que mais nos impressiona é o profundo 
sentimento trágico que impregna toda a cena. O Inferno de 
Signorelli, diametralmente oposto ao de Bosch, tem a luz 
do dia pleno, sem o pesadelo das máquinas de tortura ou os 
monstros grotescos. Os condenados conservam a dignidade 
humana e até os próprios demónios estão humanizados. 
 
- História da Arte II - 
 - 19 - 
- História da Arte II - 
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3 
O RENASCIMENTO 
PLENO 
NA ITÁLIA 
 
- História da Arte II - 
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- História da Arte II - 
 - 22 - 
O Renascimento Pleno era continuação do Proto-
Renascimento. Supunha-se que os grandes mestres do 
século XVI – Leonardo, Bramante, Miguel Ângelo, Rafael, 
Giorgione, Ticiano – haviam partilhado os ideais dos seus 
predecessores, mas dando-lhes expressão tão completa que 
os seus nomes se tornaram sinónimo de perfeição. 
Representavam o apogeu, a fase suprema do Renascimento. 
O Renascimento Pleno, se nalguns aspectos fundamentais 
nos parece a culminação do Proto-Renascimento, quanto a 
outros terá representado um ponto de partida. É certo que a 
tendência para ver no artista um génio soberano, e não um 
artífice dedicado, nunca foi mais forte que durante a 
primeira metade do século XVI. 
Este culto do génio exerceu um efeito profundo sobre os 
artistas do Renascimento Pleno, acicatando-os para 
objectivos vastos e ambiciosos. A crença do artista na 
origem divina da inspiração levava-o a firmar-se em 
critérios subjectivos de verdade e beleza, e não em critérios 
objectivos. Se os artistas do Proto-Renascimento se sentiam 
vinculados àquilo que acreditavam serem regras de validade 
universal, tais como as leis de perspectiva científica, os seus 
sucessores do Renascimento Pleno preocupavam-se menos 
com a ordem racional que com a efectividade visual. 
Desenvolveram um novo drama e uma nova retórica para 
cativar as emoções do espectador. As obras dos grandes 
mestres do Renascimento Pleno tornaram-se logo clássicas 
por direito próprio e a sua autoridade veio a ser igual à dos 
monumentos mais famosos da Antiguidade. 
 
Leonardo da Vinci 
Um dos aspectos mais estranhos do Renascimento Pleno é o 
facto de todos os seus monumentos fundamentais terem 
sido produzidos entre 1495 e 1520, apesar da grande 
diferença de idades entre os seus criadores. 
Nascido em 1452 na pequena cidade toscana de Vinci, 
Leonardo praticou com Verrocchio. Aos trinta anos entrou 
ao serviço do Duque de Milão – na qualidade de engenheiro 
militar, e acessoriamente na de arquitecto, escultor e pintor. 
A ADORAÇÃO DOS MAGOS. Leonardo deixou 
inacabada a obra mais ambiciosa que tinha encetado, uma 
grande Adoração dos Reis Magos para a qual já executara 
muitos estudos preliminares. O aspecto mais surpreendente 
– e verdadeiramente revolucionário – deste painel é o modo 
como está pintado. 
As formas parecem materializar-se de modo suave e 
gradual, nunca chegando a destacar-se completamente da 
penumbra envolvente. Leonardo não pensa em termos de 
contornos, mas sim de corpos tridimensionais tornados 
visíveis pela incidência da luz. Nas sombras, estas formas 
permanecem incompletas, os seus contornos estão 
meramente implícitos. 
A VIRGEM DOS ROCHEDOS. Pouco tempo depois de 
chegar a Milão, Leonardo executou a Virgem dos Rochedos, 
também um painel de altar. Aqui as figuras emergem da 
gruta envoltas por uma atmosfera carregada de humidade 
que lhes vela delicadamente as formas. 
A ÚLTIMA CEIA. A Última Ceia de Leonardo, composta 
uns doze anos mais tarde, tem sido sempre reconhecida 
como a primeira afirmação clássica dos ideais da pintura do 
Renascimento Pleno. Infelizmente o fresco começou a 
deteriorar-se poucos anos depois de ter sido acabado. 
Olhando a composição como um todo, salta desde logo à 
vista a sua estabilidade equilibrada como nenhum artista 
jamais tentara. 
Leonardo começou pela composição das figuras e a 
arquitectura desempenhou, desde o primeiro momento, o 
papel de simples apoio. Este quadro exemplifica o que o 
artista escreveu num dos seus livros de apontamentos: que o 
objectivo último da pintura, mas também o mais difícil de 
alcançar, é retratar a intenção da alma humana. 
A MONA LISA. Em 1500 ia executando o famosíssimo 
retrato de Mona Lisa. O delicado sfumato alcançou um tal 
grau de perfeição que pareceu um milagre aos 
contemporâneos do artista. A fama deste óleo não vem 
apenas de uma subtileza pictórica; mais intrigante ainda é o 
fascínio psicológico da personalidade do modelo. Porque 
nenhum outro sorriso foi considerado tão misterioso? 
OS DESENHOS. Na idade avançada, Leonardo dedicou-se 
cada vez mais aos seus interesses científicos. O alcance 
extraordinário das suas investigações pessoais está presente 
nas centenas de desenhos e notas que esperava incorporar 
numa série de tratados enciclopédicos. Os testemunhos dos 
contemporâneos mostram que Leonardo gozava de 
reputação como arquitecto. Estes esboços possuem uma 
grande importância histórica, pois através deles se consegue 
estabelecer a transição do Proto-Renascimento para o 
Renascimento Pleno na arquitectura. 
 
Bramante 
O TEMPIETTO. Bramante seria o criador da arquitectura 
do Renascimento Pleno. O novo estilo já se define no 
Tempietto de S. Pietro in Montorio, de Bramante, 
projectado pouco depois de 1500. 
A BASÍLICA DE S. PEDRO. O Tempietto é a primeira das 
grandes realizações que fizeram de Roma o centro da arte 
italiana durante o primeiro quartel do século XVI. Coube a 
Bramante a tarefa de substituir a velha basílica de S. Pedro, 
por uma igreja tão magnificente que ofuscasse todos os 
monumentos da antiga Roma imperial. O plano de 
Bramante obedecia a todos os requisitos estabelecidos por 
Alberti para a arquitectura religiosa, baseado inteiramente 
no círculo e no quadrado. 
Como é que ele se propunha construir um edifício de 
tamanho tão imponente? A pedra talhada ou tijolo, os 
materiais preferidos pelos arquitectos medievais não 
serviam, por razões de ordem técnica e económica; só a 
construção em betão, tal como a usada pelos romanos, mas 
depois caída em esquecimento durante a Idade Média, era 
suficientemente forte e barata para responder às 
necessidades de Bramante. Ao dar vida nova a esta técnica 
antiga, abriu uma nova era na história da arquitectura, uma 
vez que o betão permitia realizar traçados de muito maior 
flexibilidade que os métodos de construção dos pedreiros 
medievais. 
- História da Arte II - 
 - 23 - 
Miguel Ângelo 
Miguel Ângelo foi escultor e abraçava uma fé na imagem 
humana como supremo veículo de expressão conferindo-lhe 
afinidade com a escultura clássica. Assim como concebia as 
suas estátuas como corpos humanos libertados da sua prisão 
de mármore, também o corpo era para ele a prisão terrena 
da alma. Este dualismo entre corpo e espírito confere às 
suas figuras um “pathos” extraordinário; calma no exterior, 
parecem ser agitadas por uma energia psíquica irresistível. 
DAVID. As qualidades únicas da arte de Miguel Ângelo 
estão integralmente presentes no David, a primeira estátua 
monumental do Renascimento Pleno, encomendada em 
1501. A escala heróica, a beleza e poder sobre-humanos e o 
volume dilatado das suas formas tornaram-se parte do 
próprio estilo de Miguel Ângelo e, através dele, da arte doRenascimento em geral. 
O TÚMULO DE JÚLIO II. Este traço persiste no Moisés e 
nos dois escravos esculpidos cerca de uma década mais 
tarde. 
A CAPELA SISTINA. O sepulcro de Júlio II ficou por 
acabar quando o papa interrompeu a actividade de Miguel 
Ângelo na fase inicial do projecto, para que ele fosse 
decorar a fresco o tecto da Capela Sistina. Miguel Ângelo 
realizou o trabalho em quatro anos (1508-12), produzindo 
uma obra-prima que fez época. É um imenso organismo 
com centenas de figuras distribuídas ritmicamente dentro da 
moldura arquitectónica pintada. Na área central, 
subdividida por cinco pares de traves, encontram-se nove 
cenas do Génesis, desde a criação do Mundo até à 
Embriaguez de Noé. 
O JUÍZO FINAL. Quando Miguel Ângelo voltou à Capela 
em 1534, mais de vinte anos depois, o mundo ocidental 
sofria a crise espiritual e política da Reforma. É com crua 
nitidez que nos apercebemos da mudança de atmosfera 
quando passamos da vitalidade radiante dos frescos do 
tecto, para a visão sombria do Juízo Final. 
A CAPELA DOS MÉDICIS. O intervalo entre a realização 
do tecto da Capela Sistina e a do Juízo Final, a família 
Médici preferiu empregar Miguel Ângelo em Florença. As 
actividades deste centraram-se em San Lorenzo, a igreja dos 
Médicis. 
A BIBLIOTECA LAURENTINA. Miguel Ângelo 
construiu a Biblioteca Laurentina, anexa a San Lorenzo, 
para aí instalar para o público a vasta colecção de livros e 
manuscritos pertencentes à família Médici. 
O CAPITÓLIO. Durante os últimos trinta anos da sua vida, 
a arquitectura tornou-se a principal preocupação de Miguel 
Ângelo. Em 1537-39 recebeu o encargo mais ambicioso da 
sua carreira: transformar o Capitólio numa praça com um 
enquadramento monumental digno deste local venerado, 
outrora o centro simbólico da Roma Antiga. Tinha, 
finalmente, oportunidade de planear em grande escala e 
tirou todo o partido dela. 
S. PEDRO. Com o Capitólio, a ordem colossal ficou 
firmemente estabelecida no repertório da arquitectura 
monumental. O próprio Miguel Ângelo voltou a utiliza-la 
no exterior da igreja de S. Pedro, com resultados 
igualmente impressionantes. 
A PIETÁ DE MILÃO. A segurança magnífica com que 
Miguel Ângelo tratou projectos como os do Capitólio, ou o 
da igreja de S. Pedro, parece desmentir o seu auto-retrato, 
sob a forma de uma pele engelhada, no Juízo Final. Na sua 
última peça escultórica, a Pietá de Milão, há uma busca de 
novas formas. 
 
Rafael 
Se Miguel Ângelo é o génio solitário, Rafael pertence com 
a mesma certeza ao tipo oposto: o do artista-homem de 
sociedade. Ele é o pintor central do Renascimento Pleno, a 
nossa concepção global desse estilo assenta mais na sua 
obra que na de qualquer outro mestre. 
O génio de Rafael consistiu num poder de síntese único, 
que lhe permitiu fundir as qualidades de Leonardo e de 
Miguel Ângelo, criando uma arte ao mesmo tempo lírica e 
dramática, unindo a riqueza da pintura à solidez da 
escultura. 
A ESCOLA DE ATENAS. A influência de Miguel Ângelo 
sobre Rafael afirmar-se-ia com toda a plenitude nas pinturas 
que este fez em Roma. Na altura em que Miguel Ângelo 
iniciava a pintura do tecto da Capela Sistina, Júlio II fez vir 
de Florença o jovem artista e encarregou-o de decorar um 
conjunto de salas do Palácio do Vaticano. 
A Escola de Atenas de há muito reconhecida como a obra-
prima de Rafael é a corporização perfeita do espírito 
clássico do Renascimento Pleno. O tema é “a escola 
ateniense de pensamento”, um grupo de filósofos gregos 
famosos, reunidos à volta de Platão e Aristóteles, cada qual 
numa actividade ou atitude característica. É evidente que 
deve a Miguel Ângelo a energia expressiva, o poder físico. 
A impressionante composição das personagens. 
A GALATEIA. Rafael jamais voltou a montar um fundo 
arquitectural tão esplêndido. A criação do espaço pictural 
confiou-o cada vez mais ao movimento das figuras 
humanas. Na Galateia, de 1513, o tema é outra vez clássico 
– a bela ninfa Galateia, perseguida em vão por Polifemo, 
pertence à mitologia grega. 
OS RETRATOS. Já numa primeira fase da sua carreira 
Rafael dera mostras de talento especial como retratista. A 
sua genial capacidade de síntese revela-se na combinação 
do realismo dos retratos do século XV com o ideal humano 
do Renascimento Pleno. Rafael não favorecia os retratados, 
nem seguia as convenções. 
 
Giorgione 
A distinção entre o Proto-Renascimento e o Renascimento 
Pleno, tão marcada em Florença e em Roma, é muito menos 
acentuada em Veneza. Giorgione (1478-1510), o primeiro 
pintor veneziano a pertencer ao século XVI, apenas saiu da 
órbita de Bellini durante os últimos anos da sua breve 
carreira. 
- História da Arte II - 
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A TEMPESTADE. Entre as raras obras da sua plenitude, A 
Tempestade é ao mesmo tempo a mais individual e a mais 
enigmática. As figuras de Giorgione não nos explicam a 
cena; pertencem à Natureza, são testemunhas passivas da 
tormenta prestes a desabar sobre elas. 
 
Ticiano 
Giorgione morreu antes de poder explorar por completo o 
mundo sensual e lírico criado em A Tempestade. Legou essa 
tarefa a Ticiano (1488-1576), um artista de dotes 
comparáveis, influenciado decisivamente por Giorgione, 
que dominou a pintura veneziana durante o meio século 
seguinte. 
A BACANAL. A Bacanal, de 1518, é abertamente pagã, 
inspirada na descrição de um autor antigo. Ticiano 
familiarizou-se com a arte do Renascimento Pleno e alguns 
dos participantes da Bacanal também reflectem a influência 
da arte clássica. Ele vê o reino dos mitos clássicos como 
parte do mundo natural, habitado por seres de carne e osso e 
não por estátuas animadas. 
A VIRGEM DE PESARO. A mesma qualidade de 
animação festiva reaparece em muitas das suas pinturas 
religiosas, como sucede em Virgem com Pessoas da 
Família Pesaro. 
OS RETRATOS. Depois da morte de Rafael, Ticiano 
tornou-se o retratista mais procurado da época. Os seus 
dotes prodigiosos são ainda mais notáveis no Homem da 
Luva. 
OBRAS DO ÚLTIMO PERÍODO. A correspondência entre 
forma e técnica é clara em Cristo Coroado de Espinhos, 
uma obra-prima de Ticiano na velhice. 
 
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- História da Arte II - 
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4 
O MANEIRISMO 
E OUTRAS 
TENDÊNCIAS 
 
- História da Arte II - 
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 - 28 - 
O que aconteceu depois do Renascimento Pleno? Falta-nos 
ainda encontrar um nome para os setenta e cinco anos que 
medeiam entre o Renascimento Pleno e o Barroco. Tal 
período é um tempo de crise que deu origem a diversas 
tendências antagónicas, mais que a um ideal predominante. 
 
 
A PINTURA 
 
O Maneirismo: Florença e Roma 
Entre as várias tendências artísticas que se manifestaram a 
seguir ao Renascimento Pleno, a do Maneirismo é a mais 
discutida. O termo, no sentido original, é limitado e 
pejorativo, e designava o estilo de um grupo de pintores dos 
meados do século XVI, activos em Roma e Florença, que 
cultivavam uma arte conscientemente artificial e 
amaneirada, derivada de algumas concepções de Rafael e 
Miguel Ângelo. 
ROSSO. Os primeiros indícios de inquietação no 
Renascimento Pleno aparecem pouco antes de 1520, na 
obra de alguns jovens pintores de Florença. Em 1521, 
Rosso Fiorentino (1495-1540), o mais excêntrico membro 
deste grupo, exprimiu a nova atitude com firme convicção 
em A Descida da Cruz. As figuras agitam-se mas são 
rígidas. Há aqui uma revolta contra o equilíbrio clássico da 
arte do Renascimento Pleno. 
PONTORMO. Pontormo (1494-1557), um amigo de Rosso, 
tinha uma personalidade igualmente estranha. Introvertido e 
tímido, os seus desenhos, de uma sensibilidade 
maravilhosa, tais como Estudo de uma Jovem, reflectem 
bem estas facetas do seu carácter. 
PARMIGIANINO. Esta primeira fase do Maneirismo, o 
estilo

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