Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
1 Análise incremental aplicada à TIR Thiago Fonseca Morello fonseca.morello@ufabc.edu.br sala 301, Bloco Delta, SBC 3 Análise incremental 3.0 Divergência entre TIR e VPL É útil procurar compreender porque a TIR, mesmo em sua versão modificada, não é um indicador adequado para comparar o desempenho financeiro de dois ou mais projetos. Seja tomado um exemplo simples. Há dois projetos de investimento disponíveis, ambos com duração de apenas um período. O projeto A proporciona receita 1,1C um período à frente a partir de um investimento C. Já o projeto B proporciona receita 10,5C a partir de um investimento 10C. Com estes dados, pode-se calcular a TIR dos projetos como segue. TIR(A) = ݅∗: 1,1ܥ(1 + ݅∗) − ܥ = 0 → ݅∗ = 1,1ܥܥ − 1 = 0,1 TIR(B) = ݅∗ : 10,5ܥ(1 + ݅∗) − 10ܥ = 0 → ݅∗ = 10,5ܥ10ܥ − 1 = 11ܥ10ܥ − 0,5ܥ10ܥ − 1 = ݅∗ − 0,05= 0,05 Se fosse aplicado o critério de selecionar o projeto com maior TIR, o qual parece intuitivo, o projeto A seria selecionado. Porém, tal critério ignora o fato de que o capital inicial a partir do qual a TIR é gerada é maior no projeto B, ou seja, a TIR incide sobre uma maior base no projeto B. Se a magnitude em que esta base é maior for suficiente para compensar a menor TIR, o projeto B gera um maior montante. O que é equivalente a afirmar que o projeto B gera um maior retorno financeiro absoluto ou lucro. Esta possibilidade é ignorada pela TIR, a qual é uma medida para o retorno econômico percentual ou rentabilidade. É exatamente por isso que o critério de maior VPL pode levar a uma decisão de investimento diferente daquela apontada pelo critério de maior TIR. Uma maneira simples de compreender porque tal divergência é possível consiste em calcular o VPL para o exemplo acima. Para isso, o capital inicial requerido pelo projeto A será denotado por CA. A receita proporcionada pelo projeto A um passo à frente será denotada por RA e escrita como RA = (1+݅∗) RA. Já, para o projeto B, temos RB = (1+݅∗ ) CB. Esta notação torna explícito que a receita é determinada por dois fatores, o retorno percentual implícito, a TIR, e o valor do investimento inicial. A contribuição deste último elemento para o retorno econômico é desconsiderada pela TIR mas não pelo VPL. Os VPLs abaixo deixam isso claro, em que “i” representa a taxa de juro de mercado ou TMAR. 2 VPL(A) = ܴ(1 + ݅)− ܥ = (1 + ݅∗)ܥ(1 + ݅) − ܥ = ቆ(1 + ݅∗)(1 + ݅) − 1ቇܥ ⟶ VPL(A) = ݂(݅∗ , ݅,ܥ) Analogamente, VPL(B) = ቆ(1 + ݅∗ )(1 + ݅) − 1ቇܥ ⟶ VPL(B) = ݂(݅∗ , ݅,ܥ) Fica nítido, pois, que o VPL de um projeto é uma função crescente da TIR e do capital inicial. Desta maneira, pois, se CB for grande o bastante para compensar o menor valor de ݅∗ , é possível ter um maior VPL para o projeto B. Os critérios se mostrariam, pois, divergentes. No exemplo simples apresentado, em que há apenas um período, a divergência decorre da discrepância dos projetos em função do capital inicial. Porém, em projetos com mais períodos, a divergência em questão pode ser imposta também (ou exclusivamente) por discrepâncias referentes às receitas líquidas. Conforme já dito anteriormente, há uma razão conceitual para a possibilidade de divergência entre os critérios de maior TIR e maior VPL. Os dois indicadores são medidas para aspectos distintos da performance financeira de um projeto. A TIR mede a rentabilidade, enquanto o VPL mede a massa de lucro ou lucro absoluto. Esta última medida é mais correta pois o objetivo do investidor é maximizar lucro e não rentabilidade. Conforme dito em Newnan et al (2004), o objetivo geralmente é maximizar o retorno e não a taxa de retorno. Deve-se assinalar que a TIRM está sujeita às mesmas limitações da TIR discutidas nos parágrafos anteriores, exatamente porque do fato de que ambas são taxas e não medidas absolutas. É, porém, possível calcular a TIR de maneira a garantir que ela sempre aponte para o projeto que renderá maior ampliação da capacidade de investimento. Isso é, é possível eliminar a possibilidade de que o critério de maior TIR divirja do critério de maior VLP. É o que a análise incremental de um investimento proporciona. 3.1 Intuição para a análise incremental É incorreto utilizar o “critério” de maior TIR para selecionar um dentre pelo menos dois projetos de investimento. Contudo, há um procedimento que habilita a TIR a ser utilizada para selecionar dentre dois ou mais projetos, denominado por “análise incremental”. Conforme definido por Newnan et al (cap.81) trata-se da “análise das diferenças entre alternativas”. O termo “incremental” é, portanto, utilizado como sinônimo de “diferença”. Como afirmam os autores, a ideia é básica é determinar se “os 1 É recomendada a leitura deste capítulo aos interessados em análise incremental, especialmente por conta da análise gráfica bastante esclarecedora. 3 custos diferenciais são ou não justificados pelos benefícios diferenciais.” E é esclarecedor tomar a equação básica por eles apresentada: Alternativa de maior custo = alternativa de menor custo + diferenças entre as duas alternativas. Esta equação conceitual é bastante esclarecedora sobre o procedimento de análise incremental. Ela é representada graficamente na figura abaixo, em que Ci e Ri são, respectivamente, o custo e a receita da i-ésima alternativa. No caso, i =2 é a alternativa de maior custo, e também de maior receita. Será que ela vale a pena, comparativamente à alternativa 1? Figura 1 Diferenças de custo e de receita, alternativas 1 e 2 hipotéticas A resposta é afirmativa, pois o diferencial de receita é superior ao diferencial de custo, conforme se vê na terceira parte do gráfico da esquerda para a direita. Isso quer dizer que cada R$1 adicional investido na alternativa 1 proporciona mais de R$1 adicional em retorno. O excedente de despesa, portanto, é mais do que compensado pelo excedente de receita. De fato, considerando dois projetos genéricos de mesma duração cujos fluxos de caixa são {RL1,1,RL1,2,...,RL1,T} e {RL2,1,RL2,2,...,RL2,T}, o fluxo de caixa incremental corresponde à série de diferenças instante a instante de receitas líquidas. Contudo, para calcular as diferenças deve-se adotar o princípio de subtrair a série do projeto com maior custo inicial pela série do outro projeto. Assumindo se o projeto 1 o de maior custo, obtém-se {RL1,1- RL2,1, RL1,2- RL2,2,...,RL1,T- RL2,T} ≡ fluxo de caixa incremental. É direto perceber que: {RL1,1- RL2,1, ,...,RL1,T- RL2,T} = {R1,1-R2,1+D2,1-D1,1..., R1,T-R2,T+D2,T-DT,1} O que significaria o fato de o VPL do fluxo incremental ser positivo? Significaria que o valor presente dos excedentes de receita proporcionados pelo projeto 1 seria superior ao valor presente dos excedentes de despesa exigidos pelo projeto 2. Ou seja, a soma adicional investida no projeto 2 seria mais do que compensada e, portanto, o projeto 2 vale mais a pena do que o 1 (volta-se ao caso da figura anterior). Se o VPL do fluxo de $ 100 90 80 70 60 50 40 30 20 10 0 C2 R2 C1 R1 C2-C1 R2 - R1 Alternativa 1 Diferenças: 2 - 1Alternativa 2 4 caixa incremental é positivo, então a TIR referente ao fluxo incremental é superior à TMAR. Essa é a essência do critério da TIR incremental. 3.2 Procedimento No que segue, o procedimento de análise incremental para a TIR é descrito para o caso de dois ou mais projetos. 1. Ordenar os projetos em ordem crescente de investimento inicial, C0, (despesa que ocorre em t = 0); 2. Considerar como primeiro par de projetos a ser analisado aquele composto pelo investimento financeiro (à TMAR) e pelo projeto de menor C0. 3. Denominar o investimento financeiro por “defendente” e o projeto de menor C0 por “desafiante”; 4. [Caso estejam sendo comparados projetos que geramreceita (e não apenas despesa) ] Calcular a TIR para o projeto “desafiante”: a. Se TIR < TMAR, o desafiante é eliminado da sequencia ordenada; b. Caso contrário, o CSP é eliminado da sequencia ordenada. c. Repetir este passo até atingir o primeiro projeto com TIR ≥ TMAR; 5. Considerar o par de projetos composto pela alternativa não eliminada no passo anterior e pelo projeto com C0 imediatamente maior – se estão sendo comparadas alternativas que não geram receita, nenhum projeto foi eliminado. Denominar por “defendente (def.)” o projeto de menor C0; já o desafiante (des.) é o projeto de maior C0. Realizar os passos: a. Obter o fluxo de caixa incremental, correspondente à RLdes.(t) – RLdef.(t), para todos os períodos “t” de tempo; b. Calcular a TIR para o fluxo de caixa incremental, a qual é denominada por TIR incremental ou ΔTIR; c. Se ΔTIR < TMAR, o desafiante é eliminado da sequencia ordenada; d. Caso contrário, o defendente é eliminado da sequencia ordenada. 6. Repetir passos 5 a 7 até que apenas uma alternativa seja selecionada. Notar que, para isso, é preciso avançar em ordem crescente de C0, com pares em que o desafiante sempre corresponde ao projeto com C0 imediatamente superior ao desafiante do par anterior. Nota: caso os projetos em pauta não gerem receita, compreendendo pois alternativas de prestação de um mesmo serviço ou desempenho de função produtiva, não é possível compará-los com o projeto de investimento financeiro. A razão disso está em que o último tem como objetivo a geração de receita, enquanto os projetos em pauta visam a prestação de um serviço (não redutível à receita), por exemplo, descarte de resíduos e efluentes que ocorrem como subproduto do processo produtivo. Esta é a razão mais importante pela qual o estágio de comparação da TIR de tais projetos com a TMAR é eliminado. A segunda razão, menos importante, está em que não é possível calcular a TIR para fluxos de caixa cujo sinal não mude pelo menos uma vez. 5 3.3 Exercícios 1 A empresa Caterpillar considera quatro localizações para instalar uma nova fábrica. Conforme se vê na tabela abaixo, tanto o custo de instalação (custo inicial) bem como o fluxo de caixa anual líquido variam espacialmente em função de diferenças regionais salariais, de custos de transporte, preço do terreno. Assumindo que a empresa não se satisfaz com um retorno financeiro inferior a 10%, usa a análise de TIR incremental para determinar qual localização é economicamente superior. A B C D Taxa de juros (TMAR) 0,1 Custo inicial 20.000,00 275.000,00 190.000,00 350.000,00 Fluxo de caixa anual 22.000,00 35.000,00 19.500,00 42.000,00 Vida útil 30 30 30 30 A resolução pode ser encontrada na planilha “TIR_incremental”. No que segue apenas o essencial é comentado. Passo 1: ordenação das alternativas em função de C0: C, A, B, D Passo 2: análise do primeiro par: CSP vs C É preciso elaborar uma tabela com o fluxo de caixa líquido da alternativa C para 30 anos. E então, utilizar a função TIR(.) do Excel, tendo como argumento o fluxo de caixa líquido elaborado. Há dois cuidados a tomar: (i) o custo inicial, C0, deve fazer parte do fluxo de caixa líquido, (ii) custos (ou despesas) devem ter sinal negativo no fluxo de caixa, o mesmo valendo para fluxos líquidos compostos por receitas inferiores à despesas. Os demais fluxos devem ter sinal positivo. É obtido um valor 0,091 < TMAR. Logo, a alternativa C é eliminada da sequencia de projetos. Passo 3: análise do segundo par: CSP vs A Com base no fluxo de caixa líquido da alternativa A, a função TIR reporta um valor de 0,1044 > 0,1. Desta feita, o CSP (defendente) é eliminado e a alternativa A mantida. Passo 4: análise do terceiro par: A vs B Tendo sido eliminado o CSP, é necessário calcular, a partir de agora, o fluxo de caixa incremental, RLdes.(t) – RLdef.(t). No caso, a alternativa A é a defendente e a B a desafiante. A TIR incremental é de 0,172 > TMAR e, pois, a alternativa de maior custo do par, B, se mostra economicamente justificada. O que é equivalente a eliminar A da sequencia. Passo 5: análise do quarto par: B vs D 6 A alternativa B agora é a defendente e D a desafiante. A TIR calculada a partir de RLdes.(t) – RLdef.(t), i.e, RLD(t) – RLB(t) é de 0,085 < TMAR. A desafiante não é economicamente justificada, sendo, pois eliminada. A alternativa B, conclusivamente, é mantida. Ela é a melhor opção do ponto de vista econômico. 2 Calculando a TIRMI para o exemplo anterior. A tabela duas páginas atrás apresenta um fluxo de caixa incremental. Cabe calcular a TIRMI para ele. Para isso, será assumida uma taxa de captação de recursos equivalente à taxa de mercado de 10% a.a. Para simplificar o fluxo do caixa incremental que é altamente desuniforme, pode-se considerar a separação entre fluxos negativos e positivos na tabela abaixo. Ano Fluxo de caixa incremental (B - A) Fluxos positivos Fluxos negativos 0 - 25.000,00 2.000,00 -27.000,00 1 2.000,00 2.000,00 0 2 2.000,00 2.000,00 0 3 2.000,00 2.000,00 0 4 2.000,00 2.000,00 0 5 2.000,00 2.000,00 0 6 2.000,00 2.000,00 0 7 2.000,00 2.000,00 0 8 67.000,00 65.000,00 + 2.000 0 9 2.000,00 2.000,00 0 10 2.000,00 2.000,00 0 11 2.000,00 2.000,00 0 12 - 83.000,00 2.000,00 -85.000,00 13 2.000,00 2.000,00 0 14 2.000,00 2.000,00 0 15 2.000,00 2.000,00 0 16 67.000,00 65.000,00 + 2.000 0 17 2.000,00 2.000,00 0 18 2.000,00 2.000,00 0 19 2.000,00 2.000,00 0 20 2.000,00 2.000,00 0 21 2.000,00 2.000,00 0 22 2.000,00 2.000,00 0 23 2.000,00 2.000,00 0 24 7.000,00 5.000,00 + 2.000 0 7 Passo 1, cálculo do VP dos fluxos incrementais negativos ܸܲ(ܦ) = 27.000 + 85.000(1 + 0,1)ଵଶ = ܴ$ 54.083,62 Passo 2, cálculo do VF dos fluxos incrementais positivos ܸܨ(ܴ) = 2.000 + 2.000(1 + 0,1)ଶଷ + ⋯+ 2.000(1 + 0,1) + 65.000(1 + 0,1)ଵ+ 65.000(1 + 0,1)଼ + 5.000(1 + 0,1) = 2.000 + 2.000 (1 + 0,1)ଶସ − 10,1 + 65.000(1 + 0,1)ଵ + 65.000(1 + 0,1)଼+ 5.000(1 + 0,1) = 622.001,17 Passo 3, cálculo da TIRM TIRM = (VF/VP)1/T – 1 = (622.001,17 /54.083,62)1/24 – 1 = 0,1071. Passo 4, decisão Como a TIRMI se mostra superior a TMAR, o projeto B deve ser escolhido. 2 Blank e Tarquin (2011, 8.24, adaptado) A Hewett Eletronics fabrica transdutores de pressão. A empresa precisa escolher entre duas máquinas. Seleciona a mais economicamente vantajosa com base na TIRMI, considere uma TMAR de 18% a.a. Ano Máquina A Máquina A Fluxo de caixa incremental (B - A) 0 - 270.000,00 - 245.000,00 25.000,00 1 - 135.000,00 - 139.000,00 - 4.000,00 2 - 135.000,00 - 139.000,00 - 4.000,00 3 - 135.000,00 - 139.000,00 - 4.000,00 4 - 135.000,00 - 139.000,00 - 4.000,00 5 - 135.000,00 - 139.000,00 - 4.000,00 6 - 60.000,00 - 104.000,00 - 44.000,00 8 R: Deve-se ter em conta a convenção de tomar como o primeiro elemento da subtração o fluxo de caixa do projeto com maior custo inicial, a máquina A, no caso. Passo 1, fluxo de caixa incremental Ano Máquina A Máquina B Fluxo de caixa incremental (A- B) 0 - 270.000,00 - 245.000,00 - 25.000,00 1 - 135.000,00 - 139.000,00 4.000,00 2 - 135.000,00 - 139.000,00 4.000,00 3 - 135.000,00 - 139.000,00 4.000,00 4 - 135.000,00- 139.000,00 4.000,00 5 - 135.000,00 - 139.000,00 4.000,00 6 - 60.000,00 - 104.000,00 44.000,00 Passo 2, cálculo do VF dos fluxos incrementais positivos ܸܨ(ܴ) = 4.000(1 + 0,18)ଵ + ⋯+ 4.000(1 + 0,18) + 44.000= 4.000 (1 + 0,18) − 10,18 + 40.000 = ܴ$ 77.767,87 O valor presente do único fluxo negativo é exatamente igual ao valor original dele, $25.000. Passo 3, cálculo da TIRM TIRM = (VF/VP)1/T – 1 = (77.767,87 /25.000)1/6 – 1 = 0,2082. Passo 4, decisão Como a TIRMI se mostra superior à TMAR, a máquina A deve ser escolhida.
Compartilhar